Construção

O presente trabalho visa ilustrar a história de Tanabi.
Autor: Terso Marcel Mazza

Historiador Sebastião Almeida Oliveira

Sebastião Almeida Oliveira nasceu na cidade de Monte Azul, Estado de São Paulo, no dia 8 de março de 1904, vindo a ser batizado na Paróquia da mesma cidade em 8 de maio do referido ano. Filho de José Almeida Oliveira e Augusta Antônia de Jesus, agricultores, de nacionalidade portuguesa. Deste matrimônio nasceram Basílio, Sebastião, Alice, João, Adélio, Samartinho e Júlio.
            Cursou o primário na escola “Modelo”, tendo como seu primeiro professor o Sr. José Cione. Em 1912, com oito anos de idade, mudou-se com sua família para a zona rural, uma fazenda chamada “Lusitânia”, agreste de Ribeirão Claro, atual Guapiaçu, na região de São José do Rio Preto. Quando lá chegou, em carro de bois, ficou desolado diante da mata rústica que era realidade difícil de encarar.
            Os anos começaram a desfilar paulatinamente, e, Sebastião Almeida Oliveira dedicou seu tempo ao trabalho rude da lavoura e ao estudo à noite, pois, à míngua de instrução, fez um curso de agrimensor por correspondência, pelas Escolas Internacionais de Buenos Aires, com aulas em espanhol e, semanais, complementados por dois outros cursos, também por correspondência, de inglês e português por escolas nacionais.
            Mas, nada obstante às agruras do trabalho e sua satisfação de autodidata, alimentou ideias de alforria do meio em que vivia. Solicitou a um amigo que encontrasse um negócio para a troca de um cartório por uma hipoteca de imóvel rural com um advogado da cidade de São José do Rio Preto. Após alguns dias, eis que surge, em sua casa, o seu colega, e foi até à roça onde trabalhava para propor um negócio viável por uma escrivaninha cartorial na cidade de Tanabi.         Imediatamente, Sebastião Almeida aceitou e, momentos decorridos, foi de auto até a cidade citada (Tanabi) onde entrou em entendimento com o interessado e ainda o Cel. Militão Alves Monteiro (chefe político), e demais membros do diretório político da cidade. Bem jovem ainda, provindo do meio rural provinciano, onde até então vivia, sem contato com a cidade, assumiu, ex abrupto o cargo de oficial do Registro Civil de Tanabi, com funções de tabelião. Assumiu interinamente em 01 de setembro de 1927; em 10 de janeiro de 1928, tornou-se tabelião efetivo do Cartório de Registro Civil de Tanabi por ato assinado pelo então Presidente de Estado, Dr. Júlio Prestes de Albuquerque e pelo Secretário de Justiça, A.C. de Paula Junior.
            Na data de 30 de setembro de 1930, contraiu núpcias com a Sra. Carmen Vargas (natural de Taquaritinga, filha de João Vargas Manzano e Jacoba Manzano Ruiz) em regime de comunhão universal, no Cartório local, perante o juiz de paz José Serafim da Silva; termo 112, folha 133, livro B-7. O casal teve um filho e faleceu logo após o nascimento; vindo posteriormente a adotar as filhas Luzia Pereira Coin, casada com Santo Coin, e Sónia Maria Ramos, casada com Luiz Antônio Alves Feijó. 
            O jovem moço, sempre à procura de conhecimento, resolve estudar a língua esperantista; em 26 de agosto de 1934, indaga sobre o esperanto ao Sr. Ismael Gomes Braga, escritor esperantista de renomado nome na cidade do Rio de Janeiro. Na esperança de um retorno, em 30 de agosto de 1934, recebeu a sua primeira carta e, juntamente, o curso de esperanto, além de explicações e anotações a respeito. Entre idas e vindas de correspondências, Sebastião Almeida em 01 de janeiro de 1935, começa, realmente, a se aprofundar na língua esperantista da qual se tornou fervoroso apologista e, nessa qualidade, exerceu posteriormente o cargo de delegado local de várias entidades esperantistas. Ainda jovem, despertou curiosidades a respeito de vários temas, sendo apaixonado pelo folclore, dedicando-se ao estudo da geografia, história, ciências, dentre as quais se destaca a arte de desenhar e fazer caricaturas.

Obras literárias


          Neste trabalho, em 25 de fevereiro do ano de 1937, o autor aborda a origem; nomadismo; característica comum; a mulher; o casamento; tipos de habitação; gêneros de trabalho, o fogo e a roça; mezinhas; crendices; modo de cumprimentar; armas e armadilhas; o pilão; influência do mascate na vivência sertaneja.








Em dezembro do ano de 1938, o autor aborda aspectos geográficos e hidrográficos bem como as divisas do município de Tanabi. 
           
Publicou, em 1940, o livro “Expressões do Populário Sertanejo”, 219 páginas, edição da livraria Civilização Brasileira, que foi recebido com louvores pela crítica nacional. Nesse livro, o autor pesquisou tradições populares, superstições, parlendas, modismos, frases feitas e a gíria local e regional, uma fonte inesgotável de consulta. 








Em 1942, lança a obra “Garcia Redondo” (admirado polígrafo da França moderna, engenheiro e romancista já olvidado), mediante o qual obteve ingresso na Academia de Ciências e Letras do Estado de São Paulo; esta publicação foi a tese de recipiendário. Garcia Redondo é o patrono da cadeira, na Academia, que Sebastião Almeida ocupou. 








Em 1947, lança o “Cancioneiro Tanabiense”, publicação feita pela revista do Arquivo Municipal de São Paulo; nesta obra, o autor traduz expressões de cunho romântico e amoroso, ao passo que, na segunda parte, registra cantigas de escárnio e burla, eivadas de sadio humorismo e pandas de malícia; canções a um tempo jogralescas e sensatas resultam desabafos de quem sofreu ingratidões ou desenganos e, através de comparações e cotejos, que vão até ao insulto, entremostram estados de alma diversos por meio de imagens raras e perfeitas. 






No ano de 1948, publica outra obra intitulada “Folclore e outros Temas”, pela editora Gazeta de Limeira S.A. Editora; na presente obra, o autor estudou ensaios temáticos sobre a nossa demopsicologia. 










Por fim, em 1977, lança “Subsídios para a história de Tanabi”, edição da editora Grafik – assessoria e consultoria editorial – São Paulo. Neste tema, o autor descreve o fator histórico do município de Tanabi; suas origens, povoação, fundação etc.








            Incansável na escrita, deixou no prelo outras obras literárias; mas não foi possível sua publicação, devido a falta de recursos financeiros para a concretização e efetivação junto ao domínio público. Ficaram para serem lançadas as seguintes obras: “Poranduba Folclórica”, “Notas de Leitura”, “Expressões do Populário Brasileiro”, “Estudos sobre Paremiologia” e “Conceito e Definição de Folclore”.


Em julho do ano de 2009, foi lançado o livro "Folclore, Memórias e História do Rio das Borboletas", através da Editora ASJ de Tanabi-SP, contendo 270 páginas, o livro aborda toda a vida de Sebastião Almeida Oliveira, aonde também é publicado obras inéditas com referência a cidade de Tanabi. Autor: Terso Marcel Mazza. Apoio - Prefeitura do município de Tanabi.







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            Foi membro do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, Minas Gerais e Uruguaiana, na fronteira sulina; fundador do jornal “O Município” de Tanabi; Membro da Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro, Buenos Aires e Washintgon; sócio da “União Brasileira de Escritores”, Membro da Academia Brasileira de História; foi escolhido titular da Academia Riopretense de Letras (na época, em fase de organização, vindo posteriormente a não ser instalada); membro do Centro de Estudos da Sociedade Brasileira de Estatística; sócio da Confraternidad Universal Balzaciana, Montevidéo – Uruguai; membro da Sociedade de Etmografia e Folclore de São Paulo; membro do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás; membro do Centro de Ciências, Letras e Arte, de Campos; membro da Sociedade de Geografia, Pen Clube do Brasil, membro da Sociedade dos Amigos de “Alberto Torres”, do Rio de Janeiro; membro da National Geographic Society, de Washington; membro do Institute of American Ideals, de Sundand Califórnia, USA; membro da Associação Cultural, de Guiratinga, Mato Grosso; membro da Sociedade Brasileira de Folk-Lore do Brasil, estado do Rio Grande do Norte; membro da Associação Paulista de Imprensa  e  Associação  dos  Profissionais  de  Imprensa  de  São  Paulo;

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            Jornais em que Sebastião Almeida Oliveira escrevia: “O Pensamento”, da Capital Paulista; “O Astro” semanário espiritualista, São Paulo, Capital; “O Foguete”, da cidade de Mirassol; “O Município”, da cidade de Tanabi; “Correio de Mirassol”, da cidade de Mirassol; “Cidade de Tanaby”; “A Garra” – Uberaba, Minas; “O Porvir”; “Bálsamo”, da cidade de Bálsamo; “O Imparcial”, da cidade de São José do Rio Preto; “Jornal do Estado”; “Jornal do Aluno”, São Paulo, Capital; “A Vanguarda”, Cássia, Minas Gerais; “Vida Doméstica”, Rio de Janeiro; “A nota”, Rio de Janeiro; “Jornal do Comércio”, Rio de Janeiro; “O Correio Paulistano”; “Língua Auxiliar”, do Rio de Janeiro; “O Brasil Esperantista”, do Rio de Janeiro; “A notícia”, de São José do Rio Preto; “A Folha”, de São José do Rio Preto; “Cidade de Tabapuan”; “A República”, de Natal – Rio Grande do Norte; “A Notícia”, de Campos – Estado do Rio de Janeiro; “Gazeta de Limeira”; “A Cidade”, de São Carlos; “O Estado de São Paulo”, “O Eco de Estremoz”, Estremoz – Portugal; “Cidade de Bragança”, da Bragança Paulista; “Comércio do Oeste”, de Guiratinga- Mato Grosso; “Novo Mundo”, do Mato Grosso; “O Brasil Esperantista”, “O Castanheirense” , de Castanheira de Pêra – Portugal; “Inter American Contemporaries” – EUA; “Correio do Sul”, de Sorocaba; “O Arauto”, de Tanabi; “Lavoura e Comércio”, de Uberaba; “A Tarde”, de São Carlos; “Correio Popular”, de Campinas; “Jornal do Povo”, de São José do Rio Preto; “O Município”, de Monte Azul; “Boletim Literário”, de Natal; “Letras da Província”, de Limeira; “Diário da Região”, de São José do Rio Preto; “Correio Paulistano”, de São Paulo; “Correio da Araraquarense”, de São José do Rio Preto; Jornal católico “Folha Popular”, de Sorocaba; “A Gazeta de Votuporanga”, de Votuporanga; “A Vanguarda” de Votuporanga; “Diário de Fernandópolis”, de Fernandópolis e “O Ascensor”, de Jaboticabal.
            Revistas: “O Templo”, de São Paulo; “Revista Nova”; “Revista do Arquivo Municipal de São Paulo”; “Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo”; “Língua Auxiliar”, do Rio de Janeiro; “Universal”, de São Paulo; “Rio Pretana”, de São José do Rio Preto; “Aura”, de Niterói, Rio de Janeiro; “Vamos Ler”; “Vida Social”, de Bragança Paulista; “Casa de Cultura”, de São José do Rio Preto; “Rio Esperantista”, do Rio de Janeiro; “Ilustração Brasileira”; do Rio de Janeiro; “Centenário”,  de  São  José  do  Rio  Preto.
            Escreveu nótulas literárias para os livros “Os Reinos Naturais na Superstição Brasileira” e “Superstições em Geral”, de Edmundo Krug; “Vocabulário Analógico”, de Firmino Costa; escreveu “Subsídios para a História de Cosmorama”; “Subsídios para a História de Votuporanga”; e colaborou com a história de Ibirá e Mirassol; escreveu artigos para vários livros do escritor, José Lins do Rego; escreveu vários artigos para os Boletins das Associações dos Serventuários de Justiça do Estado de São Paulo e Estado de Minas; organizou vários estudos de Heráldica; traduziu e resumiu os oitos volumes do livro “A Lei do Triunfo”, do filósofo americano Napoleon Hill; traduziu o livro “How To Turn Failure Into Succes”, de Harold Sherman; Elaborou centenas de monografias sobre variados temas (Einstein, Dom Casmurro, Machado de Assis, Maçonaria etc.); proferiu várias palestras em Tanabi, região e na capital paulista, abordando vários temas (Educação Sexual, Judiciário, Literatura Nacional e Estrangeira etc.), participou de vários congressos de escritores brasileiros; Sebastião Almeida Oliveira foi um dos fundadores das cidades de Votuporanga e de Cosmorama, estado de São Paulo. Autor do brasão de Votuporanga e autor do hino da cidade de Cosmorama.

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            Leva o seu nome uma escola na cidade de Votuporanga, situada na Rua Valdecir de Oliveira Guerra, 2960, bairro – Jardim Alvorada, por indicação do Prof. José Carlos Rossato; recebeu o título de cidadão Votuporanguense; recebeu o título de cidadão Tanabiense, leva o seu nome a Biblioteca Municipal de Tanabi, através do decreto 514/84 ; recebeu a medalha cultural comemorativa “Mário Dedini” do Centro de Folclore de Piracicaba; proferiu várias palestras e conferências na Rádio de Tanabi, Canal 8, Rádio Tupy de São Paulo; foi chefe de gabinete, por vários anos, da municipalidade de Tanabi; discursou em várias solenidades; foi homenageado pela 23a. Exposição Agropecuária de Fernandópolis; foi soldado constitucionalista; foi homenageado pela C.E.E.S.P S/A por ser o cliente número 1; homenageado pelo município de Tanabi por várias vezes e em várias administrações municipais; homenageado pelo Lions Clube de Votuporanga; foi agraciado com o título de sócio benemérito pelos relevantes serviços prestados ao Clube dos Tangarás (foi fundador e secretário por vários anos); foi homenageado pela “Confraternidad Universal Balzaciana” e pelo International Institute of American Ideals;  tem o seu nome citado em enciclopédias nacionais e internacionais; seus livros são estudados por Universidades Federais e Estaduais, estrangeiras e nacionais; tem o seu nome inserido no Dicionário Biobibliográfico Regional do Brasil, de autoria de Mário Ribeiro Martins; seu nome está  inserido na rede mundial de internet como um dos maiores folcloristas nacional e estrangeiro; como apologista ao esperanto, teve seus artigos publicados em vários países, Holanda, França, Hungria, Áustria, Polônia, Germânia, Espanha, Japão, Rússia, Chechoslováquia, Portugal, Uruguai, Argentina; recebeu Honra ao Mérito do Hospital “São Vicente de Paulo de Tanabi pela sua participação no programa Cidade X Cidade, de Sílvio Santos, Televisão Tupy, no qual Tanabi venceu a cidade de Campo Belo, MG; recebeu o Diploma da Prefeitura Municipal de Tanabi – Secretaria de Educação e Cultura, pela participação na 1a. Mostra Filatélica Educativa de Tanabi; prefaciou vários livros dispersos por aí; foi chefe de gabinete nas administrações de Pedro Ovídio, Venizelos Papacosta, Milton Cury Miziara e Alberto Víctolo, vindo a pedir demissão do cargo em 1 de fevereiro de 1983; teve sua biografia inserta no “Inter American Contemporaries”, página 743, de 1945; exerceu a profissão de jornalista; recebeu o Diploma de Membro Honorário da Academia de Letras de Uruguaiana; Diploma de Membro Honorário da Sociedad Geográfica Americana; foi declarado visitante ilustre do Município de Olímpia durante o 23º Festival do Folclore, nos termos do decreto nº 1396, de 1º de agosto de 1987; possuidor da cadeira cativa nº 69 no Estádio Municipal “Alberto
Víctolo”; membro da Loja Maçônica, “Fé e Amor”, nº 42 de Tanabi e trabalhou incansavelmente  para  o  progresso  de  Tanabi.
            Sebastião Almeida Oliveira conviveu diuturnamente com a população do interior sertanejo e acompanhou pari passu, a formação de seu melting-pot, um caldeirão de raças em ebulição. Diante de muitos papéis timbrados simetricamente por azulíneas pautas, o seu lápis e a sua pena, dormiram sensíveis, refestelando-se indolentes nas almofadas carnosas e polpudas de seus dedos; André Carrazone disse: -“Escreva sempre, se quiser ocupar um lugar ao sol”; Sebastião Almeida o fez, e fez com perfeição. Pensou e voou muito alto na escrita; seu pensamento tornou nobre e operou maravilhas além e aquém. De certa forma, pensar tornou-se um vício, um vício incurável. Devorou todo e qualquer impresso que caiu em suas mãos; o lema de sua vida resumiu-se num simples monossílabo, sintético, de sentido claro, inequívoco e simbólico, “ler”. Esse verbo, que se pronuncia num só alento de voz, ele conjugou em todos os tempos e modos, em todas as fases de sua humilde existência que, diga-se de passagem, foi brilhante; leu com devoção, fez da leitura a sua crítica literária. Separou cautelosamente o joio do trigo e jamais se enganou na eleição de bons autores e obras de valia; cultivou a literatura, sempre à procura de emoções, estéticas e puras. Suas escritas literárias despertaram louvores de grandes escritores e editores de jornais de renomado nome; Álvaro Augusto Lopes (de “A Tribuna” de Santos); Hermes Vieira (do “Jornal da Manhã”, SP); Lellis Vieira (“Correio Paulistano”, SP); Flávio de Campos (Sup. De “O Estado”, SP); João Dornas Filho (“Folha de Minas”, Belo Horizonte); Nelson Werneck Sodré (“Correio Paulistano”); Ismael Gomes Braga; A. de Taunay; Raimundo Maranhão Ayres; Afonso Costa; Tito Lívio Ferreira; “Dom Casmurro”; Bernardino José de Sousa; João Ribeiro; Tavares Pinhão; Bueno de Azevedo Filho; Mário Carvalho da Silva; José A. Gonsalves; Antônio Loureiro; Mário de Andrade, Carlos Drumond de Andrade; João Cândido de Melo e Souza; Antônio Constantino; Cãndido Brasil Estrela; Pierre Mombeig; Francisco Pablo Labombarda (diretor de Cultura da Argentina); J.M. Coimbra; Maria Bichon (do Museu Histórico e Nacional de Santiago Del Chile); R.S. Boggs (da The University of North Carolina, da U.S.A); Manuel Viotti (autor do “Dicionário da Gíria Brasileira”, Rio de Janeiro); Levindo Lambert (diretor do Conservatório Mineiro de Música), Francisco Fernandes (autor do “Dicionário de Sinônimos e Antônimos da Língua Portuguesa”, Porto Alegre, Rio Grande do Sul); Felix Coluccio (da Universidade de Buenos Aires e autor do “Dicionário Folklorico Argentino” e “Folklore de las Américas”; Luis Corrêa de Melo ( autor do “Dicionário de Autores Paulistas); Basílio de Magalhães (historiador brasileiro); Gastão de Bettencourt, diretor do Instituto de Coimbra e autor de “Os Três Santos de Junho no Folclore”.
            Sebastião Almeida Oliveira deixou de existir no dia nove de abril de mil novecentos e noventa e três, às 19h20, em Tanabi, contando com 89 anos de idade, de afanosa existência toda ela consagrada à sua família, que estremecia, e à cidade de Tanabi, que idolatrava, sendo causa de sua morte hemorragia cerebral. Jaz sepultado em jazigo da família, no Cemitério Municipal Central, em Tanabi, Av. da Saudade, s/n;  está sepultado sob o nº 6022, perpétua. Dele, se poderia dizer o que expressam os lindos versos do excelso poeta Raul de Leoni:  “Simples como a água  lírica  das  fontes,  e  puro  como  o  espírito  das  rosas!”
                                                                          Dr. Térso Marcel Mazza









Artigos que falam sobre Tanabi


Tanaby

            Na esplanada de uma elevação, que a confluência de doris ribeirões formára, se localiza o núcleo civilizado cujo nome, tirado do lindo vocabulário guarani, tem a sonância aprimorada de Tanaby.
            Recebe do sól as carícias matinais de ardentes raios a se desfazerem em jactos de luz, da natura um clima saudabilíssimo e ameno; por lindes: dois lagos azulíneos e uma vegetação com pinceladas verde-amarelas. É o último ponto do mapa de São Paulo. Duas centenas de edificações onde estilos variam e as cores brigam.
            Deslizam pneus macios por ruas apedregulhadas onde o histórico carro-de-bois foi impedido de transitar. Á noite, eletrizadas luzes ferem a escuridão, aureolando com círculos os postes de madeira que, alinhados, sustentam esses pequeninos glóbos de claridade.
            Porém, urge que se desenvolva; que abandone, de vez, o marasmo amortecedor das vibrações do Progresso. Mas, para a consecução desse ideal preciso é que se conjuguem todos os esforços isolados, que se unifiquem todas as iniciativas dispares, e, sejam postos à margem picuinhas de campanário, e que o derrotismo seja mera ficção nestas alturas.
            Fatores existem, que não merecem desprezados, para elevação de Tanaby à plana que bem merece.
            A divisão, em lotes acessíveis, dos grandes latifúndios existentes no município, circunscrevendo milhares de alqueires, é necessidade premente dado que é no regime das pequenas propriedades que a população se adensa; cumpre ter em vista que o loteamento proporciona pingues lucros o que não se daria si vendidos em conjunto e com sua aplicação teríamos a valorização dos ubérrimos terrenos marginais da cidade e a conseqüente infiltração de trabalhadores advindos de zonas cansadas e menos férteis que a nossa.
            Outro ponto que tolhe passo na escalada do progresso é a deficiência clamorosa de meios de transporte estagnado a energia inconteste do laborioso tanabyense. A justificar-se o avanço de qualquer linha de penetração em todo o Estado, isso deveria ser atribuído im primo loco à Araraquarense, a qual, há mais de três lustros vem se enquistando em Rio Preto cidade da qual distamos cerca de cincoenta quilômetros. Quantas e quantas sacas da preciosa rubiácea não logram atingir preços compensadores tão somente devido à distância que nos separa dessa estrada, sendo que, em determinadas fazendas do município, o cereal colhido não oferece margem a venda por ser o transporte mais oneroso que o valor da mercadoria. Outras razões justificam a inadiável necessidade do prolongamento dessa ferrovia, razões de ordem estratégica – evidentes e irretorquíveis – e razões de fundo econômico dado que essa estrada servirá de escoadouro para a segunda riqueza nacional trazendo dos extensos campos mato-grossenses as longas manadas de gado bovino que oram se esfalfam fazendo, a casco, o percurso de centenas de léguas antes de atingir o primeiro entreposto distribuidor – Barretos.
            Precisamos de amplas rodovias internas para dar vazão à imensa produção cerealífera e cafeeira do “hinterland”: de estradas que entrelacem num amplexo amigo a sede do município com as cidades vizinhas. Nova Granada, breve ouvirá os silvos estridentes de possantes locomotivas a repercutir nas caladas de seus espigões enastrados de vigorosos cafeeiros e Monte-Aprazível, em dias que se aproximam, empunhará o ceptro da Justiça com a instalação de sua comarca à qual iremos pertencer. Pois bem: necessitamos de artérias que nos unam a essas futurosas cidades, afim de, podermos acompanhar pari-passu o palpitar de progresso que se aproxima.
            Assim sendo, confiemos no patriotismo sadio de Júlio Prestes que, em linguagem oficial, portanto merecedora de crédito, prometeu galardoar nossa terra de melhoramentos que façam jus ao seu pujante crescimento para maior realce do Estado que seguramente preside.


                                                                    Tanaby, 25 de março de 1928.
                                                                                  Publicado em “Cidade de Tanaby, nº 20, na data supra. 

                                                                                   Diretor – Gerente do Jornal: Benedicto F. Sampaio.




Tanabi


Tanabi, belo termo que fascina
E nos empolga pela voz sonante.
Simboliza a cidade triunfante
Onde o Progresso estúa e predomina!

É do sertão paulista a Adamantina
Jóia que esplende, rara, fascinante!
E ascende e galga, impávida, pujante
Os cimos que antevê e descortina!

Numa colina, em meio a dois regatos
Onde dois lagos, deles se formaram,
O casario branco se divisa...

A natureza em volta mil ornatos
Criou; e desses dons se originaram
As belezas do amor que a civiliza!



                                         Tanabi, 21 de março de 1929.


Tanabi

 Este colosso geográfico, que se estende das decantadas barrancas do majestoso Paraná, até ás proximidades da vila de Bálsamo, num raio longitudina1 de quase duzentos quilômetros, tendo por lindes extremas as águas barrentas do Turvo e do São José dos Dourados, rios eminentemente paulistas, vem de ser retalhado em largos trechos de seu território para compor municípios limítrofes, quer adensando-lhe os seus contornos, quer servindo de geratriz á sua existência autônoma, nos termos do recente decreto que trata da nova divisão administrativa e judiciária do Estado.
            Assim é que na foz do ribeirão Jataí, o qual, em suas nascentes, banha a cidade, outrora batizada com esse mesmo melífluo topônimo, nessa foz, uma pequena faixa de terras foi incorporada ao vizinho município de Mirassol, passando as raias atuais pelo pequeno córrego da Divisa até galgar o divisor das águas principal.
            Esse, no entanto, é o menor quinhão de sacrifícios entre os impostos á célula tanabiense.
            Continuam mantidas as demais 1inhas divisórias com aquele município e o de Monte Aprazível até o ponto em que, descendo o veio d’agua dos córregos Grama e Fortaleza é este atravessado pela estrada do Taboado; aqui, nesta passagem, não mais segue o referido córrego e depois pelo São José dos Dourados até o Paraná; pelo decreto em questão, perlonga o eixo da abandonada e quase intransitável Boiadeira até a ponte do Soledade, ou Cana do Reino e, descendo por este, retoma, em sua confluência,o curso do
São José até encontrar a correnteza do Maribondo; no trecho precitado Fortaleza - Soledade perdeu Tanabi um dos melhores tractos de seu hinterland, zona pastoril por excelência., de aceso fácil á cidade pela via natural do Taboado, distando da séde uma dezena de quilômetros, ao passo que, dobrada é a distância que a separa da séde comarcal, para onde não convergem caminhos vicinais e a ausência de pontes se faz sentir.
            Confirmando nossa assertiva, ai está a ata do Diretório Municipal de Geografia de Monte Aprazível opinando pela não modificação dos limites entre os dois municípios, certo de que aquela porção de terreno por jus não lhe assiste.
            Porque não manter-se o statuquo anterior ?
            Subindo o Maribondo e seu afluente o córrego do Rancho, este, de existência ignorada por velhos moradores do sertão, atinge o espigão mestre Grande-Dourados, espigão que acompanha até o córrego Lagoa Seca pelo qual desce até o rio Grande na fronteira de Minas, ficando, assim extremado o territorium cedido pelo nosso município para o de Pereira Barreto, sediado na urbs nipônica ex-Novo Oriente; nesse sector, perdeu Tanabi os imensos latifúndios da Ponte Pensa e Araras, onde as propriedades se individuam por milhares de alqueires, de população rarefeita e quiçá  inexistente; perdeu ainda Porto Taboado, por onde são comboiadas as manadas bovinas derivadas de Mato Grosso e Goiás e escolhido ponto terminal da Araraquarense que, segundo promessa governamental, dentro em breve penetrará o sertão municipal.
            Rio Grande acima, tendo Minas do lado oposto, segue até a embocadura do Turvo, pouco abaixo da povoação de Vila Cardoso que a autonomasia popular castiga com o desanimador epíteto “Caba-já”, como á profetizar-lhe vida efêmera, muito embora a localidade se desenvolva, tal como as demais congêneres deste torrão.
            A seguir, pelo rio Turvo, águas contrárias, confronta-se com Severinía, antiga Patos, centro de grandes fazendas de gado; depois, pelo seu tributário o rio Preto até o córrego da Cruz avizinha-se com o novel município de Palestina, de recente data desmembrado de
Nova Granada; do córrego da Cruz até a confluência do Jataí com este último, agora elevado a comarca por força do mencionado decreto.
            Pelo ligeiro, retrospecto verifica-se que Tanabi, sem obter compensações outras sofreu profundas retalhações, uma das quais, a da margem esquerda da Boiadeira é bem uma injustiça a reparar, atendendo-se que esse seccionamento infringe tradições respeitáveis, prejudica os interesses recíprocos do fisco e dos contribuintes, afora outros de menor monta.
            Mesmo assim, com todos esses cortes profundos continua Tanabi a ser um dos mais vastos, si não o maior dos duzentos e setenta municípios componentes do Estado Bandeirante.
            Agora, com referência ás divisas internas, aquelas que delimitam os distritos entre si, objectamos que precisam melhor definidas e, por assim dizer, retificadas em sua quase totalidade, uma vez que, assim como estão descritas tornam-se confusas e inaplicáveis balburdia estabelecida, pelas inovações introduzidas na nomenclatura dos cursos de água e outros cochilos existentes.
Assim é que, o distrito da séde (Tanabi) depois de subir a correnteza do Soledade e alcançar o espigão - Preto-São José dos Dourados, caminham por este até as cabeceiras do córrego Coelho (denominação não registrada pela tradição local) - e por este abaixo até sua
juncção no Piedade, descendo por este até o rio Preto; ora, a seguir-se divisas tais, necessariamente desapareciam absorvidos os distritos de Cosmorama, inclusive a
Povoação, e o de Américo de Campos, tendo em vista que o Piedade passa á montante desta última localidade.
            Ao traçar as fronteiras deste último distrito, o embaraço cresce de vulto, porquanto, as mesmas passam pelo córrego Coelho, chegam até o divisor das águas Piedade, Córrego do Meio (sic) ,sem se atentar que este fica entre Cosmorama e Tanabi e é separado daquele pela caudal do Retiro; prosseguem, fazendo algumas acrobacias pelo córrego do Retiro e concorrentes seus, sobem as águas do Tangará (que ninguém sabe onde fica) e vão até a sua foz no córrego Prata, este já na bacia oposta, isto é, vertente do São José dos Dourados!
            Sobem pelo Prata até sua cabeceira mais ocidental e após, pelo divisor que deixa,  á direita, as águas do rio Preto, e, á esquerda, ás do rio São José dos Dourados, em frente á cabeceira mais ocidental do córrego Prata; seguem pelo espigão da margem esquerda do ribeirão Tangará, (que dança!) até alcançar a cabeceira do córrego Betari (topónimo de existência duvidosa) e por este abaixo até o rio Turvo; em nosso entender são esses limites arbitrários e até mesmo incongruantes, porquanto incorporariam eles a Américo de Campos as vilas de Cosmorama e Monteiro, com apreciável porção de seus respectivos distritos, além da disparidade de certas designações; não é preciso muita ginástica cerebral para ver
isso claramente.
            A descrição da área distrital de Cosmorama é também sobremodo incerta; situa ela, na confinação de Vila Monteiro, como seu início as cabeceiras do Ranchão, seguindo então o divortium aquarium Grande São José até as cabeceiras do córrego Prata; a seguir, faceando o distrito de Américo de Campos as divisas seguem o inverso das que foram
aqui transcritas anteriormente, o que nos leva concluir talvez impensadamente, que a florescente Cosmorama não possui jurisdição apreciável, porquanto já havia sido tragado in totum na caracterização dos distritos de Tanabi e Américo de Campos...
Em se referindo, às divisas de Vila Monteiro; abstraindo das denominações incoerentes dos córregos Tangará e Betarí, que não se sabe por onde correm, são, noutros pontos, mais precisas, porque definem o perímetro com perfeição recomendável.
Concluindo estas apreciações,  julgamos conveniente aconselhar aos poderes competentes a manutenção das linhas divisórias com Monte Aprazível e dos distritos entre si, até que estas sejam melhor aclaradas, concordando-se com a desanexacão dos terrenos formadores do novel município de Pereira Barreto.
Fiquem, pois, consignados o nosso reparo afim de que sejam feitas oportunas corrigendas das nossas raias divisoras para que estas mais tarde não se tornem objecto de litígio entre as circunscrições judiciárias e administrativas relacionados com a existência deste colosso geográfico, como é de ver, a grandes cometimentos futuros.

                                                                         Tanabi, dezembro de 1938.
 * Publicado na revista do Instituto Histórico eGeográfico de São Paulo, Volume 36 em 1939. 



Joaquim Chico 
                     A primeira notícia que dele tivemos refere que viveu a princípio nas cercanias da fazenda Viradouro, ou seja, o primeiro ponto habitado no imenso trato de terras compreendidas entre as vertentes dos rios: Preto e Dourados, na bacia do Paraná, a mesopotâmia tanabiense de outrora, onde hoje vicejam numerosas cidades – vilas e povoados, cada qual mais pujante de vitalidade, êmulas entre si na mesma vontade de progredir que a todas impulsiona.
            Foi nesse lugar que José Alves Ferreira e João Ramos da Costa, primeiros povoadores da região, fizeram alto em sua longa derrota, isto é, “viraram” carros e alimárias que conduziram suas mudanças trazidas desde as longínquas paragens mineiras. 
            Anos mais tarde, Joaquim Chico, o caiapó, já habituado aos contatos humanos com os nossos sertanejos, deixa esse primeiro núcleo habitado, o Viradouro, e vem, com sua família e seus trastes, habitar as margens pacatas do Jataí, em ponto adrede escolhido onde se fixa. Segundo reza a tradição, próximo ao local onde se instalou Joaquim Chico, já aí habitavam outros moradores. Confabulando entre si, uns e outros, surgiu desses encontros, a idéia da fundação de um arraial, idéia concretizada com a ereção de um cruzeiro de madeira, marco simbólico de uma cidade, a cidade de Tanabi, que hoje nos orgulhamos de habitar.
            Baseados nessa tradição oral, de antepassados e coévos, concluímos que esse fato relevante teve lugar na manhã radiosa de 04 de julho de 1882, com a presença de padres missionários, que aí celebravam missa e o concurso do bugre manso Joaquim Chico, o nosso herói, além de um punhado de “homens bons”, entre eles, Hilário de Souza Rozendo, Agostinho Pereira, Manoel Francisco da Silva, Joaquim Euzébio, além de Bento Perez de Souza, o carpinteiro que lavrou e esculpiu a cruz simbólica. Nesse mesmo dia, e ainda presentes os mesmos missionários, foi também erguido o cruzeiro Divino à margem esquerda do Jataí em local onde até hoje se encontra chantado, isto é, um pouco abaixo da atual Vila Tomaz.
            Aliás, o patrimônio de Jataí, bem maior que o atual, era limitado por um “valo” cujos vestígios ainda podem ser encontrados e teve sua área reduzida; dele tirando-se várias porções para pagamento de divisão judicial terminada em 1913.
            A esse tempo, fundado o Jataí Joaquim Chico tinha sua vendinha instalada na mesma palhoça singela onde morava desde 1860 aí comerciava produtos da terra, cereais, toucinho, fumo, pinga e rapadura, gêneros que trazia em cargueiros, por ínvias picadas que ele mesmo, auxiliado por vizinhos, abriu para os lados de São José do Rio Preto, picadas que serviam de fulcro à construção da Estrada Boiadeira, em 1900, fator econômico de marcante influência nos destinos do povoado recém fundado.
            Após esses eventos, oralmente comprovados, nenhum outro traço encontramos na vida do ousado pioneiro nativo. Mas, analisando o papel saliente por ele desempenhado na formação desta civitas, veremos que sua individualidade projetou-se nitidamente em todos os movimentos iniciais do burgo vilarengo, quer como seu primeiro habitante em 1860, quer edificando o primeiro casebre que aqui se ergueu e ainda auxiliando o levantamento da cruz de que resultou a fundação do arraial em 1882, ou, ainda, abrindo a primeira via de acesso para outras localidades e, conseqüentemente, o transporte das primeiras mercadorias aqui vendidas e ainda a instalação do primeiro estabelecimento comercial do povoado. Além de tudo isso, vemo-lo, alma emergente das selvas, primitiva e rude, ainda influenciada por totens e tabus tribais, a contribuir, no entanto, com todo o seu esforço e tenacidade para a edificação de uma futura cidade e para a implantação de uma religião nestas paragens, fatos que bem demonstram a rápida evolução de seu espírito marchando célere para a civilização e para o progresso.
            E ao encerrarmos estas considerações recordemos que, ao morrer, anos decorridos, seu corpo foi inhumado no primitivo cemitério aldeão que recolheu as cinzas venerandas de nossos ancestrais. E seu espírito, onde quer que esteja, acompanhará, estamos certos, entre deslumbrado e atônito, o ritmo ascensional de Tanabi, que teve por berço e crisálida o Jataí de outrora, cidade que soube vencer as agruras da adversidade e que se projeta, ovante e vitoriosa, para os horizontes do futuro!


                                                                                              Tanabi, 21 de junho de 1956.    





Pela interlândia Tanabiense.

            Convite amável para esplêndida excursão, levou-nos a dar, em companhia de amigos, num domingo de sol radiante, profundo mergulho na selva interior do município que habitamos, há três longos lustros, agora transformado num dos mais vigorosos alicerces da economia agrária paulista.
            Precisamente uma hora após nossa partida, atingíamos a localidade de Cosmorama edificada numa ondulação de terreno entre os córregos Retiro e Cavalinho; sede de distrito de paz desde 1937, possui Cosmorama, agradável aspecto nela prosperando bons estabelecimentos comerciais e modelar casa de saúde; brevemente será ligada ao sistema ferroviário nacional pelos rails da Araraquarense cuja estação distará cerca de três quilômetros do centro urbano e onde se ergue, já funcionado, importante usina algodoeira. Logo adiante do povoado deixamos, à esquerda, a rodovia que se dirige a Votuporanga e prosseguimos varando a paisagem pelos vales do Sumidouro e do Piedade grávidos de águas barrentas derivadas das fenomenais chuvas desabadas neste janeiro estival; atravessando lavouras onde vicejam cafezais vergados de frutos ópimos e trechos de matas frontejantes, emoldurando o caminho numa arcaica de verdura intérmina, ganhamos os socalcos do espigão mestre onde o panorama é encantador e onde o viajante emudece reflexionado o que vê. Ao marcar o velocímetro 54 quilômetros percorridos surge-nos à vista o povoado de Monteiro distrito de paz desde 1926 e que vem progredindo lenta, mas seguramente.
            O antigo “São João do Marinheiro”, como era conhecido, oferece hoje ao visitante animadoras perspectivas dada sua posição geográfica de centro abastecedor da região que se distante até as barrancas do rio Grande. Sem maiores detenças, porque o tempo urge, deixamos a promissora vila e nos embrenhamos, por estrada regularmente transitável, nada obstante as grandes precipitações chuvosas haverem prejudicado suas obras de reparo, transpondo os ribeirões do Bonito, do Engano, do Gatão e demais afluentes do Marinheiro, que igualmente cruzamos, sendo esta a maior e mais dilatada bacia hidrográfica do município daí resultando a formação de grande imóvel rústico com cerca de setenta mil alqueires de terras. Como num caleidoscópio, ante nossos olhos atônitos desfilam milhares de alqueires de mata recentemente abatida pelo homem e aí crescem, viçosos e exuberantes, robustos milharais, algodoeiros de vários portes e, numa visão chinesa, o oceano de arrozais se distante pelas grimpas marginais, domina os tabuleiros e vertentes, infiltra-se pela mata broqueada a foice e a machado, derrama-se pelos sapecados, reveste os baixadões suculentos de húmus e vai aí afora numa sucessão infinda levando-nos a calcular sua produção com números astronômicos. Toda essa policultura, nascida de lavouras improvisadas por levas contínuas de pioneiros instalados de um biênio a esta parte da região sertaneja de Tanabi, promete, por si mesma, transforma-la num dos mais fornidos celeiros da terra brasileira, concorrendo, de modo digno na extrema batalha de produção que todos nós estamos empenhados. De um lado e outro da rodovia que nós leva ao centro desse hinterlândia agreste, vê-se, a cada passo, a habitação rural cercada das instalações que lhe são peculiares, diferentes modos de fixação do homem à terra: toscos e primitivos ranchos de taipa cercados de varas e revestidos de coqueiros, cavacos ou sapé; casas de pau-a-pique, cobertas de telha vã, estágio mediano da civilização caipira e, por derradeiro, algumas raras vivendas mais confortáveis de tijolos, pintadas e caiadas, arremedo revivescente da lendária “Casa Grande” do regime patriarcal de antanho, nelas habitando o sitiante e o proprietário de grandes tratos de terras.
            Em diferentes trechos da jornada, divisam-se, aqui e ali, rudes taboletas indicadoras de pontos, que servem caminhos vicinais e particulares, onde param jardineiras para recolher o aflito viajor, jardineiras que vêm sacolejadas e morosas, pejadas de viageiros adaptados a impérvias marchas, oriundas de localidade remotas que repontam sertão à dentro. Numa curva do caminho avistamos, e logo passávamos além, a pequenina Parizi ainda ontem simples casinhola de beira de estrada e já agora aglomerado semi-urbano que promete crescer. Continuando nosso roteiro, a devorar distâncias, avistamos, finalmente, Brasilândia, meta de nossos desígnios e que, nesse dia, toda ela se engalanava para receber a visita de autoridades civis e administrativas para a instalação solene de sua sede distrital a que recentemente foi elevada. Composta, a vila, de imensa praça contornada por vários prédios comerciais e particulares no centro da qual se ergue modesta capelinha; diversas ruas pontilhadas de habitações cruzam-se formando o tabuleiro da futurosa localidade fadada a grandes destinos; circunscreve-a vasto anel constritor de opulentas culturas que lhe propiciarão fartas colheitas e melhoria de vida para seus habitantes. Pouco mais além, separada por estreita faixa de mata virgem, emerge, promissora e ridente, a povoação de Pereira constituída de quatrocentas casas espalhadas em vasta área como a denunciar os lineamentos de grandiosa urbe. Ao vive gente empreendedora e audaz, confiante nos destinos da localidade, aspirando, para esta, sua alforria distrital agora prejudicada pela proximidade de sua rival Brasilândia que lhe arrebatou a palma. Praza aos céus seja, um dia, realizado, um ao outro, esses distintos núcleos de civilização, formando, por meio de ampla avenida, e com nome comum, uma das mais florescentes cidades do Oeste Paulista.
            Foi, pensando assim que, ao entardecer desse domingo de sol, retomamos nosso lugar no auto que aí nos conduziu, despedimo-nos daquele povo acolhedor e amigo para iniciar, daí a instantes, nosso regresso a Tanabi, cabeça comunitária de imenso prestígio entre os duzentos e setenta municípios de São Paulo.

                                                                                              Tanabi, 20 de janeiro de 1943.



Tanabi e seu bloco de intelectuais.

            O topônimo Tanabi teve, outrora, na acepção de Urbino Viana, o significado de “madeira adstringente, que aperta – tanino”. Mais tarde, com o desenvolvimento dos estudos tupinólogos, Plínio Ayrosa, incontestavelmente grande autoridade no assunto chegou à conclusão que esse vocábulo deriva de Pa – nambi que pode ser traduzido, mais ou menos, por “rio das borboletas”.
            Nos tempos do velho Jataí, seu primitivo nome, e mesmo até 1930, foi esta cidade e região teatro de crimes nefandos, a serviço da sórdida politicagem, que tanto a infelicitou refreiando-lhe os assomos de evolução. Resultado de tudo isso foi a fama deprimente que repercutia lá fora com muito desdouro os que aqui labutavam.
            Daí para cá tudo evoluiu. A cidade adquiriu aquele ar de civilização característico dos grandes centros e sua fama tomou sentido e se orientou para outras latitudes. Agora somente se fala em Tanabi como uma cidade simpática, atraente e acolhedora. Não mais a cidade caipira dos tempos de sua meninice.
            Reflexo dessa nossa assertiva é o que vimos de colher nos jornais da culta São José do Rio Preto, cidade-mater não só de Tanabi, como, ainda das que, nascidas em sua órbita, muito lhe devem.
            Em menos de uma semana trouxe a “Folha de Rio Preto” dois artigos asinados enaltecendo o que aqui temos de mais importante no campo material e espiritual.
            No primeiro, José Alexandre de Morais, um velho educador bragantino, relata-nos, em prosa fluente, a excursão que fez, abalando-se da vetusta cidade tricentenária às margens do Atibaia para vir conhecer um região pioneira. E seu artigo é todo ele repassado de expressões laudatórias à nossa terra e a alguns de seus homens representativos, vaticinando para Tanabi um grande e merecido futuro.
            Neste outro, o redator da página social do apreciado diário riopretano, que se esconde sob o pseudônimo literário Del Rios, teceu também loas e ditirambos à cidadezinha bonita e limpa e termina sua apreciação pondo em relevo algumas figuras de projeção a compor um verdadeiro bloco de intelectuais devotados à causa pública.
            Como um dos citados nessa homenagem prestada aos tanabienses, cabe-nos agradecer àqueles nossos colegas de imprensa, e ao jornal que veiculou seus escritos, para dizer-lhes que suas amáveis expressões, principalmente as que se referem de modo lisonjeiro a Tanabi, calaram fundo em nossa sensibilidade e repercutiram de maneira toda especial no seio da população citadina.
            É essa uma política de boa vizinhança que cumpre fomentar.
            Realmente, tem nossa urbes destacada propensão para o culto da inteligência bastando dizer que seu único clube recreativo tem o nome simbólico de “Grêmio Literário” o qual já teve a honra de acolher em seus salões, além de virtuoses da música e das belas artes, um corte de intelectuais dos mais reputados em todo o país, alinhando-se entre eles, Jamil Almansur Hadad, David Serra, Salomão Jorge, José Lins do Rego e Agripino Griecco que aqui produziram apreciatas conferências ouvidas por muita gente. E, para provar que não estamos distanciados de centros mais evoluídos basta recordar que nem todos os parleurs  foram aqui aplaudidos.
            Abstração feita a nosso modesto nome, conta á cidade um púgilo de beletristas de escol entre os quais se alinham João Batista Fruquim Lambert, jornalista e orador; Dr. Valentim Alves da Silva, diretor de “O Município” em cujas colunas vem derramando seu talento polimorfo sendo, também, eloqüente tribuno e, por último, João de Mello Macedo, que reúne em sua pessoa todos os predicados exigidos as perfeito literário: orador primoroso cuja palavra a todos agrada; jornalista de pulso, a firmar trabalhos em prosa e verso suficientemente cada um de per si a realçar lhe o mérito que realmente possui, dando-no “Arribada” e uma coleção de escritos e poemas, inéditos uns, publicados outros, todos eles de real valor.
            Há, ainda, luzida equipe de médicos, bancários, farmacêuticos, advogados e comerciários que, embora atarefados em sua faina profissional, e sem aparecer em letra de forma, amam, contudo, cultivar as flores da literatura em leituras memoradas, sabendo, por isso mesmo, apreciar e acompanhar a marcha do pensamento e as manifestações do espírito, notando-se em quase todas as residências e escritórios boas bibliotecas particulares capazes de servir a qualquer artista da pena, verdadeiras rivais da Biblioteca Municipal, instalada em prédio próprio, e veterana das agremiações congêneres na região.
             Quem aqui aporta, como visitante ou disposto a marrar o barco de sua existência, junto aos velhos tanabienses, encontra logo receptividade franca por parte de todos os habitantes e isso nada mais é que resultado de seu refinamento cultural.
            Para nós, essa é a glória que fica, honra e consola.

                                                                                              Tanabi, 30 de agosto de 1945.







Tanabi – cidade caipira.

            Tavares de Almeida, um nome que se destaca entre os estudiosos da região riopretana, visitando-nos em companhia de Jamil Almansur Haddad, disse, com a displicência que lhe é característica que, Tanabi, por seu aspecto típico e singular, era bem uma cidade-caipira, notável por sua diferença de aspecto com os vizinhos aglomerados urbanos.
            Longe de nos enfadarmos com a opinião do apreciado sociólogo, onde muitos poderiam, por falso bairrismo, entrever sentido deprimente, achamo-la, pelo contrario, apropriada, vindo, a talho de foice, servir como definição a esta localidade sertaneja.
            Chovem argumentos comprovantes de que o autor de “Oeste Paulista” não laborou em erro, nem alimentou idéias menos nobres, ao exteriorizar seu pensamento relativo à cidade que muito prezamos e de quem sabemo-lo admirador apaixonado.
            No entanto, indagar-se-á, e com razão, porque atribuir a Tanabi o epíteto incriminado de cidade caipira?
            J.C. Fairbancks disse, certa ocasião, haver uma civilização caipira no interior brasileiro. Com apoio em afirmativas desse tomo podemos muito bem conceber uma cidade progressista, como é o caso de Tanabi, sem, contudo, cortar as amarras do passado e esconder, completamente, origens atávicas refletindo o meio onde se formou.
            Vamos, pois, desenvolver nossa proposição ao esposarmos aquela asserção emitida pelo ilustre causídio patrício.
            Sem desdouro ao que é nosso, sem intenção preconcebida de ofender a quem quer que seja, e muito menos ao dinâmico administrador da sede comunal, Tanabi é uma cidade caipira pelos curiosos aspectos que oferece ao visitante, alguns dos quais passamos a enumerar.
            Quem, pela primeira vez aqui aporta, fica impressionado ao ver o centro citadino composto de casas com beirais antigos de telha vã de acanhadas e rústicas fachadas; muros esborcinados onde prolifera uma algaravia de caracteres mal desenhados propaganda espúria de credos políticos em detestável simbiose; por outro lado, ausência completa de letreiros luminosos, que é hoje distintivo de modernismo; reduzido número de vitrines na frontaria das casa comerciais. Quem se postar na esquina principal do centro quase só vislumbra diante de si bares e chalets de bicho como se passássemos o tempo a ingerir bebidas e a fazer uma fezinha nos intervalos...
            Idéia nítida de cidade-caipira poderá ter o forasteiro que, em dias úteis, lançar uma visada pela rua principal, quando é mais intenso o movimento comercial: autos, ônibus e caminhões entrecruzando-se ao som de apitos estridentes; cavalos e outras alimárias amarrados junto aos passeios; colonos a conduzir pacatamente suas montarias vergadas sob o peso extraordinário de produtos do solo que trocam por artigos manufaturados; carroças com espantadiças parelhas de muares ao lado de carros puxados por copiosas juntas de bois em sonolenta marcha e, de mistura a tudo isso, a algazarra da multidão heterogênea, onde campeiam raças dispares predominando a ibérica, fornecendo ao observador quadros de confusão babélica, os olhos preocupados com a indumentária variegada dos freqüentadores da cidade “boca-de-sertão”.
            A visão exterior da Matriz, com suas paredes sem reboco, sugere-nos o pensamento de um arraial em formação; circunda-a inculto gramado e na praça fronteiriça rodeada de prédios distanciados há sempre um circo de cavalinho para dar relevo ao quadro...
            As entradas e saídas de Tanabi nenhum atrativo oferecem além da paisagem revolta de grotões e pirambeiras como aquela da estrada do Taboado, que hoje perdeu sua função de grande pista de gado para transformar-se em mero e acidentado “caminho de cabras”; outros pontos de acesso à urbes guardam similares de rusticidade e assim mal deixamos o centro citadino mergulharmos ex-abrupto em campos forrados de invernadas e quiçaças pois é notória a carência de chácaras como também a pequena densidade de população no círculo de alguns quilômetros de em torno. O casario, disperso e assimétrico, esparrama-se em desordem numa área de setenta alqueires aproximadamente, formando curioso mosaico de edificações.
            Alguém que recentemente esteve no Brasil, afirmou não haver país algum no mundo mais cheio de lirismo do que o nosso e eu quero atrair para este recanto paulista a definição acertada daquela ilustre personagem. Sim, todos esses “defeitos” que recapitulamos convertem-se em poesia e lirismo aos olhos dum esteta.
            Reflexo do meio rural, base de sua economia, Tanabi é bem um consórcio feliz da tradição e do progresso com todos os atributos inerentes de uma cidade pioneira.

                                                                                              Tanabi, 23 de março de 1946.



Visões de Tanabi

            Quem, como nós, conheceu Tanabi vinte anos volvidos, conserva, na retentiva, visões e imagens fieis da cidade embrionária. Reproduzi-las, em alguns de seus aspectos, e com maior ou menor fidelidade, é tarefa que vamos tentar neste ligeiro retrospecto.
            Descendo ao longo da estrada boiadeira, ao transpor o “Mangue” ou “Bacurí”, deparava-se à esquerda, magnífica represa natural, o “Tanque”, balneário natural onde o tanabiense, anos a fio, encontrava refrigério às inclemências do calor estival e hoje, infelizmente, desaparecido.
            Subindo a encosta íngreme, que o Forte de bigodes vingava a custo, tinha, o visitante, à sua frente, um pequeno burgo composto de casebres espalhados, circundado por algumas chácaras agrestes, e pela quiçaça derredor. Súbito, a praça da Matriz, que, de 1930 a esta parte, passou a chamar-se “24 de outubro”. Aqui, uma igrejola com ligeiros ressaibos de estilo colonial, com seu frontispício sacrificado pelo estoiro de fortíssima bomba e onde trazia gravada a data histórica de sua fundação: 1891. Ao fundo, velho cruzeiro de madeira lavrada, que o carpinteiro Bento Perez de Souza esculpiu, ereto, segundo reza a tradição, em julho de 1882 pelos fundadores do arraial: o Alferes, o Amaralzinho, o Bataglia e o Joaquim Chico.
            A um dos cantos da praça a casa de Dante Celeri, ostentando, em seu frontal, as armas da coroa italiana; logo adiante, um renque de coqueiros plantados por Ugolino Ugolini que, como membro da Comissão Hummel, dirigiu, aqui, os trabalhos de construção da Estrada do Taboado. Na esquina, a casa onde mais tarde viveu, displicentemente, o saudoso Xavier de Almeida misto de filósofo e boêmio; a casa paroquial, duas ou três vivendas e, no ângulo oposto, a residência do Dr. Paulo de Abreu, no mesmo local onde um dia remoto habitara o índio manso Joaquim Chico, com sua vendinha de pinga e rapadura, bugigangas que trazia, em lombo de animal, por extensa picada, que ele mesmo abriu ligando estas paragens a Rio Preto, na época incipiente povoado em gestação. Nos fundos, logo abaixo da feira, onde está hoje a Usina Coimbra, as ruínas do velho presídio, construído de pedra “tapiocana” e sustido por fortes esteios de aroeira, no pavimento superior funcionando, desde 1902, o distrito policial; na outra face, em frente à atual quadra de tênis, casinholas acachapadas onde viveu outrora o Amaralzinho e, logo acima, a habitação do Bomfim, seresteiro de prol e famoso organizador de cavalhadas, então em grande voga; numa travessa, o cochicholo onde  fora linchado, sob as vistas complacentes da polícia o fascinora “Cacheado”.
            Subindo a rua principal, na ocasião denominada Antonio Prado, lá estava, na esquina, o Hotel Central que anunciava a hora das refeições por meio de estridente campainha; cercas de arame onde hoje está á Farmácia União, casas comerciais de relativa importância, dado que aqui estava sediado o último entreposto sertanejo. Lá no extremo da rua, a Empresa de Luz com seu vapor a lenha, batendo pancadas isócronas como um grande coração a pulsar. O cine “Rio Branco”, no mesmo local onde hoje se encontra, exibia filmes silenciosos, ao som de afinada orquestra, regida pelo Prof. Viola, saudoso diretor das Escolas Reunidas que funcionavam em prédio fronteiro à casa de diversões.
            Tanabi, distrito de paz desde 1907 e município em 1925, possuía dos anos após menos de duas centenas de edificações a maior parte feita de pau-a-pique. Cumpre recordar que a atual Praça da Bandeira, e adjacências, nada mais era do que extenso matagal; nas imediações do Hospital “São Vicente de Paulo” estava localizada a roça do velho Maurício e bem perto demorava o cemitério cercado de achas de madeira partida. Á esse tempo procedeu-se o lançamento da pedra fundamental da nova Matriz sendo necessário mondar a capoeira existente. Havia um campo de futebol onde se ergue hoje o magnífico edifício do Grupo Escolar. 
            Não nos é dado olvidar, neste bosquejo, figuras e fatos que entreteceram os anais citadinos; vem-nos logo à mente o nome do Cel. Militão, morubixada da clan Tanabiense que, não obstante seu tradicional mandonismo, foi desbravador da gleba sertaneja e incentivador de seu progresso. Barbosa Lima, com seu dinamismo irriquieto, sacudia a cidadela da política trazendo, “num cortado”, os vereadores bisonhos e os delegados leigos até que Durval de Góis Monteiro, irmão do famoso cabo de guerra brasileiro, aqui viesse ocupar a delegacia de carreira. José Augusto de Souza, capitão da guarda Nacional, entretinha seus ócios “inventando” o motu-contínuo. Firmino Justino da Silva, por antonomásia “o Sabiá”, repartia sua atenção entre o Juizado de Paz e a “Pensão do Sol”. Jerônimo Fortunato, eterno namorado da política, não perdia vaza, com ou sem pretexto, para deitar falação aos seus correligionários, no fundo, das mais populares e benquistas figuras da cidade. Clovis de Lima Paiva, mestre-escola e intransigente defensor do erário público. José Vieira Alves, figura magna pars em todas as eleições com e sem bico de pena, com seu aplomb de capitalista, Gabriel José de Oliveira granjeou fama e destemor arrebatando, num lance quixotesco, a “chapa” democrática. Nada se fazia, então, dentro e fora do P.R.P, sem á palavra autorizada do, Capitão Daniel, sempre hábil e atilado em dirimir questiúnculas, apaziguar demandas ou solver complicações políticas. Em campo oposto ao situacionismo destaca-se luzida equipe chefiada por Francisco Vargas e João Gualberto Portugal; Laudelino de Brito, Jerônimo Martins de Araújo, Ernesto Tabachi, Antonio de Faria, José de Arimathéa Corrêa e tantos outros que seria fastidioso enumerar.
Havia na ocasião, o semanário “Comarca de Tanabi” que, através de seu pomposo título, andava a apregoar iminente emancipação judiciária somente conseguida vinte anos depois...
            Quem não se recordará, com saudades, da cidadezinha pacata de então, movimentada por um grupo de guapos rapazes; tendo à frente o boêmio incorrigível que sempre foi Mário Camargo, pintor nas horas vagas? O Guimarães a retinir afinado violão, no intervalo de ferinas chacotas; o Macedo, sempre jovial e bem quisto, já as voltas com as musas, líder dos moços e por todos admirado; o Fausto com suas piadas mordazes e ainda o Olavo, saturado de pessimismo por contínuas e mal digestas leituras de Albino Forjaz de Sampaio, seu autor predileto. E outros, e outros mais, formavam neste grupo, que vivia, por horas mortas, a roubar o sonho de moçoilas casadoiras, a organizar pomposos bailes e a animar festas religiosas e profanas.
            Há muita coisa digna de recordação nesse capítulo de episódios vividos, e de figuras que aos poucos vão sendo olvidadas, a exemplo do que Mello Macedo através de seu rodapé dominical que, infelizmente, interrompeu. Recordar fastos da cidade, os eventos de datas mergulhadas no pretérito, não é tarefa despicienda de escriba em férias, mas, sim, inestimável contribuição para o historiador futuro a quem apraza reconstituir, com precisão e carinho, o lento estratificar de uma urbes, acompanhando-lhe, pari-passu, todas as vicissitudes desde o berço à atualidade!

                
                                                                                  Tanabi, 21 de dezembro de 1946.
   História de Tanabi


            Durante o primeiro quartel do século passado Tanabi, ou seja a extensa área territorial compreendida e banhada pelos rios são José dos Dourados , de um lado, Preto e Turvo, de outro, tendo ao fundo o caudaloso Paraná, verdadeira mesopotâmia com dez ou doze mil quilômetros quadrados de superfície, era habitada somente por índios e feras. Comprova-o, quanto aos primeiros, a existência de taba indígena próximo a Cosmorama onde o autor destas notas encontrou fragmentos de cerâmica, igaçabas (urnas funerárias) e até machados de pedra. Além disso, persistem lendas de que aglomerações de amerabas povoaram as margens fecundas do rio Caiapós que estendia seus domínios aquém das regiões adustas da Farinha Podre.          
            É fato histórico ter Joaquim Francisco Lopes, irmão do famoso guia Lopes, explorado, em 1831, a margem esquerda do rio Grande, quando, com sua gente, pervagou o Triângulo Mineiro e Mato Grosso. Nessa ocasião deram-se as primeiras entradas: os mineiros João Ramos da Costa e José Alves Ferreira, avoengos da família Costa, penetraram a selva ignota descendo, com suas mudanças, pelos vales ribeirinhos do Fortaleza e do São José e, onde se fazia mister, rasgavam picadas na floresta impérvia; assim atingiram o lugar que ficou desde então conhecido por Viradouro, ou seja, onde  “viraram” seus carros, lugar este que, por muitos anos, constituiu o primeiro e único ponto habitado a noroeste de São José do Rio Preto localidade fundada em 1852 por João Bernardino de Seixas. Posteriormente surgiram outros posseiros que se fixaram: Flávio Alves da Costa, na barra do Turvo; Luis Januário de Barros, no rio Grande; José, João e Adão da Costa Maldonado, no Marinheiro; João Tomás da Costa, na Santa Rita; Camilo Militão de Oliveira, Jerônimo José Pereira e Antonio Fernandes Franco, na Barrinha e Viradouro; Teodoro Mendes da Costa e Antonio Costa Lima, na Grama; José Francisco Pereira, na Alegria; José Joaquim Rangel, na Água Vermelha, ou Queiroz; João Botelho de Vasconcelos, em Águas Paradas; José Antonio Barreto e Ana Esméria, na Fortaleza, Fuão Boamorte, na Prata e outros. A partir de 1850, por força de um decreto, tiveram os posseiros suas terras legalizadas e daí a origem de escrituras particulares. E vieram, então outros pioneiros: Vicente Cardoso da Silva, que se estabeleceu na confluência do Turvo com o Grande e cujo nome serviu de topônimo para designar o atual município de Cardoso; Antonio Cassimiro da Silveira, cujos descendentes povoam hoje o bairro da Fortaleza; Felício Bassoural, patriarca dos Macieis, na Cachoeira, (daí Cachoeira dos Felícios) para onde também vieram os Paula ribeiro e, ulteriormente, Daniel da Cunha Morais. Muitos outros para aqui vieram, tangidos, a maioria, pelo mesmo impulso dos bandeirantes mas, quantas vezes as matas seculares serviram de valhacouto aos perseguidos da justiça em outras bandas! Reza a tradição que, por essa época, os transportes para os centros povoados: são José do Rio Preto, Jaboticabal, São Carlos, Araraquara e Campinas eram feitos por cargueiros e carros de boi e a viagem de ida e volta prolongava-se meses seguidos; levavam produtos da terra e traziam, de retorno, sal, tecidos grosseiros e artigos de primeira necessidade.
            Em 1860, Joaquim Chico, um bugre manso que habitava no Viradouro, transfere-se para o Jataí e, construindo uma choça de capim, nela vendia rapadura, fumo e cachaça, além de outros artigos que trazia de lugares distantes e por ínvios caminhos. Por esse motivo, e com justiça, é considerado o primeiro habitante da cidade, muito embora, por esse tempo, existissem, pelas cercanias, outros moradores com suas cabanas colmadas de sapé.
            Consta, todavia, que Januário Garcia Leal, o lendário “Corta Orelhas”, esteve homiziado nos sertões tanabienses e quando, em 1892, três cidadãos de Santana do Paranaíba, Carlos Ferreira de Castro, José Maria e Pe. Ferraz resolveram abrir uma estrada que do porto do Taboado alcançasse o bairo do Viradouro, subiram pela via líquida do São José e, nessa derrota, encontraram restos de uma ponte rústica feita pelo dito Januário e da casa onde ,orou um ferreiro perito no fabrico de ferros de marca.
            Aliás, cita-se de oitiva que, ao tempo da guerra do Paraguai, (1870), havia tendas de ferreiro nesta região, onde se faziam concertos de canhões, veículos e mais petrechos de campanha.
            E já que estamos evocando o passado remoto, para amenizar a aridez destas citas, registremos também a passagem, por estas bandas, do solitário Frei João Maria de Jesus, conhecido em todo sertão brasileiro, o qual em sua peregrinação, pernoitava ao lado de um cruzeiro, próximo à casa do velho Cassimiro, sendo certo que o bondoso cenobita, por princípio, não aceitava hospedagem de ninguém e, tampouco, alimentos caseiros.  
            Mas, retomando nosso tema, com a vinda de Joaquim Chico não se pode considerar fundada a povoação, o animus manendi, idéia que se concretizou, mai tarde, com a ereção de um cruzeiro de madeira, gesto litúrgico que, em todo o Brasil cristão, indica a instituição de uma localidade. Por isso, baseados no testemunho de alguns habitantes daqui, já descrevemos e divulgamos ter sido esse cruzeiro erguido nos idos de julho de 1887. Entretanto, pesquisando cartórios, verificamos ter sido lavrada, no distrito de São José do Rio Preto, aos 21 de maio de 1887, uma escritura de doação, transcrita no Registro de Imóveis de 1º. Circunscrição daquela Comarca, aos 02 de agosto de 1906, na qual os transmitentes Francisco de Souza Lopes e sua mulher Maria Francisca da Conceição, Joaquim José de Souza e sua mulher Gertrudes de Souza Martins e Maria Rosária da Conceição, doaram setenta e cinco alqueires de terras, oriundas do espólio de seu pai e sogro Bento de Souza Lopes, ao patrimônio de Nossa Senhora da Conceição de Jataí (nome primitivo do lugar), com a condição de que esse terreno, incorporado a vinte e cinco alqueires de Manuel Correa de Souza, condômino já falecido, “ser anexado a uma capela ai edificada e em construção” (sic). O patrimônio em questão situava-se na fazenda pró-indiviso, denominada “Jataí” atravessada em toda a extensão pelo ribeirão desse nome. Logo, a fundação do arraial não poderia ter ocorrido nos meados de julho de 1887 e, sim, anteriormente, a menos que seja apócrifa essa escritura que menciona a existência de uma capela em construção. Espicaçados pelas discordâncias encontradas, prosseguimos, de indagação em indagação, concluindo em pós por acatar depoimentos de velhos moradores a confirmar que o levantamento do cruzeiro se deu precisamente a 4 de julho de 1882, (ou sejam, cinco anos antes da data que tínhamos notícia), com a presença não só de Joaquim Chico, o primeiro habitante, como, ainda, de Hilário de Souza Rozendo, Agostinho Pereira, Manuel Francisco de Silva, Joaquim Euzébio e Bento Perez de Souza, este ultimo carpinteiro que, desbastou o tosco madeiro dando-lhe forma de cruz, a qual, com o ato solene de sua instituição, tornou-se, ipso-facto, marco simbólico da fundação de Tanabi e que, para edificação dos pósteros, cumpre resguardar e preservar.
            Alhures registramos ter sido o ato realizado com a presença de Polenice Celeri (conhecido por “Alferes”), João Barboza do Amaral e Leonídio Bataglia, referência, que aqui retificamos para declarar que estes denodados tanabienses para aqui vieram mais tarde e foram eles, notadamente o primeiro, os impulsionadores do vilarejo e construtores da igreja em rudimentar estilo colonial, que veio substituir a primitiva capela onde, narra José Joaquim Cardoso, foi ai batizado Eduardo Alves Ferreira, nascido em 1885, igreja essa demolida em 1932 e em cujo frontespicio estava gravada a data de sua conclusão: 1891.
            Antes, porém, de prosseguirmos nestas considerações, há um outro ponto a dilucidar; nos termos da escritura citada, a doação do patrimônio foi feita pelos descendentes de Bento de Souza Lopes; entretanto, consta, à fls. 5, do Livro 1 de Notas, do Cartório de Paz desta cidade, ter sido (o patrimônio de 75 alqueires) doado por José Teodoro Ferreira Lemos e sua mulher, aos 08 de março de 1907, confirmando escritura particular anterior; nesse documento há um tópico onde se afirma serem os doadores legítimos possuidores, em comum com outros, de terras na fazenda denominada Jataí, ora em divisão, e que doavam “trinta e cinco mil e tantos reis de legítima a Nossa Senhora da Conceição para i fim de se constituir um patrimônio nesta povoação de Tanaby, que se acha encravado na referida fazenda”. Assim, ambas doações se coincidem mas cumpre atentar na circunstância de que a folha de pagamento, expedida nos autos de divisão judicial da citada fazenda Jataí, quinhão nº 12, gleba nº15, homologada em 19 de novembro de 1913, e que pós termino à pendência, ai se declara que o imóvel tem por limites ao norte o Jataí, a Leste o Bacurí, ao sul e a Oeste Hilário de Souza Lopes ou sucessores, sendo que este ultimo nome nos faz recordar um dos participantes na elevação do cruzeiro e, possivelmente, parente próximo de Bento de Souza Lopes.
            Às fls. Do Livro Tombo da paróquia de São José do Rio Preto, ano de 1914, deparamos uma referência afirmando que, não muito distante da Capela de Jataí, núcleo inicial da povoação, existe outro patrimônio indicado por um cruzeiro. Investigando a respeito, apuramos que este patrimônio está sob a invocação do Divino. Não prosperou e está até hoje reduzido ao mesmo primitivo cruzeiro que, aliás, foi erguido no mesmo dia de seu congênere da sede; rodeado de ex-votos lá está hierático à margem do caminho que, passando pela Vila Tomaz, se dirige para os bairros do Cedro e do Guamirim, caminho por onde transitavam os primeiros habitantes do povoado; e mais tarde substituído com a abertura da Boiadeira.
            Em 1889 foi nomeado primeiro inspetor de quarteirão de Jataí recaindo a escolha no Cap. Delmiro Corrêia e iniciada a construção da primitiva cadeia, nos fundos da atual Feira, construção essa feita de grossos esteios de aroeira, revestida de pedra tapiocana e com dois pavimentos. Em 1902 foi criado o distrito policial sendo nomeados sub delegado João Barboza do Amaral e suplentes João Baptista de Lima e Antonio de Almeida Funchal.
            Havia, também, no incipiente povoado, um cemitério cercado de grossas pranchas de aroeira onde se inhumavam os mortos da clã tanabiense sem a formalidades de estilo. Funcionou até 1918, na esquina fronteiriça à atual Praça da Bandeira, onde se acha agora moderna quadra de basquetebol.
            Fundado trinta anos após São José do Rio Preto (que na ocasião contava somente cinco casas), por muitos anos o velho Jatai dormitava à beira da estrada acolhendo tropas em comitivas que iam e vinham da Mato Grosso a Barretos. Só depois de instalado o distrito de paz (1907) é que lhe adveio relativa prosperidade. Com o distrito, recebeu nova denominação Tanabi, ou seja: “madeira adstringente, que aperta” segundo Urbino Viana e ainda “rio das borboletas” na versão de Plínio Ayrosa, designação essa sugerida pelo saudoso político riopretense Cel. Adolfo Guimarães Corrêa. Numerosas famílias vindas de pontos distantes aqui se fixaram, ou se embrenharam pelo interior remoto abrindo sítios e fazendas, por sua vez fundando povoados como Marinheiro, Água Paradas, Piassava, Carvalho e Santa Helena. Em 1913, juntamente com seu irmão João Alves Monteiro, para aqui se transportou, vindo de Barretos, o Cel. Militão Alves Monteiro que exerceu, com seu prestígio, marcada influência nos destinos da zona.
            No que tange ao seu território, propriamente dito, revela notar que até 13 de março de 1925 pertenceu à jurisdição municipal de São José do Rio Preto; vinte anos depois, em 1945, fragmentou-se, por cissiparidade, em três partes distintas: os domínios latifundiários da Ponte Pensa, na bacia do Paraná, passaram a integrar o município e comarca de Pereira Barreto, que teve por núcleo inicial um quisto nipônico; extensa área de terras (cerca de oito mil quilômetros quadrados) passou a compor os municípios de Fernandópolis e Votuporanga, sendo esta elevada concomitantemente de distrito a comarca; em 1948, dois novos municípios dele se desmembraram reduzindo-o à décima parte. Além de três comarcas onze municípios e 21 distritos, com numerosas povoações florescentes, pontilham a imensa gleba que já esteve e que, em parte, se encontra sob sua jurisdição. Eis a nominata dos distritos de paz: Tanabi, Cosmorama, Ibiporanga, Américo de Campos e Pontes Gestal, nessa comarca; Votuporanga, Simonsen, Álvares Florence, Valentil Gentil, Meridiano, Parizi, Cardozo, Pedranópolis, Macedônia, Indiaporã, Fernandópolis, Estrala do Oeste, Jales, Dorcinópolis, Victória Brasil e Três Fronteiras, estes na comarca de Votuporanga.
            O machado iconoclasta abate a floresta derredor; consideráveis forças telúricas prendem o homem ao solo feracíssimo levando-o a olvidar o convite sedutor das metrópoles onde a existência é mais suave. A paisagem aos poucos se humaniza com a aparecimento de novas instalações agro-pecuárias e industriais. “Os movimentos dos grupamentos humanos, escreve Nelson Werneck Sodré, in “Oeste”, pág. 105, são motivados, sem dúvida, por impulsos de ordem econômica. É a necessidade que compele tais infiltrações, expansões e deslocamentos. Eles se fixam onde o trabalho permite tal fixação. Aí se enraízam, desdobram e são assimilados”. Numerosos sítios, ainda há pouco desertos de ecúmeno, são agora povoados de casebres e arroteados pelo homo viril; daí surgem lavouras promissivas e emansipadoras. Em torno da ossatura do espigão mestre Turvo Dourados, onde a Araraquarense cava seu leito em busca da caixa líquida do Paraná, é que se processa a grande penetração humana dos últimos tempos. Aí nasceram e nascem povoações que são a um tempo vilas e cidades tão rápida é sua eclosão, tão vertiginoso seu desenvolvimento!
            Tanabi é uma dessas cidades que surgiram como pouso no caminho palmilhado por indígenas e bandeirantes, caminho que se concretizou na Estrada do Taboado, agora com meio século de existência, e que perdeu sua razão de ser preterida que foi pela ferrovia. Nasceu, pois, do fator estrada, como toda boca de sertão e foi mesmo antigo pouso de boiadeiros e de peões, onde imperava a civilização do couro, mas, contrariamente ao que se presume, Tanabi não vive mais no passado do que no presente e tem, sim, vida ativa que se caracteriza por intenso movimento comercial e cultural exercendo peculiar influência em toda região limítrofe. Pouco lhe resta de seu imenso e outrora inexplorado território primitivo, mas, em compensação, sua população iniciada com um só habitante, em 1860, com alguns fogos esparsos em 1882, data de sua fundação, tem, atualmente (1949) cerca de seis mil habitantes na sede a mais de trinta cinco mil em toda a comarca, esta, aliás, com uma superfície orçada em mil, oitocentos e setenta quilômetros quadrados abrangendo três municípios: Américo de Campos, Cosmorama e Tanabi propriamente dito.

                                                                               Tanabi, 13 de abril de 1949.

Efemérides Tanabienses.

            No decorrer do ano santo de mil novecentos e cincoenta, comemora, Tanabi, um punhado de gratas efemérides salientando-se, entre elas, seu jubileu municipal. Há vinte e cinco anos, ou seja, precisamente, no dia 13 de março de 1925, instalava-se, com grandes festas e intensa alegria, a jovem comuna de Tanabi criada pela lei nº 2009, de 23 de dezembro de 1924, com território desmembrado de Rio Preto. Com essa lei, que concedeu foros de cidade à incipiente sede distrital, Tanabi passou a figurar na vanguarda de grandes cometimentos, como sentinela avançada na conquista do sertão império, emancipando-se, conjuntamente com Mirassol e Monte Aprazível, e a que mais tarde se juntaram Ibirá, Nova Granada, José Bonifácio, Potirendaba, Uchoa, Cedral e outras localidades situadas na periferia riopretana.
            No contexto da lei citada ressalta que as lindes extremas do novel município apóiam-se em acidentes naturais, divisão ideal preconizada por Elisée Reclus e seu roteiro é quase um decalque das primitivas divisas descritas na lei 992, de 01 de agosto de 1906, que criou o distrito de paz: “Começam no rio Paraná, na barra do rio São José dos Dourados; sobem por este até a barra do córrego Fortaleza, pelo qual sobem até a barra do córrego da Grama e por este até a sua cabeceira principal; continuam pelo divisor que deixa, à direita, as águas do rio São José dos Dourados e córrego do Balsamo e rio Preto e à esquerda, as do rio Preto e córrego jataí até a barra deste córrego, no rio Preto; descem os rios Preto e Grande até a barra do rio São José dos Dourados onde tiveram começo”.
            Pormenor digno de apreço, releva notar que, embora elevada a distrito de paz, Tanabi, outrora, só obteve categoria de vila nos termos da lei 1058, de 19 de dezembro de 1906, a qual, em seu parágrafo 5º, art. 4º, CP. I, assim declara: “Terão a categoria de cidade as sedes de municípios e de vila a dos distritos de paz que constituírem povoações distintas da sede do município”
            Mas, o distrito de paz não lhe trouxe, como era de prever-se, o ambicionado progresso e o povoado, composto de raros casebres, vegetava à margem da Boiadeira e teve lento desenvolvimento no decurso do primeiro quartel deste século, bastando recordar que, no ano de 1916, segundo se infere de publicação oficial da Câmara Municipal de Rio Preto, o distrito de Tanabi concorria para os cofres públicos com uma arrecadação orçada em Cr$ 2.675,00 ao passo que sua despesa não ultrapassava Cr$1.840,00.
            Por essa ocasião, transferindo-se de Barretos para estas bandas o Cel. Militão Alves Monteiro e seu irmão João Alves Monteiro, acolitados por outros denodados sertanistas como o Cap. Daniel da Cunha Morais, Antonio de Faria, Jerônimo Fortunato Alves Pereira, Manuel Pereira Leal, Veríssimo Ferreira Junior, Antonio Soares Bomfim, Gabriel de Oliveira e mais companheiros conjugaram seus esforços no sentido de conseguir a emancipação política do distrito. Rasgaram-se as primeiras estradas em demanda do Porto Taboado, seguindo a rota da Boiadeira, de Américo de Campos e Monteiro. Abriram-se em plena selva as primeiras grandes fazendas agro pecuárias e um surto de progresso melhorou o aspecto do povoado. Em 1922, quando se comemorava em todo o país o centenário de nossa independência, Tanabi logrou a criação de sua paróquia, por decreto firmado em São Carlos do Pinhal, pelo Arcebispo Dom. Marcondes Homem de Melo, e conseqüente nomeação do primeiro vigário Pe. Agostinho dos Santos Pereira.
            Com a divisão do antigo e imenso município de Rio Preto, o perada em 1924, consegue Tanabi sua autonomia administrativa aos 23 de dezembro desse ano, pela lei 2009. no ano seguinte, a 13 de março, grandes festejos assinalam a solene instalação da Câmara Municipal, e, registrando a magna ocorrência, transladamos ipsis literis o documento que trás o relato das solenidades: “Ata de instalação do município de Tanabi. Às 12 horas do mez de março, no dia 13 do mesmo mez do ano de 1925. nesta cidade de Tanabi, no edifício destinado às sessões da Câmara Municipal, à rua Coronel Joaquim da Cunha Junqueira, reunidos ai os vereadores eleitos, diplomados e reconhecidos cidadãos: Cel. Militão Alves Monteiro, Marcílio Cesário de Magalães, Veríssimo Ferreira Júlio, Augusto Manoel Elias Abufares, Manoel Pereira Leão e José Flávio de Moraes sobrinho, sob a presidência do Meretíssimo Juiz de Direito da comarca de Rio Preto, Dr. João Elias da Cruz Martins, abriu-se a sessão solene da instalação do Município de Tanabi, pertencente à referida comarca. O Dr. Presidente, em breve, mas eloqüente alocução, congratulou-se com os habitantes desta cidade, pela justa aspiração que é a criação do município, que ora se instala, e, com o Governo do Estado, por esse auspicioso acontecimento. Dando o compromisso aos vereadores eleitos, convidou para secretário da reunião, o vereador José Flávio de Moraes Sobrinho, ordenando em seguida, ao escrivão do Jury e do Juízo da comarca, que lavrasse os termos de compromisso dos vereadores, sendo por todos, assinado. Declarando o Dr. Presidente que poderiam usar da palavra quem o desejasse, levantou-se o vereador Augusto Manoel Abufares que agradecendo congratulou-se com o povo desta terra pela realização do seu desejo, prometendo que ele e seus companheiros cumpririam com zelo e patriotismo, seus deveres de vereador. Em seguida usou da palavra o advogado Dionizio José  dos Santos filho que dirigiu vibrante saudação ao Cel. Militão Alves Monteiro, aos membros do Diretório, vereadores eleitos, não somente em seu nome, como também em nome do Cel. Fabiano Barreto. Falou em seguida o Reverendo Pe. Agostinho dos Santos Pereira que em entusiásticas palavras dirigiu saudação ao referido chefe político, vereadores, membros do diretório e ao povo desta terra. Fez em seguida vibrante oração, em nome da classe operária, o Sr. Oscar Rufino. Depois foi proferido eloqüente discurso de saudação ao chefe político desta localidade e vereadores eleitos, pelo advogado Adauto do Amaral, em nome próprio e em nome do Capitão Augusto de Almeida e do povo de Severinia. Falou em seguida o Dr. Abelardo de Oliveira congratulando-se com o chefe político, vereadores, membros do Diretório e com o povo desta terra pela instalação do município. Pelo Juiz de Direito foi declarado que tendo compromissado os vereadores, estava instalado o município, pelo que se regosijava e declarava encerrada a sessão de que vai lavrada a presente ata por mim secretário escolhido que a assino, bem como o Dr. Juiz de Direito, todos os vereadores e pessoas presentes à este ato. (a.a.) João elias da Cruz Martins, Militão Alves Monteiro, Marcílio Cesário de Magalhães, Veríssimo Ferreira Júlio, Augusto Manoel Elias Abufares, Manoel Pereira Leal, José Flávio de Moraes Sobrinho, Joaquim Pinto da Costa, Antonio Fidelis, Oscar Pires, Arlindo Faria, Rufino Rodrigues Barboza, Nestor Biazon, Aziz Maluf, Francisco Laurito”.
            Segundo lemos em “O Direito”, primeiro jornal que aqui circulou, contava o município, por ocasião de sua instalação, doze mil habitantes e possuía 3 farmácias, 3 hotéis, 2 jardineiras diárias, correio e telefone. Aos 4 de abril de 1925 foi criada uma coletoria estadual de 4º classe, inaugurada a 9 de junho do mesmo ano, sendo empossados nos cargos de escrivão e coletor, respectivamente, os senhores João Gomes da silva e Francisco Laurito.
            Numa das primeiras sessões da novel edilidade foi, pelo vereador Augusto fManoel Elias Abufares, apresentado o projeto nº 6 que tratava da desapropriação de terrenos para a formação do Jardim Público, o qual teria a denominação de “Praça 13 de março”, em homenagem à data da instalação do município, projeto esse de flagrante atualidade, para o qual deviam atentar os nossos edis, no tocante à nomenclatura de nossos logradouros públicos.
            Com a revolução de 1930, que grande impulso proporcionou à zona interiorana, dado o desafogo político que a entorpecia, numerosas localidades brotaram pela interlândia. Em 1932, prosseguindo a Araraquarense, em direção ao Taboado, atinge Mirassol e, posteriormente Balsamo e Balduino em demanda de Votuporanga. Como um toque de mágica, toda a jungle sertaneja desperta e novas cidades surgem. Ao ritmo desse progresso avassalador, Tanabi vê sua imensa gleba municipal fragmentar-se e aglutinar-se para a formação de numerosos distritos, municípios e até comarcas.
            Sede comarcal desde 13 de junho de 1945, numa área de mil oitocentos e setenta quilômetros quadrados, com jurisdição nos recém criados municípios de Cosmorama e Américo de Campos, Tanabi é hoje município mediano, tendo sido o maior do Estado. Comparado ao passado é agora pequenino, territorialmente falando, mas assim mesmo, e talvez por isso mesmo, ostenta provas de vitalidade invejável n círculo de seu vizidário.

                                                                                              Tanabi, 01 de julho de 1950.


História de Tanabi

            Ao ensejo das comemorações do 75º aniversário da cidade de Tanabi, cabe-nos a nós, um dos responsáveis pela fixação de seus fatos históricos, traçar algumas linhas relativas à data de fundação, além do que consta de nosso ensaio inédito subordinado ao título que encima estas linhas.
            Assim é que, como subsídio ao que escrevemos, referente á fundação e primórdios de povoamento, ajuntamos nestas nótulas, elementos novos colhidos alhures, quer em depoimentos fidedignos, quer em leituras de atas, apontamentos, jornais e outras fontes dignas de crédito. A história é um processo em perpétua revisão postularam Marincourt e Bertrant em seus abalizados escritos.
            A fundação da Capela do Jataí, isto é, o ato simbólico da ereção da cruz, símbolo cristão com foros de marco oficial, deu-se, precisamente, aos 4 de julho do ano da graça de mil oitocentos e oitenta e dois. Até aqui nada a aduzir. Mas, e aqui é que bate o ponto, além de Joaquim Chico, a quem nossa tradição conforme honras de fundador, cujo nome completo é Joaquim Francisco de Andrade, tomaram parte na festa inaugural Hilário de Souza Rozendo, Agostinho Pereira, Manoel Francisco da silva, Joaquim Euzébio, Bento Perez de Souza (o carpinteiro que lavrou o cruzeiro) e ainda: Polenice Celeri, cognominado “O Alferes”, e que exerceu, vida afora, acentuada influência social em torno do povoado e ajudou a fundar; quase todas as iniciativas locais, naqueles tempos, devem-se a ele; Leonildo Bataglia, seu companheiro inseparável desde a Itália, e, ainda, João Barboza do Amaral, o “Amaralzinho”, natural de Sergipe, também um dos primeiros comerciantes da localidade. Na manhã desse dia memorável de 4 de julho, celebrou-se missa campal, que foi assistida por todos os moradores das cercanias, homens, mulheres e crianças sendo oficiantes padres missionários provindos de Campo Belo, longínqua localidade das rechãs mineiras, que, periodicamente visitavam os sertões destas bandas aquém Rio Grande, e aqui celebravam casamentos, batizados e outros atos religiosos. Como nota pitoresca, rezam as crônicas, tomavam notas em papel de embrulho.
            No próprio dia da fundação foram celebrados, entre outros, o casamento do Alferes com d. Ana Delmina de Paula, casamento esse feito numa capelinha de sapé adrede construída pelos habitantes do lugar. Logo após, vendo estes que a cabana era insuficiente projetaram a construção de uma igrejola de madeira e fizeram, também, uma casa para o carpinteiro que cuidava desses serviços. Mas o certo é que a igreja não foi avante pois, antes de ser colocado o telhado, verificaram que os esteios estavam tortos e o madeiramento empenado. A esse tempo já existiam aqui algumas vendas: a do Joaquim Chico, por nós mencionadas noutros escritos, a do Alferes, que também montou a primeira farmácia, a do Amaralzinho, um engenho de cana de Antonio Severiano da Costa, além de outros melhoramentos. Em 1891 foi iniciada a construção da igreja de alvenaria, em estilo colonial, demolida em 1932; os tijolos e telhas vieram da olaria do Alferes, no Jataí de Cima; por não haverem artífices na localidade trouxeram um pedreiro, o Ludovico, das bandas de Taquaritinga, contando-se, entre os que auxiliaram a construção: Polenice Celeri, Jerônimo Gomes Machado, Tobias de tal, Joaquim Pernambucano, Antonio Severiano da Costa, provavelmente, Adolfo Honório. Vieram depois as primeira imagens, a saber: a da padroeira escolhida, Nossa Senhora da Conceição; a de São Sebastião, do Senhor do Bom Jesus e a do Divino sendo estas imagens benzidas por Pe. Antonio e Pe. José Bento procedentes de Rio Preto.
            Em 1901 Dante Celeri termina a construção do primeiro prédio de tijolos do vilarejo, prédio esse que tinha no frontispício não só a data de sua conclusão, como, ainda, desenhada em relevo, as armas da coroa real Italiana, um luxo para a época, a entremostrar reminiscências atávicas de seu proprietário. Já havia, nessa ocasião, funcionando, escolas particulares onde lecionavam primeiras letras Eduardo Ferreira Guedes e Antonio do Rego, professores leigos pois não os havia diplomados na região. O primeiro cemitério do povoado foi feito em 1895 pelo Bataglia em terrenos onde está hoje a quadra de Cestobol na esquina da praça da Bandeira.
            Para complemento destas anotações que, manda a verdade, houvemos por bem inserir, para que não pairem dúvidas aos futuros historiadores desta terra, que estremecemos, como homenagem á sua figura magna pars, vamos, unindo a lenda à realidade, transcrever aqui o termo de óbito de Joaquim Chico, o fundador, copiando, na íntegra, e com todo sabor do original, documento lavrado à folhas 126 do Livro C-1 do Cartório de Registro civil local:
86 – “Aos vinte e cinco dias do mez de Novembro do anno de mil, e nove centos e dez nesta Villa de Tanaby, em meu cartório, compareceu Azarias Paulino de Andrade, e declarou-me, em prezença das testemunhas abaixo assignadas, que hontem, as dez horas da noite nesta Villa de Tanaby em caza delle declarante falleceu Joaquim Francisco de Andrade, de cor parda com noventa e sete annos de idade natural da cidade de Campanha Estado de Minas, de filhação eguinorada, sendo cauza da morte, febre, dando-se o falecimento sem assistência médica, foi constatado o óbito por duas pessoas edoneas. Do que para constar fiz este termo que assigna o declarante e testemunhas. Eu, Francisco Zeferino do Carmo, Official do Registro Civil, que o escrevi, Azarias Paulino de Andrade, Cassiano Maciel da Silva, José da Silva Pereira”.   
            São estas, pois, as alterações que houvemos por bem publicar no que tange à história local agora que comemoramos, eufóricos e felizes, os três quartos de século de fundação desta mui nobre e leal cidade de Tanabi.

                                                                                           Tanabi, 2 de julho de 1957.

Aspectos curiosos da história de Tanabi


            O nome Tanabi foi proposto pelo político riopretense Adolfo Guimarães Corrêa por ocasião da elevação do povoado a distrito de paz.
            O inspetor escolar Cândido de Corte e Brito visitou a escola isolada do Jataí,  fazendo  o  percurs  a  cavalo.  A data :  1908.
            Em 1922, as escolas isoladas foram transformadas em escolas reunidas, sendo nomeado primeiro diretor o professor Tertuliano Soares Albergaria.
Em 1879, o alferes Joaquim Inácio adquire o Varjão dos Dourados pela quantia de mil e oitocentos cruzeiros, imóvel esse que foi vendido, em 1916, ao Cel. Militão Alves Monteiro por três mil cruzeiros. Aliás, o imenso latifúndio das Araras, com 72.000 alqueires, foi, em 1900, vendido por uma simples trela de cães de caça.
            A data da fundação de Tanabi, 4 de julho de 1882, por nós fixada, baseados em depoimentos de antigos moradores, foi oficialmente instituída por lei municipal, datada de 29 de junho de 1949, assinada pelo então prefeito Ary Terra Sócio.
Desmembrado do município de Rio Preto pela lei estadual nº 2009, de 23 de dezembro de 1926, o município de Tanabi foi instalado em 13 de março de 1925.         Fato digno de registro, inédito em todo o Brasil, foi criado o cartório do registro geral nesta cidade, sendo seu primeiro titular o Dr. Urbano Ganot Chateaubriand.
            Durval de Góis Monteiro, irmão do General Góis Monteiro, foi o primeiro delegado  de  polícia,  de  carreira,  em  Tanabi.
            O primeiro médico a clinicar nesta cidade foi o Dr. Américo do Nascimento. Polenice Celeri, na fundação da cidade, fundou a primeira farmácia aqui existente.
            Em 1925, aqui circulou o primeiro automóvel de propriedade do fazendeiro João Alves Monteiro; motivo de intensa curiosidade, o veículo foi transportado até esta  cidade,  via  Boiadeira,  com  grande  dificuldade.
            O Campo de Aviação local foi construído pela população por ocasião da revolução  constitucionalista  de  1932.
            Segundo relato de Eduardo de Paula Brandão, habitavam, nas cercanias do Jataí, os seguintes moradores: Dante Celeri, Antônio Soares Bonfim, João Barbosa do Amaral, Manoel Antônio Pereira Lima, Laudelino de Brito, Francisco Zeferino do Carmo, Joaquim Tito da Costa, e, na zona rural, Polenice Celeri, José Alves Ferreira, Daniel da Cunha Morais, Marcilio Cesário de Magalhães, Gabriel José  de  Oliveira  e  João  Alves  Monteiro.
            Polenice Celeri, que se mudou de Ibirá para o Jataí em 1880, casou-se no religioso com Ana Delmira de Jesus no dia 04 de julho de 1882.
            Em 20 de dezembro de 1922, foi nomeado vigário da paróquia de Tanabi o Pe.  Agostinho  dos  Santos  Pereira.
            Em 1926, o famoso fascínora João Cacheado é linchado na Cadeia Pública, sob as vistas complacentes das autoridades locais, fato esse que motivou a criação  da  comarca  não  em  Tanabi,  mas  sim  em  Monte  Aprazível.
            Era de 3.000 almas a população citadina em 1938.
            Em 26 de outubro de 1930, logo após a vitória do movimento revolucionário getulista, com a chegada das forças provindas de Porto Taboado, que ocuparam a cidade, registraram-se motins dos quais resultou um morto e, vários feridos. Era delegado de Polícia o Dr. Pedro de Albuquerque Cavalcanti.
            Consignamos, aqui, no primeiro centenário da cidade, que a mesma foi administrada, em seus 58 anos de edilidade, por 31 prefeitos municipais, inclusive interventores, partindo da gestão do Cel. Militão Alves Monteiro até o momento atual, por Alberto Víctolo, que deverá continuar no cargo até 31 de janeiro de 1983.

                                                                          Tanabi, 09 de junho de 1982



Velho presídio de Tanabi

            Desfilaram, na parada do Tempo, um septenário de lustros, trinta e cinco longos  anos  despenharam-se  na  garganta  absorvente  do  ocaso...
            Remontando-nos a esse período decorrido, tentamos recompor, auxiliados pelas versões, muitas vezes contraditórias, dos contemporâneos, dos remanescentes dessa época afastada, o viver simples dos habitantes do lendário Jataí  de  então.
            Ressaltam, dessa objetivação a que gostosamente nos entregamos, figuras marcantes como a do Alferes, do Amaralzinho, do Bataglia e tantos outros quase todos já colhidos e tragados na voragem impiedosa do tempo, individualidades que formavam a ambientação rudimentar do incipiente “arraial” em seus lineamentos nascentes e que, pelo muito que fizeram em prol desta terra, lugar de  destaque  merecem  nas  páginas  de  sua  história.
            Museu de recordações vividas dos bons tempos de antanho é o nosso largo da Matriz; nele se resumia a vida vilarenga daqueles dias: a capelinha tosca com arremedos de estilo colonial, a casa onde residiu Dante Celeri, que tinhano frotespício uma coroa real italiana e a data de sua edificação: “1902”; finalmente, a antiga cadeia e mais casebres das vizinhanças como atestados vivos das primeiras  construções  do  povoado.
            É do presídio, porém, que vamos tratar neste rápido escorso, tentando fotografar  à  pena  as  impressões  que  sua  visão  nos  sugere.
            Trata-se de uma casamata assobradada de rudimentar estilo-e note-se: o único prédio de dois pisos até hoje construído na cidade – plantada nos fundos da praça; circunda-a uma vegetação carrasquenta, fruto espúrio de solo árido e pedregoso; logo abaixo, em rápidos declives, opera-se a junção do Jataí e do Bacuri, confundido suas águas que descem marulhosas, em  coleios curvilíneos, rumo  ao  nordeste.
            Esteios de aroeira, angulados pelo machado de exímio carpinteiro, sustentam – hieráticos e pasmos – a envergadura pesada do grosso travamento; paredes grossas, bojudas e disformes, construídas de pedras comprimidas e soldadas por leve camada de argamassa onde a caliça vai, paulatinamente, se desprendendo, eretas se mantêm por milagres de equilíbrio; o telhado, negro e caliginoso, onde a pátina do tempo desenhou esquisitos lavores, é o ponto predileto de irrequietas andorinhas que elegeram seus desbeiçados beirais para neles edificarem  seus  ninhos  prolíficos  e  pipilantes...
            Mas a parede frontal do rez-do-chão, de há muito arruinada lentamente, se desfaz em disforme amontoado de pedras: no entanto, a porta gradeada, de madeira, que dá acesso ao interior da infecta enxovia, lá ficou erécta e escancarada como  a  gargalhar  sinistramente  uma  risada  de  escárneo...
            O lado interno daquela primitiva detenção é bem um quadro lúgubre de horror e pestilência. Evoca-nos aquelas confrangedoras páginas de Dante quando lançamos nossas vistas em torno dos míseros cubúculos soturnos e tétricos de que se compõem; nas paredes esborcinadas a imaginação fantasista descobre contudo de espantosas linhas compondo indecifráveis hieróglifos de estranhas formas.
            Decadente e corroída escada de madeira liga o pavimento térreo ao plano superior e aí, nesse aposento de uma só peça, cinco amplas janelas deixam lobrigar o horizonte para os quatro pontos cardeais; delas, algumas, cansadas de girar nos ferrugentos gonzos que as sustentam, tombaram para o lados numa atitude displicente,  desprezo  atroz,  consciente  esquecimento  de  si  próprias...
            Eis, em pinceladas vagabundas e despretensiosas, o quadro ruinoso desse atestado perene de um passado remoto, relíquia a lembrar-nos – imagem da saudade – a odisséia ignota e selvativa desses tempos volvidos, na pacatez do burgo  nascedoiro.
            Mais além, no topo da praça quadrangular, a matriz solitária e triste também se ressente do ferrete temporal que a estigmatiza; esta, porém, possui ainda o carinho confortante de um povo que a não esquece, dantes a desvela prodigalizando-lhe cuidados reparadores dos estragos das intempéries, aopasso  que  o  velho  presídio  definha  num  patente  ostracismo.
            A cidade trepou a esplanada da colina rumo ao ocidente – caminho da civilização – e por isso olvidou a antiquada prisão; desapareceu o chiado monótono do tradicional carro-de-bois cedendo lugar ao estrépido explosivo dos motores; Klaxonam buzinas estrídulas na saleência das esquinas e usinas  barulhentas  ferem  o  ar  com  seus  apitos  impiedosos.
            A velha cadeia do lendário Jataí é hoje quase um mito. Pertence mais à tradição mas tem, no entanto, singular destino: dantes servia para resguardar a sociedade nascente do convívio pernicioso de tarados e viciosos, transviados pelas sendas do crime, ao passo que hoje abriga em seus escombros uma família de sandeus, imbecis e cretinos a vegetar sordidamente naquele velho presídio.

                                                                         Tanabi, 30 de março de 1929
                                                           Publicado no "Cidade de Tanabi", na data supra.   

          

Tanabi e seu presídio


            Tanabi queiram ou não, cassandras derrotistas, tem progredido a olhos vistos em todos os setores. Assim é que, nada obstante ficar à margem da ferrovia, e de ter perdido parte de sua importância comercial em benefício da região sertaneja, em cujo território se processou o condensamento de vários núcleos urbanos, hoje transformados em prósperos distritos de paz, municípios e até comarcas, graças ao nomadismo de nossa gente que deu outrora o bandeirismo e produz agora moderno pioneiro. Contrariando todos os fatores adversos, Tanabi jamais deixou de se impor no conceito das localidades vizinhas e graças a essa emulação conquista, paulatinamente, seguras posições no terreno do progresso material e quiçá cultural.
            E principalmente neste terreno que nossa terra adquire foros de cidade civilizada, mostrando, além disso, evidentes sinais de evolução e vitalidade dado que conta atualmente com diversos melhoramentos que, à porfia, fazem-na cada vez mais ombrear e mesmo superar em alguns pontos suas rivais lindeiras. Nesta ordem alinham-se: o Aéro Clube, com sua escola de pilotagem; a Biblioteca Municipal com ótima porcentagem de freqüência; o Grêmio Literário e recreativo; o Ginásio “Fernando Costa” e o Grupo Escolar com suas majestosas edificações; o Hospital “São Vicente de Paula” com âmbito, além-fronteiras; o Centro de Puericultura, único da zona; o Fórum e todo o aparelhamento judiciário de sua novel comarca; muitas outras realizações de vulto que seria ocioso aqui relatar.
            No entanto, e talvez por isso mesmo, vamos aqui mencionar nódoa que vive a macular sua tradicional fama, labéu e mazela que é preciso extinguir antes de serem dados outros passos na senda do progresso. Referimo-nos à Cadeia Pública instalada, como todos sabem, num prédio em ruínas tendo unicamente duas celas sombrias onde, em triste promiscuidade, se acotovelam infelizes detentos, tarados e psicopatas. O que se passa no interior desses cubículos talvez nem ao próprio Dante ocorresse descrever, tamanha é a ignomínia do quadro que se nos antolha, miserandos, infectos e nauseabundos! Visitar esse presídio é receber, na certa, chocante impressão de desalento e tristeza e, porventura, de remorso, dado que todos nós temos nosso quinhão de responsabilidade nas culpas coletivas. Custa a crer mesmo que, após milênios de existência cristã, ainda tenhamos coragem moral de trancafiar semelhantes nossos em tão abjetas pocilgas, como se esses deserdados da sorte já não tivessem outros estigmas a suportar!
            Não haverá por aí uma alma de Cristo que se rebele contra esse estado de coisas, contra tão deprimente situação e leve ao conhecimento das autoridades superiores o fato de que num dos mais florescentes municípios paulistas, numa de suas mais jovens comarca, existe um presídio que aberra tudo o que imaginar se possa em matéria de torpeza, hediondez e indigência?
            Deve haver, sim, e também possivelmente haverá um governo que não fará ouvidos de mercador e apelos dessa natureza mas atenderá reclamos de justiça mandando construir em Tanabi, não um palácio de grandes proporções, mas um prédio decente e habitável que sirva de abrigo àqueles que, pelo imperativo das leis, venham a sofrer reclusão segregados da vida social.


                                                                                 Tanabi, 24 de maio de 1947.

Os Japoneses em Tanabi e o Registro Civil.

            É modesto o intuito que nos anima ao traçar estas linhas: lançar rápidos comentários acerca do primeiro registro civil de descendente japonês feito em toda a circunscrição judiciária do município tanabiense.
            Tanabi, ainda que nem todos saibam, é uma das maiores, si não a mais vasta célula municipal do Estado de São Paulo, justamente uma dúzia de quilômetros quadrados, integram seu imenso território em que há zonas de reduzida densidade demográfica, mormente os grandes latifúndios das barrancas do Paraná.
            Limita-se ao Norte, com o Estado de Minas, a Oeste, com Mato Grosso, ao Sul, com o município de Monte Aprazível e a Este, com os municípios de Mirassol e Nova Granada.
            Em suas terras feracíssimas, diferentes nacionalidades se mesclam num “melting pot” caldeador.
            No vizinho município de Monte Aprazível, há quase trinta léguas da sede, nas vertentes do Tietê, está localizada a cidade amarela; Novo Oriente; possui Grupo Escolar, Hospital, Fiação de Seda, Delegacia de polícia de 5º classe, Sub-Prefeitura e Cartório de Paz.
            Ai tudo lembra o Império do Sol Nascente; excepto os funcionários das repartições civis poucos brasileiros aí residem.
            Nova Granada, por sua vez está bastante penetrado por imigrantes dessa raça, principalmente Onda Verde, que é o maior centro algodoeiro da região, quiçá do Estado.
            Rio Preto, cidade de grande movimento, possui bons estabelecimentos comerciais, de propriedade e direção de japoneses e onde os seus patrícios se abastecem.
            Não obstante essa infiltração, até cerca de dois anos á esta parte, nenhum filho do DAÍ NIPON fixara residência neste município.
            O trabalhador japonês era aqui desconhecido.
            Para comprovar essa assertiva, nada melhor que os livros de Registro Civil, a nosso cargo, cujo arquivo de trinta anos, não acusa, até 1935, um só nome arrevesado dos nipônicos.
            Além disso, sabemos de fonte limpa e conhecimento de causa de que os súbditos do Mikado jamais se estabeleceram em Tanabi, quer no comércio, quer nas lides afanosas da lavoura em que são peritos, denodados, perseverantes.
            Vagas referências induzem crer que, nos cofins lindeiros, na “Ponte Pensa”, uma Cia. Japonesa possui alguns milhares de alqueires, incultos e desabitados.
            Há pouco mais de um biênio, dois japoneses Jinshiro Tagashira e Sartore Okay, vindos de Catanduva, Catanduva é um grande centro habitado por essa “gens”- adquiriram, por compromisso, do Cel. João Alves monteiro, setecentos alqueires de terra; esses terrenos, reduzidos a lotes, foram sendo vendidos aos seus conterrâneos que aí se fixaram com o propósito de cultivar o ouro branco que é, aliás, a sua lavoura predileta.
            Data daí a introdução das primeiras famílias asiáticas na jurisdição municipal.
            Actualmente sabemos residir aqui dez famílias; a do Sr. Tagashira, na cidade, tendo uma sua filha concluído no Grupo Escolar local o curso primário; oito famílias na fazenda “Nova”, de que atrás falamos e a do Sr.  Yosito Tashima, na fazenda “Jataí de baixo”, onde é arrendatário de quarenta alqueires de terras, agora cobertos de viçoso algodoal.
            Bons trabalhadores; elemento ordeiro; nada temos a objectar sobre seu modo de viver; em alguns pontos podem até servir de padrão ao nosso sertanejo indolente e descoroçoado.
            Entretanto, a vida civil desses advenas continuava ignorada para nós funcionários do registro civil; nenhum lançamento de pessoas naturais, dessa nacionalidade, fora até aqui feito em cartório.
            Até que em fim, a 03 do corrente fomos agradavelmente surpreendidos com a vinda á repartição de um sorridente amarelo que, mais por gestos que palavras, nos manifestou o desejo de senta crianno livro...
            Embora tratando-se de domingo, consagrado ao descanso funcional, atendemos com muito prazer ao rude trabalhador, tendo, até, certo orgulho de podermos, afinal, anotar os nomes, prenomes, filiação, etc. De uma pequerrucha de olhos de amêndoa.
            Vencendo as dificuldades naturais de pronuncia e compreensão, conseguimos redigir o termo que a título de curiosidade vai a seguir transcrito:
            “Nº 5270 – (cinco mil duzentos e setenta) – Aos três dias do mês de janeiro de mil novecentos e trinta e sete, nesta cidade de Tanabi, comarca de Monte Aprazível, em cartório, compareceu Kosaka Kaniti e declarou que ás dezenove horas do dia 1º (primeiro) de janeiro deste ano, em seu domicílio na fazenda “Nova”, deste distrito, nasceu uma criança de cor branca, do sexo feminino que recebeu o nome de YUHUMIKO KANITI, filha legitima dele declarante e de sua mulher dona Yohsi Kaniti, lavradores, naturais de Shiroshima e Tokushima, Japão e casados civilmente em Kurê, Japão. São avós paternos, Kosaka Kanikiti e dona Kosaka Tabo, falecidos e maternos Sadamo Kakuhiti e dona Sadamo Takeno, residentes em Tokushima, Japão. Do que para constar lavrei este termo que, lido e achado conforme o assinam: o declarante, as testemunhas Germano Robach e João Barbosa do Amaral, comigo Sebastião Almeida Oliveira, Oficial do Registro Civil, que o escrevi. (a.a.) Kosaka Kaniti, Germano Robach, João Barbosa do Amaral, Sebastião Almeida Oliveira”.
            Manifestando interesse por esse assunto, conseguimos apurar que o declarante é pai de dez filhos, alguns dos quais nascidos e registrados no Brasil. Elogiamos seu esforço nesse sentido e pedimos ao mesmo interessar seus patrícios no cumprimento das exigências de nossas leis reguladoras da família.
            Explicamos a ele a existência da lei 252, de 22 de setembro do ano findo, a qual, como é sabido, isenta de multa os registros feitos fóra do prazo legal comum; havia, pois, convivência em aproveitar os favores da lei.
            Prometeu-nos o bom lavrador procurar convencer seus compatriotas, entre o quais – disse-nos haviam diversas crianças não registradas civilmente.
            O facto não é de causar assombro, porquanto temos tantos compatrícios nesse pé de igualdade...
            Segundo informações fidedignas, os lugares onde predominam os orientais pouco favorecem os funcionários do Registro Civil, pela notória animadversão que aqueles votam ao nosso instituto civil.
            Até os papéis de casamento, uma vez preparados de conformidade com as leis nacionais, servem para os nubentes casarem-se... no Japão!
            Não fazem questão de registrar seus descendentes nos cartórios brasileiros (quando o fazem), por que, garante a nacionalidade dos filhos, ainda que estes venham á luz em terras estranhas.
            Querem a todo transe conservar o Yama todamashu (espírito japonês).
            Segundo estatísticas amplamente divulgadas atinge a mais de cem mil o número de filhos de japoneses nascidos em território brasileiro e registrados nos consulados daquele país.
            O Código Civil Brasileiro reconhece nacional ao filho de pais estrangeiros nascido no Brasil.
            Há, pois, uma antinomia, da qual resultam dualidade de pátrias; situações dúbias que precisam e devem ser conjuradas por quem de direito: governo, legisladores, etc,
            Antes, de mais nada, mantenhamos a todo o custo, os dispositivos contidos nos parágrafos 6 e 7 do artigo 121 da Constituição Federal Brasileira, os quais vedam a concentração de imigrantes em qualquer ponto do país e fixa a quota de dois por cento para as correntes imigratórias.
            A menos que se queira permitir budhicamente a formação nos intra-muros brasileiros de um imenso Kisto asiático, um Shi Niho (Novo Japão).
            Para que o Brasil não seja no futuro uma mera expressão geográfica; para que ele continue sendo o desdobramento evolutivo do organismo nacional, iniciado e continuado, pelo esforço das gerações actuais. (Azevedo Amaral – O Problema Eugênico da Imigração).
            BANZAI BRASIL! (VIVA O BRASIL!)

                                                                                                              Tanabi, 08 de janeiro de 1937.
 * Artigo publicado no “Jornal do Comércio”e em “A Nota”, do Rio de Janeiro.



A Nossa Matriz


Vai de vento em popa a construção de nossa Matriz.
            Constituída a Comissão de Obras, na forma da provisão assinada por_Dom.   Lafaiete libânio, aos Vinte e nove de agosto de 1.936 e empossada aos onze de setembro daquele ano, entrou a mesma em franca actividade, trabalhando com denodo e afinco, sob a presidência do Sr. Francisco Vargas, que, dito de passagem, no exercício de suas atribuições, tudo tem feito em seu pról.
Assim é que, como medida preliminar, foram iniciados os serviços de revestimento do alicerce da parte a construir; é do domínio público o copioso material consumido nas bocas hiantes dos enormes fossos, material esse consistente em arêia, cal, cimento, pedregulho, ferro e massiços blocos de pedra, tudo disposto de forma a garantir a mais ampla estabilidade ao grandioso edifício.
            Meses após, já as possantes muralhas de cimento-armado emergiam do solo na ânsia de atingir as cumiadas. E a esperança ia renascendo aos poucos nos corações tanabienses, na espectativa de que, em limitado espaço de tempo, ter-se-ia terminado o arcabouço estructural do espaçoso tempo.
            Agora é o terrapleno que se processa rapidamente na parte circunscrita pelas paredes externas; as depressões e funduras cederam lugar a nivelada quadra, formando o piso que será, futuramente, revestido a mosaico.
Estamos ainda no início, do ano e já se nota a desenvoltura das paredes laterais, verdadeiros contra-fortes de composição granítica, apropriados a receber o peso do travejamento e telhado e a resistir os embates do tempo.
Operários, numa azafama sadia, tecem andaimes, assentam tijolos e preparam argamassa; aos poucos surgem os lineamentos murais e todo o trabalho segue em rítmo harmonioso e progressivo.
O Padre Fidelis, coadjuvando eficientemente os membros da Comissão , entrega a esta mais de dois contos e quinhentos mil reis, apurados dos recebimentos de laudêmios, etc.; restaura os bimbalhantes sinos; coloca lindos vitraux nas amplas janelas que banham de luz colorida o artístico altar, admirável trabalho inacabado devido ao buril competente de João Vargas. Alem disso, manda colocar, á entrada da parte construída, preciso anteparo; trata da aquisição de um armonium e cuida de resgatar a dívida resultante da compra das imagens sacras da Semana-Santa.
Tudo isso sem alarde ou falazes promessas.
E o povo começa a compreender que a Comissão está mesmo de facto empenhada em concretizar o sonho tanabiense – a terminação da Igreja Matriz. Para comprová-lo, aí temos os donativos entregues á tesouraria: Saul Vieira, doa cincoenta mil reis; Marcilio Cesário de Magalhães, oferece dez mil tijolos. Outras ofertas, sabemos estarem sendo encaminhadas, motivando nosso optimismo no sentido de crêr que os trabalhos não sofrerão solução de continuidade, por falta de numerário, á mingua da generosidade do povo desta terra, sempre disposto a emprestar o seu auxilio a todas as boas causas.

As localidades vizinhas: Mirassol, Monte Aprazível, Neves, Nova-Granada e outras, esmeram-se na feitura de seus templos, alguns deles primorosas jóias de arquitetura. Precisamos acompanhar pari-passu esse movimento creador, construindo nossa Matriz dentro do menor prazo possível, afim de, podermos mostrar aos visitantes o gráu de nosso adeantamento e o amor ás nossas instituições entre as quais a Igreja está, indiscutivelmente, em primeiro lugar.
            Para isso, entretanto, necessário se torna que todos - comerciantes, fazendeiros, industriais, sitiantes e colonos, o povo em geral, contribua, na medida de suas possibilidades, com seus valiosos donativos, em dinheiro ou gêneros, os quais poderão ser entregues directamente á Comissão, para que esta continue aparelhada a contornar as vultosas despesas que vêm sendo feitas nas obras em andamento.
Qualquer contribuição será religiosamente aplicada nesse desinteratum.
Tanabienses! emprestai vosso decidido concurso a esse nobre mister, concorrendo com urna parcela dos vossos esforços para a conclusão mais rápida do magnífico templo que será o orgulho dos presentes e a admiração dos postéros, a casa do vosso DEUS!
          
           
                                                                         Tanabi, 27 de janeiro de 1937.


Biblioteca Municipal de Tanabi

            Num dos seus apreciados sueltos subordinado ao título: “O Exemplo de Araçatuba”, publicou, recentemente, o vespertino “Folha da Manhã”, de São Paulo, interessante considerações sobre a criação de setenta e quatro bibliotecas municipais espalhadas pelo interior do Estado, entre as quais figura a de Tanabi, todas elas seguindo o sulco luminoso, iniciado na Capital da Variante, com a instalação daquela casa de livros que se orgulha de esculpir, em seu frotespício, o nome inconfundível do emérito jornalista que é, sem nenhum favor, Rubens do Amaral.
            Lisonjeia-nos sobremodo, o fato de estar nossa terra inscrita entre essas poucas dezenas de cidades do planalto que tiveram a feliz idéia de fundas uma biblioteca; sim, e toda a vez que vemos o nome de Tanabi aparecer numa lista dessa categoria exultamos de contentamento. E não é para menos o nosso entusiasmo, mormente sabendo-se que, entre as duzentas e setenta cidades da interlândia paulista, alinham-se numerosas de muito maior importância, política e economicamente falando, do que a nossa e que ainda não tiveram semelhante iniciativa. E todas elas necessitam, tanto ou mais que nossa terra, de uma biblioteca pública, sendo de aconselhar uma campanha inspirada nos moldes da que está sendo feita em prol da aeronáutica, pois os vôos do espírito também são importantes...
            Mas, e aqui é que bate o ponto em rijo; é preciso que essa biblioteca entre em funcionamento imediato, para que não permaneça indefinidamente incubada num decreto, como se fora letra morta. É preciso abrir-lhe as portas, entregando-a à mocidade tanabiense, ávida de conhecimentos, que não dispõe de um lugar propício onde dessedentar-se da “sede de saber” que a todos empolga. Para isso nada mais é necessário do que dotá-la de instalação adequadas em local acessível com uns poucos livros básicos para sua estréia e com isso não se gastará uma fortuna. Depois, uma propaganda bem feita, carreará, para sua estantes, as dotações dos que lhe queiram vê-la engrandecida, dos propagadores de bons livros que aqui os há como em alhures e ainda das instituições públicas, entre as quais, sobressai, por sua função precípua, o Instituto Nacional do Livro.
            Tanabi, até esta data, quase nada tem feito pela cultura de seus habitantes, a não ser contribuir subsidiariamente para o engrandecimento cultural de outras cidades. Nada temos aqui de grande e elevado, nesse terreno, para mostrar aos que nos visitam; nenhuma coisa que lembre cultivo da inteligência, cogitação superior ao ramerão quotidiano: ganhar e gastar dinheiro, função de cidades pioneiras. Não há aqui um só estabelecimento de ensino secundário e em seu grêmio literário não há, sequer, uma revista para ilustração e deleita de seus habitués. Ora, é urgente mudar de ruma, se não quisermos ficar na retaguarda das cidades que nos rodeiam, reduzidos à simples condição de aldeiota sem vida cultural própria, mero ponto geográfico de passagem que o desvio da linha férrea lhe quer condicionar. Azado é, pois, o momento que se nos oferece para iniciar uma campanha pelo soerguimento de nossas forças latentes com a instalação de nossas forças latentes com a instalação da Biblioteca Municipal nos primórdios de 1942. A essa inauguração, forçosamente, outras iniciativas terão seguimento imediato e Tanabi mostrará á todos, apologistas e detratores, que a chama do pensamento aqui se extinguiu e que o espírito de sua gente flutua muito acima das injunções materiais.


                                                                       Tanabi, 27 de outubro de 1941. 


O Cavalo e sua influência social em Tanabi.

            Pela configuração de seu vasto território, ilhado na mesopotâmia dos rios lindeiros, o Paraná e seus coletores; Turvo e Dourados, de cruzamento dificultado pela inexistência de pontes e de navegação organizada e ainda de caminhos de acesso, o município de Tanabi tornou-se, ipso-fato, um dos derradeiros redutos a ser explorado, pela aguiculturação de seu solo, em todo o Estado e quiçá, por esse mesmo motivo, o habitat preferido; antigos meios de locomoção e transporte, entre os quais tem lugar de relevo o carro de bois e o cavalo, hoje colocados em primeiro plano em virtude da escassez de combustível, a qual, infelizmente, tende a agravar-se com o prosseguimento da peleja que ensangüenta o Orbe.
            Já desde os pródomos de sua conquista pelos batedores de mato, esses primeiros ousados pioneiros que lhe devassaram a selva penetrando-a, de facão em riste, e puxando, pela picada assim aberta, a esquálida alimária vergada sob o peso inclemente de provisões de boca e alguns trastes indispensáveis á nova instalação no recesso da floresta, vem o cavalo, aqui, exercendo alta função sociabilizante, quer como meio de condução, na sela ou no tiro, quer como veículo adequado á varação de impérvios caminhos, onde só ele poderia transitar, contribuindo, assim, para o encurtamento das distâncias, entre os moradores da gleba latifundiária, hoje quase dissolvida, e conseqüente dilatação do círculo de vicinagem, ou seja, a extensão máxima, que á um individuo, peão ou cavaleiro, é dado a atingir, de modo que possa, sem esforço e sem fadiga, voltar, “ainda com dia”, à sua casa de vivenda, na definição clara e irretorquível de Oliveira Viana.
            Meio século depois de palmilhado seu território, foi aberta a via natural do Taboado que nos pôs em comunicação com os dilatados domínios pastoris do imenso Mato Grosso, onde eram arrebanhadas, a casco de cavalo, multifárias manadas bovinas destinadas ao sacrifício em Barretos. Instalo-se, com ela, no interior municipal, transformando em vasto campo de engorda, uma verdadeira civilização de couro, de que nos fala Capistrano, em que o cavalo representaria o seu mais saliente papel transportando em seu dorso, através de centenas de léguas, pesadas bruacas, arreotas de variado estilo, resistentes laços, ou, ainda, o próprio peão revestido de sua especial indumentária que tem muito de mourisca e consistente em vistosas bombachas de couro curtido com a qual devassa, em correrias loucas, a emaranhada quiçaça que domina os flancos da solitária estrada; outras vezes, conduz com soberbia o capataz da comitiva ou o próprio boiadeiro chefe, para o qual o arreiamento de seu animal consiste numa exteriorização de sua personalidade; por isso cavalga escarranchado em garbosos socados e arrebicados francanos ornados de cintilantes metais e macias badranas, quando não de fofos pelegos, “forros” que lhes servem, a um tempo, de sela, nas viagens, e de agasalho nos pousos e, para complemento desse conjunto, vistosos “peitorais” onde pompeiam argolas prateadas, bridas e freios de couro trançado, perneiras e botas ringideiras, arrebicados cabos-de-relho, rebenques e rabos de tatus pacientemente burilados por eméritos cultivadores de arte de trançar. Tudo isso constitui os apetrechos componentes dessa civilização que até hoje perdura, não obstante o progresso que avassala o Oeste Paulista conseqüente da onda migratória aqui afixada.
            Com a implantação dos transportes mecanizados, completa revolução se operou nos costumes da gente sertaneja: não mais as empolgantes cavalgadas, rumo à sede municipal acompanhando esquifes e noivados e simples viagens escoteiras de recados compadrescos, na ação reflexa de amplitude ao círculo de vicinagem em que o fator pressa não entrava em linha de conta. Tudo isso foi de roldão levado pelo carro do Progresso simbolizado pelo automóvel prenhe de conforto para o abastado, pela jardineira acolhedora e barata que serve ao mesmo tempo pobres e remediados, gênero de locomoção a que o sertanejo se habituou à maravilha, a ponto de neles circular pelo simples gosto de fruir o prazer de uma viagem “bestando à toa”. Mas é de se convir que dói, com essa poderosa infiltração da máquina em plena selva, que se operou impetuosa migração humana no território tanabiense pontilhando-o de numerosos núcleos urbanos e adensando-lhe o povoamento rural já agora bastante significativo e que tende a crescer espantosamente com a penetração da ferrovia em seu hinterland.
            Segundo Oliveira Viana o pastoreio na savana, desenvolvendo os hábitos da cooperação e da solidariedade, é, de si mesmo, uma escola incomparável de sociabilidade; “parar o rodeio”, o “sustar as disparadas”, o “repontar a Tropa”, o “rondar o gado”, operações fundamentais do serviço pastoril, são todas operações coletivas, sem nenhuma possibilidade de realização individual. E também a vivacidade de gestos e de fisionomia, modos desembaraçados e francos, conseqüência natural das condições do pastoreio na savana, refletem-se na vida natural, de onde a jovialidade extrema e a extrema sociabilidade do povo pastoril para as quais o cavalo contribui sua poderosa influência. Daí, por certo, concluirmos, repousar nesse fator á proverbial jovialidade e extrema sociabilidade do povo tanabiense, sempre ativo nas questões de solidariedade, amável, acolhedor e simpático. 


                                                                                              Tanabi, 30 de julho de 1942.

  
Asas Metálicas em Tanabi

            Constitui para nós fato alvissareiro o registro de que aqui em Tanabi já estamos formando ambiente aviatório propício ao desenvolvimento de nossas imensuráveis possibilidades no domínio do ar, quer nas lides produtivas da  paz, quer nas ásperas agruras da guerra onde só subsistem os povos adrede preparados.
            Além de magnífico aeroporto que possuímos, temos, como indispensável corolário, grandioso hangar construído com todos os requisitos da moderna técnica rivalizando-o com os melhores da zona; nele se encontram, além de imenso compartimento, apto a abrigar pequena esquadrilha, casa para depósito de combustíveis, aposento para residência do guarda e posto de sinalização. E dentro desse vasto galpão possuímos, para nosso maior gáudio, o elegante “Lusitânia” doação do benemérito banqueiro Moreira Sales, mediante o qual, luzida plêiade de moços; fazem seu treino diário para a conquista do ambicioso brevet.
            Todos os dias, do romper da aurora até o lusco-fusco, exceção feita de regulares intervalos, ai se encontra animado grupo de aspirantes norteados pelo infatigável diretor de campo, o sempre solícito Paulo Pereira da Silva, e pelo hábil instrutor Romeu que, paulatinamente, vai dispondo a jovem turma para a ambiciosa escalada dos céus num futuro vôo solo.
            Antes que o motor se aqueça, ou durante as consecutivas idas e venidas do pássaro metálico generalizam-se palestras animadas onde respigamos vocábulos e expressões antes de uso quase desconhecido e já agora correntias, tais como: linha de horizonte, rotação de motor, hélice, vácuo, pista, manchão, bequilha, fuselagem, nacele, carlinga, aterragem, pane, campo de pouso e outras de igual teor.
            Tudo pronto, Romeu à frente no comando, tomamos assento no confortável avião-escola que, em rápida manobra, vai, daí a segundos, abandonando as amarras que o prendiam ao solo; um frisson percorre nossa espinha ao sabermos que, vencendo a lei da gravidade, galgamos o espaço e ai, permanecemos mantidos por quatro forças opostas: sustentação, peso, tração e resistência.
            Após algumas evoluções estamos já a apreciável altura espraiando nossos olhares pelo vasto horizonte que daí se descortina: vamos aos poucos afeiçoando-nos à novidade e reconhecendo os sítios que nos são caros. Após largo contorno voejamos pelos subúrbios de Tanabi e a cidade surge a nossos olhos extasiados tal qual fora linda visão chinesa; seus quarteirões assimétricos, suas ruas retilíneas, casas e jardins tudo isso a desfilar com incrível rapidez, semelhando, lá de cima, frágeis brinquedos infantis, miniaturas caprichosas de algum atrevido pintor que se comprazesse a debuchar esquisitos lavores; em seus meandros perambulam microscópicos seres humanos que parecem diminutos vermes...
            Daí, da imensidade azul que tão facilmente vingamos é que, divagando, avaliamos quão pequeninos somos, quão mesquinha é nossa prosápi como são ridículos os nossos sonhos e projetos que reputamos grandiosos...
            De lá, desse campo infinito e para nós virgem, descobrimos panoramas indescriptiveis formados, compostos pela natureza e pelos homens e o casario em linha vertical tem estranhas formas; dir-se-ia estarmos presenciando um fenômeno da quarta dimensão ou algo fantástico e irreal. Os arredores de Tanabi, que palmilhamos a pé e percorremos a cavalo ou de auto, contemplados de avião, tem agora outra perspectiva e são dotados de prestígio diferente; suas chácaras e charnecas, pequenos sítios e fazendolas compondo o mosaico constrito de onde emerge nossa semelham autênticos parques ingleses desses que estamos habituados a ver em fitas de cinema ou através gravuras coloridas; naquelas paragens até o feio se alinda e o mais ferrenho carrascal assume feições amenas, toda a paisagem se humaniza oferecendo-nos quadros de incomparável suavidade. E como são formosos os dois regatos que num abraço amoroso cingem o enxadrezado da civitas; estradas poeirentas e esburacadas, que tanto temos percorrido, de lá divisadas, mostram contornos poéticos enovelando-se como tiras amarelas pelos socalcos e ondulações do terreno que se distende em todas as direções.
            Sucedem-se espantosamente as mutações físicas e as mais típicas formas da atividade humana, nesta região agro-pastoril, perpassam com incrível viol~encia. O avião permite apanhar em bloco todos os aspectos da paisagem cultural, declara Pierre Mombeig o que, aliás, nos foi dado consignar. É todo um desfile caleidoscópio que presenciamos: a suave cor verde das pastagens emolduradas pela copa azulada das árvores e, em miríades de quadrados regulares, despontam habitações austeras de fazendeiros, rompem, numa decoração álacre, pitorescas vivendas de pau-a-pique enfeitadas de cercados e arvoredos, de animais domésticos e de gente tudo isso reduzido à sua expressão mínima; pelas encostas ondulam talhões regulares de cafeeiros disciplinados e desdobram-se espigões dominados pala policultura, celeiro onde o homem provê suas necessidades; vales verdes, de fundo chato, aparecem riscados ao fundo por esquisitos fios de água que teimam em seguir para o oriente...
            Mais ao largo, num esforço de visão, divulgamos os característicos fisiográficos da região reconhecendo-lhe os acidentes naturais, cheios de encantadoras perspectivas, de onde emergem, triunfantes e promissoras, cidades e vilas, testemunhas do esforço de seus habitantes, arestas vivas a viçar o fácies geográfico do oeste paulista.
           
                                                                                                Tanabi, 20 de maio de 1943.


Considerações acerca das Principais Estradas Tanabienses.


O município de Tanabi creado pela lei nº 2.009, de 23 de dezembro de 1.924, compõem um vasto tracto de terras formando o maior território municipal do Estado, porquanto cobre uma área aproximada de doze mil quilômetros quadrados; desfruta privilegiada situação, tendo por limites políticos duas unidades federadas: Minas e MatoGrosso, mediante a baliza natura do caudaloso Paraná, ou Paranã, - "o rio enorme, caudal, imenso, grande como o mar”; confina com o município de Monte Aprazível, séde da circunscrição judiciária a que pertence, por meio de breve trecho de espigão divisor, e a seguir, pelo talvegue dos córregos da Grama e Fortaleza e, finalmente, pelo rio São José dos Dourados até sua foz; com os municípios de Mirassol, Nova Granada e Palestina, pelo divortium aquarium dos córregos Bálsamo e Jataí e depois pelo veiu d’agua dos rios Preto e Turvo até sua embocadura no Grande, dando-lhe, portanto, a característica de essencialmente mediterrâneo, com invejável rede hidrográfica a marcar-lhe os contornos externos.
            Embora datando de alguns decênios o desenvolvimento que ostenta, foi, sua séde, fundada nos meados do ano de 1.887. Assenta suas edificações numa esplanada de suave relevo, onde a cota mais alta registra 550 metros de altitude, á montante da junção do Jataí e seu afluente Bacurí. “Jatai", - "arvore de fruto duro e também espécie de abelha”, nome da fazenda geral onde se localiza a cidade, designa também o antigo topônimo desta; somente mais tarde, em 1.907, com a instalação do distrito de paz, é que recebeu sua actual denominação TANABY, ou, pela fonética hodierna TANABI - que poeticamente expressa “rio das borboletas”, em que pese opinião contrária de “madeira adstringente, que aperta”.
            Possui, a cidade, cerca de 3.000 almas, clima saudável e comércio movimentado; dista 50 quilômetros de Rio-Preto, cognominada “Capital da Alta Araraquarense" e 30 ditos de Mirasso1, ponto terminal da Estrada de Ferro Araraquara que, em seu prolongamento, conforme estudos definitivos, penetrará o sertão tanabiense, em sentido longitudinal, rumo noroeste, até as raias dos Estados limítrofes, realizando, assim, o sonho dourado de Pimenta Bueno e outros expoentes da engenharia nacional; de Porto Taboado, na fronteira matogrossence, com a qual se comunica por meio de lancha a vapor, destinada ao transporte de gado, dista aproximadamente 200 quilômetros e uns cem de Porto Monteiro, na barra dos rios Turvo e Grande, onde, ha anos vo1vidos, havia balsas servindo de liame ao comércio regional com as povoações do Triângulo Mineiro: Aldeia, Santa Rosa, Monte Alto e São Francisco de Sales.
De acordo com a actual divisão judiciária e administrativa da República, comporta este município uma cidade e três vilas: Cosmorama, Américo de Campos e  Vila Monteiro, além de outros povoados que se delineam.
A principal artéria que põe Tanabi em comunicação diária com os demais centros civilizados, inclusive a Capital é a que, partindo desta, tangencia Bálsamo e Mirassol e     culmina em Rio-Preto, estando esta, por sua vez ligada ao sistema rodoviário do Estado;
ainda querudimentar e acidentada, desempenha, essa estrada, papel saliente de abastecedora da região, canalizando o grosso da produção agrícola e mais gêneros exportáveis e importáveis.Mereceu, por isso mesmo, de Menotti Del Picchia, o cintilante poeta que todos nós admiramos, o expressivo cognome de "Nilo da Região”, dada sua importância vital para o comércio sociabilidade humana de seus habitantes.
Articulando-se a essa via e com irradiação para diferentes zonas do município partem, de Tanabi, e em demanda dos confins sertanejos indo perder-se nas águas lindeiras, ou ,transpondo-as, nas localidades circunvizinhas, um feixe de rodovias de construção primitiva apropriadas ao trânsito de veículos á tracção motora e animal, preponderando estes. Mormente na estação aquática, tornam-se esses caminhos emperrados e inviáveis, atendendo-se á precariedade de sua construção e quiçá conservação defeituosa.
            Assim, dentre as estradas de maior projecção, destacamos:
a) a que se orienta em direção a Monte Aprazíve1 - 24 quilômetros
distantes de movimentação reduzida, em virtude de ser utilizada quase tão somente pelos que lidam negócios forenses, porquanto o comércio regular é feito exclusivamente para Rio Preto; corta, no bairro dos Angicos, a divisa municipal, mas, alguns quilômetros antes bifurca-se noutra que segue pelo vale do ribeirão Fortaleza até o distrito de Sebastianópolis, hoje General Salgado, já nos domínios extra-municipais; diversos outros pequenos ramais a ela se juntam, principalmente no bairro do Mangue, aliás bastante povoado;
b) a estrada do Taboado, ou Boiadeira, da qual fizemos minucioso estudo inserto na Revista do Arquivo Público Municipal, nº XXXI; essa estrada, de incalculável alcance comercia1 e estratégico, de que deu provas no movimento armado de 1.932, verdadeira "pista de gado” (P. Deffontaines), está hoje criminosamente abandonada pelos poderes públicos, convertida em mero caminho de cabras, quando sua finalidade é bem diversa; desenvo1ve-se a mesma pelas vertentes do São José, num desfile de quase quarenta léguas pelo hinterland. Municipal,  passando por Vila Carvalho e Piassava e através os grandes latifúndios marginais do Paraná, o qual transpõem rumo a Sant'Ana do Paranaíba e aos campos de Vacaria, Cuiabá e Goiás; essa travessia é feita alguns quilômetros abaixo da “lha dos três Estados”, medindo o rio, aqui, de 800 a 1.000 metros; em quase todo o seu percurso, isto é, a partir de Barretos, atravessa imensas pastagens naturais e artificiais, onde o comércio bovino tem seu habitat, delimitando, portanto, a região da pecuária. É com dificuldades de monta que as grandes boiadas por ai passam, pois, acha-se invadida pelo matagal e o seu largo corredor reduz-se a trilhos escavados nos taboleiros; em muitos pontos dilatados caldeirões obstruem-na, impedindo a marcha regular de carros-de-bois; a ela se vinculam inúmeros caminhos que servem ás propriedades confinantes;
c) á direita. daquela, e em direção noroeste, parte outra, de automóveis, a linha tronco que, á altura de Cosmorama sub-divide-se em duas, distraindo um ramal para a nascente povoação de Votuporanga “o vento, o sopro de ar bonito e bom”, ramal esse que se prolonga; até Vila carvalho; entretanto, a linha principal prossegue para Vila Monteiro, Boa Vista, (a quem a malícia caipira crismou com o deprimente epíteto de Caba-.já,) e Vila Cardoso, esta a curta distância das lindes mineiras; dita estrada, em seu desenvolvimento, enfeixa numerosas congêneres que por sua vez ligam-se às grandes fazendas “Marinheiro", "Guariroba” ,”Araras","Santa Rita", “Água Vermelha" e tantas outras que se distendem em a bacia do rio Grande, onde se encontram formidáveis reservas hidráulicas, como essa maravilhosa Cachoeira dos Índios, cujo potencial é avaliado em 300.00 HP. O segundo dos grandes saltos do Estado; a estrada que liga, si lograsse reforma, poderia, de futuro, transformar-se numa rota de turismo aos que desejassem contemplar o extraordinário aspecto dessa grandiosa queda;
d) ainda de Cosmorama e inflectindo á direita desdobra-se outra via para Américo de Campos que, de per si, liga-se a Vila Monteiro, Palestina e á sede Tanabi, da qual dista uns 42 quilômetros, servindo esta ultima rodagem, ao povoado de Vila Nova e ás fazendas Piedade, Ribeirão Bonito, Barra Mansa e Cachoeira dos Felícios;
e) a mencionada estrada de Américo de Campos, antigamente Águas Paradas, parte de Tanabi pelo bairro do Tomazinho e a cerca de 5 quilômetros diverge, á destra, um braço que vai a Ibiporanga –“ terra –bonita” e daí segue até Mirassolandia, distrito este pertencente a Mirassol;
f) partem ainda da sede, emprestando-lhe característica peculiar de cidade-chave, outras estradas e caminhos de menor bulto, tais como os que atravessam o Guamerim, o bairro da Alegria, e o das Peróbas; as que se encaminham para o Mangue, a Grama, o Angola, o Veado, etc...;
g) de Porto Taboado e galgando o Ponte Pensa e o São José, mediante pontes de madeira, vai a Itapura e Novo Orienve, urna estrada, construída em 1.842, e reaberta no ano findo para atender ao incremento desta última cidade, habitada exclusivamente por milhares de famílias nipônicas, genuíno quisto amarelo enraizado no sertão paulista;
h) essa, a que põe o imóvel Guariróba em comunicação com Palestina, e alguns caminhos menos importantes, divergentes que são da sede, posto que não lhe tragam nenhum contributo econômico, carream para outras zonas valiosa porção de seus proventos e rendas.
            Com referência ao derradeiro tópico citado, cumpre salientar que, a falta de reconstrução da estrada do Taboado, sobre dificultar o acesso a Tanabi, motiva a polarização da maior parte aos moradores da margem direita do São José em direção as povoações situadas no vizinho município de Monte Aprazíve1, onde, manda a verdade que se diga, permitem as estradas que autos e carros devassem os recônditos sertanejos. Daí a prosperidade crescente de Nhandeára, General Salgado, Palmira, Macaúbas, Floresta e Magda, todas tributárias daquele rio. Refeita a via do Taboado, empresa a que o Estado convinha atentar teríamos engrossada a caudal bovina tangida a passo moroso dos intérminos campos de Goias e Mato Grosso em direitura á feira de gado barretense; aqui,
no município, o rebanho desnalgado e abatido pelas jornadas restaurar-se-ia, alcançando melhores preços no mercado frigorífico; as comitivas de tropas e peões em sucessivas viagens e torna viagens emprestariam á cidade o semblante de outros tempos, quando a mesma via oferecia melhores condições de trafego a veículos e montarias.
            Regular serviço de auto omnibus, ou jardineiras é feito diariamente quer para Mirassol e Rio Preto, quer para os distantes povoados de Votuporanga, fundada sob os auspícios da firma Theodor Wille & Cia. Ltda., que está retalhando em lotes seu latifúndio de 12.000 alqueires de terras; para Vila Monteiro, cujos domínios também está sendo retalhado e vendido em pequenos sítios; para Cosmorama, jovem localidade que já possui mais de cem prédios e rodea-se de numerosas pequenas propriedades; para Américo de
Campos, florescente vi1a onde laboram diferentes etnias; para Ibiporanga e Mirassolândia; de Guariróba a Palestina e Nova Granada, ligando-se, aos trilhos da E. de F.São Paulo Goiás; o imóvel Guariróba pertence a uma firma inglesa e nele se fixaram, nos últimos anos, milhares de trabalhadores nordestinos explorando plantações cerealíferas e algodoeiras.
Á carência de outras viaturas mais confortáveis é a jardineira, o veículo por excelência para o transporte co1ectivo, desempenha papel de relevo em nossa civilização, caipira, na inspirada definição de João Carlos Fairbancks; o próprio caboclo, refractario a inovações, adotou-a, prescindindo o inseparável matungo; o automóvel simples, condução mais cara, é de uso mais restrito, ao passo que o caminhão penetra o município em todas as direções onde haja um palmo de estrada que, por suas condições, permita passagem ao pneumático, substituindo, vantajosamente, o tardio carro de bois, cujo canto nostálgico ainda se houve nas raias urbanas, trazendo do alto sertão o cereal recém colhido; suínos e outras espécies; mudanças e até viagens de famílias inteiras, viagens que duram semanas, são nele feitas com integral desprezo á hora veloz que passa; finalmente o cavalo de sela, a montaria predilecta do lavrador, do boiadeiro, de todos, em suma, que habitam a zona rura1, completa  movimentação social; daí depararmos a cada passo vistosas bombachas, completando  essa excêntrica indumentária, a cartucheira, a guaiaca recheiada de pelegas, o lenço esvoaçante e o chapéu de abas largas, apetrechos que denunciam claramente a tendência profissional de seu portador, cujo maior gosto consiste em trazer, como símbolo, á anca do animal, enrodilhado laço que manejo com maestria peculiar.
As vias de comunicação com a séde são reparadas anualmente por meio de turmas volantes da Prefeitura; as tributarias e carreteras, segundo os argentinos, são restauradas de modo primitivo e tosco pelos particulares que se organizam em verdadeiros mutirões, ou ajuntamentos colectivos para esse mister; um simples aviso da municipalidade, contendo a nomeação de inspector de caminho, delega a determinado proprietário, ou sitiante, poderes para intimar os moradores da redondeza, interessados no concerto dos caminhos que palmilham; outras vezes, á míngua do interesse público, reúnem-se espontaneamente e fazem eles mesmos esse laborioso serviço de restauração viatória.
Estradas existem que, ímpe1idas por cercados, benfeitorias, córregos e outros obstáculos de monta, desviam seu itinerário, dilatando as distancias; alguém mais afoito abre ligeira picada, ou trilha um atalho próprio e com a frequência de pedestres e cavaleiros e mais tarde de carros, transmuda-se em rodal; ano e dia, decorridos desse trânsito comprovado, adquire foros de existência legal, não podendo mais ser fechada, ou interceptada por quem quer que seja, segundo o direito comum. Resulta dai a ogerisa dos
proprietários de terras em permitir passagem eventual sobre suas posses, receiosos de que a mesma se torne em servidão permanente.
A estrada é um dos maiores agentes modificadores da paisagem, humanizando-a e, conforme Pierre Mombeig, mais do que a água decide da estructura agrária; toda a vida dos povos gravita em torno das grandes estradas, afirma Edmundo Desmoulins; ao longo de suas margens e dos caminhos que a põe em comunicação com os sítios e fazendas de gado e de plantação, estabelecem os colonos, meeiros, empreiteiros, camaradas e patrões, pequenos e grandes proprietários suas relações regulares, não só entre si, como, também, com o centro urbano mais próximo; erguem-se, nas cercanias, ranchos acolhedores e casas de pau á pique, hospedagem transitória e permanente do trabalhador e do peão; desbravam-se as florestas e desnudam-se paulatinamente, os socalcos dos espigões e das lombadas vertentes, e logo, fileiras de milhares pés de café alinham-se em todos os quadrantes; repontam os mangueiros, currais, potreiros e piquetes ao redor das moradias e mais tarde surgem as grandes invernadas onde vicejam o jaraguá, o gordura, o catingueiro roxo, o colonião e outras gramíneas formadas pelo esforço humano e pelo casco das próprias rezas; culturas diversas acolhem-se á sua proximidade, na certeza de que o cereal colhido alcançará preços compensadores que a facilidade de transportes condiciona; com o transcurso do tempo, melhoram-se os prédios e até o gênero de vida de seus habitantes; casas de fazenda, de amplas janelas e varandas, ostentam estilos mais corrigidos e as próprias colônias, fileiras de casas de um só tipo,tornam-se melhor habitadas, feitas de tijolos, caiadas e cobertas de telhas vá. A permuta de valores e condições leva á movimentação de capitais; nascem daí os aglomerados urbanos - arraiais, patrimônios, vilas e capela, “tudo é função da via de transporte" (E. Simões de Paula). E Tanabi não escapou a essa regra niveladora, porquanto, seu berço foi assente á margem da velha estrada do Taboado, onde, em 1.901, Euclides da Cunha sonhou vê-la construída, norte fito em Cuiabá, imitando, ainda de longe, as famosas estradas romanas e cartaginezas de antanho.
            Servindo-se dessas veredas de comunicação, por onde se estreitam afectos e interesses, labora aqui uma população de mais ou menos vinte mil almas, fusionando diferentes etnias provindas, de todos os recantos europeus e até asiáticos, espanhoes e portugueses, alemães e italianos, turcos e japoneses, plasmando o homem tanabiense que levará esta terra a grandes destinos, e, para retrospecto destas afirmativas, concluímos, transcrevendo o que disse nosso delicado poeta Mello Macedo, em seu esplendido poema.

“MELTING- POT”

O italianinho rubicundo,
no colo da mãe de ancas fecundas,
bate palmas para a terra virgem do sertão paulista

Um cheiro acre de pau d'alho
infla narinas espertas
a farejar padrões de terra boa.

E a jardineira,
roncando nos aclives,
sacoleja a estranha carga
de raças heterogêneas.

Ó a doce democracia
dessas pequenas populações flutuantes
de grileiros, de mascates, de imigrantes,
que sonham uma nova pátria
sem os problemas inquietantes
dos seus países de origem!

Como aí se fraternizam,
na mais suave promiscuidade,
o braço à procura de trabalho
e a ambição ardente do jovem profissional,

que abandonou todos os princípios da ética
na plataforma da última estação ferroviária!

Há imperialismos velados
no olhar miúdo de japoneses risonhos,
que se acotovelam com caboclos displicentes,
anônimos heróis da grande penetração.




À algaravia dos passageiros se mistura
a nacional tagarelice do chofer,
que, no seu idílio com a espanholita,
que lhe vai ao lado,
deixa que a viatura se requebre,
a remexer a estranha carga de raças heterogêneas,
em busca da Terra de Todos...

E a jardineira é um imenso caldeirão ambulante,
aquecendo-se ao sol dos trópicos,
e de onde vai saltar,
fundido no milagre da América,
o “homem-cósmico" de amanhã!

                                                                                                        Tanabi, 24 de abril de 1938.


                                                                                       * Para o Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo.

  
As Novas Divisas do Município.

            Não fosse o particular que devotamos a este rincão e não estaríamos aqui, de novo, a bater esta enfadonha tecla – a questão das novas divisas tanabienses. Receamos até incorrer no desagrado de nossos possíveis leitores, mas, tratando-se, como se trata, de assunto vital para os jurisdicionados aos limites recém estabelecidos, justificando está de sobejo nosso retorno ao tema ventilado.
            Em nossos escritos anteriores, benevolente acolhidos pela imprensa regional, ao mesmo tempo que nos manifestamos de perfeito acordo quanto á justiça na integração dos territórios latifundiários – Ponte Pensa e Araras – ao novel município de Pereira Barreto, outrora Novo Oriente, ai, também opomos formal objeção quanto á pretendida anexação da pequena área de terrenos pastoris confinada entre o rio São José, a Boiadeira e os córregos Fortaleza e Soledade, área essa que recente publicação oficial vem novamente incorporar a administração tanabiense, de quem sempre foi subsidiária.
               É isso o que consta da edição do “Diário Oficial” de 13 de janeiro, retificando alguns senões continentes no decreto 9775, de 30 de novembro do ano findo, o qual trás em seu bojo o quadro geral da divisão territorial paulista.
            Dissemos alguns senões, porque, como é óbvio de ver-se, nem todas as incorreções foram aí totalmente expurgadas, referindo-nos ás que nos dizem respeito, porquanto, si as divisas com os municípios de Monte Aprazível, Paulo de Faria (ex Patos), Nova Granada, Palestina e Pereira Barreto estão satisfatoriamente delimitadas, o mesmo já não sucede em relação a determinado trecho das fronteiras mirassolenses e com as divisas inter distritais, como a seu turno vamos apontar.
            A divergência encontrada na parte referente a Mirassol cinge-se exclusivamente á localização exata do córrego da divisa, dado que este, não só é omisso nos mapas que perlustramos, como, também, a tradição popular não o acusa, ainda que tivéssemos inquirido diversos moradores das circunvizianças.
            Isso posto, passemos a descrever as extremas divisórias com aquele próspero município: “Começam no rio Preto, onde se lança o ribeirão Jataí, sobem por este a barra do córrego da Divisa, sobem por este até sua cabeceira e continuam pelo espigão que deixa, á direita, as águas do ribeirão Jataí, e, á esquerda, as do Balsamo, até frontear a cabeceira do córrego Água Fria, já no espigão mestre as águas dos rios Turvo e rico São José dos Dourados”. Ora, em face do estatuído nesse período, originaram-se os mais desencontrados comentários quanto á precisa situação do mencionado córrego da Divisa, havendo, mesmo, pessoas e até autoridades do município limítrofe que aventuram a hipótese de aplicar-se denominação tal ao conhecido córrego Perobas, passando, ipso-facto a importante fazenda de igual nome a gravitar em torno á esfera administrativa de Mirassol!
            Não estamos de acordo com esse modo de interpretar o texto decretado e discreparmos, tendo por base os seguintes ponderosos motivos: a) o córrego da Divisa, afluindo ao Jataí serve de liame lindeiro entre este e o divortium-aquarium Jataí – Balsamo por onde sempre passaram as demarcações municipais; b) o Perobas, que tem sua designação assente desde as primitivas penetrações dos pioneiros tanabienses, recebeu esse nome em virtude da predominação, em seu vale, entre essências várias, da procura Aspidosperma Gomesianum e, além disso, afluente do Jataí, está compreendido no sistema das águas vertentes deste ribeirão onde desemboca a menos de três quilômetros de Tanabi, e não poderia portanto, servir de eixo divisório invocando-se o espírito do mesmo decreto, o qual veda o estabelecimento de fronteiras num raio mínimo de seis quilômetros; c) existem, nas cercanias da fazenda “Recreio”, nada menos de quatro pequenos córregos, contribuintes da margem direita do Jataí, sem designação própria, podendo-se aplicar, a qualquer deles, a toponia Divisa, para expressar com propriedade a função que essa correnteza parra a exercer entre os dois municípios; injustiça será remeter denominação tal a qualquer caudatário do Jataí, de nomes já definidos como o Barreiro, o Alegria, o Perobas etc.
            Pondo de parte essas questiúnculas, mister se torna volvermos nossa atenção para a linha perimétrica dos distritos e, reportando-nos ás divisas entre Tanabi e Cosmorama, copiemos, aqui, na íntegra, o relato do decreto: “Começam no rio São José dos Dourados, na foz do córrego da Soledade, vão pelo córrego acima até o espigão mestre são José dos Dourados – Preto, pelo qual caminham até frontear a cabeceira do córrego do Coelho, descem por este até o ribeirão da Piedade”. Cabem aqui algumas ponderações que externamos, baseados no conhecimento das correntes líquidas citadas, no tópico em questão: traçando-se a linha divisória do córrego Soledade ao Coelho que, indubitavelmente, é componente do Piedade, todo o distrito e a própria vila de Cosmorama perderá sua autonomia judiciária passando a pertencer ao distrito da sede, a menos que aquele tivesse sido suprimido pelo decreto 9775, o que, felizmente, não se deu; esta, pois, retificar essa mesma linha repondo-a, aquém daquela povoação, no círculo legal de uma légua brasileira, pelo menos, e isso poderá ser feito tendo em vista o que dispõe o art. 2º do mesmo decreto.
            A seguir, as divisas entre Cosmorama e Vila Monteiro situam-se da seguinte forma: “Começam no espigão mestre Grande – São José dos Dourados, em frente á cabeceira do ribeirão do Maribondo, seguem pelo espigão mestre até a cabeceira do córrego Prata”. Refletindo sobre essas confrontações e, tendo em vista que a divisa com o distrito da sede (Tanabi), passa pelo veio do Soledade, forçoso é concluir que o distrito de Cosmorama deverá estar constringindo entre o rio São José dos Dourados, o espigão mestre e os córregos Soledade e Maribondo, á apreciável distância da respectiva sede, deslocando, portanto, do habitat que por força de direito lhe compete. De qualquer forma que o encaremos, o distrito de Cosmorama tem seu território disputado pelos vizinhos eis que às novas divisas de Américo de Campos consigo tem a seguinte redação: “Começam no ribeirão da Piedade, na foz do córrego do Coelho, sobem primeiro até a barra do córrego do Meio, continuam pelo divisor que deixa, á direita, as águas do ribeirão Piedade, e, á esquerda, as do córrego do Meio, até frontear a cabeceira mais oriental do córrego do Retiro, pelo qual descem até o ribeirão Tangará, seguem por este acima até a foz do córrego Prata e por este ainda até sua cabeceira mais ocidental”. Com referência a estas divisas temos a refutar o seguinte: a menos que se a denominação de Meio a qualquer uma das cabeceiras do Piedade não se poderá conceber o vertiginoso salto que é preciso das para transpor a distância que separa os cursos de água Piedade e Córrego do Meio, porquanto este último forma, com o Retiro o ribeirão Bonito em plena fazenda Nova, e muito aquém de Cosmorama; o Tangará é nome desconhecido e, portanto, difícil de ser identificado, mas, pelo que se deduz da mesma redação é ele tributário do Prata, pelo qual as divisas sobem até sua cabeceira principal.
            Américo de Campos e Vila Monteiro tem por limites as seguintes linhas: começam no espigão divisor que deixa, á direita, as águas do rio Preto, e, á esquerda, as do rio São José dos Dourados, em frente á cabeceira mais ocidental do córrego Prata, seguem pelo espigão da margem esquerda do ribeirão Tangará, até alcançar a cabeceira do córrego Betari e por este abaixo até o rio Turvo”. Mas, como acima foi dito, si o tangará pertence, como tributário, á vertente do Preta, como poderiam as divisas entre estes distritos seguir pelo espigão da margem esquerda do referido Tangará, uma vez que o mesmo corre em sentido oposto á direção que tais divisas devem tomar, isto é, em direção á embocadura do Turvo no rio Grande? Além disso, ninguém nunca jamais ouviu falar em córrego Tafari em toda a região municipal.
            Entretanto, para não alongarmos em demasia esta série de considerações vamos concluir, frisando, mais uma vez, a necessidade e urgência na definitiva retificação das nossas divisas internas e isso, pensamos, somente poderá ser obtido com a vinda a este município de engenheiro componente da comissão que elaborou as citadas linhas divisórias, o qual, tendo em vista ás condições histórico – sociais, natureza e conformação do solo, situação e dependência das sedes distritais, trace, de vez, divisas naturais, lógicas e definidas, como remate ao charivari existente.

                                                                                          Tanabi, 21 de janeiro de 1939.


 ·         Publicado no jornal “A Notícia”, de Rio Preto, em 05 de fevereiro de 1939.



Toponímia Fluvial Tanabiense

Do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo.


            A carta hidrográfica do município de Tanabi, a nominata de suas correntes líquidas,  desde os maiores rios que sulcam o continente americano, encabeçado pelo volumoso coletor do planalto - o Paraná, semelhante ao mar - até os minguados filetes de água que desaparecem na estação estival, formando tudo isso um aranhol potamográfico digno, não deste ensaio, mas de acurado estudo, sobre atraírem nossa atenção, levam-nos a desenvolver  conceitos e a consignar, de passagem, paralelos e grupamentos adrede estabelecidos, sem outro intuito que documentar os nossos fastos regionais.
            Circunscrição de mais largo domínio territorial, entre as que compõem o curioso mosaico paulista, Tanabi tem a assinalar-lhe os contornos externos não marcos convencionais de madeira e de pedra, efêmeros e perecíveis na marcha impiedosa do tempo, mas, sim, o caminho sinuoso de seus coleantes rios lindeiros, tornando-o, por assim dizer, típica e essencialmente mediterrâneo, embora submeta-o a um regime de isolamento forçado com a vizinhança municipal, dada a relativa ausência de pontes e outros meios de comunicação. Somente a breve trecho, que não vai além de trinta quilômetros, distância que separa a foz do Jataí das cabeceiras do córrego da Grama, só aí, nesse acanhado trato de terras, perlongam as raias limítrofes pelas cumiadas do espigão mestre, portanto em terra firme. Pelos demais pontos, a linha perimétrica acompanha o talvegue de três importantes caudais e seus mais antigos afluentes dando-lhe características nítidas e perenes. Assim, o São José dos Dourados e seus tributários da margem direita o Fortaleza e o Grama separam-no de Monte Aprazível onde, há mais de um decênio, se acha instalada a sede comarcal; o Turvo, por si e por intermédio de seus concurrentes esquerdos, o Preto e o Jataí, define-lhe a jurisdição com Paulo de Faria, Palestina e Nova Granada, respectivamente, três jovens prefeituras, dentre as quais, a última, já obteve sua alforria judiciária; aos fundos, a muralha branca do conjunto Grande-Paraná, cujas águas correm ligeiras com pressa de chegar, situa-lhe as divisórias com Minas e Mato Grosso, os colossos do centro brasileiro.
            Estamos, pois, em face de divisas ideais, in natura, tal qual preconizava o erudito geógrafo Gaulês Eliseu Reclus, ao estudar a gênese das divisões políticas dos estados e municípios, contrapondo-o às formações artificiais e forçadas.
            Ultimamente, porém, pelo novo quadro territorial da República, perdeu Tanabi alentada faixa de terras em benefício de seu congênere Pereira Barreto, sediado, com propósitos de louvável brasilidade, no populoso quisto amarelo batizado por novo Oriente. Essas terras, situadas na junção das bacias Paraná – Dourados, formam a quase totalidade das imensas glebas latifundiárias conhecidas por Araras e Ponte Pensa e abrangem centenas de mil alqueires, torrão feracíssimo e inexplorado, futuro celeiro da zona Araraquarense, na atualidade e sem nenhum favor, o maior centro produtor do Estado.
            As novas divisas traçadas orientam-se águas acima do ribeirão Maribondo até sua cabeceira, ganham o divortium aquarium dos rios Grande – São José e vão em demanda das cabeceiras do ribeirão da Lagôa Sêca pelo qual descem até o rio Grande, a meia distância entre a Cachoeira dos Índios e a confluência do Paranaíba.
            Mas, não temos a intenção de bordar comentários acerca deste momentoso assunto, por nós já ventilado em outros escritos. Animamos, tão só e exclusivamente, tecer ligeiros e despretensiosos confrontos referentes às denominações ribeirinhas, aos rios e riachos, arroios, córregos, regatos e nascentes, de curso normal ou transitório, no vasto hinterland tanabiense que, embora seccionado pela recente divisão, de que nós ocupamos, comporta ainda área não inferior a dez mil quilômetros quadrados, o que lhe confere primazia no cômputo de superfície entre os duzentos e setenta municípios de São Paulo.
            Os rios exercem marcada influência no comportamento humano. É para gozar das vantagens destes caminhos naturais e de fácil acesso que o povoamento procura, no início, de preferência e quase exclusivamente, a margem dos rios, escreve Caio Prado Junior. Além de excelente campo de alimentação pela pesca e pela água, indispensável á vida, servem de meios de comunicação, e, por isso, junto deles, se aglomeram os homens. A civilização egípcia desenvolveu-se toda ela próximo aos deltas e no vale do famoso Nilo e, para usarmos “prata de casa” diremos que os rios foram aliados do brasileiro na penetração do país, as bandeiras e monções, aproveitando o fenômeno de que os nossos rios interiores correm, não para o mar, mas para o sertão, em suas entradas seguiram as trilhas indígenas e as fluviais e os primeiros estabelecimentos foram fundados à sua jusante e montante.
            Os pioneiros e sertanistas destes rincões, violaram a selva municipal, há mais de uma centúria, indiretamente, pelas vertentes do Turvo e do Grande, vindos da Farinha Pôdre, a hodierna Uberaba, ou do incipiente arraial dos Trinta Fogos, atual cidade de Parnaíba e, de modo direto, através os campos vicinais dos córregos e ribeirões com passagem pelas cercanias da vetusta São José do Rio Preto. Construíram elos (no que foram imitados pelos demais que se lhe seguiam), bem rente aos cursos de água e com a fachada voltada para estes, suas primitivas cabanas de pau-a-pique, toscos ranchos de madeira cobertos de folha de coqueiro, cavacos de árvores, capim e sapé, reminiscências dos romanos e dos sarracenos, conforme opina Gilberto Freire; aí fazem e até hoje fazem, profusa criação de gado de espécies várias, encurralados em fechos e cercados, ou mais à larga em potreiros e invernadas, tendo por base, ao fundo, a aguada indispensável; aí se instalaram as dependências da habitação rural, currais e cocheiras, casinha de despejo, paióis, chiqueiros, hortas e demais edificações agropecuárias, todos os marcos da chamada “civilização caipira” de que nos fala João Carlos Fairbanks, sobre a Alta Sorocabana. O monjolo, o moinho de fubá e a roda de água exerceram e exercem privilegiada atuação na economia rural sertaneja.
            Só mais tarde, com o adensamento da população, constituída, em parte, de elementos alienígenas, portadores de novos costumes, é que o roceiro, por antonomásia “beira – córgo”, em virtude de seus hábitos arraigados, resolveu edificar sua moradia em terras mais altas, a regular distância da correnteza, quer em fileiras ou “colônias”, quer isoladas em “retiros” e “fazendas”, sinônimo de casa grande, passando a dar aos animais domésticos, água extraída de cacimbas e cisternas posta em grandes cochos de madeira à sombra de copadas árvores. Só assim foi possível condensar o povoamento nos tabuleiros enxutos e pelas lombadas distantes da linfa cristalina.
            Das denominações de um riacho, de um manancial mais ou menos importante, vem, muitas vezes, os nomes dos bairros e das localidades que daí surgem. Todos os nossos núcleos de população, sem exceção de um só, tornaram-se conhecidos pelos nomes dos córregos onde se localizam: o Mangue, o Peróbas, o Malhador, o Grama, o Alegria e tantos outros todos eles são servidos por pequenas águas de quem herdam seu nominativo próprio. A maior parte das povoações do município: Américo de Campos, Vila Monteiro, Piassava, Vila Cardoso, Vila Nova, Boa Vista, Tanabi mesmo situam-se a cavaleiro de ribeirões mais ou menos pandos, ao passo que Cosmorama, Vila Gestal, Brasilândia, Votuporanga, Vila Pereira, Ibiporanga etc., chantaram-se mais ao alto, em aclives bem feitos, ainda que não mui distantes do líquido precioso.
            Releva notar que os modernos “plantadores de cidade” preocupam-se com a excelência climática, com a topografia, o panorama e outros fatores não menos desprezíveis, meios e facilidades de comunicações, eqüidistância de outros centros, terras propícias, ás lides agricultoras e pastoris etc...
            Tanabi o simpático topônimo que, por ocasião da criação do distrito de paz, nos últimos dias de 1906, substituiu sua anterior denominação Jataí, então singelo aglomerado de casas rudimentares em torno ao velho largo, ponto de reunião de boiadeiros e peões, pouso forçado de tropas e boiadas em constantes idas e venidas a Mato Grosso, esse mesmo sonoro vocábulo, tonado, à encantadora língua ameríndia, significa, nada mais nada menos que “rio das borboletas”, a exemplo de Tatuí, rio dos tatus, Piraí, rio do peixe, conforme ensina Plínio Ayrosa, ilustrado tupinólogo bandeirante, em que pese definição contrária de “madeira adstringente que aperta”, homenagem, talvez, à sua flora arbustiva rica em tanino.
            Dessarte, seu próprio nome acha-se vinculado ao elemento líquido. Fundada que foi nossa urbs na foz do Jataí (Hymenae courbaril), árvore de fruto duro ou Jatobá e do Bacuri (Slatonia insignis, Mart.), palmeira de elegante porte – encontra-se, não obstante esse fato, assente em magnífica lombada e cresce, como a civilização, rumo ao oeste e em direitura ao traçado da ferrovia que ora demanda o sertão, prolongando seus trilhos até Presidente Vargas, ex Porto do Taboado.
            Os grandes imóveis rústicos, lembrando as sesmarias do período colonial, receberam, outrossim, os nomes dos córregos e ribeirões que banham suas terras; definindo seu perímetro pela divisão judicial, são as grandes, fazendas devidamente registradas im primo loco. Acontece, porém, haver invasão de área e um imóvel absorver outro já inscrito e, muitas vezes, nomes distintos são aplicados à mesma propriedade comum, por quem quer que tenha interesse em criar confusão e arrebanhar alheios direitos, dando, assim, origem aos famigerados “grilos” que infestam as zonas novas e que se tornam espantalhos dos adquirentes de boa fé, más paraíso dos espertalhões que deles aurem pingues lucros.
            Fazendas há, bastante dilatadas, que se tornam conhecidas por uma e mais toponímias variantes: “Marinheiro”, “Barra das Pedras” e “Anhumas”; “Cachoeira dos Tomazes” ou “Macaúbas” com seu aposto “Pinheiros”; “Água Vermelha” também designada “Queirozes”; a fazenda “Nova” que tem por alcunha “Ribeirão Bonito”; “Viradouro” sub nomeada “Espraiado”; “Pádua Diniz” que atende pelos nomes de “Cervo”, “Aparecida” e outros, deixando de mencionar, propositalmente, as hipotéticas “Corredeira Grande”, “Buriti”, “São Martinho”, “Alegria”, “Ribeirão dos Vianas”, e outras que a fantasia humana registra. Assim, numa simbiose perfeita, as fazendas Jataí, Perobas, Fortaleza, Nova, Prata, Piedade, Barra Mansa, Cachoeira dos Felícios, Água Vermelha, Santa Rita, Araras, Marinheiro, Águas Paradas, Guariroba, Viradouro, São João e São Pedro, Jagóra, Ranchão, Barrinha, Carrilho, Ponte Pensa, Pádua Diniz, Cachoeira dos Tomazes todas elas receberam seus topônimos idênticos aos dos córregos que sulcam e transitam nesses sítios. Desses nomes, uns memoram antigos posseiros e habitantes da redondeza, outros nomes de santos tirados do hagiológico cristão, cores do prisma, benfeitorias humanas, símbolos dos reinos naturais, um acontecimento qualquer, em suma: variação, diversidade, memória.
            E, para encerrar estas sensaboronas nótulas, recolhidas a esmo, vamos tentar grupar em classes os nomes dos nossos “ caminhos que andam”, na feliz expressão de Palcal:
            Antroponímicos -  Boaventura, Antônio Bento, Cabeceira do Pio Néco, Fachina, Cabeceira do Adolfo, João Caetano, Constantino, Prudêncio, Pádua Sales, Pelágio, Botêlhos, Adolfo Silvério, Pompeu, Inocêncio, Chico Gabriel, José Antônio, Pádua Diniz, Manuel, Egídio, J. Costa, Juca Barão, David, Juvêncio, Carneiro, José Leopoldino, Lino Alves, Honório, Nelson, Geraldo, Queirozes, Bernardo, João Clemente, Isáaque, Caio, Lúcio, Araújo,
            Agricultura – Roça, Capoeira, Quiçássa, Mata.
            Construções civis – Ponte Pensa, Ranchão, Tapera, Cambão, Monjólo, Giráu, Carrinho, Estiva, Moinho, Cocho, Abarracamento, Pulador.
            Flora – Mandioca, Carandiúva, Buriti, Perobas, Angola, Capituva, Pimenta, Jataí, Cana do reino, Herva Danta, Feijão Queimado, Sapé, Marinheiro, Grama, Aroeira, Cedro, Coqueiro, Cambaúva, Macaúbas, Coqueiral, Piassava, Arroz, Paineiras, Guariroba, Açoita Cavalo, Limoeiro, Taquari, Bacuri, Goiaba, Capim.
            Fauna – Veado, Nutum, Queixada, Cérvo, Anta, Onça, Jacu, Sucuri, Jaguar, Irara, Tapir, Tatu, Garças, Capivara, Cavalinho, Perua, Maribondo, Sapo, Notuca, Jaú, |Itaguaba, Sapinho, Taiassú, Anhumas, Jagóra, Cancan, Abelha, Tangará, Jacutinga, Corvo, Cotia, Araras.
            Configuração do terreno – Rochedo, meio, Espraiado, Sumidouro, Corredeira, Divisa, Esgoto Grande, Varginha, fundo, Vertente Comprida, Estreito, Pontal, Lagoa Seca, Resfriado, Varjão, Chapadão Comprido, Barra Mansa, Cacimba.
            Caminhos e natureza do solo – Barreiro, Pedras, Barro Preto, Cabeceira da Estrada, Arrancado, Cabeceira das Minas, prata, Lageado, Barreirinho, Mangue, Água Parada, Água Quente, Água Fria, Água Limpa, Água Suja.
            Sentimentos humanos, estados de alma – Cachoeira Feia, Confusão, Fortaleza, Boa Vista, Alegria, Retiro, Cariri, Tristeza, Soledade, Suspiro, Piedade, Engano, Perdido, Duvida, Bonito, Formoso.
            Mitológico – Cachoeira da Sereia.
            De religião – São Pedro, São João, São Domingos, Santo Antônio, São Martinho, Santa Rita, Santana, São José, São Roberto.
            Cores do prisma – Água Vermelha, Turvo, Preto, Anil, Água Amarela, Cachoeira Dourada.
            Diversos – Três Irmãos, Quebra Cocão, Coivara, Lingüiça, Quebra Carros, Malhador, Tupi.

                                                                                  
  Tanabi, 06 de janeiro de 1940.




Distrito Policial de Tanabi


                     Em 1902, é que foi criado o distrito policial conforme se vê do termo de audiência inicial lavrado a 12 de julho daquele ano: “Aos dôse dias do mez de Julho de mil novecentos e dois neste districto Policial da Capella do Jatahy município de São José do Rio Preto comarca de Jabuticabal Estado de São Paulo em casa de rezidencia do Cidadão João Baptista de Lima ahi presente ao Cidadão João Baptista de Lima Sub-Delegado de Policia em exercicio commigo escrivão em Bonca por não haver Official de Justiça. Não havendo ninguem a requerer foi dicto pelo Subdelegado que suas audiencias ficavão marcadas todos os sabbados, quando friado este dia ficava transferida para o primeiro dia util immidiacto e que o escrivão lavra-se os competentes edictaes, avizando ao publico da rezulução acima vem como á casa das audiencias será na sua propria rezidencia. Eu, Daniel da Cunha Moraes, Escrivão da Policia o escrevi – Lima”.


Distrito de Paz

                     Em menos de um lustro, o povoado tomava o impulso com a construção, pelo povo, de uma igrejola em estilo colonial (atualmente demolida) e prédio para cadeia em dois pavimentos. Assim, atendendo ao desejo dos moradores criou o governo do Estado o distrito de paz de Tanabi, nome pelo qual fora substituída a antiga denominação e dentro das seguintes divisas: “Começando nas cabeceiras do córrego do Bálsamo, por este abaixo até o Rio Preto, daí a rumo direito até o Rio Turvo, e por este abaixo o rio Grande, por este abaixo até a barra do São José dos Dourados, por este acima tudo quanto verte, até a barra do córrego do Tatu ou Ipê, daí em rumo direito à cabeceira do Bálsamo onde tiveram princípio”.
            Mas a sua instalação teve lugar somente no ano seguinte nos termos da ata que para aqui transcrevemos: “Acta da instalação do Distrito de Paz de Tanaby – Aos nove dias do mez de Janeiro de mil novecentos e sete, nesta Povoação de Tanaby, sede do districto do mesmo nome, comarca de Rio Preto, na sala superior da Cadêa, presentes, as dez horas do dia, os Cidadãos Capitães José Alves de Magalhães e Bernardino Mendes de Seixas, primeiro e terceiro Juizes de Paz, e os Senhores: Coronel Adolpho Guimarães Corrêa, representando a Câmara Municipal, Capitão Luiz Francisco da Silva, representando o Jornal “O Porvir”; José Pimenta Bemfica e Manoel Leão, representando os empregados da Câmara Municipal; José de Assis Pereira Silva, Collector Estadoal, e outros que vão ao fim assignadas, commigo Nicolau Lerro, Escrivão de paz interino, assumiu a presidencia o primeiro nomeado. Em seguida depois de declarada aberta a sessão, disse que tendo sido creado pelo governo do Estado por decreto n. 992 do anno passado este Districto de Paz de Tanaby, haviam sido eleitos Juizes de Paz os Senhores José Alves de Magalhães, Polinice Celeri e Bernardino Mendes de Seixas por eleição designada e realizada no dia dezesseis de Dezembro proximo passado; que tendo sido os mesmos Juizes à excepção do segundo empossados dos cargos em data de ante-hontem perante o doutor Juiz de Direito da Comarca, vinha declarar para isso instalado para todos os effeitos legaes o Districto de Paz de Tanaby, e por isso se congratulava com todos os habitantes do districto pelo importante melhoramento, beneficio intraduzível que vinha firmar a sua prosperidade. Pelo Coronel Adolpho Guimarães Corrêa foi proferido algumas palavras relativo ao acto. Em seguida o Snr. Manoel tambem proferiu algumas palavras e o Snr. Alarico Lex. Nada mais havendo a tratar foi levantada a sessão depois de lavrada, lida e assignada a presente acta por todas as pessoas presentes. Eu, Nicolau Lerro, Escrivão de Paz int.o, o escrevi e assigno. (a.a.) José Alves de Magalhães – Bernardino Mendes de Seixas – Adolpho Guimarães Corrêa – Luiz Franco da Silva – Manoel Leão – José Pimenta Bemfica – José de Assis Pereira Silva – Alarico Lex – Cornélio Alves de Magalhães – Antonio Funchal – João Evangelista de Castro – (assinatura ilegivel) – Felipe Wasser – Emygdio Alves de Menezes – João do Amaral Filho – Donato Martinez Portela – Belarzzo Ludovico – Augusto Corrêa – João Barbosa do Amaral – Amaro Rodrigues Carneiro – Antonio B. Costa – Leonildo Bataglia – Nicolau Lèrro”.


O Município

            Instalado o juizado de paz maior foi o incremento tomado no desenvolvimento da vila, aqui se localizando numerosas famílias entre as quais ás dos coronéis João Alves Monteiro e Militão Alves Monteiro, ente ultimo, mais tarde, chefe político de fama regional. Instalam-se as primeiras lavouras cafeeiras secundadas pela abertura de grandes fazendas pastoris e o bovino torna-se base de sua economia e, pela lei 2.009, de 23 de dezembro de 1924 é elevada a foros de cidade inaugurando-se o município com grandes festas no ano imediato conforme se vê no documento seguinte: “Ata da Instalação do município de Tanaby – As 12 (dose) horas do mez de março, no dia 13 do mesmo mez do ano de 1925, Nesta cidade de Tanaby, no edificio destinado ás sessões da Camara Municipal, á rua Coronel Joaquim da Cunha Junqueira, reunidos aí os vereadores eleitos e diplomados e reconhecidos cidadãos: Cel. Militão Alves Monteiro, Marcílio Cesário de Magalhães, Veríssimo Ferreira Julio, Augusto Manoel Elias Abufares, Manoel Pereira Leal, e José Flavio de Moraes Sobrinho, sob a presidencia do Meritissimo Juiz de Direito da Comarca de Rio Preto, Dr. João Elias da Cruz Martins, abriu-se a sessão solemme da instalação do municipio de Tanaby, pertencente à referida Comarca. O Dr. Presidente, em breve, mas eloqüente alocução, congratulou-se com os habitantes desta cidade, pela justa aspiração que é a creação do municipio, que ora se instala, e, com o Governo do Estado, por esse auspicioso acontecimento. Dando o compromisso aos vereadores eleitos, convidou para secretário da reunião, o vereador José Flavio de Moraes Sobrinho, ordenando em seguida ao escrivão do Jury e do Juízo da Comarca, que lavrasse o termo de compromisso de vereadores, sendo por todos assignado. Declarando o Dr. Presidente que poderiam usar da palavra que o desejasse, levantou-se o vereador Augusto Manoel Abufares que agradecendo congratulo-se com o povo desta terra pela realização do seu desejo, prometendo que ele e seus companheiros cumpririam com zelo e patriotismo, seus deveres de vereador. Em seguida usou da palavra o advogado Dionizio José dos Santos Filho que dirigiu vibrante saudação ao Cel. Militão Alves Monteiro, aos membros do Directorio, vereadores eleitos, não somente em seu nome, com tambem em nome do Cel. Fabiano Barreto. Falou em seguida o Reverendo Pe. Agostinho dos Santos Pereira que em entusiasticas palavras dirigiu saudação ao referido chefe politico, vereadores, membros do Directorio e ao povo desta terra. Fez em seguida, vibrante oração, em nome da classe operaria, o Sr. Oscar Rufino. Depois foi proferido eloqüente discurso de saudação ao chefe político desta localidade e vereadores eleitos, pelo advogado Adaucto do Amaral, em nome proprio e em nome do Capitão Augusto de Almeida e do povo de Severinia. Falou em seguida o Dr. Abelardo de Oliveira congratulando-se com o chefe politico, vereadores, membro do Directorio e com o povo desta terra pela instalação do municipio. Pelo Juiz de Direito foi declarado que tendo compromissado os vereadores, estava instalado o município, pelo que se regosijava e declarava encerrada a sessão de que vai lavrada a presente ata por mim secretario escolhido que a assigno, bem como Dr. Juiz de Direito, todos os vereadores e pessoas presentes á este acto. (a.a.) João Elias da Cruz Martins - Militão Alves Monteiro – Marcilio Cesário de Magalhães – Veríssimo Ferreira Julio – Augusto Manoel Elias Abufares – Manoel Pereira Leal – Jose Flavio de Moraes Sobrinho – Joaquim Pinto da Costa – Antonio Fidelis – Oscar Pires – Arlindo Faria – Rufino Rodrigues Barbosa – Nestor Biazon – Aziz Maluf – Francisco Laurito.”
            Á esse tempo já havia sido criada a paróquia de Nossa Senhora da Conceição, sendo seu primeiro vigário o Pe. Agostinho dos Santos Pereira. Circulava se primeiro jornal “O Direito” dirigido por José Batista de Carvalho e funcionava o primeiro e até hoje único cinema, propriedade da Empresa Vargas. Em 1926 a cidade é iluminada a luz elétrica movida a vapor e mais tarde ligada à usina do Maribondo. Nesse mesmo ano dava-se a instalação dos distritos de paz de Monteiro e Américo de Campos.
            Foram criados, a seguir, a Coletoria Estadual – decreto 3836, de 04 de abril de 1925 – cuja receita orça atualmente em mais de mil e quinhentos contos de reis, a Delegacia de Polícia, elevada a 5º classe pela lei 2210, de 28 de novembro de 1927 e atualmente de 4º classe e, posteriormente a Coletoria Federal com renda superior a duzentos contos anuais. Data de 1922 a criação das Escolas Reunidas e sua transformação em Grupo Escolar (ainda, infelizmente sem prédio próprio) deu-se já em plena Republica Nova, graças aos esforços do político Francisco Vargas então chefe peceita.
            Surgiram ultimamente em todo o vasto território municipal novas e importantes povoações já elevadas a distrito: Cosmorama, (Lei 2659, de 09 de setembro de 1936, instalado em 30 de janeiro de 1937 e Votuporanga, 2º zona do distrito de Monteiro criada em 25 de março de 1940 e no mesmo ano instalado. Ainda recentemente, perdeu Tanabi, a favor de Pereira Barreto o grande imóvel rústico “Ponte Pensa” composto de centenas de milhares de alqueires de terras diminuindo-lhe o território. Não obstante, dispõe ainda de aproximadamente dez mil quilômetros quadrados de superfície onde labora ordeira população calculada em sessenta mil almas, das quais a décima parte habita o perímetro urbano da sede.
            Dentre as principais povoações que pontilham a hinterlândia municipal destacam-se, além das sedes distritais, as de Ibiporanga, Gestal, Cardoso, Pedranópolis, Brasilândia, Pereira, Piassava, Nova, Indianópolis, Itaporam, Jales, Boa Vista, Cachoeira dos Índios, Estrela do Oeste e outras que diariamente surgem.
            Com o prolongamento da ferrovia Araraquarense, em demanda de Porto Presidente Vargas, cujos rails tangenciam-se na sudoeste e sulcam terras do patrimônio municipal, Tanabi, por certo, estará fadado a tornar-se uma das mais movimentadas e progressistas cidades da faixa pioneira do planalto.


                                                                             Tanabi, 08 de dezembro de 1940.


Sumário para as Monografias Municipais – Tanabi.


            Posição, configuração, confrontações e limites: O município de Tanabi está situado na fronteira de Minas Gerais, confrontando-se com este Estado pelo Rio Grande; com o município de Pereira Barreto pelo córrego Ilha Seca e Ribeirão Maribondo; com o município de Monte Aprazível pelo rio São José dos Dourados e seus afluentes o Fortaleza e Grama; com o município de Mirassol pelo espigão das águas vertentes dos córregos Balsamo e Perobas e ainda com o córrego da Divisa e Ribeirão Jataí; com os municípios de Nova Granada, Palestina e Paulo de Faria pelos rios Preto e Turvo.
            A configuração geral do município é semelhante à do Estado de São Paulo.
            Divisão, superfície e população: O município está atualmente dividido em quatro distritos de paz e uma zona, a saber: o distrito da sede abrangendo a cidade e a povoação de Ibiporanga; o distrito de Monteiro dividido em duas zonas sendo a 1º com sede na referida localidade e abrangendo as povoações de Cardoso, Bela Vista, Pedranópolis, Brasilândia, Pereira, Indianópolis, Cachoeira dos Ìndios, Itaporam, Mira Estrela, e a 2º zona, recentemente criada, com sede em Votuporanga e abrangendo as povoações de Piassava, Jales, Estrela do Este e Carvalho; o distrito de Américo de Campos compreendendo a povoação de Gestal; o de Cosmorama compreendendo a povoação de Nova.
            A superfície do município é calculada em cerca de onze mil quilômetros quadrados, o que equivale dizer que é, não só o maior como ainda o que lhe vem a seguir com quase metade de sua área – Araçatuba.
            O recenseamento de 1940 colocou-o no 19º município mais povoado do Estado com 60.000 habitantes; tudo leva a crer que esse número deve oscilar entre 65.000 dada a crescente penetração de novos moradores. A população da sede deve orçar entre 4.500 a 5.000 e as dos distritos entre 350 a 550 habitantes cada.
            A sede municipal: Tanabi está assente no pontal dos córregos Jataí e Bacuri em local aprazível e saudável de ótima topografia; suas ruas são apedregulhadas, iluminadas a luz elétrica, passeios pavimentados. Possui cerca de 1.000 prédios para residência e comércio, Igreja Matriz, Hospital “São Vicente de Paulo”, Jardim Público, jornal semanário “ O Município”, coletorias Federal e Estadual, Prefeitura, Agência Postal Telegráfica, cinema “Rio Branco” com boas instalações, 2 hotéis, associações recreativas “Grêmio Recreativo e Literário”, esportivas: “Tanabi Tênis Clube”, “Tanabi Futebol Clube”, e “Tanabi Cestobol Clube”, biblioteca pública Municipal, delegacia de polícia de 4º classe, cadeia pública, cartório de paz e tabelionato com instalações que rivalizam com os melhores do Estado e diversos melhoramentos de prol.
            Aspecto e relevo do solo: o terreno em geral é pouco acidentado, achando-se as maiores elevações junto ao divisor das águas Dourados – Preto e Dourados – Grande; na fazenda “Fortaleza” o solo é mais revolto mas em geral predominam declives mansos dos espigões aos córregos e destes aos rios para onde correm. Terras secas e arenosas.
            Hidrografia: É banhado por três grandes rios que lhe marcam os contornos externos: o Dourados e seus afluentes da vertente esquerda; o Grande e seus tributários da direita; o turvo e seu galho principal o Preto; os rios interiores de maior importância são: o Jataí que banha a sede municipal; o Cachoeira, o Barra Mansa, o Fortaleza, o Prata, o Bonito, o Piedade, o Marinheiro, o Pádua Diniz, o Água Vermelha, o Santa Rita, o Águas Paradas, o Tomazão, o Espraiado, o São João, o São Pedro, o Jagora, o Açoita Cavalo, o Ranchão, o Arrancado etc... É um município quase mediterrâneo, porquanto, afora pequeno trecho de espigão na divisa de Mirassol e outro na divisa de Pereira Barreto acha-se compreendido e circunscrito por águas ribeirinhas.
            Clima: É em geral quente e seco, contudo agradável. Só nas proximidades dos grandes rios como o Dourados e Grande é que a malária predomina, sendo saudável noutros pontos.
            Riquezas naturais: Há muitas, todas, porém, inexploradas. Contudo há indícios da existência de jazidas minerais nas margens do rio Grande, tais como, petróleo, diamantes, breu, etc... Grandes quedas de água pontuam a fronteira municipal entre elas a cachoeira de São Roberto, a dos Índios, a da Quiçaça e outras. A principal exploração atual é a agrícola com extração de lenha e madeira, cascas de tanino etc.
            Lavoura e criação: o cultivo de cereais e algodão é intenso em todo o município onde centenas de milhares de alqueires de terras são plantados anualmente tornando-o um dos maiores produtores do Estado.
            A pecuária é, igualmente desenvolvida principalmente nas margens da estrada do Taboado onde uma verdadeira civilização do gado aí se desenvolve. Entre os maiores criadores contam-se os Srs. Francisco Antonio Maximiano, Eduardo Alves Ferreira e outros.
            Indústrias: Não é muito desenvolvida. Há, no entanto, máquinas de benefício de café e arroz, usinas para benefício de algodão na sede e em Cosmorama, fábricas de telhas e tijolos, de calçados, cortume, tipografia, fabricação de rapadura e álcool em pequena escala, marcenarias, carpintarias, etc...
            Comunicações e transportes: As principais vias de comunicação são constituídas de estradas de auto e de carros de boi. A principal é a que, partindo de Rio Preto serve à cidade e se dirige para Cosmorama de onde se bifurca indo um ramo para Monteiro, Cardoso e ainda Pereira e Cachoeira dos Índios; o outro ramo passa por Votuporanga e vai um galho para Pereira e outros pontos e outro galho para Piassava e galhando a Boiadeira para porto Presidente Vargas. De Tanabi saem: uma para a sede da comarca (Monte Aprazível) e outro para ibiporanga e Mirassolândia e ainda para Américo de Campos e Palestina. Centenas de caminhos vicinais recortam o município em todas as direções. O principal transporte é feito por meio de jardineiras e automóveis com intenso tráfego diário para todo o sertão. Há também o carro de bois e o cavalo que bons serviços prestam e próximo aos povoados a carroça e pequenos veículos de transporte.
            Crédito e previdência: O município não tem ainda agências sendo-lhes prometido para breve a instalação aqui do Banco do Estado; todo o seu comércio bancário é feito pela praça de Mirassol onde contribui com cerca de 90% de seu movimento. O crédito particular é feito por meio de empréstimos a juros acima da taxa legal. A caixa econômica anexa à coletoria estadual recolhe as economias dos particulares com depósitos oscilando entre 200 e 300 contos. Desenvolve-se o costume capitalizações com várias companhias operando na praça.
            Propriedade territorial: Contando mais de quatro mil propriedades territoriais o município está bem subdividido principalmente na região de Cosmorama, Votuporanga, Pedranópolis, Pereira e outras onde as grandes companhias retalharam em pequenos lotes suas propriedades agrícolas rústicas; há contudo alguns latifúndios em toda a gleba municipal alguns próximos à sede o que lhe tem retardado o desenvolvimento.
            Comércio: Cidade-chave do sertão, enfeixando vasta rede de estradas de autos e carroçáveis seu comércio é bastante ativo superior em movimento às cidades vizinhas; o comércio nos distritos, principalmente em Cosmorama e Votuporanga é bem intenso tendendo a progredir mesmo nos pontos mais afastados como Cardoso, Pereira, Monteiro etc...
            Condições nosológicas e recursos sanitários: A região é, via de regra, saudável; registram-se, no entanto, casos de malária, principalmente nas cercanias dos grandes rios limítrofes, de amarelão e bócio, motivado pela incipiente habitação do roceiro; a mortalidade infantil é bastante acentuada na zona rural pela predominância de métodos empíricos.
            Melhoramentos urbanos: Entre os principais em vias de conclusão, iniciados ou em projeto destacam-se: a reforma geral das estradas; abertura da estrada para a Estação de Engº Balduino da qual distará 7 quilômetros; muro em torno do cemitério e respectivo necrotério; construção das quadras de tênis, cestobol e futebol; ajardinamento da Praça da Bandeira; construção do prédio do grupo escolar prometida pelo governo do Estado para 1942; serviço de água e esgoto de imprescindível necessidade.
            Ensino público e particular: Deixa a muito desejar. O público, constituído por um grupo escolar com 10 classes na sede e escolas urbanas nas sedes de Cosmorama, Votuporanga, Américo de Campos, Monteiro, Cardoso, Pereira, Gestal, Ibiporanga e isoladas nas fazendas Nova, Peróbas, Cachoeira dos Felícios, Nova etc... O ensino particular é quase inexistente. Não há um só edifício público construído pelo Estado estando o Grupo Escolar a pedir rápida substituição.
            Imprensa, bibliotecas, museus, monumentos históricos e artísticos: Tem um semanário “O Município” órgão tradicional fundado há muitos anos e atualmente em nova fase sob a direção dos jornalistas Dr. Valentim Alves da Silva e o autor destas linhas com oficinas próprias à rua Carlos de Campos.
            Teatros e cinematógrafos: Na sede funciona há quinze anos o cinema “Rio Branco” de propriedade do Sr. Francisco Vargas, moderna casa de diversões com todos os requisitos necessários e freqüentados diariamente pela melhor sociedade local. Em Votuporanga foi inaugurado recentemente outro cinema de instalações modestas.
            Assistência pública e privada: como obras de assistência social há o Hospital “São Vicente de Paulo” construído pelo povo e que presta assistência gratuita e renumerada à população, com boas instalações que a coloca entre as melhores da região. Há um posto de Saúde subsidiado pela prefeitura que também atende aos doentes pobres da região.
            Criminalidades e suicídios: Há algumas décadas o município constituía forte reduto de criminosos e velhacouto de bandidos foragidos de outras partes do Estado; com a penetração de milhares de famílias e aumento da população verificado nos últimos 15 anos, com o aniquilamento da política que contribuía para esse estado anormal cessou a grande criminalidade aqui imperante; atualmente poucos casos registram os anais do crime o que se pode verificar pelo decréscimo de processos a julgar no Júri da Comarca. Também são raros os casos de suicídios.
            Associações: São poucas as associações locais. Há as associações religiosas e entre as profanas: o “Grêmio Literário e Recreativo”; o “Tanabi Futebol Clube”, os clubes de Tênis e Cestobol e nada mais.
            Religiões: Impera o catolicismo com boa matriz em construção nas sede e várias igrejas nos distritos. Existem diversos adeptos de outras religiões como o espiritismo, o protestantismo etc...
            Governo e administrações municipais: O município é governado por um prefeito, o Sr. Manuel Garcia de Oliveira nomeado em agosto de 1941 e que vem exercendo o cargo a contento. No entanto, não tem sido feliz em administrações posteriores razão pela qual a iniciativa privada tem em muito superado a pública. Nos distritos o prefeito é representado por pessoas de sua confiança, agentes municipais e fiscais.
            Finanças públicas: A renda da Prefeitura está orçada em 500:000$000 anual sendo que a arrecadação supera em muito essa cifra. O Estado arrecada anualmente dois mil contos e a União mais de duzentos e cinqüenta contos de reis.
            Política e repressão: O município é sede de delegacia de 4º classe sendo delegado atual o Dr. Francolino Machado Filho e escrivão Oscar Rufino; em todas as sedes distritais há sub-delegacias funcionado no cartório de paz respectivo; nas fazendas e bairros a autoridade é o inspetor de quarteirão. Sertão bastante remoto em alguns pontos serve de abrigo a criminosos e larápios de outros pontos do Estado motivo pelo qual a escolta de capturas periodicamente lhe visita para por cobro a essas anomalias.
            Justiça: Nas sedes distritais a Justiça é representada pelo escrivão e juiz de paz. O município pleiteia e com razão a instalação de sua comarca atendendo-se a enorme área de seu território.
            Defesa nacional: para a defesa nacional concorre anualmente com dezenas de jovens sorteados e alistados no município onde não há unidades do exército. Com o prolongamento da Araraquarense em seu território e ainda pelos numerosos portos fluviais e sua posição fronteiriça torna-se município essencialmente estratégico razão que lhe assiste de tornar-se sede futura de unidades aquarteladas do Exército onde poderão ser instalados campos de aviação civil e militar para o centro do país.
            Organização trabalhista: Não havendo indústria bastante desenvolvida seu número de operários é pequeno; copioso é seu número de trabalhadores rurais constituído de pequenos sitiantes, camaradas, arrendatários, parceiros, agregados, peões etc. O ordenado médio diário é de 6 a 10$000 isto é, com e sem alimentos.

                                                                               Tanabi, 30 de dezembro de 1941.


Tanabi e sua Toponímia

            A toponímia geográfica do município de Tanabi foi ultimamente enriquecida de: novas denominações expressivas e interessantes, umas, complicadas e estranhas outras, todas, porém, refletindo o fácies heterogêneo ruhs, operado em seu território, com a invasão sistemática de milhares de habitantes novos vindos em ondas sucessivas a tentar fortuna dadivosa faixa pioneira. Dessa penetração, em grande escala, trazendo o despovoamento a regiões mais antigas e que tem como fatores precípuos a estrada de ferra e o algodão, resultou, como conseqüência imediata, a implantação de numerosos povoados e o avigoramento de localidades existentes, todos eles, hoje, em franco progresso, alguns aspirando, já, sua autonomia, alforria de vilas e cidades, pretensão que vem esbarrar na lei qüinqüenal elaborada pelo Conselho Nacional de Geografia.
            Para designar povoações recém fundadas, escolheram os desbravadores topônimos de origem e composição vária, buscando, cada qual dessas denominações, traduzir o mais belo pensamento adequado á situação onde fundados os novos arraiais. E, a maioria desses nomes, buscam expressar a excelência das terras circunjacentes forradas de magníficos exemplares da flora, fazer a apologia trombeteante do clima e também da fauna regional e tantos outros fatores emotivos; daí a multiplicidade de termos indicando a beleza sugestiva do local onde deslizam rios de águas puras e claras e o céu é sempre benigno. Foi, talvez, por este motivo, pelo desejo inato de encarecer a paisagem que o homem sertanejo não mais denomina de Campo Triste, Cerradão e Sapato Queimado o trato de terras onde pretende erguer um povoado como outrora procediam seus avoengos.
            Outro ponto que desejamos ressaltar é para o costumeiro hábito de nomear localidades novas com dados extraídos da onomástica; assim, Pereira, Cardoso, Gestal, Jales e Parizi, abonam nossa tese por serem nomes de pessoas dados em homenagem ao dono das terras, ao chantador do cruzeiro, ao fundador do povoado embora venha incidir recente lei vedando designar povoações e vias públicas com nomes de pessoas vivas.
            Assim, dentre os topônimos que merecem mantidos, citemos: Cosmorama – panorama cinematográfico do mundo expressa bem uma das mais prósperas regiões do município; Ibiporanga – terra bonita, povoação em crescente ascese e que já aspira foros de vila; Votuporanga – terra dos bons ares, o clima bom; indica talvez beneficamente influência por seu nome, um dos mais ricos centros da interlândia municipal, sede de zona distrital desde 1940; Américo de Campos – sob o patrocínio de notável político brasileiro que já não pertence ao número dos vivos; é um dos mais antigos distritos do município tendendo a progredir; Monteiro – nome dado em homenagem ao Cel. Militão seu patrono já não ambiciona glórias e vaidades; Mira Estrela – composto em que o primeiro elemento provém do espanhol merecendo conservado por sua clareza e expressão.
            Discordamos, no entanto, nas designações das seguintes localidades: Pereira – importante núcleo improvisado em pleno sertão e que já conta cerca de 300 casas; não poderá substituir pela existência de município homônimo no Estado; Brasilândia – florescente localidade a dois quilômetros de Pereira exigindo, como corolário futuro, junção de ambas; trata-se de vocábulo arrevesado, sabendo-se que sufixo lândia é de composição estranha ao português; além disso, idênticos nomes existem nomeando localidades de outros Estados e pelo critério atual deverá ser mudado para evitar-se duplicidade; Indianópolis, Pedranópolis – duas prósperas povoações cujas denominações híbridas tem seu primeiro elemento tirado do vernáculo e o último extraído do grego; para serem mantidos deveriam tomar a forma póle de metrópole e assim grafados Indianópole, Pedranópole etc... Bela Vista – bastante expressivo mas inaplicável pelo fato de existirem centenas de correlatos pelo imenso Brasil; Cachoeira dos Índios – de signa tipicamente uma das mais lindas quedas de água do pais, jóia natural a enfeitar nossa fronteira com Minas; seu nome deriva do fato de pertencerem outrora aos silvícolas os terrenos marginais e seu único defeito reside no fato de ser denominação longa, quando a tendência é encurta-lo. 
            Eis, aí, em rápido escorço, as considerações que ousamos entreter relativamente à nomenclatura dos novos centros de povoamento do maior e menos explorado município paulista.


                                                                                      Tanabi, 14 de fevereiro de 1942.


Dicionário Geográfico do Município de Tanabi.

            Nos primeiros albores do século dezenove poucos aglomerados urbanos pontilhavam o noroeste paulista a partir de São Bento de Araraquara, Jaboticabal, Ribeirãozinho (atual Taquaritinga), São José do Rio Preto e outros surgiram muito mais tarde, assim como Espírito Santo de Barretos, São João Batista de Bebedouro, São Bom Jesus de Monte Azul e tantos mais.
             Além de Rio Preto estendia-se, impenetrável, o imenso sertão habitado por índios e feras e, como referência geográfica, havia o incipiente Jataí habitado, desde 1860, pelo tamoio Joaquim Chico e realmente fundado, em 4 de julho de 1882, pelo esforço conjugado da tríade Polenice Celeri, o “alferes”, único remanescente vivo, Leonildo Bataglia e João Barbosa do Amaral, mais conhecido por Amaralzinho.
            Com a abertura da estrada do Taboado, em 1900, teve o povoado, ligeiro sopro de progresso até que, em 1906, foi elevado a distrito de paz, instalado este ano seguinte com o nome atual: Tanabi. Prossegue lento, o dealbar do vilarejo quando em 1922, é criada a paróquia desmembrando-se de Rio Preto em 1924 para se constituir em município autônomo o qual abrange, além do distrito da sede, as circunscrições judiciárias de Monteiro (subdividida) em quatro zonas as demais Votuporanga, Brasilândia e Cardoso, Américo de Campos e Cosmorama.

A sede – Tanabi


A cidade está edificada nas proximidades da confluência dos córregos Jataí e Bacuri em magnífico chapadão de terras arenosas cobertas de cerrado; não longe do centro já se percebe melhoria na constituição do solo atestada por bons padrões vegetais de terras menos sáfaras; talvez, por esse motivo, é que se nota verdadeiro anel de população rerefeita constringindo o perímetro urbano onde escasseiam chácaras. Os terrenos da sede, encravados na fazenda Jataí, foram doados verbalmente por José Teodoro Ferreira Lemos e sua mulher confirmada, a doação, por escritura pública lavrada em 08 de março de 1907. possui, atualmente, Prefeitura Municipal instalada em prédio próprio; Coletorias Federal e Estadual onde são arrecadados milhares de contos anualmente; Caixa Econômica Estadual; Agência do Banco do Estado de São Paulo; Paróquia; Cartório de paz, registro civil e tabelionato funcionando regularmente há trinta e cinco anos; cartório do Registro Geral da sede da 2º Circunscrição judiciária da Comarca de Monte aprazível à qual pertence desde 1928. É iluminada a luz elétrica fornecida pela Usina do Maribondo; as principais ruas são revestidas de pedregulho com sarjetas e passeios de pedra e tem uma praça ajardinada. É sede de delegacia de polícia de 3º classe e tem Grupo Escolar funcionado com dezenas de classes e cemitério murado com necrotério. Grande número de estabelecimentos comerciais suprem as necessidades sertanejas e entre eles se destacam barbearias, carpintarias, máquinas de benefício de café, arroz, usina de algodão, serraria, cortume, torrefação de café sapatarias, hotéis, pensões, seis farmácias, seis médicos, seis advogados, campos de footbal, tênis, basquetebol, clubes dançantes, posto telefônico, aeroporto com magnífico hangar e biblioteca pública municipal.
            Conta, a cidade, duas praças: “24 de outubro” ajardinada e a “Praça das Bandeiras” nos fundos da Matriz e suas principais artérias são as seguintes: Rua Cel. Militão, Antonio Prado, a mais movimentada; Cel. Joaquim da Cunha, Barão do Rio Branco, Carlos de Campos, Rui Barbosa, Benjamim Constant, 7 de setembro, Marechal Floriano Peixoto, Nilo Peçanha, 9 de julho, 13 de maio, Tiradentes, 15 de novembro, Lacerda Franco e outras.

População

Segundo os últimos dados estatísticos a população municipal eleva-se a cerca de 80.000 habitantes, da qual, cerca de cinco mil habitam o perímetro urbano de Tanabi e os demais o vasto “hinterland” adensando-se em círculo ao redor das principais sedes distritais e povoados e rarefazendo-se pelas fazendas e regiões mais agrestes e distantes, principalmente as situadas nas margens do rio Grande.
            Não obstante a grande infiltração operada nos últimos anos com as enormes plantações de algodão e cereais o âmago sertanejo não foi ainda seriamente atingido pelas vagas humanas e a paisagem diminuta mutação sofreu, comparado a outras zonas do Estado cujo povoamento é mais denso.

Superfície

A área territorial de Tanabi é calculada presentemente em oito a dez mil quilômetros quadrados muito embora tenha perdido recentemente, a favor de Pereira Barreto, a quase totalidade das terras componentes da fazenda Ponte Pensa. Mesmo assim, é ainda o mais dilatado município de São Paulo.

Limites

           
            Ao norte, com o Estado de Minas Gerais, confinando com o chamado Triangulo Mineiro, antigo sertão da “Farinha Podre”; a noroeste com o município de Pereira Barreto (outrora com o Estado de Mato Grosso pelo rio Paraná); ao Sul com o município de Monte Aprazível, sendo divisor o rio São José dos Dourados; a sudeste e a leste com os município de Mirassol, Nova Granada, Palestina e Paulo de Faria. As suas raias lindeiras são, em sua quase totalidade, banhadas por caudalosos rios: o Dourados, o Preto, o Turvo, o Grande e ainda pelos tributários de menor importância como o Grama, o Fortaleza, o Divisa, o Jataí, e, somente numa extensão que não vai além de trinta quilômetros é que os marcos divisórios assentam em  terra perlongando o divortium aquarum Jataí – Bálsamo e Jataí – Dourados até ganhar as nascentes do pequeno córrego da Grama.

Distâncias

            Tanabi dista de sua estação ferroviária Balduino de Almeida cerca de sete quilômetros por boa estrada de rodagem em ótima forma; da estação de Bálsamo quinze quilômetros; de Mirassol trinta e de Rio Preto quarenta e cinco quilômetros; da sede comarcal – Monte Aprazível está separado vinte quilômetros; eqüidista cerca de vinte e cinco ditos de Cosmorama, trinta de Ibiporanga, atualmente segunda zona distrital da sede; quarenta e dois de Américo de Campos e cinqüenta e cinco de Monteiro e Votuporanga respectivamente ao passo que é de cento e cinqüenta a duzentos quilômetros as distâncias de seus pontos fronteiriços no rio Grande.
Bacias fluviais

            Para o rio Grande convergem, além do Turvo e Dourados os seguintes cursos d’água: o ribeirão das Araras, também conhecido por Ilha Seca; o Santa Rita, o Arrancado, o Água Vermelha, o Divisa, o Pádua Diniz, o Córrego Novo, o Taquari, o Marinheiro e seus tributários; o Tomazinho e o Tomazão, afora grande número de pequenos concurrentes; por sua vez, para a bacia do Turvo correm o rio Preto, o Guariroba, o Botelhos, o Águas Paradas, o Piedade, o Ribeirão Bonito, o Retiro, o Vau, o Barra Mansa, o Varginha, o Cachoeira, e, por último, o Jataí e seu afluente o Divisa ou Barro Preto estes como limites externos com o município de Mirassol; para o Dourados correm o Fortaleza, o Lageado, o Pulador, o do Abarracamento, o Carrilho e seu contribuinte o Vertente Comprida, o Prata, o Juvêncio, o Cpoeira, o Coxo, o Barreiro ou Cachoeira, o Água Amarela, o Soledade, o Cachoeira Feia, o Espraiado, o Santo Antonio, o Buriti, o são Pedro, o Jagóra, o Lingüiça, o Ranchão, o ribeirão do Maribondo e seu galho principal o Pimenta estes marcando as extremas divisórias com Pereira Barreto. No interior contam-se entre outros como afluentes do Jataí o mangue, o Bacuri, o Perobas, o Angola, o Cedro, o anil, o Alegria, o Guamirim, o Malhador, o Ladrão, o Divisa ou Barro Preto; despejam suas águas no Fortaleza o Grama, o Estiva, o Congo e muitos outros; confluem para o Cachoeira o Belarmino, o Cambauva, o macaúbas, e outros; para o Ribeirão Bonito vertem o Jambeiro ou Meio, o Retiro, o Capim, o Pedras, o Cavalinho etc.; convergem para o Piedade o Sucuri, o Coelho, o Coqueiral, o Cabeceira Comprida, o Adolfo, o Boaventura, o Pio, o Pontal, o dos Três Irmãos, o Bacuri, o Bonito, o Sumidouro, o Mangue e outros; engrossam as águas do ribeirão do Marinheiro o Engano, o Gatão, o Bonito, o Barreiro, o Marinheirinho, o Abelha, o Égua, o Pedras, e outros de menor importância.

Relevo do solo

            O solo da região tanabiense é ligeiramente ondulado por pequenos espigões e ausência completa de desfiladeiros e vales profundos; só em alguns pontos como na fazenda Fortaleza é que se notam ligeiros enrugamentos de superfícies aliás de formação secundária; o restante é composto de taboleiros, chapadões e extensas várzeas principalmente nas margens dos rios limítrofes.
           
Reserva hidráulica

            Entre as grandes quedas de água que pontilham os rios da região tanabiense podemos destacar a famosa Cachoeira dos Índios com mais de trezentos mil cavalos e a secunda entre as maiores do Estado; a da Quiçaça, a da Onça, todas no rio Grande a de são Roberto e do Paredão no rio Preto.

Vias de comunicação

            É atualmente ligado ao sistema ferroviário nacional pela estrada de ferro Araraquara com estações denominadas Engº Balduino (a mais próxima da cidade), Cosmorama (em vias de inauguração) e Votuporanga além de outras intermediárias sendo que esta última já está atingida pelos cortes da via permanente.
              Das estradas de penetração podemos eleger três grande eixos: a do Porto Taboado (já agora denominado Getúlio Vargas) uma das mais antigas e abandonadas pistas de gado, de trânsito dificultado até para as manadas bovinas; a de Cosmorama – Monteiro – Porto – Militão e Américo de Campos – Gestal – Porto do Anil; a elas se ligam os caminhos vicinais, galhos de pequenas e grandes artérias formando cruzamentos e ligando habitantes de vilas, povoados e bairros com a sede municipal. Exceto a primeira e conhecida pista de gado, a Boiadeira, onde transitam animais e carros de bois as demais veiculam autos, caminhões, ônibus ou “jardineiras” repletas de passageiros, carrinhos de mola e cavaleiros transportando viajantes e gêneros de produção em que predominam cereais e algodão em rama, além de mercadorias importadas. Nos últimos decênios foram abertas e conservadas boas estradas ligando a cidade a Cosmorama, Votuporanga, Monteiro, Pereira, Indianópolis, Cachoeira dos Índios, Cardoso, Gestal etc., sendo de cerca de mais de um milhar de quilômetros o sistema viatório tanabiense.

Altitude

            Segundo dados que possuímos não ultrapassa de 550 metros a altitude máxima de Tanabi porquanto acha-se a cidade a 537 metros acima do nível marítimo; a bacia do rio Preto está a 316 metros, Porto Taboado a 328 e a barra do Turvo a 360 metros respectivamente. Como elevação principal destaca-se o divisor das águas dos rios Turvo e Dourados por onde está concentrada a maior densidade de população e se desenvolvem os maiores núcleos demográficos. Resta-nos conhecer ainda as medidas de altitudes feitas pela E.F.A perlongando esse divisor onde altos índices devem ter sido encontrados. Compõem-se  os demais pontos do município de ondulações mansas que vão dos espigões às margens ribeirinhas em declives suaves propícios às culturas agrícolas e criação intensiva.

Cultura do solo

            Conta o município de Tanabi de quinze a vinte mil cafeeiros aliás de produção fraca dado os modos empíricos de seu cultivo e por se tratar de solo arenoso e seco o que tem motivado o abandono de extensas áreas cultivadas. No entanto, a cultura de cereais, e, sobretudo de algodão, dia a dia mais se dilata com a abertura de roças novas, co derrubadas ciclópicas que atingem centenas e milhares de alqueires; tudo leva a crer que, dentro em breve, será Tanabi o maior celeiro agrícola do estado Bandeirante. Em geral, o tratamento do solo é feito por métodos primitivos consistindo em roçada derrubada, queima, plantação, trato desta com uma ou duas carpas anuais, colheita manual etc.. Dentro de três ou quatro anos semeia-se capim para formação de pasto na área cultivada, e novo trecho de mata virgem é abatido.

Divisão das propriedades

            O município acha-se dividido em grandes fazendas que conglobam todas as vertentes e bacias dos ribeirões, de quem, quase todas, herdam o nome contando-se, entre elas, as seguintes: Perobas, Jataí, Cachoeira dos Felícios, Fortaleza, Prata, Carrilho, Nova ou Ribeirão Bonito, Piedade, Águas Paradas, Marinheiro, Guariroba, Cachoeira dos Tomazes, Pádua Diniz ou Cervo, Corredeira Grande, Ribeirão dos Vianas, Santa Rita, Araras, Água Vermelha, Viradouro, Barrinha, São João e São Pedro, Jagóra, Ranchão, Maribondo ou Pimenta, Ponte Pensa, Saltinho da Boa Vista, etc..

Posseiros e início do povoamento

            Os primeiros posseiros do território hoje constituinte do município foram: a do Campo Belo (hoje Marinheiro) feita por José da Costa Maldonado; Barra do Turvo por João e Adão da Costa Maldonado; a do Rio Grande feita por Luiz Januário de Barros; a da Barra do Rio Turvo feita por Flávio Alves da Costa; a do Rio Grande devida a João da Costa Maldonado; a Santa Rita feita por João Tomaz da Costa; a da Barrinha feita por Manuel Gracia Pires, Pedro Teles, Camilo Militão de Oliveira, Jerônimo José Pereira; a da Grama feita por Teodoro Mendes da Costa e Antonio da Costa Lima; a do Turvo feita por Luiz Antonio da Silveira, um dos fundadores de Rio Preto; Alagoas devida a José Francisco Pereira: Queiroz a Joaquim Rangel; Águas Paradas a João Botelho de Vasconcelos, sendo, a mais antiga a de José Alves Ferreira e João Ramos da Costa na fazenda Viradouro, primitivo núcleo de povoação.
            Os movimentos dos grupamentos humanos são motivados, sem dúvida, por impulsos de ordem econômica. É a necessidade que compele tais infiltrações, expanções e deslocamentos. Eles se fixam onde o trabalho permite tal fixação. Aí se enraízam, desdobram e são assimilados, escreve Nelson Werneck Sodré em seu ensaio “Oeste”, página 105, onde fala das primitivas penetrações em solo matogrocense, aliás, bastante comuns com as processadas em nosso território. No pontal dos rios Grande Paranaíba as clãs pastoris dos Garcias e Sousas cedo iniciaram aí sua labuta. Em 1831, Joaquim Francisco Lopes explorou as terras do rio Grande; mas, do lado direito, o nosso lado, nada foi feito senão muito mais tarde, embora já houvessem por esse tempo, posses esparsas pelo território inquinado. Vieram de Minas os primeiros povoadores e mormente da região de Barretos. Grande parte buscava a região como esconderijo, para fugir á perseguição das autoridades de outras plagas. Em torno da Boiadeira muitos deles tem essa origem embora sejam hoje pacatos fazendeiros, que nada mais desejam do que viver em paz e prosperar. Muitos, também, foram peões que, indo e vindo de Mato Grosso, aí se fixaram para não mais voltar.
            Em 18 de setembro de 1850 promulgou o Império a lei que proibia aquisições de terras que não fossem por escritura pública de compra. Existiam, nessa ocasião, aqui, diversas posses e datam daí as primeiras legalizações por meio de registros em Rio Preto e Jaboticabal.
            Descendentes dos Lopes, os Queirozes influíram na toponímia tanabiense emprestando seu nome, por antonomástica, à fazenda “Água Vermelha” onde se acha localizada a Cachoeira dos Índios, uma das mais lindas e possantes quedas de água do Brasil.
            Alimento comigo a convicção de que o próprio nome do rio fronteiriço São José dos Dourados deve sua origem, provavelmente, a lembranças da região matogrocensse onde há o rio Dourados que serviu de teatro à épica resistência de Antonio João. Igualmente Santo Antonio, ou Piassava, conhecido por “Corrutela” na gíria da peonada que por aí transita tais origens do Oeste por onde os povoados são assim conhecidos.
            Na transmissão dos grandes imóveis rústicos contam-se casos interessantes e dignos de registro: enquanto Luiz Antonio da Silveira adquiria todo o Ribeirão Claro com onze mil alqueires de terras por um simples carro de bois, um caboclo nosso, cujo nome ignoramos, vendeu toda a imensa fazenda “Araras” em troca de uma trela de cachorros caçadores! Sítios e fazendas trocadas por espingardas, carros de milho cavalo arreado etc., são comuns nos princípios do século e derradeiros anos do anterior.
              Rápida leitura das escrituras lavradas no cartório local mostram a indigência das vendas efetuadas: dilatadas glebas cobrindo vastas áreas de terras hoje valorizadas eram despretensiosamente vendidas por ninharias, algumas centenas de mil reis somente. Além disso, outro contraste frisante verificamos, a exemplo do que aconteceu e acontece em Mato Grosso: donos de latifúndios extensos vivem paupérrimos em choças e tugúrios onde causa acanhamento penetrar e muitas vezes nem sequer dispõem de numerário para ocorrer ao pagamento dos impostos que sobre essas terras recaem, além de seu nível de vida ser quase primário.
            As casas de madeira, barreadas com esse barro úmido que se joga nos cruzamentos das ripas e parrotes e cobertas de telha vã, ou mesmo sapé, são ainda a morada preferida de quase todos os camponeses. Só os mais abastados fazendeiros e sitiantes, é que possuem vivendas construídas de tijolos com relativo conforto disseminados na imensa região q que circunscrevemos este singelo estudo; mesmo nos povoados tais tipos de construção bastando citar, por exemplo, Pedranópolis, Pereira, Brasilândia, Votuporanga e ainda Gestal, ibiporanga e outras; revela frisar que Votuporanga, padrão de rápido desenvolvimento na zona, em recente estatística de 1940 acusa a existência de 121 casas de madeira al lado de 122 de tijolos! Numerosos sítios, ainda há pouco desertos de ecúmeno são agora povoados de casebres de construção recente, arroteado pelo homo viril e daí surgem lavouras promissivas e emansipadoras.
            É em torno da ossatura do espigão mestre, onde atualmente a Araraquarense cava seu leito em busca da caixa líquida do Paraná, que se processa a grande penetração humana dos derradeiros anos. Aí nasceram povoados que hoje são vilas e amanhã cidades de importância como Cosmorama, Votuporanga, Monteiro, Pereira, Brasilândia, Pedranópolis, Cardoso, Jales, Indianópolis e outras mais que surgem como cogumelos e logo atraem atenção; fora dessa diretriz bem poucas localidades conseguiram impor-se, havendo até casos de involução e retardamento. Foi aí que as propriedades retalhadas adquiriram valorização acima do normal, bastando citar a existência em Votuporanga e Pereira de datas vendidas por oito contos de reis e terrenos marginais ao leito da via férrea dos povoados valendo de três a cinco contos por alqueire.
            Dá-se, em Tanabi, interessante fenômeno: o afluxo cotidiano de elementos estrangeiros: sírios, espanhóis, japoneses, italianos, portugueses, alemães, e elementos nativos a jogar no tabuleiro interno suas tendências, ambições díspares e complexas, interesses mútuos ou antagônicos; infiltraram-se, eles, pelos meandros das matas e são os plantadores de algodão, cultivadores de arroz ou criadores de gado, via de regra as três coisas juntas, ficaram, os demais, na esquina dos povoados, que ajudaram a improvisar, e são os comerciantes, os vendedores ambulantes que varam o território sertanejo de um a outro extremo; parte deles adquiriram lotes de terras e são os sitiantes e muitos tornaram-se boiadeiros, contando-se, entre estes, nacionais, peninsulares xucros e até louros alemães.
            Com essa penetração é que se deu a luta do homem com a terra a quem o regime pastoril não concorre, dado que é de exploração natural seu contato com o solo. Grandes clareiras nas matas seculares, primeiros rudimentos de maquinismos agrários secundados por transportes motorizados, tudo isso indica que aqui já se opera a conquista do meio agreste.
            A existência de imensas matas cobertas de angicos em todo o trato de terras municipais está provocando o aparecimento de indústrias extrativas. Aliás, supomos, deve-se à existência de matas fornecedoras de tanino, o fato de Tanabi significar, na opinião de Urbino Viana “madeira adstringente, que aperta”. Essa madeira o angico, fornece grande quantidade de cascas que são tiradas em tamanhos de, um metro, empilhadas na beira da estrada e daí transportadas para a cidade onde já existe um bom curtume, ou diretamente para a estrada de ferro. Além disso, essa madeira fornece alto teor de eficiência calorífica, sendo, bastante procurada para lenha, indústria de carvão agora valorizada como crescente emprego do gazogênio.
            Pequenas e grandes propriedades instalaram-se ao longo dos cursos de água de maior ou menor extensão; desse modo, para nomear os bairros, populosos ou não, outra palavra não temos que aquela designativa do curso de água em cujas margens o homem fixou sua moradia.
            Há, contudo, aberrações contrárias; elementos nômades, talvez influenciados pelo exemplo nipônico edificam seus ranchos precários em plena roça, junto ao algodoal, para melhor aproveitar o serviço de mulheres e crianças, fixando-se nos espigões altos a regular distância do elemento civilizador, a água, e daí nascem novos bairros de nomes arrevesados como esse “Waceda” que é o maior núcleo japonês do município.
            Com este intróito passemos a arrolar os topônimos geográficos do município de Tanabi:

ABELHA:  córrego afluente do Pedras, na fazenda Marinheiro; serve de limite da zona distrital de Monteiro, com sede em Brasilândia; bairro desse nome.
ÁGUA AMARELA: bairro e córrego na fazenda Prata; dista poucos quilômetros de Cosmorama e de sua estação ferroviária.
ÁGUA LIMPA: córrego tributário do ribeirão do Espraiado, na fazenda Viradouro, vertente do rio são José. Primitivo nome da cidade de Monte Aprazível outrora pertencente ao distrito de Tanabi.
ÁGUA VERMELHA, ou QUEIROZES: grande imóvel rústico confinante com as fazendas Satã Rita, Pádua Diniz e Rio Grande; em suas proximidades está a Cachoeira dos Índios; pertence ao distrito de Monteiro, 3º zona distrital denominada Brasilândia; banhada pelo ribeirão Água Vermelha, que lhe empresta o nome, o qual tem por afluentes o Bonito, o Araras e outros.
ÁGUAS PARADAS: imóvel rústico sito à margem do rio Preto e confinante com seus congêneres Piedade e Guariroba; é banhada pelo ribeirão de igual nome em cuja margem direita está assentada a vila de Américo de Campos; no espigão divisor ergue-se a povoação de Gestal, também conhecida por São Roberto, fundada por Manuel Pontes Gestal. Diversos córregos como o Suspiro, o Irara, o Varjão e outros engrossam suas águas todos eles constituindo bairros habitados.
ALEGRIA: bairro e córrego afluente do ribeirão Jataí distante cerca de oito quilômetros da cidade. Querem alguns que o verdadeiro nome da fazenda geral “Jataí de Baixo” seja esse de Alegria, dado que é lá que se processou uma das primeiras posses nas terras de Juca Boiadeiro hoje pertencente a terceiros.
ALTO BACURI: nome do patrimônio fundado em 1929 por José Baliano no divisor Dourados – Turvo próximo a Votuporanga. Desapareceu logo após a morte de seu fundador e dele só restam hoje alguns esteios fincados à beira da estrada.
AMÉRICO DE CAMPOS: sede de distrito de paz criado pela lei 2180, de 29 de dezembro de 1926 e instalado no ano seguinte; possui cerca de 150 prédios. Foi fundada à margem do ribeirão Águas Paradas, sua antiga denominação, em 8 de maio de 1920; nessa data, o agrimensor João Inocêncio do Amaral cortou os primeiros quarteirões da vila que esta sob a invocação de São João Batista e Nossa Senhora Aparecida. Joaquim Manuel Serapião foi o primeiro comerciante que aí se estabeleceu sendo considerado seu fundador. Teve também o nome de “Vila Botelho”, em seus pródomos, em homenagem aos primeiros lavradores dessa família que aí se instalaram.
ANGICOS: antigo povoado entre Tanabi e Monte Aprazível nas proximidades da estação de Engº Balduino que serve às duas cidades; segundo a tradição, chegou a rivalizar com Tanabi, possuindo afinada banda musical que se fazia ouvir ruidosamente nas festas religiosas do velho Jataí quando este não sonhava ainda possuir sua filarmônica. Hoje nada mais resta da localidade extinta a não ser alguns carcomidos esteios fincados na invernada rústica.
ANGOLA: córrego afluente do Jataí neste desembocando no bairro da Vila Tomaz, córrego esse também conhecido por José Portinho; designa igualmente o bairro desse nome.
ANHUMAS: regato na vertente do ribeirão do Marinheiro; serve de linde divisória para á 4º zona distrital de Monteiro com sede em Cardoso.
ANIL: porto fluvial no rio Turvo, também conhecido por porto do Isaac, nome este de velho morador do local e que aí mantém balsa de madeira para a travessia do rio. Nome de afluente do Jataí e de córrego na fazenda Guariroba.
APARECIDA: uma das sub-denominações da fazenda Pádua Diniz. Propriedade agrícola, na fazenda Piedade, pertencente à família Arroyo, sendo considerada uma das melhores fazendas de café do município possuindo máquina de benefício.
ARARAS: grande imóvel rústico à margem esquerda do rio Grande, limitando-se com este e com as fazendas Santa Rita, Ponte Pensa e Ranchão. É banhada pelo ribeirão das Araras, ou Lagoa Seca, o qual serve de limite entre os municípios de Tanabi e Pereira Barreto. Designa também boa extensão de terras e córregos na fazenda Viradouro propriedade dos Irmãos Cavalini.
AROEIRA: afluente do rio Grande, na fazenda Pádua Diniz. Com esse mesmo nome existe outro córrego na fazenda Jataí provavelmente parte de seus terrenos incorporados ao distrito de Mirassolândia pela ultima divisão territorial.
ARRANCADO: ribeirão concorrente ao sistema hidrográfico do rio Grande e sítio na fazenda Santa Rita; possui diversos afluentes entre os quais o denominado Candinho.
BACURI: córrego situado ao sul da cidade de Tanabi e que deságua no Jataí logo abaixo da cidade; tem por afluentes o Mangue e pequenas nascentes.
BALDUINO ou ENGº BALDUINO: estação da estrada de ferro Araraquara situada nas linhas fronteiriças dos municípios de Tanabi e Monte Aprazível servindo ambas cidades e a estes ligadas por moderna rodovia, distando cerca de 7 quilômetros de Tanabi. Esse topônimo foi dado em homenagem ao antigo diretor da Estrada.
BANDEIRANTES: praça central na vila de Cosmorama onde se ergue a primitiva igrejola construída quando da fundação do povoado; nela está sendo edificada atualmente nova matriz e circunda-a bons prédios, entre os quais sobressaem, a “Casa de Saúde dos Drs. Nunes”, o cartório de paz e diversos estabelecimentos comerciais.
BANDEIRA: praça contornada pelas ruas Carlos de Campos, Floriano Peixoto, Nilo Peçanha e Rui Barbosa nos fundos da Igreja Matriz.
BARÃO DO RIO BRANCO: rua na cidade de Tanabi tendo por limites externos a transversal “13 de maio” e terrenos de Flávio Soares de Paula; teve, outrora, o nome de Altino Arantes; nela estão situadas atualmente a Cadeia Pública, o Cinema Rio Branco, a Coletoria Federal e a Biblioteca Municipal, além de ótimos prédios residenciais.
 BARRA MANSA: grande imóvel rústico confinando com as fazendas “Cachoeira dos Felícios”, “Nova” e com o rio Preto; banhada pelo ribeirão de igual nome com numerosos afluentes entre eles o Cambão; pertencente nesta data à 2º zona distrital de Tanabi sediada em Ibiporanga e a estas, ligada por estrada de rodagem. Houve, outrora, nesse local, rudimentos de um povoado com patrimônio e cemitério, o qual não logrou subsistir.
BARRETO: córrego na fazenda “Jataí de Baixo” e que segundo Martius, essa palavra, em tupi tem o significado de terrenos salitrados e por isso mesmo freqüentados por animais silvestres.
BARRINHA: também conhecida por Buriti; fazenda confinante com o rio São José e imóveis Viradouro e São João e São Pedro. Está situada próximo ao incipiente povoado de Santo Antonio e é banhada pelo córrego do Buriti.
BARRO PRETO: nome de córrego à margem direita do Jataí oficialmente conhecido por córrego da Divisa. Córrego na fazenda Nova, também conhecido por Capim.
BENJAMIN CONSTANT: rua, outrora conhecida por Anita Garibaldi, tendo, por limites, a rua Capitão Daniel e terrenos particulares; nela se localizam as máquinas Tabacchi, Vendramini e Aguilar, boas casas comerciantes, ferrarias e carpintarias além de numerosas residências.
BOA VISTA: vilarejo situado na fazenda”Cachoeira dos Tomazes” à margem da rodovia Monteiro Cardoso; tem a antonomásia popular de “Caba já” como a profetizar-lhe vida efêmera.
BOTELHOS: nome de primitivos habitantes do distrito de Américo de Campos designando bairro desse nome; córrego afluente do rio Preto na fazenda “Águas Paradas”. O bairro desse nome é servido pela estrada de autos Guariroba – Palestina, passando por Gestal.
BRASILÂNDIA: povoação fundada em 1937 por Carlos Barrozzi e filhos na fazenda “Marinheiro” distante dois quilômetros da povoação de Pereira. Em 24 de agosto de 1942 foi elevada a sede de zona, a 4º do distrito de Monteiro sendo instalada em 24 de janeiro de 1943. É um topônimo de formação irregular híbrida em que entram como componentes termos de origem anglo e luso.
CABAJÁ: curioso topônimo aplicado pela irreverência popular aos lugarejos retardados e incipientes; nada menos de três povoações, neste município, são assim designadas: Bela Vista, Vila Nova e Gestal e, parece-nos, subsistirá somente quanto à primeira a quem já é hábito assim nomear.
CACHOEIRA DOS ÍNDIOS: grande queda de água no rio Grande, na fronteira de Minas; ligada a Tanabi por estrada de autos com um percurso de mais de cento e cinqüenta quilômetros passando por Indianipólis e Pereira. Constitui excelente logradouro público para turistas que ai já encontram acomodações construídas pelo ex prefeito do Município Vergninaud Mendes Caetano ai residente. Deve sua denominação ao fato de pertencer aos indígenas os terrenos marginais, segundo a tradição.
            CACHOEIRA DOS FELÍCIOS: grande imóvel rústico assim denominado por ter sido habitada, há mais de meio século, pela família Felício, tronco dos Macieis; banhada pelo ribeirão da Cachoeira e seus tributários: o Belarmino, o Cambauva, e outros menores; limita-se com as fazendas Jataí, Nova, Barra Mansa e com o rio Preto, sendo cortada pela estrada de autos Tanabi – Américo de Campos; pertence à 2º zona distrital de Ibiporanga a partir do córrego da Cambauva e o restante à zona da sede.
CAMBAUVA: bairro e córrego afluente da margem esquerda do ribeirão Cachoeira, servindo de divisa entre o distrito da sede e sua 2º zona. Seu nome deve ser originário de vegetal que prolifera junto à sua corrente.
  CAMPO SANTO: rua em Tanabi com ponto terminal no Cemitério Municipal e no ribeirão Jataí. Nela está situado o “Hospital São Vicente de Paulo”, moderno estabelecimento de caridade dirigido pelas Irmãs da Divina Providência que aí mantém freiras e pela Irmandade de São Vicente.
CAMPO DE AVIAÇÃO: construído nas imediações da cidade há um e meio quilômetro de distância na fazenda Jataí e onde foi construído moderno hangar denominado “Visconde de Mauá”, tomando o campo a denominação de “Aeroporto Getúlio Vargas Filho”. Além desse campo de pouso para aviões outros já existem em terras do município contando-se entre eles o de Jales, Monteiro e fazendas de particulares.
CANA DO REINO: também conhecido por Soledade; córrego na fazenda Viradouro servindo de limite entre os distritos da sede e Monteiro, 2º zona com cartório em Votuporanga. Seu nome deriva de conhecida gramínea.
CAPIM: córrego que deságua no ribeirão Bonito.
CAPITUNA:  afluente do ribeirão Marinheiro, na fazenda nome próximo ao rio Grande.
CARDOSO: vila situada nas proximidades da desembocadura do Turvo, no rio Grande; foi fundada por Joaquim Cardoso Filho do sertanista Vicente Cardoso da Silva, um dos primeiros moradores da zona; possui mais de uma centena de prédios, regular comércio regional. Em 24 de agosto de 1942 foi elevada a sede distrital com cartório já instalado.
CARLOS DE CAMPOS: rua na cidade de Tanabi tendo por limites extremos de Victor Della Colecta e Guilherme Alvim Moore; é uma das únicas vias públicas da cidade cujo nome não foi alterado desde a instalação da Prefeitura em 1925; nela se localizam o cartório de paz, redação do jornal “O Município”, o “Aéro Clube” de Tanabi” campos de esporte etc., além de boas residências.
CARRILHO, ou CARRINHO: grande imóvel rústico limitado pelas fazendas Fortaleza, Prata e pelo rio Dourados. É banhada pelo ribeirão de igual nome; pertence ao distrito da sede e é cortada pela estrada do Taboado com boas propriedades pastoris.
CARVALHO: vilarejo fundado por Felício José de Carvalho à margem da Boiadeira na fazenda Viradouro; com a morte de seu fundador decaiu a ponto de constituir atualmente mera referência geográfica co alguns botequins esparsos e poucas residências.
CEDRO: CÓRREGO AFLUENTE DO Jataí e bairro do mesmo nome distante cerca de três quilômetros da cidade. Seu nome é tirado de conhecida madeira de lei.
CEMITÉRIO: pequeno córrego nas proximidades de Ibiporanga, nome que recebeu em virtude de haver, em tempos idos, nesse local, um cemitério onde, segundo afirmam, só eram inhumados gente de cor, dele ainda restando vestígios.
CERVO: cognome do imóvel “Pádua Diniz” e denomina diversos regatos no município.
COQUEIRAL: córrego no distrito de Américo de Campos e afluente do Piedade; bairro bastante habitado, principalmente por ibéricos e descendentes destes.
CORREDEIRA GRANDE: imóvel rústico à margem do rio Grande.
CÓRREGO NOVO: afluente direto do rio Grande no imóvel “Pádua Diniz”.
COSMORAMA: vila desde 1927, data da criação do distrito de paz; antiga venda à beira da estrada de autos Tanabi – Monteiro, nas imediações do córrego Cavalinho; ai, Antonio Cândido Borges, proprietário dos terrenos, e Júlio Catini, fundador da primeira máquina de beneficiar café e arroz, ergueram o povoado, o qual, em poucos anos atingiu foros de vila e conta atualmente mais de duzentos prédios. Seu nome vernáculo tem o significado de panorama cinematográfico do mundo, tendo sido escolhido pelo autor destas linhas, tornando-se, em pouco tempo, bastante conhecido em toda a região. Já se acha ligado ao sistema ferroviário do país com estação própria que dista de sua sede somente dois quilômetros. Nesse local ergue-se imponente conjunto industrial da firma Anderson Clayton &Cia.
CÔXO: afluente do ribeirão Piedade, no distrito de Cosmorama.
DANIEL ou CAPITÃO DANIEL: rua em Tanabi assim denominada em homenagem ao velho sertanista aqui residente há meio século; foi seu primeiro escrivão de polícia, em 1902 e exerceu vários cargos públicos tais como: juiz de paz, prefeito, presidente da Câmara etc... A rua, de que falamos, limita-se com os córregos jataí e Bacuri em suas extremidades.
DIVISA: córrego afluente do rio Grande entre o Pádua Diniz e o Água Vermelha. Com esse nome existe outro afluente no ribeirão Jataí.
ÉGUA: afluente do ribeirão Tomaz, no distrito de Américo de Campos, tendo suas nascentes próximo ao espigão da fazenda Guariroba.
ENGANO: pequeno curso d’água tributário do Marinheiro.
ENGENHO: nascente que verte para o rio Preto e fica entre o Piedade e o Bonito no distrito de Cosmorama.
ESTRADA VELHA: antiga estrada de carros que, partindo de Rio Preto, passa por Ibiporanga e se dirige à Barra Mansa e Américo de Campos; é uma das mais antigas linhas de penetração municipal e por ela, supomos, viajou a cavalo o então Tenente Taunnay vindo de Mato Grosso para São Paulo com escalas pela então vila de São José do Rio Preto.
FAZENDA: assim se denominam as herdades destinadas à cultura de cereais, café, algodão, cana etc., e às propriedades pastoris onde são invernadas as manadas bovinas de criação e engorda. Assim, também, são nomeados os grandes imóveis rústicos compreendidos pelas águas vertentes dos maiores cursos d’água recebendo denominação distinta por ocasião de sua divisão judicial. O termo “fazenda”, no sentido de propriedade agrícola, começou a ser empregue nos primórdios do século XVII, segundo lemos em Alencar.
FLORIANO PEIXOTO: rua em Tanabi tendo anteriormente os nomes de 16 de julho, Washington Luiz e Miguel Costa; nesta artéria estão situadas atualmente a Prefeitura Municipal, a “Casa de Saúde Tanabi”, e a Igreja Matriz tendo por limites nos fundos terras de Gruilherme Alvim Moore e na outra extremidade de Victor Della Coleta.
FORTALEZA: fazenda situada entre os municípios de Tanabi e Monte Aprazível tendo por divisor entre estes o córrego da Grama e ribeirão daquele nome; limita-se co as fazendas “Nova, Jataí, Carrilho e com o rio Dourados. É atravessada pela estrada de ferro Araraquara e estrada Boiadeira; possui terrenos acidentados cobertos de angicais onde se desenvolvem culturas agro-pecuárias de importância.
FUMAÇA: nome de uma das maravilhosas quedas da famosa Cachoeira dos Índios na fronteira de Minas.
GATO ou GATÃO: córrego e bairro na fazenda Santa Rita próximo à localidade de Pereira.
GESTAL: patrimônio fundado por Manuel Pontes Gestal em terras de sua propriedade no distrito de Américo de Campos a margem da estrada de autos Guariroba – Palestina.
GETÚLIO VARGAS: atual denominação de Porto Taboado, no rio Paraná e ponto terminal da estrada de ferro Araraquara. Possui barco a vapor para o transporte de gado que, arrebanhado em Mato Grosso, é conduzido a pé para os frigoríficos de Barretos. Pertence, desde 01 de janeiro de 1939, ao município de Pereira Barreto.
GOIABA: córrego afluente do Jataí e bairro desse nome entre Tanabi e a estrada de ferro Araraquara no prolongamento para Cosmorama.
GUAMIRIM: córrego afluente do Jataí na fazenda deste nome. Bairro bastante habitado.
GUARIRÓBAS: pequeno afluente do córrego das Pedras na fazenda “Marinheiro”; serve de limite da 3º zona distrital de Monteiro, com sede em Brasilândia.
GUARIRÓBA: imóvel rústico à margem do rio Turvo tendo este e as fazendas “Cachoeira dos Tomazes”, “Marinheiro”, “Piedade” e “Águas Paradas” por extremos divisórios; é banhada pelo ribeirão de igual nome e pertence ao distrito de Américo de Campos e constitui propriedade única de firma inglesa que ai mantém exclusivamente criação e engorda de gado. Seu nome deriva de conhecida palmeira.
HILÁRIO: pequeno córrego que desce no Espraiado, na fazenda “Viradouro”.
IBIPORANGA: povoado, na fazenda “Cachoeira dos Felícios” fundado por Marciano Maciel da Silva à margem da estrada velha que se dirige a Rio Preto; dista cerca de 30 quilômetros da cidade de Tanabi e desta foi desmembrada em 25 de outubro de 1942 passando a construir sede da 2º zona distrital instalada em 24 de janeiro de 1943; seu nome, escolhido pelo autor destas linhas, significa, no linguajar tupi guarani, conforme Plínio Ayrosa, “terra bonita” e substitui a designação primitiva de “Negrinha” assim batizada pela existência de gente de cor nesse local.
INDIANÓPOLIS: povoado na fazenda “Água Vermelha” fundado em 1940; é ligado a Tanabi por linha de jardineiras e em seu início tinha a denominação popular de “Quebra Paus”.
JAGÓRA: imóvel rústico pastoril confinado com as fazendas “São Pedro”, “Santa Rita”, “Ranchão” e com o rio Dourados. É banhada pelos córregos da Jagóra, Jagorinha, Duas Pontes ou Lingüiça e atravessa-o a estrada do Taboado. Segundo supomos seu nome é uma corruptela de Jaguar, isto é, onça.
JALLES: povoado fundado pelo Dr. Euphly Jalles no divisor Turvo – Dourados e justamente no prolongamento da ferrovia Araraquara ao Taboado. Já está bem desenvolvido e possui o 1º campo de aviação do município inaugurado em 1942 com grandes festas e Aéro Clube próprio.
JARDIM PÚBLICO: na praça 24 de outubro em Tanabi construído pelo prefeito Odilon Pacheco logo após a revolução de 1930 no local onde se erguia a primeira igreja desta cidade demolida em 1932; nos fundos do Jardim está a Feira Municipal e a praça de esportes do “Tanabi Tênis Clube”.
JATAÍ: nome primitivo de Tanabi; grande imóvel rústico abrangendo as fazendas “Jataí de Baixo” e “Jataí de Cima”; limita-se com  as fazendas “Cachoeira dos Felícios”, “Nova”, e “Fortaleza” e com o município de Mirassol ao qual pertence parte. O ribeirão desse nome tem por afluentes o Bacuri, o Veado, o Anil, o Alegria, o Barro Preto, Barreiro, o Aroeira, o Malhador, o Guamirim, o Angola, o Perobas, o Goiaba e outros pequenos.
JOAQUIM DA CUNHA: rua da cidade de Tanabi, assim denominada em homenagem ao saudoso político da zona mogiana. É a principal saída para Rio Preto.
LACERDA FRANCO: avenida em Tanabi, assim denominada em homenagem ao saudoso paulistano; tem por limites o córrego Jataí, de um lado, e terrenos de particulares, de outro.
LIMEIRA: córrego paralelo ao Sant Rita, na fazenda deste nome e pertencente ao sistema hidrográfico do rio Grande.
MALHADOR: bairro bastante povoado na fazenda Jataí de Baixo e córrego afluente de Jataí , servindo de limite, em confluência, entre a 1º e 2º zona distrital.
MANGUE: um dos galhos principais dos córrego Bacuri na fazenda Jataí e bairro desse nome servido pela estrada de rodagem que liga Tanabi a Balduino. Córrego tributário do ribeirão da Piedade.
MARINHEIRO: cabeceira principal do ribeirão da Marinheiro na fazenda deste nome próximo a Votuporanga; bairro populoso.
MARINHEIRO: fazenda com milhares de alqueires, cerca de setenta mil, conhecida por Anhumas, Barra das Pedras etc. Dentre seus primitivos posseiros destaca-se Joaquim Pedro de Castro que ai residiu desde 1841; em 1905 Eduardo Ferreira Guedes promoveu contra Luiz Januário de Barros sua divisão judicial. Limita-se com as fazendas “Piedade”, “Prata”, “Viradouro”, “São João e São Pedro”, “Santa Rita” e com o rio Gande. Nela estão assentes as localidades de Monteiro, Votuporanga, Brasilândia, Pereira, Pedranópolis, Mira Estrela e outras. É banhada pelo ribeirão de igual nome o qual tem como tributários o Suspiro, o Mel, ou Santana, o Atoleiro, o Onça, o Égua, o Arrozeiro, o Três Lagoas, o Barreiro, o Arrelia, o Barracas, o Barra Grande, o Pedras, o Bonito, o Macaúbas, o Caqueiro, o Jacu, o Angola, o Fundo, o Japiranga, o Caridade, o Ana, Santa Luiza, o Duas Barras, o Marinheirinho, o Mineiro, o Carangeuijo, o Alegre, o Vaca, o Estiva, o Abelhas, o Sapé, o Pantanal, o Capituva, o Anhumas, o José Durante, o Bagre, o Baixada, o Tamanduá, o Veadinho, o Boi, o Papiassú, o Maravilha, o Flores, o Água Fria, o Jacu e outros.
MATEIRO: pequeno filete d’água que se lança no Veado e ambos engrossam o Pádua Diniz, servindo, um e outro, de divisa entre a 4º e 3º zona do distrito de Monteiro.
MILITÃO: porto fluvial no rio Grande, também conhecido por Porto Monteiro; rua em Tanabi em homenagem ao Cel. Militão Alves Monteiro que por muitos anos exerceu os cargos de Prefeito e Presidente do diretório do P.R.P local. É a mais importante artéria comercial da cidade, onde se concentra seu mais ativo comércio; limita-se com o córrego Bacuri, por um lado, e com terrenos de Victor Della Coleta, por outro. Teve, outrora, o nome de Conselheiro Antonio Prado, em homenagem ao ilustre brasileiro que foi prefeito da Capital.
MIRA ESTRELA: povoado fundado, em 1941, por Cândido Brasil Estrela, capitalista em Mirassol, em terras da fazenda “Marinheiro”.
MOINHO: nome de um córrego concurrente do ribeirão Piedade, na fazenda deste nome entre Cosmorama e Monteiro; seu nome deriva do fato de existir, na passagem da estrada de autos que liga aquelas povoações, um velho moinho de fubá, movido por roda de água e que foi instalado pelo Cel. Militão junto à sede de seu latifúndio.
MONTEIRO: distrito de paz atualmente dividido em 4 zonas; foi elevado a vila em 29 de dezembro de 1926 por decreto nº 2179, e instalado no ano seguinte no povoado já existente. É ligado a Tanabi e à região sertaneja por boas estradas de autos e tem regular comércio.
MORCEGO: afluente do ribeirão Marinheiro.
NILO PEÇANHA: rua em Tanabi assim nomeada em honra do ex ministro do Exterior brasileiro. Limita-se com o córrego Bacuri e terrenos de particulares.
NOVA ESPANHA: patrimônio fundado pelo Dr. Arlindo Carneiro, advogado, em terras de sua propriedade na fazenda Santa Rita. Não prosperou até hoje.
NOVA ou RIBEIRÃO BONITO: fazenda atravessada pelo ribeirão bonito, de quem herda o nome; tem por limites as fazendas “Cachoeira dos Felícios”, “Fortaleza”, “Prata”, “Piedade” e com o rio Preto; em seu território estão situadas: a) uma estação ou chave da EFA; b) a vila de Cosmorama entre os córregos Cavalinho e Retiro; c) a pequena povoação de Nova na estrada de Tanabi a Américo de Campos esta com escola, igreja e casas de negócio; não tem prosperado talvez por estar assente em terrenos pouco férteis.
NOVE DE JULHO: rua em Tanabi assim denominada em homenagem à revolução Paulista de 1932; tem por limites a rua Tiradentes e terrenos de particulares.
PÁDUA DINIZ ou CERVO: grande imóvel rústico à margem do Rio Grande com o qual confina e ainda com as fazendas “Santa Rita” e “Marinheiro”; foi dividida judicialmente em 1918 e ai se desenvolvem grandes propriedades, agro-pecuárias.
PAU ROXO: córrego e bairro na fazenda Marinheiro próximo a Brasilândia.  
 PEDRAS: curso d’água afluente do ribeirão Marinheiro; banha a povoação de Pedranópolis. Córrego na fazenda Nova.
PEDRANÓPOLIS: povoado fundado por João Gonçalves Leite em suas terras na fazenda “Marinheiro” no dia 13 de junho de 1938; topônimo de formação híbrida pouco recomendável pelos lingüistas. Tende a desenvolver-se com o afluxo de compradores de terras próprias para algodão ai existentes.
PERDIDO: córrego próximo ao Arrancado na bacia do rio Grande.
PEREIRA: povoação fundada em 1938 por Joaquim Antonio Pereira em terrenos de sua propriedade na fazenda “Santa Rita”; dista cerca de dois quilômetros de Brasilândia e igual distância do traçado ferroviário do traçado da Araraquarense em seu prolongamento em demanda do Paraná; é ligada a Monteiro, Cachoeira dos Índios e Votuporanga por boas estradas. Possui mais de 300 prédios em tem regular comércio. Está fadada a tornar-se uma das mais populosas vilas de hinterlândia tanabiense. Os moradores da vila estão pleiteando mudar sua denominação para Alcântara Machado, homenagem ao saudoso escritor paulista.
PERÓBAS: fazenda agrícola banhada pelo córrego que lhe empresta o nome confinando-se a fazenda Jataí e com o distrito de Bálsamo; é uma das mais povoadas do município sendo servida pela estrada de autos Tanabi – Rio Preto e cortada pelos trilhos da Araraquarense. Seu nome origina-se da abundância, outrora, em suas matas da conhecida madeira de lei que tem o nome genérico de Aspidorperma. O córrego Perobas tem como afluentes o Sapo, o Sapinho e deságua no Jataí seis quilômetros abaixo de Tanabi.
PEROBINHA: bairro rural sito na fazenda Perobas; possui escola estadual com prédio próprio.
PIÇARRÃO: afluente do ribeirão Tomazes, na fazenda deste nome; serve de linde divisória entre a 1º e a 4º zona de Monteiro.
PIEDADE: grande imóvel rústico que tem com limites as fazendas “Águas Paradas”, “Guarirobas”, “Marinheiro”, “Nova” e com a rio Preto; é banhada pelo ribeirão Piedade divisor entre os distritos de Monteiro, Américo de Campos e Cosmorama tendo com afluentes o Mococa, o Cachoeira, o Mangue, o Geraldo, o Sumidouro, ou Moinho, o anta, o Pio, o Corvo e outros menores.
PONTAL: porto fluvial na confluência dos rios Preto e Turvo ligando os municípios de Tanabi e Paulo de faria.
PRATA: fazenda limitada por suas congêneres “Marinheiro”, “Viradouro”, “Carrilho”, “Nova”, “Piedade” e rio Dourados. É banhada pelo ribeirão da Prata formando pelo Cachoeira, Água Amarela e outros menores. Pertence ao distrito de pás da sede e é atravessada pela estrada Boiadeira e, no espigão, pelos trilhos da EFA de Cosmorama a Votuporanga.
QUIÇAÇA: porto fluvial no rio Grande abaixo da famosa Cachoeira dos Índios.
RANCHÃO: fazenda sita na vertente do Dourados e constituída de pastagens e matas; tem como confinantes as fazendas da “Ponte Pensa”, ou Boa Vista, “Araras”, “Santa Rita”, “Jagóra” e rio Dourados; é banhada pelo ribeirão do Ranchão e servida pela estrada Boiadeira pertencendo à 2º zona distrital de Monteiro com sede em Votuporanga. Nas cabeceiras desse imóvel ergue-se a povoação de Jalles destinada a grande incremento por estar situada nas raias do prolongamento da Araraquarense.
RELÓGIO: córrego tributário do rio Grande entre o Lagoa Seca e o Arrancado.
RIBEIRÃO BONITO: afluente do rio Preto; banha a fazenda “Nova” e serve de divisor entre os distritos da sede e Cosmorama; são seus divisores o Meio ou Jambeiro; o Palmeira, o Retiro, o Fundo, o Barro Preto, o Porteira, o Monjolo, o Olaria, o Bagaço e outros. Há outro córrego, desse nome, nas imediações de Monteiro e deságua no Marinheiro. Bairro desse nome habitado por nipônicos onde há escola estadual.
RUI BARBOSA: rua assim denominada em honra do grande brasileiro que tão alto elevou o nome de nosso país nas convenções de Haya e Buenos Aires; confina-se ao fundo com a rua 13 de maio e ao sul com terras de Flávio Soares de Paula.
SALTINHO DA BOA VISTA: fazenda sita à margem do Dourados e abrange terras do imóvel Ponte Pensa.
SANTA RITA: ribeirão tributário do rio Grande e nome do grande imóvel rústico banhado por suas águas; são seus afluentes o córrego do Lauro, o Taboca, o Galo, o Jacaré, o Manhoso, o Dispensa, o Fim, o Baía, o Tacão, o Macaco, o Paisagem, o Mara Caída, o Desengano, o Volta para trás, o Feijão, o Porto, o Estiva, o Barro, o Pedras, o Emerenciana, o Arroio, o Cotia etc... A fazenda desse nome limita-se com a “Água Vermelha”, “Pádua Diniz”, “Marinheiro”, “São João  e São Pedro”, “Jagora”, “Ranchão”, “Araras”, e com o rio Grande; nelas se desenvolvem diversos povoados sobressaindo, em suas cabeceiras, o de Pereira.
SANTO ANTONIO ou PIASSAVA: também conhecido por “Corrutela” na gíria boiadeira; antigo povoado à margem do ribeirão de Santo Antonio na Fazenda “Viradouro” e servido pela estrada do Taboado; constitui-se de pequena igrejola e largo circundado de casebres; é o centro da peonada que transita rumo a Mato Grosso.
SÃO FRANCISCO: propriedade pastoril à margem do rio Dourados e pertence a uma firma inglesa.
SÃO JOÃO E SÃO PEDRO: fazenda na vertente do rio Dourados confinando-se com as fazendas “Barrinha”, “Viradouro”, “Marinheiro”, “Santa Rita” e “Jagora”; é banhada pelos córregos São Pedro, São João e São Domingos; constitui um dos mais antigos bairros do município.
SÃO JOSÉ DOS DOURADOS: rio eminentemente paulista servindo de divisor entre os municípios de Tanabi e Monte Aprazível e, do Maribondo abaixo entre Tanabi e Pereira Barreto desaguando no Paraná. Tem, entre outros, os seguintes tributários na parte confinante com Tanabi: o Fortaleza com os sub-afluentes: Boa Esperança, Grama, Manuel Alves, Congo, Divisa, Varginha, Lageado, Arroz, Cachoeirinha e Estiva; o Carvalho ou Vargem Comprida; o Água quente, o Cachoeira, o Prata e seus coletores: Juvêncio, Égua, Barreiro e Perua; o Soledade inclusive o Juca Barão e o Tamanduá; o Cachoeirinha, o Espraiado, o Viradouro, o Santo Antonio, o Buriti, o São João, o São Domingos, o São Pedro, o Jagóra, o Lingüiça, o Duas Pontes, o Jagorinha, o Ranchão o Açoita Cavalo, o Lageado e o Maribondo com seus afluentes da margem esquerda: Mandacaru, Talhadinho, Quebra Cabeça e Pimenta sendo este e o Maribondo limites de Tanabi e Pereira Barreto até o espigão divisor.
SÃO ROBERTO: cachoeira à margem do rio Preto e cognome da povoação de Gestal.
SAPO: afluente do Peróbas, na fazenda deste nome.
SETE DE SETEMBRO: rua em Tanabi limitando-se com o Córrego Jataí e com o Bacuri.
SUMIDOURO: córrego que deságua no Piedade vivendo em suas margens laboriosa população.
SUSPIRO: córrego tributário do Águas Paradas na bacia do rio Preto.
TAQUARI: afluente direto do rio Grande na fazenda “Pádua Diniz”.
TANQUE: lago natural formado na passagem da rodovia que liga Tanabi a Rio Preto, no córrego Bacuri.
TIRADENTES: rua em Tanabi em homenagem ao proto martir da independência nacional; limita-se com a rua 13 de maio e córrego Bacuri.
TOMAZ: bairro nos arredores de Tanabi, na estrada de Américo de Campos; ribeirão na bacia do Turvo tendo como afluentes o Viana, o Aldeiamento, o Piçarrão, o Joaquim José e o Barro Preto.
TREZE DE MAIO: rua em Tanabi homenagem à Abolição; tem lindes extremas em terras de particulares e aí se localizam estabelecimentos industriais e algumas boas residências.
VARJÃO: afluente do rio Preto no distrito de Cosmorama. Idem, do ribeirão Marinheiro.
VEADO: córrego na vertente do Jataí com sua foz há poucos quilômetros da cidade. Afluente da Santa Rita na fazenda de igual nome e ainda do pádua Diniz na bacia do rio Grande.
VIANA: ribeirão e suposta fazenda à margem do rio Grande.
VICENTE ALBINO: córrego concorrente ao ribeirão Bonito, sub-denominado Pedras. É atravessado pela estrada que vai a Américo de Campos.
VIRADOURO: fazenda à margem do ribeirão São José dos Dourados limitando-se com as congêneres: “Barrinha”, “São João” “Marinheiro”, “Prata” e em seu interior correm os córregos de Santo Antonio, Cachoeira Feia, Cana do Reino, (ou Soledade), Espraiado, Viradouro e pequenos regatos. É atravessado pela estrada do Taboado e nela se erguem as povoações de Carvalho e Santo Antonio, sendo um dos mais antigos núcleos povoados do município; suas terras estão todas ocupadas em grandes invernadas rústicas e criação intensiva de gado.
  VOTUPORANGA: povoação fundada sob os auspícios da firma Theodor Wille &Cia. LTDA. Em terrenos desta na fazenda “Marinehriro”; conta cerca de 500 prédios e é atualmente uma das mais prósperas vilas do interior tanabiense; foi elevada a sede de distrito no governo Ademar de Barros, em 24 de abril de 1940 e já aspira, por sua importância, foros de cidade. Brevemente será ligada ao sistema ferroviário nacional mediante os trilhos da Araraquarense cujo leito já se encontra construído.

                                                                        Tanabi, dezembro de 1942.

* Este trabalho foi destinado ao 10º Congresso Brasileiro de Geografia, em Belém do Pará.




Discurso proferido no ato inaugural da Organização Imobiliária “Flama” aos 31 de maio de 1956.

            Obrigado pelas circunstâncias a dizer-vos, caros ouvintes, algumas palavras à cerca do evento que hoje comemoramos, eis me aqui pouco afeito ao desempenho de meu papel, por quanto, bem o sabeis, sempre fui infenso a falar em público, embora admirador incondicional dos bons oradores que, aliás, em todos os tempos foram sempre recebidos com palmas e louvores.
            A Organização Imobiliária “Flama”, que neste momento inauguramos, tem por escopo ser a mediadora dos bons negócios nesta região, quer os de natureza imobiliária; propriamente ditos, quer aqueles que se relacionam com o ramo de representações comerciais em geral. Nuns e noutros, abstração feita ao lucro colimado, alma de todos os negócios, é propósito fixo de seus componentes servir à coletividade tanabiense como bons tanabienses que são e que pretendem ser no futuro se Deus quiser.



            A ninguém é dado ignorar, e todos vós o sabeis, estou certo, o papel preponderante de organizações como esta que aqui estamos improvisando, ao pretender merecer a confiança do povo com o fito de incrementar transações, em todos os setores das atividades agro pecuárias, base da propriedade econômica que habitamos. E o que pedimos a todos, ao fundar esta casa, é confiança, apoio e interesse para que todos nós e o público, possamos usufruir em conjunto as vantagens recíprocas dessa cooperação e desse esforço. Mandatários da confiança pública, deste bom povo tanabiense, é o que pretendemos ser, nada mais.
            Confiantes, pois, que dareis vosso apoio a nossa Organização, aqui estamos irmanados no são propósito de prestar serviços. Aqui estamos, formando uma equipe disposta a lutar e a criar elementos de progresso no movimentar incessante de nossa economia interna. Queremos progredir porque, força é confessa-lo, representa esse progresso como um espelho fiel, o progresso de toda a comunidade que servimos. E desse intercâmbio de valores, num mutualismo incessante, colheremos todos os frutos de nossos esforços e, de nossos labores.
            No interregno de nossas considerações cabe aqui um apelo: temos que elevar nossa mentalidade canhestra e bisonha de meros caudatários dos grandes centros e criar, aqui mesmo, em nosso meio, empreendimentos novos que nos capacitem a ombrear com outros centros mais adiantados. É preciso vencer o marasmo que nos debilita e procurar, através de idéias novas, valorizar o que é nosso, estimular a circulação de nossa riqueza própria e gerar novas fontes de aplicação de capital alienígena nos intra-muros das fronteiras municipais. Muita gente caminha pelo mundo afora sem descobrir a força que dorme na sua própria mente. Descubramos a que nos compete e dela façam,os a alavanca locomotora de nossas sonhos de conquista.

            Contamos, por isso mesmo, caros ouvintes, obter o beneplácito quer das autoridades constituídas, a quem externamos nosso cordial agradecimento pela honra de sua presença, neste recinto, quer da população inteira desta gloriosa cívitas, a quem, de antemão, endereçamos também o nosso muito obrigado pela acolhida da Imobiliária “Flama”, um pequenino elo na cadeia infinita de realizações que marcam o progresso ascensional de Tanabi, e que tem por finalidade, como seu propósito nome indica, manter bem alto e sempre acesa, a chama bendita do ideal que a anima e impulsiona.


Ata lavrada por Sebastião A. Oliveira, do lançamento da pedra fundamental da Indústria de Óleos Vegetais LTDA.

            Aos quatro dias do mês de julho do ano de um mil novecentos e cincoenta e oito; do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo, as onze horas da manhã, nesta cidade de Tanabi, Estado de São Paulo, em local adrede escolhido á margem da rodovia Mirassol- Presidente Vargas, presentes os senhores José Siriani eVenizelos Papacosta, respectivamente prefeito e vice prefeito municipal, Cônego Victor, Vigário da Paróquia, autoridade locais e numerosas pessoas gradas, procedeu-se à cerimônia do lançamento da pedra fundamental do edifício onde funcionará a Indústria Tanabiense de Óleos Vegetais LTDA., firma constituída dos sócios também presentes senhores: Dr. Renato Catini, Miguel Tomé, Osvaldo João Elias, Mário Mattos, Sebastião Arroyo, Cristovam dos Santos Munhos, José Chain e Rafael Chain. Após a benção da urna, na qual foram colocadas cópia desta ata, moedas e jornais do dia, fizeram-se ouvir alguns oradores que discorreram sobre o evento que vem marcar mais uma etapa no desenvolvimento de Tanabi, sendo vivamente felicitados por sua iniciativa os jovens capitães da indústria local. Em seguida lavrou-se a presente ata que vai assinada por todos os presentes. Eu, Sebastião Almeida Oliveira, escrivão ad-hoc, a escrevi e assino: Sebastião Almeida Oliveira, Olavo Lima Guimarães (desembargador do Tribunal de Justiça), Emilio Mallet (Juiz de Direito), Everson Soares Pinto (Promotor de Justiça), Cônego Victor (Pároco local), José Siriani (Prefeito Municipal), Eduardo Ferreira Fontes (Delegado de Polícia), Waldemar Alves da Costa, A. M. Moraes Dias, J. Lambert, João de Mello Macedo, Venizelos Papacosta, Pedro Luz, Maximiano de Oliveira, Renato Catini, Sebastião Arroyo, Cristovam Santos Munhoz, Nuiguel Tomé, Rafael Chain, Antonio dos Santos, Milton José Fontes, Diniz Fracaro, José Francisco de Paulo, Mário de Mattos, Antonio Primo Mazza, Aníbal Menegasso, Manoel Torres, Divino D. Silva, S.A. Fernandes, Flávio Celso Contatore, Irineu Pedro Perez, João Caberlin, José de Mattos, Edmur Rodrigues Alves, José Liebana Torres, Braz Sauro e Jorge Marão.



Instalação solene do 1º Lar Regional do Consórcio Inter-Municipal da Alta Araraquarense no dia 05 de julho de 1959.

         Senhor Presidente, e dignos diretores do Consórcio Inter-Municipal da Alta Araraquarense,
            Senhor Prefeito Municipal de Tanabi,
Digníssimas autoridades e ilustres visitantes,
            Meus Senhores, Minhas Senhoras.

            Na qualidade de sócio fundador e membro da primeira diretoria do “Lar da Criança de Tanabi”, que mais tarde se transformou neste opulento Primeiro Lar Regional, ponto alto das realizações do Consórcio Inter-Municipal da Alta Araraquarense, erguemos nossa humilde voz para congratular-me com a população de Tanabi, e de toda a região circunvizinha, pelo auspicioso evento que hoje se registra, qual a instalação solene desta casa, abrigo e educandário a um só tempo, cuja direção interna foi confiada a dona Maria Bustos Moreno e que já acolhe, nos intra muros de seus edifícios, nada mais, nada menos, que cincoenta meninas, que aí recebem amparo e educação, tornando-se, ipso-fato, no futuro, novas e risonhas esperanças de pátria.
            Olhos volvidos à um passado ainda recente, recordamos e recordar é viver, na linguagem expressiva de Júlio Dantas, aquela manhã radiosa de 04 de julho de 1953, quando vimos aqui, Doutor Argemiro Acayaba de Toledo, aquela figura impoluta de magistrado e de cidadão, que todos admiramos, acolitado pelo não menos abnegado servidor que foi o saudoso José Luz de Freitas e ainda Mário Mendes Ferreira, que tão grande lacuna deixou em nossa terra, além de outros vultos de prol da clã tanabiense, lançar, neste local, a primeira pedra deste edifício, naquela ocasião ainda com a designação modesta de “Lar da Criança de Tanabi”. Nesse momento histórico, que evocamos com saudade, um pensamento fugaz perpassou nossa mente e indagamos, então, se aquela simples cerimônia da colocação de uma inaugural representaria, de verdade, uma realização efetiva, ou teria sua concretização postergada para tempos remotos, ou para as calendas gregas como soe acontecer a empreendimentos tais? O tempo, porém, se encarregou de desmentir prognósticos assim sombrios, porquanto, mudados os timoneiros, outros denodados trabalhadores, já agora comandados por Waldemar Alves da Costa, que dignamente preside esta casa, Venizelos Papacosta, e outros, levaram a bom termo sua tarefa, até que um dia, e já la vão seis longos anos o espírito filosófico de Cândido Brasil Estrela, vulto plutarqueano de boa cepa, com seu dinamismo contagiante, abrigou a luminosa idéia, deu-lhe âmbito regional, e fez nascer o consórcio Inter-Municipal da Alta Araraquarense, idéia luminosa que encontrou guarida, e obteve aprovação irrestrita, de todos os juízes de direito, prefeitos e vereadores da região riopretana, tornando-se, atualmente, a maior e mais completa obra social do país.
            O milagre que aqui vedes concretizados, nas paredes de cal e pedra que compões estas edificações, no conforto que aqui desfrutam as internadas, possibilitado foi só pelo esforço pertinaz da população local, já de si digno de nota por seu caráter pioneiro, como, também, pelo concurso de todas as prefeituras da região, vale dizer com a contribuição de todos os municípios que integram as populações da Alta Araraquarense, esforço de cooperação digno de imitado por todas as comunas de São Paulo e do Brasil.
            Glória, pois, aos idealizadores e continuadores de tão belo tentamen, que já conseguiu, em tão curto lapso de tampo, amparar e conduzir para um sentido de vida mais nobre, milhares de crianças que, sem esse amparo, e sem essa educação, todos o sabem, poderiam tornar-se, amanhã, verdadeiros marginais a povoar prostíbulos e prisões. E que Deus ampare e ilumine esses denodados empreendedores afim de que realizações de caráter assistencial, como esta de Tanabi, da Sede-Triagem de Rio Preto, e o futuro 2º Lar que se projeta em Nhandeára, sejam sementes fecundas a espalhar por toda a parte os frutos da benemerência, o evangelho do amor e as rosas da caridade!



Palestra gravada e irradiada pelos estúdios da ZYM-4 – Rádio Clube de Tanabi aos 9 de julho de 1959.

         Prezados ouvintes da ZYM-4 o meu cordial; boa tarde!
            A população de Tanabi recebeu com justificado júbilo a alvissareira notícia da transação recém efetuada entre o Banco do Estado de São Paulo e a ZYM –4 relativamente à venda do prédio onde até há poucos meses funcionou aquele renomado estabelecimento de crédito e que a emissora local vem de adquirir para nele serem instalados escritórios e estúdio. Situado que está no centro da cidade, sua aquisição pela Rádio Clube de Tanabi representa alto senso de visão de seus diretores e é por isso mesmo que aqui estamos, atendendo gentil convite, para externarmos nossa opinião frente ao microfone desta querida emissora.
            Há trinta e dois anos, quando aqui aportamos pela primeira vez, jovem ainda, Tanabi não passava de vilarejo em formação com sua igrejola de arraial, a decantada cadeinha velha, o tanque, um largo quadrado, com algumas casinholas esparsas, casas comerciais e de residência ao longo da Cel. Militão e outras perlongando ruas transversais. A velha Boiadeira ao lado e alguns “caminhos de cabra”, que estradas não eram, ligando nos á Rio Preto e ao sertão e pelas quais rodavam jardineiras do Feliciano e raros Fordes de bigode. Tudo muito incipiente ainda, e muito retrogrado. Houve quem denominasse Tanabi de “cidade caipira” e, aliás, com muita razão.
            Veio depois às duas revoluções: a de 30 e a de 32. Tanabi despertou de seu letargo; novas edificações foram aparecendo e com elas iniciativas de maior fôlego; administradores mais capacitados surgiram e nos três últimos quatriênios, principalmente, seu progresso se acentuou de maneira notável não obstante haver perdido a hegemonia de capital do sertão quer com o advento de novas comunas como: Votuporanga, Fernandópolis e Jales, quer ainda, por ter a EFA tangenciar seus trilhos pelo divisor das águas dos rios Turvo e Dourados afastando-se, assim, de seu primitivo traçado. Houve, por essa ocasião, Cassandras de mau agouro, que lhe vaticinaram decadência e derrocada, o que, graças a Deus, não se realizou. Nada obstante óbices dessa natureza, e o grande “rush” operado com o deslocamento de sua população, que em grande parte acompanhou as paralelas de aço até Santa Fé do Sul e adjacências, Tanabi cresceu e se adensou e crescendo adquiriu melhoramentos de várias espécies: grupos escolares, escola de comércio, ginásio, escola normal e colégio estadual com milhares de alunos a adquirir instrução eficiente e completa e também ostenta, entre as suas realizações: aeroporto, bancos, hospital, mercado, luz elétrica, água e esgotos, magníficas residências, ruas modernas e bem traçadas, além de modernas rodovias ligando-a às cidades vizinhas e à Capital do Estado. Para se aquilatar o progresso que alcançou basta recordar sua imponente Matriz Santuário, suas belas praças ajardinadas, magnífica estação rodoviária e os últimos edifícios inaugurados como o do Fórum, da Associação Rural, do Banco do Estado, do 1º Lar Regional e da estação ferroviária: Tanabi, além de outras conquistas materiais e espirituais que aos poucos transformam a fisionomia da cidade.

Na região rural onde se desenvolve a exploração agro pecuária, base de sua economia, assinalamos a existência de cerca de dez milhões de cafeeiros, novos fatores que lhe condicionam futuro estável e lisonjeiro.





Palestra proferida ao microfone da ZYM-4, Rádio Clube de Tanabi, ás 12 horas do dia 6 de setembro de 1966, em comemoração á Semana da Pátria, promoção do Lions Clube de Tanabi.


            Caros ouvintes da ZYN-4:
            Convidados que fomos pela Comissão Promotora desta Semana Comemorativa da emancipação nacional, promoção do Lions Clube de Tanabi, aquém agradecemos a generosidade deste convite, para dizer algumas palavras a cerca desse memorável evento, desculpas solicitamos ao nobre auditório pela indigência desta mensagem que sabemos despida de idéias novas ou de novos conceitos que lograssem empolgar, ou mesmo edificar, aqueles que nos honram com sua atenção. Nils novem facies terrae, lá diz o prolóquio latino.
            No pressuposto de que rios de tinta já se consumiram, no lento evolver dos tempos, para descrever, com a roupagem de novas palavras, tudo aquilo que já foi dito sobre os fastos de nossa independência, ocorrida, como sabeis, a sete de setembro de 1822, vale dizer há cento e quarenta e quatro anos precisamente. Nada obstante isso, cremos não ser descabido tecer alguns comentários em torno dessa ocorrência, data lendária que seu substância ao sentido de pátria, caracterizando-a, como ela é, como herança e tradição do passado.
            Não fossem essas comemorações de alto sentido cívico, a serviço da brasilidade e do patriotismo, e nada mais se faria mister falar ou escrever em torno desse tema exuberante que para todos nós tem sentido de perene eternidade. Mas, por isso mesmo, para que se perpetue nas gerações coévas e porvindouras, é que devemos manter sempre acesa a lâmpada votiva de nosso ideal, ao recordar comovidos a passagem de mais uma data que todos nós brasileiros jubilosamente comemoramos.
            Decorridos, portanto, quase século e meio da epopíea emancipadora, que teve Piratininga por cenário, eis-nos a recordar maravilhados o gesto imortal de um príncipe impetuoso e intimorato a derribar, com seu grito eloqüente: “Independência o Morte!”, grito que até hoje reboa pelos quadrantes da pátria, as muralhas opressoras que régulos de além mar teimavam edificar e manter nesta jovem nação fadada a grandes destinos no concerto dos povos livres. E foi esse gesto redentor de Pedro I que legou ao Brasil a predestinação de pátria no caminho da liberdade e da soberania que até hoje persiste uma e indissolúvel.
            Ao evocarmos a passagem gloriosa dessa fecunda etapa de nossa história, que fez o colosso sul americano gravitar confiante na órbita das maiores constelações políticas do mundo atual, saudemos efusivamente os heróis imortais da independência: José Bonifácio, Clemente Pereira, Gonçalves Ledo e tantos outros, vultos exponenciais que nos legaram o Brasil uno e monolítico, fadado, por isso mesmo, a grandes cometimentos no futuro. E agora, quando o povo brasileiro.


Cancioneiro Tanabiense


            É bem provável que as quadras populares, adiante expostas, não sejam privativas da área geográfica tanabiense, dado que, muitas delas, são encontradiças em vários pontos do território nacional e nesse caráter já se acham incorporadas ao nosso folclore; nada impede até que alhures figurem em livros, escritas por algum porta consagrado ou anônimo, portanto sem cunho algum de originalidade, mas o que podemos afirmar, sem receio de contestação, é que todas elas foram por nós colhidas no município paulista de Tanabi, na região da Alta Araraquarense, bebidas na tradição oral num convívio freqüente de vinte anos. Flores agrestes de nossa literatura, não tem elas as lantejoulas brilhantes das canções estilizadas que andam, repetidas de boca em boca, em povos de cultura milenar, provenham, embora, bastas vezes, de remotas origens lusitanas, mas não, contudo, lídimos cantares da gente humilde, compondo, em sua ingenuidade, um dos mais perfeitos mosaicos de nossa mitografia e é nesse caráter, como poesia espontânea e fonte de sentimento popular que vão aqui arroladas.
             A primeira parte do Cancioneiro traduz expressões de cunho romântico e amoroso, ao passo que, na segunda, registramos cantigas de escârneo e burla, eivadas de sadio humorismo e pandas de malícia; canções a um tempo jogralescas e sensatas ressumbram desabafos de quem sofreu ingratidões ou desenganos e, através de comparações e cotejos, que vão até ao insulto, entremostram estados de alma diversos por meio de imagens raras e perfeitas.
            Tem o folclore, palavra inventada pelo insulano William John Thoms, por escopo e finalidade estudar os mitos, lendas e canções populares, ou, melhor, no original inglês: Folklore, in fact, is the traditional culture of the folh, whether it is to be seen in the fields of philosophy, religion, science, and medicine, in social organization and cerimonial, in the more strictly intelectual regions of unwritten history, poetry, and literature, or in the tradicional arts and crafs handen on fron one generation to another. O material mais comum, e quiça mais agradável ao pesquisador é constituído por versos e cantigas repassadas de ternura e ingenuidade que são como o substractum anímico do povo e contém recordações da infância sendo, por outro lado, elementos fixadores da tradição.
            Dizem, os escritores, que os poetas da Provença se inspiravam outrora nas cantilenas do povo. Vamos, pois, beber inspiração na ternura lírica e romântica de nossos bardos e menestréis anônimos. Pois são elas, no dizer de Olegário Mariano,

Trovadores que o mesmo gênio inspira,
Ao luar amoroso dos sertões,
Tangem, num ritmo igual à mesma lira,
Cantam na mesma voz iguais canções.






Cancioneiro Tanabiense



1- Quando ela pisa na areia
A areia muda de cor,
Fica o terreiro cheiroso
Todo coberto de flor.

2- Quando a morena se deita
Na mata para dormir,
Todos os galhos se curvam
Para seu cheiro sentir.

3- A pombinha com o pé n’água
Pode estar quarenta dias,
Um amor longe do outro
Não pode estar nem um dia.

4- Alecrim verde arrancado
Dura só quarenta dias,
Um amor longe do outro
Não pode estar nem um dia.

5- Água apanhada no jarro
Joga-se ao chão mas não corre,
Este amor que já foi meu
Passa trabalho e não morre.

6- Atirei um limão verde
Lá no fundo de Belém,
Deu n cravo, deu na rosa,
Deu no peito de meu bem.

7- Cravo branco na janela
É sinal de casamento,
Menina tira esse cravo
Que não chegou o teu tempo.

8- Se vires a garça branca
Por cima do mar voando,
Serão as minhas saudades
Que aos poucos me vão deixando.

9- Dizem que a viola chora,
Esse é um falar errado:
A viola anda cantando
Eu é que tenho chorado.

10-  Vou mandar fazer uma casa
De vinte e cinco janelas,
Para prender a saudade
Que já não posso com ela.

11-  Meu galhinho de alecrim
Rouxinol de laranjeira,
Não há dinheiro que pague
Beijo de moça solteira.

12-  Da laranja eu quero um gomo
Quero da lima um pedaço,
Da tua boca, um beijo,
De teu corpo, um abraço.

13-  Dentro de meu peito trago
Um cravo chita dourado,
Por ninguém inda chorei,
Por você tenho chorado.

14-  Lá vai a garça voando
Co’as penas que Deus lhe deu,
Contando pena por pena
Mais penas padeço eu.

15-  O anel que tu me destes
Era de vidro e se quebrou,
O amor que tu me tinhas
Era pouco e se acabou.

16-  Eu não durmo a noite inteira
Até cantar a cauan,
Quando penso em ti morena
Julgo que a noite é manhã.

17-  Viola, minha viola,
Vamos no campo chorar,
Você sabe e não me conta
Onde meu amor está.

18-  Sonhei que o fogo gelava
E que a branca neve ardia,
E por sonhar impossíveis
Sonhei que tu me querias.

19- Os teus olhos são de fogo
Ardem mais do que um tição,
Devoram como um roçado
O meu pobre coração

20- Tenho um lencinho branco
Bordado nas quatro pontas,
Foi dado por meu benzinho
Que de mim já não faz conta.

21- Si esta rua fosse minha
Eu mandava ladrilhar,
Com pedrinhas de diamante
Para meu bem passear.

22- No alto daquele morro
Tem uma fita voando;
Não é fita, não é nada,
É meu bem que anda penando.

23- Menina, minha menina,
Minha flor de melancia;
Um beijo da tua boca
Me sustenta todo o dia.

24- Palavra fora da boca
É pedra fora da mão,
Tu tens me dito palavras
De cortar o coração.

25- Laranjeira pequenina
Carregadinha de flor,
Eu também sou pequenina
Carregadinha de amor.

26- Quero bem o pé de rosa
Por ter as folhas embaixo;
Quanto mais eu te namoro
Mais bonitinha te acho.

27- A folha da malva é doce
Mas amarga na raiz,
Você diz que não me quer
Isso me torna infeliz.



28- No alto daquele morro
Passam bois, passam boiadas;
Também passam moreninhas
De cabelos cacheados.

29- Quem quiser moça bonita
Vai na casa de capim,
Casa de tijolos tem
Mas não é bonita assim.

30- A folha da bananeira
De tão verde amarelou,
A boca de meu benzinho
De tão doce açucarou.

31- Pássaro de peito largo
Na escura moita cantou,
Moça solteira que casa
Tempo bom já se acabou

32- Cavei a terra na leira
Para plantar alecrim,
Alecrim nasce pra moças
Teu amor nasceu pra mim.

33- Lá do céu caiu um cravo
De tão alto desfolhou
Si quiser casar comigo
Fale com quem me criou.

34- Nesta rua tem um bosque
Que se chama solidão,
Dentro dele mora um anjo
Que roubou meu coração.

35- Que quer dizer ramos verdes
Brotando numa queimada?
–Significa olhos pretos
De sobrancelhas cerradas. 

36- Canta, canta canarinho,
Não cantes fora de hora;
Vem aí a luz do dia
Coitado de quem namora.



37- Os galos já estão cantando
Vem o dia amanhecendo,
Já está chegando a hora
De quem ama ir padecendo.

38- Em cima daquele morro
Vejo perdizes piando,
Uma por me ver tão triste
Outra por me ver chorando.

39- Trem de ferro quando passa
Vai rebocando vagões,
Só não há trem que reboque
As cargas dos corações.

40- As estrelas do céu correm
Eu também quero correr,
Vão elas atrás da lua
Eu atrás do bem querer.

41- O meu amor não é esse
Nem aquele que aí vem,
Meu amor anda de branco
Não parece com ninguém

42- As folhas do mato caem
Procurando seu assento,
Eu também estou procurando
Em teu amor o contento.

43- Eu bati em tua porta
Correstes logo ao batente,
Quando quer o coração
Cabe nele muita gente.

44- Quem ama não pensa em nada
Quem quer bem não considera;
Amar é coisa medonha,
Querer bem é uma miséria.

45- Trago assim a minha vida
A carregar minha cruz,
Ando atrás de ti morena
Como a sombra atrás da luz.



46- Cresce tanto a trepadeira
Que a janela já alcançou,
Cresceu tanto nosso amor
Que o juízo me tomou.

47- Atirei um limão verde
Na porta da sacristia,
Deu no cravo, deu na rosa,
Deu naquela que eu queria.

48- Eu não canto por cantar
Nem por ser bom cantador,
Canto é só para espalhar
Minhas penas, minha dor.

49- Eu de cá, você de lá,
Ribeirão passa no meio;
Quando aqui dou um suspiro
Você dá suspiro e meio.

50- Moreninha tu és bela
Tens a beleza das flores,
Por isso é que te dedico,
Moreninha, meus amores.

51- Quando vem o sol saindo
Vai deixando luz atrás,
Deixando moça bonita
Para mim que sou rapaz.

52- Eu queria, ela queria
Eu pedia, ela negava;
Eu chegava, ela fugia,
Eu fugia, ela chorava

53- A rolinha quando voa
Deixa as penas pelo ninho,
Sinhazinha quando dorme
Tem sono de passarinho.

54- Cada vez que eu considero
Que você vai me deixar,
Foge-me o sangue das veias
E o coração do lugar.



55- Açucena quando nasce
Deita rama pelo chão,
Assim cresce meu amor
Dentro de meu coração.

56- Menina, minha menina,
Minha flor de Cananéa;
Menina, vives no mundo
Para ser minha “tetéia”.

57- Vou me embora para o mar
Fazer vida com os peixinhos,
Já que no mundo não acho
Quem goze dos meus carinhos.

58- Você diz que bala mata
Bala não mata ninguém,
Mata quem Deus é servido
Nos braços de quem quer bem.

59- Tanta laranja madura
Tanta lima pelo chão,
Tantos espinhos de agulha
Dentro de meu coração.

60- Machado que corta páu
Não pode cortar raiz,
Coração que ama dois
Nunca pode ser fe1iz.

61- Meu amor me deu um lenço
Com desdem peguei na ponta,
Para que fiquem sabendo
Que de amor não faço conta.

62- Os olhos de meu amor
Parecem céu estrelado,
Na boca: um botão de rosa;
No peito: um botão fechado.

63- Lá vai a garça voando
Leva uma folha no bico;
E quando fores embora,
Meu amor, aqui não fico.



64- O céu coberto de nuvens
Enche tudo de tristeza,
Eu já perdi a esperança
Onde tinha mais firmeza.

65- Rosa branca é criminosa
Da raiz até na ponta,
Eu não sei o que te fiz
Que de mim não fazes conta.

66- Vai cartinha venturosa
Por esse mundo sem fim,
Vai dizer a meu amor
Que não se esqueça de mim .

67- Açucena quando nasce
Toma conta do jardim,
Também estou procurando
Quem tome conta de mim.

68- Água que corre na lage
Garça não pode beber,
Quem tem amor como eu
Outro nunca pode ter.

69- Galho de limão abaixa
Quero apanhar um limão,
Para tirar uma nódoa
Que trago no coração.

70- De que serve um pingo d'água
Quando rola na corrente?
De que serve ter amor,
Querer bem, viver ausente?

71- Alecrim tem vinte folhas
E a roseira dezesseis,
Ou me ames com firmeza
Ou desprezes de uma vez.

72- Você diz que não me quer
Mas um dia hás de querer,
Que a água bate na pedra
Te que a faz embrandecer.



73- Há no alto daquela serra
Dois pilõezinhos de prata,
Pisa um, outro responde,
Teu semblante é que me mata.

74- Só depois que a chuva cai
É que a terra se amolece,
Só depois que o amor se acaba
É que o remorso aparece.

75- Adeus - eu digo chorando,
Adeus - eu torno a dizer;
Quem quer bem nunca se esquece
Em cem anos de viver.

76- Minha viola de pinho
Tem dois canarinhos dentro,
Não pode ter bom juízo
Quem tem vários pensamentos.

77- Lá vem a lua saindo
Com uma santa cruz de prata;
Tua chegada me alegra,
Tua partida me mata.

78- Quem disser que amor não dói
Na cara digo que mente,
Amor deixado por outro
Quem suas dores não sente?

79- Quem disser que bala mata
Bala não mata ninguém,
As balas que mais me mata
São os teus olhos meu bem.

80- As estrelas miudinhas
São companheiras do vento,
Em calado venço tudo
Falarei quando for tempo.

81- Quem quiser moça bonita
Ponha um laço na jurema;
Inda ontem peguei uma
Na carreira, como ema.



82- Chapéu preto, capa branca,
Fita verde, fivelão;
Menina de cor morena
Foi a minha perdição.

83- Eu tenho rosas no peito
Roseiral no coração,
Quando te vejo morena
Tudo se torna em botão.

84- Quem tiver o seu segredo
Não conte a mulher casada,
A mulher conta ao marido
E o marido à namorada.

85- Árvore do amor se planta
No centro do coração,
Só pode derrubar
O golpe da ingratidão.

86- A laranja de madura
Caiu n’água, foi ao fundo;
Triste da moça solteira
Que cai na boca do mundo.

87- Arruda também se muda
Do jardim para o deserto,
Também pode amar de longe
Quem não pode amar de perto.

88- Nadador que vai nadando
Nas águas do mar sagrado;
Nada com Deus, nada é muito;
Nada sem Deus, não e nada.

89- O coração e os olhos
São dois amantes leais,
Quando o coração tem penas
Os olhos deitam sinais.

90- O papel em que te escrevo
Saiu da palma da mão,
A tinta veio dos olhos
A pena do coração.



91- Nunca vi carrapateira
Botar cacho na raiz,
Nunca vi mulher solteira
Ter palavra no que diz.

92- A laranja quando nasce
Faz-se logo redondinha,
Assim tu quando nascestes
Deus te fez para ser minha.

95- As pedras desta calçada
Hei de manda-las vidras,
De pedrinha em pedrinha
Para meu amor passear.

94-Cravo branco na janela
É sinal de casamento,
Menina recolha o cravo
Para casar inda há tempo.

95- Eu não tenho pai nem mãe
Nem quem de mim se condoa,
Eu sou como a seriema
Que tem asas e não voa.

96- Laranjeira pequenina
Carregada de botão,
Eu também sou pequenina
Carregada de paixão.

97- Alecrim verde arrancado
Na tua mão reverdece;
Quem eu quero, não me quer,
Quem me quer, não me merece.

98- As estrelas miudinhas
Eu conto de uma em uma,
Sou dizimeiro de moças
Quem tiver três me dá uma.

99- O sol prometeu à lua
Uma fita de mil cores,
Quando o sol promete à lua
Que fará quem tem amores. 


Termos e vocábulos de uso correntio em Tanabi:

Abancar - gozar algo.
Abracar - o mesmo que abraçar.
Ademão ou adjutório - ajuntamento de pessoas trabalhando gratuitamente para outra.
Amarrar-se - o mesmo que contrair casamento.
Arear caçamba - adular, agradar.
Arteiro - fazedor de artes, brincalhão.
Atarantado – confuso, atrapalhado.
Bacuri - filhote de porco.
Baita - agigantado, desmesurado.
Bibóca - grota, barroca; o mesmo que pirambeira.
Bolo - confusão, grupo de coisas.
Boquinha - beijo; bocota, idem.
Bronha - engano.
Bucha- logro, tapeação.
Caçamba - estribo de sola; balde de cisterna.
Cair no mangue - fugir, evadir-se.
Carrascal - quiçassa. Existem outros correlatos: malva, saróba, samambaia, gravenha etc...
Chatear - aborrecer a outrem.
Chuchar - intrometer, empurrar.
Chué - coisa desemxabida, que não tem graça.
Coleado - unido, combinado, mancomunado.
Curioso - pessoa que sabe fazer pequenos trabalhos que demandam inteligência e paciência.
Desengonçado - desageitado; que não tem aprumo.
Descabeçado - desajuizado, doudivanas.
Embicar- encaminhar, encarreirar negócio etc...
Entuchar - encher, abarrotar.
Esbodegado – esbaforido, estropeado.
Escachado - relaxado no traje.
Estropeado - cansado; o mesmo que esbodegado.
Estrumela - traste sem valor, ninharia.
Fusquinha - desafio, incitamento.
Giráu - prateleira rústica.
Gramar - suportar, arcar com as despesas.
Gravenha - espinhadeiro, quiçassa.
Grude - alimentos; pegar o grude - almoçar.
Lacear - ceder aos poucos, desistir.
Ladrão - rêgo que tira água do veio principal.
Lambança - vagabundagem.
Latir atôa - falar a esmo, palrar.
Mal-feito - feitiço.
Matar defunto - contar novidade já conhecida.
Negacear - ação do animal que se volta inopinadamente.
Osso - coisa que não dá lucro; pinóia.
Pintaiva - excacez de dinheiro; pessoa sem eira nem beira.
Querência - lugar habitual onde o gado repousa.
Relance - na expressão: “Aguentar o relance” isto é, resistir, suportar etc...
Samóra - pessoa sem expediente, abobalhada.
Saparia - gente que vai a festas sem convite.
Selente - vagaroso, silencioso.
Sepurtar - aturar conversa enfadonha; suportar.
Sururú - briga, chinfrim, conflito.
Táca - nome que dão ao rabo-de-tatu; rebenque.
Tapera - individuo bronco.
Tiquinho - coisa de nonada; um quase nada.
Tirar linha - namorar.
Tirázio - extensão longa.
Toupeira - individuo atrasado, de poucas noções.
Tráia - móveis, trem de cozinha.
Tramela – taramela.
Trebuzana - tempestade, rumor forte.
Varado de fome - esfomeado, faminto.
Ver o russo - passar trabalhos, sofrer algo.
Zanzar - andar atôa, vadiar. Correlatos: sambar, descontar cheque.


Provérbios correntios em Tanabi:

01. É mais fácil chegar um burro ao moirão, que um homem à razão.
02. Barco parado não ganha frete.
03. Macaco velho não põe a mão em cumbuca que tem formiga.
04.. Urubu campeiro não tem morada.
05. Cabaça quebrada não dá cuia.
06. Papagaio velho não aprende a falar.
07. Onça não come lobo.
08. O que desabusa angú é quiabo.
09 .Não é preciso madrugar para encontrar o diabo.
10. Em terra de cegos quem tem um olho é rei.
11. Em terra de papudos, que não tem papo é defeituoso.
12. Antes pingar do que secar.
13. Conversa sem proveito, dóe no peito.
14. O que é pouco não se regra, quando acabar sossega.
15. Quanto mais rico, mais ridico.

Termos e vocábulos usuais em Tanabi.

Abrir o pala - fugir.
Assustado - festinha improvisada.
Afocinhar - cair no solo bruscamente.
Água-que-gato não bebe - aguardente.
Assuan -ou suan, espinha dorsal do suino, de Schwein, além.
Bolada - dinheiro em pacote, muito dinheiro.
Burrada - empresa mal sucedida; negócio mal feito.
Bufar - ameaçar.
Bucho - estômago.
Bucal - cabresto destinado à doma.
Calote - tapeação, logro, fraude.
Chaleira - adulador.
Chupado - magro, cadavérico.
Chorão - lamuriento, choramingas.
Canja - problema de solução fácil, trivial.
Descunhambado - resolvido, destorcido, desempenado.
Derrear - amolecer, ceder.
Dar corda - entretar namoro ou outra pretensão, alimentar
Dar na mala - embravecer, dar o cavaco.
Doce - o mesmo que açúcar.
Escrofunchar - remecher, virar.
Empachado - cheio, empanzinado.
Enrabixado - amante, apaixonado.
Emprazar - dar prazo.
Engatar - o mesmo que ligar, prender.
Fintar - lograr.
F'ilar - tirar, furtar.
Frege - casa mal frequentada, briga.
Ferrado - cavalo com ferraduras.
Fecha - aperto.
Gamela - bacia de madeira; agrimensor.
Garranchos - escrita desconexa,mal alinhavada.
Gramar - suportar.
Impio - ímpeto, resolução brusca.
Inverno -estação chuvosa.
Intrometido - intruso.
Instumar - arremeter, instigar.
Ingruvinhado - resequido, crestado.
Jagunço - guarda-costas, matador profissional.
Jóssa - coisa sem valor, sem préstimo.
Judeu - sujeito mau, avarento.
Jururú - triste, nostálgico.
Lambada - chibatada.
Lambido - sem graça.
Lorotas - histórias, invencionices.
Maludo -valente, destemido.
Mal inclinado - de má catadura.
Náfego - animal com uma das pernas encolhidas.
Nagão - revolver de cavalaria.
Nêgo - tratamento afetivo.
Pinchar - jorgar, atirar fóra.
Pagode - sinônimo de festa.
Pachóla - ótimo, vistoso.
Perrengue - adoentado.
Purunga - igabaça.
Quiréras - dinheiro miudo.
Babeira - retaguarda; pegar rabeira: entrar pela traseira de um veículo.
Ressabiado - desconfiado.
Revêsso - torto, empenado.
Remelêcho - coleio, volteio.
Sanfonear - aborrecer, conversa chula sem proveito.
Sabedença - sabedoria em sentido deprimente.
Sabichão - sabido.
Subir na serra - alterar a voz, encolerizar-se.
Sapéca - incorrigivel, irriquleto, brincalhão.
Sabão - reprovação, exprobação, advertência.
Tranca - pessoa desprezivel.
Treta - briga, altercação.
Tortura - cousa torta.
Tempo das zagaias- das calendas gregas, antigo.
Velheira - o mesmo que velharia.
Voação - dissimulação, furto.
Xuputú - disforme, horrendo.
Zanga - aborrecimento, muchocho.
Zebra - parvo, abobado.
Zebroide - o mesmo que zebra.


                                                              Tanabi, 15 de junho de 1932.


SUPERSTIÇÕES DE TANABÍ



1. Para que as plantações de cereais não criem ferrugem, a qual emperra o crescimento vegetativo, costumam os roceiros colocar à altura de um metro ferramentas velhas e bastante enferrujadas, as quais atraem para si toda a ferrugem que atrasa as plantações. Também é usual colocar esqueletos e cabeças de reses espetadas nas cercas afim de imunisar - criações e plantas - das maléficas influências do máu-olhado e são ainda usados trapos e judas de pano esparsos pelas roças afim de afastar pássaros danminhos que atacam as searas.
2. Contra quebranto e mau olhado ajuntar aos rosários e berloques das crianças figas bentas e amuletos.
3. Crêem os caboclos que casal com sete filhos de um só sexo preserva-os de se transformarem em lobis-homem convidando um deles para padrinho do último rebento.
4. Mulher grávida não deve olhar cavalo malhado –pampa, porque, fazendo-o, seu filho nascerá com manchas no corpo; e aquela que, em estado interessante, comer frutas duplas isto é, inconhas, fatalmente terá filhos gêmeos.
5. Deve-se evitar que as crianças andem para trás, porque isso provoca a morte de seu pai.
6. Para se conhecer o segredo de uma pessoa, basta beber-se o resto que a mesma deixou no copo.
7. Para incontinência de urina usam pendurar guiso de cascavel na perna do paciente e quando se trata de retenção aconselha-se chá de cabelo de milho.
8. Sinal de morte próxima são as melhoras súbitas do moribundo.
9. Acreditam os roceiros que o gato possui sete fô1egos, equivalente a sete vidas, razão pela qual custa a morrer. De onde a frase: “Tem fôlego de gato”.
10. Para curar lombrigas nas crianças usam dar raspagem de chifre de boi, torrada e posta em infusão ou chá; também dão sementes de abóbora ou, então, uma colher de óleo
de Santa Maria, três sexta-feiras seguidas.
11. Quando cai uma estrela deve-se pensar três vezes a cousa que se deseja ver realizada e isso acontecerá.
12 .Moça solteira, que se veste de freira, jamais se casara.
13. Quantas malhas contiver o pelo de onça que se tem em casa, tantas serão as infelicidades de seu possuidor.
14. Dizem os caboclos que: “carro que não canta, os bois não puxam com gosto”, isto é, com força.
15. Entre os roceiros o Diabo é conhecido por “Capeta”, “Demo”, “Tinhoso”, “Cabuloso” e “Coisa-Ruim”.
16. Não se deve atirar ao cisco pedaços de pão, visto que com isso se perde a graça divjna e se dá um pontapé na fortuna.
17. Crêem os caboclos que nos terrenos onde ao amanhecer aparecem fumaças, existem minas de ouro; assim também aparentemente poisam fogos de Santelmo, fogo-fátuo que o vulgo apelidou de “Mãe douro” ou “Mãe D’água” em lugares onde existem minéreos, lugares esses que são assombrados.
18. Cortar unhas de recém nascidos pagãos é indício de que estes se transformarão, mais tarde, em lobis-homens.
19. Destruir caixas de marimbondo, de nossa habitação, é destruir nossa felicidade; por isso, não devemos destruir teias de aranha que estão tecendo nossa ventura.
20. Possuir mesa de três pés, em nossa casa, provoca a vinda e manifestação de maus espíritos.
21. Perde-se o medo de defuntos beijando-lhes os pés; ao conduzir um corpo ao cemitério os pés devem ir à frente e não presta atirar mais do que três punhados de terra na sepultura.
22. Não e bom ter ou criar pombos em casa; quanto mais estes aumentam, maior é a ruína do possuidor.
23. Não presta mudar de casa no mês de agosto, dá azar; por esse mesmo motivo não se deve viajar em sexta-feira.
24. Gafanhoto verde, conheci do por “Louva-Deus” pousando em nós trás felicidade e ninho de beija-flôr, construindo em casa, igualmente é bom prenuncio.
25. Para salvar pessoa engasgada, bater três vezes com a mão nas costas do paciente, invocando o nome de São Braz
26. Por ocasião da lua nova, quando o trovão ribomba tronicamente e solene, nossos roceiros proferem seu vaticínio:
“Lua nova trovejada,
              trinta dias na molhada”.
27. E, como medida defensiva contra um ataque inesperado das cobras, a invocação:
            “São Bento, São Bento,
              livrai -nos de todo o bicho peçonhento”.
28. É, também, muito popular o seguinte terceto:
            “Não há sábado sem sól,
              Nem domingo sem missa,
              Ou segunda sem preguiça”.
29. Bregeiros e gratêscos gostam de recitar o:
            “Santa Bárbara, São Jerónimo,
              Quem não tem barba não é homem”.
30. Bons observadores da natureza, predizem o tempo verificando o círculo que se forma em torno ao satélite da Terra e dizem:
            “Círculo perto, chuva longe;
             Círculo longe, chuva perto”.
31. Misto de supersticioso e atemorisado, nosso caboclo cultiva presságios e maus agouros afirmando que “nao presta”:
1. Varrer a casa após o ocaso do s61;
2. Encruzar as mãos com outrem ao cumprimenta-la;
3. Andar para trás, isto é, às recuadas;
4. Contar estrelas, apontando-as com os dedos;
5. Cruzar as mãos sobre a nuca;
6. Matar urubu ou pomba; esta é imagem do Divino;
7. Aparar unhas na sexta-feira santa porque o diabo leva as aparas para o inferno onde estas aguardarão seu possuidor;
8. Mirar-se ao espelho à noite ou ter espelhos partidos em casa.
32. Em compensação, a almejada felicidade entra em sua habitação nas azas vo1úveis do beija-flor, mormente quando este entretece seu ninho dentro de casa.
33. Uivo prolongado de cão significa mau agouro, principa1mente quando este escava o solo: está abrindo a sepultura do dono.
            34. Maus prenúncios: Galo cantar fora-de-hora ou galinha cantar imitando seu companheiro.
35. Para se ter um dia feliz deve-se pisar com o pé direito ao descer do leito.
36. Avisos de visita iminente em nossa casa:  a) O crepitar da chama no fogão; b) zumbido enfadonho de mosca voejando em torno de nossa pessoa; c) encontrar sabugo em pé no terreiro.
37. Visitas cacetes, que entediam, são afastadas abrindo-se as lâminas de tesoura atrás da porta.
38. Obtém salvação aquele que, ao expirar, cinge entre os dedos uma vela acesa.
39. Sinal seguro de que o paciente ganhou o prêmio eterno é o aparecimento de nuvens pandas e negras, ou mesmo chuva pesada, no momento em que alguém expira.
40. Antes de baixar o corpo à sepultura deve-se desatar qualquer ligadura que o prende, porque isso é impecilho para o vôo de sua alma às alturas.
41. Somente os "anjos" - esses adoráveis entes que ainda não atingiram sete anos de idade - somente eles poderão lobrigar as almas dos eleitos, que demandam o céu, quando o seu corpo é entregue à terra-mãe.
42. É defeso atirar mais de três punhados de terra na cova quando se procede à inhumação de alguém.
43. Quantos enterros se acompanhar em vida tantos serão aqueles que nos acompanharão à última morada.
44. Diagnóstico para descobrir moribundos: um copo com água junto ao paciente; agitando-se a água é sinal de morte iminente.
45. Recen-nascido que morre pagão não vai direito o céu, mas faz escala forçada pelo Limbo.
46. Objetos perdidos podem ser encontrados atando-se palha de milho e atirando o nó atrás de qualquer móvel.
47. Muitos recorrem a São Longuinho, patrono dos objetos perdidos, chamando-o três vezes consecutivas.
48. Cometa ou “estrela-de-rabo” tocando a superfície da Terra esta se desfará em escombros imediatamente.
            49. Os eclípses também se tornam malignos emperrando e atrasando as plantações, principalmente as de feijão.
50. Os anos bi sextos são os causadores de grandes cataclismos entre os quais se enumeram: guerras, pestes, desastres e infortúnios.


Ibiporanga

            Trinta quilômetros a nordeste da cidade de Tanabi, no grande imóvel rústico denominado “Cachoeira do Felícios”, sob os auspícios do lavrador Marciano Maciel da Silva, fundou-se, em 1934, o novo patrimônio de Ibiporanga, e levado, por força do decreto 13010, de 24 de outubro de 1942, a foros de distrito de paz com a criação da 2º zona distrital da sede e solenemente instalada, três meses após, isto é, a 24 de janeiro do ano em curso.
            Descendente de João Berto da Companhia, um dos povoadores da fazenda citada, Marciano Maciel da Silva de há muito acalentava o sonho de fundar um povoado em terrenos de sua propriedade, motivado pela distância que a separava de Mirassolândia, Tanabi e Américo de Campos e, principalmente pela circunstância de ser o imóvel atravessado por antiga pista de carros de bois, conhecida por “estrada velha de Rio Preto”, artéria essa que, supomos, ter sido a utilizada pelo então Tenente Taunay em sua memorável jornada dos confins matogrocenses à capital do Império passando por São Francisco de Sales e São José do Rio Preto então simples aldeiota composta de ranchos de sapé e, assim, varando “estrada coberta de densa mataria”. Pela direção tomada, outra não poderia ter sido a rota percorrida pelo ilustra relator da guerra do Paraguai, dado que, em suas “Viagens de outrora”, faz menção de haver transposto o rio Turvo.
            Escolhido o ponto propício á instalação da localidade e incumbido o agrimensor Germano de Robach, a quem fora cometida igual empresa com referência a Cosmorama, de proceder ao levantamento e traçado de ruas e praças, deu este cumprimento ao seu mandado com a entrega do respectivo mapa em 10 de março de 1934. fomos então consulados sobre a escolha de um topônimo condizente à natureza do solo, suas condições de altitude, salubridade e sobretudo à visão panorâmica que lhe era própria. Foi assim que, após havermos submetido o termo composto, Ibiporanga, à autoridade de Plínio Ayrosa, abalizado catedrático de tupi guarani na Universidade de São Paulo, dele obtivemos aprovação plena, por quanto compondo-se, o vocábulo das raízes ibi – terra e poranga – bonita, traduzida, à maravilha, a beleza da paisagem circunjacente, a excelência de seu clima bafejado de virações suaves, a fertilidade de seu solo onde medram culturas variegadas, esse conjunto, em súmula, de fatores estimulantes que, reunidos, determinam a prosperidade de um lugar, mormente sabendo-se que Ibiporanga fora edificada num cômodo de ligeira elevação formado pelo divisor das águas do Varginha e do Cachoeira de onde se descortinam sítios agrestes e modificados pela mão humana.
            Houve, a princípio, alguns recalcitrantes que tentaram aplicar ao lugarejo nescente nomes galhofeiros como Negrinha motejo aos coloured men, seus primeiros habitantes, ou ainda Varginha, recordando o pequeno regato de que falamos e que, a breve distância daí, conduz suas águas em direitura ao rio Preto. Nenhum desses ápodos geográficos logrou vencer o batismo típico de nossa escolha e assim veiu a denominar-se a nova sede vilarenga.
            As ruas do aldeiamento assim formado lembram nomes das nações sul americanas; ruas cortadas em xadrez, tal qual a maioria das localidades brasileiras, tendo ao centro , modesto templo católico feito de tijolos e telhas comuns com o concurso de todos os moradores da zona e sob a invocação da padroeira Nossa Senhora da Aparecida e que recebeu, em 1940, a primeira visita pastoral na pessoa do Bispo Dom Lafayete Libânio. De igual modo foi construído o prédio onde funciona, com boas instalações, uma escola mista urbana regida por professora estadual. Casas comerciais e particulares, cartório, farmácia, máquina de benefício e outros rudimentares requisitos inerentes aos povoados em formação aí se encontram e novos prédios estão sendo construídos ao redigirmos estas nótulas.
            Á nova sede distrital pertencem integralmente a fazenda “Barra Mansa” e parte de suas congêneres Nova, Cachoeira e Jataí tendo as seguintes divisas: “Começam no ribeirão Bonito, na confluência do córrego Jambeiro ou Meio; sobem pelo ribeirão Bonito até a barra do córrego Barro Preto ou Capim pelo qual sobem até sua cabeceira; vão daí em reta à cabeceira do córrego Cambauva, pelo qual descem até sua barra, no ribeirão Cachoeira, donde vão em reta à barra do córrego Malhador, no ribeirão Jataí; por este abaixo até sua barra no rio Preto e pelo veio desde a foz do ribeirão Bonito pelo qual sobem até o ponto de partida”.
            Sua população compõe-se de diferentes etnias predominando, nas cercanias da vila, o elemento italiano e seus descendentes; pelas margens do Malhador e Cachoeira, com infiltrações pela fazenda Nova, habitam ibéricos e sua prole nativa, e nos demais setores, vive o caboclo brasileiro, quase sem mescla, mormente na região da Barra Mansa onde há antigas fazendas abertas pelos primeiros povoadores do sertão tanabiense. Cumpre lembrar aqui que, em 18 de março de 1918, foi doada uma área de dez alqueires de terras naquele local destinada à instalação de um patrimônio do que são atestados vivo, pequena capelinha e cemitério ai construídos.
            Ibiporanga tem ainda rude aspecto, se o encararmos pelo prisma de progresso que vem avassalando as regiões pioneiras do planalto paulista. Embora de evolução lenta, a fertilidade de seu solo e o ânimo empreendedor de sua gente, certamente farão da localidade um núcleo pando de possibilidades cada qual mais favorável aos seus desígnos de prosperidade.

                                                                                              Tanabi, 29 de janeiro de 1943.

Inauguração das novas instalações dos Correios e Telégrafos, em Tanabi, no dia 7 de setembro de 1970           


Exmo. Sr. Dr. Olegário Dantas, D.D Diretor da Regional dos Correios e Telégrafos  de  São  José  do  Rio  Preto.
            Exmas. Autoridades presentes, meus Senhores, minhas Senhoras:
            Aos 28 de fevereiro de 1904, uma comissão de riopretenses composta dos senhores Porfírio, Adolfo Guimarães Corrêa e Frutuoso José de Figueiredo, em representação dirigida ao Administrador dos Correios de São Paulo, pedira a instalação de linhas postais para o Jataí, que a esse tempo não tinha ainda a designação atual – Tanabi. Três anos depois, a 5 de novembro de 1907, a mesma
comissão insistia no pedido, alegando que a localidade já possuía cerca de seis mil habitantes e fazia jus ao melhoramento pretendido. Entretanto, há precisamente meio século, na década de 20, Tanabi viu instalar-se aqui, pela primeira vez, uma agência de correio. Nesses recuados tempos, a correspondência era transportada por  estafetas  a  cavalo  pelas  ínvias  trilhas  da  velha  estrada  Boiadeira.
            Anos mais tarde, esse transporte de malas passou a ser feito pelas jardineiras do intrépido Feliciano Sales Cunha, sonhador e pioneiro, o pioneiro que nos ligou à cidade-mater São José do Rio Preto, às localidades sertanejas e ao Estado de Mato Grosso, via Porto do Taboado. Com seus ônibus ronceiros, verdadeiras traquitanas desconjuntadas, pois nem estradas possuíamos, o transporte de malas e passageiros convertia-se num milagre a repetir-se diuturnamente.  E  assim  se  amansou  o  sertão...
            De conquista em conquista, chegamos à comunicação telefônica e telegráfica que nos pôs em contato imediato com os grandes centros comunitários do país. E assim veio o correio servindo à cidade que lentamente crescia. Antes da atual distribuição de jornais pelas empresas editoras dos grandes matutinos da Capital, nas primeiras horas da manhã, a principal meta do tanabiense era ir ao correio, a repartição mais concorrida da cidade, e era comum ver-se conspícuos fazerem fila para receber correspondência, como, também, como nota pitoresca, era comum vê-los, jornal distendido, pelas ruas centrais da cidade, ainda não invadidas pelo automóvel, a deglutir as últimas notícias que o correio lhe trazia, com 24 horas  e,  a  mais  das  vezes,  com  semanas  de  atraso.            O interessante, porém, é que naquele tempo se lia mais do que na época atual e a importância do sujeito se media pelo número de cartas e jornais que recebia diariamente. Hoje, na era dos televisores, da eletrônica, já ninguém mais lê, ninguém mais cultiva a arte de se corresponder por meio de cartas e a comunicação entre os homens é feita visualmente por aparelhos de transmissão. Infelizmente, o correio  de  hoje  quase  só  nos  entrega  avisos  de  vencimento...
            Entretanto Tanabi se ressentia, nos dias atuais, de correio à altura de seu adiantamento, nada obstante os insistentes apelos da Regional de Rio Preto. Nossa agência postal telegráfica funcionava num pardieiro e tinha o aspecto deprimente de  uma  dessas  agências  de  ínfima  classe  de  uma  corruptela  qualquer.
            Diante disso, a Prefeitura de Tanabi, tendo à frente o Sr. Pedro Ovídio e uma equipe de homens esforçados a assessorá-lo, tomou a iniciativa de construir um prédio funcional, de linhas simples, como este que ora se inaugura. Tanabi agora se orgulha de possuir uma agência à altura de seus  foros  de  cidade  que  se  projeta  para  o  futuro.
            Resta-nos agora a esperança de que a Regional da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, sob a eficiente direção de Olegário Dantas, que tem dotado outros centros iguais a Tanabi de melhoramentos e equipamentos condignos, reserve, também, para esta cidade, melhoramentos condizentes e à altura de seu progresso. É preciso lembrar àqueles que disso conhecimento não tiveram que Tanabi foi a terra-mãe de todo esse rosário de cidades que hoje formam a Alta Araraquarense. Daqui se irradiou o progresso sertão adentro, mas é de justiça também relembrar ter sido ela esquecida na partilha dos benefícios que o Governo distribui para outras comunas, e é para esse ponto que, neste momento, chamo a atenção de todos os que dispõem de uma parcela de poder, quer na região, no Estado ou no País, este país maravilhoso que todos estamos ajudando a construir e a  tornar  vanguardeiro  nas  Américas!


                                                                                              Tanabi, 7 de setembro de 1970.

Folclore Tanabiense

            Desejo de gestante merece o máximo respeito, ordinariamente é satisfeito; por isso, estando uma senhora em estado interessante, manifestou ao marido desejos de comer carne de peixe. Palavras não haviam sido proferidas e já o solícito marido, de vara em punho, acha-se à beira do riacho no santo propósito de obter o desejado. Aí, sabendo ser difícil obter o pescado pelas vias ordinárias, prometeu rezar vinte padre-nossos em louvor de São Benedito, caso conseguisse boa pescaria. Minutos decorridos, enorme traíra fisga-se ao anzol e sua fé no santo milagroso ganha alento, não é que ele estava sendo atendido?... A seguir, dois ou três peixinhos seguem o mesmo caminho, até que, em dado momento, é abalado por forte emoção: a linha retesada transmite ao anzol vigoroso puxão, denunciando caça grossa ou, por outra, magnífico dourado debatia-se, em furiosa luta, espadanando água por todos os lados, na ânsia incontida de livrar-se da armadilha em que caíra. Com sofreguidão de profissional, o pescador recolhe a linha lentamente e já havia mesmo agarrado o belíssimo espécime pelas guelras quando
este, numa incrível rabanada, consegue desvencilhar-se de suas mãos e, mergulhando, desaparece, furioso, no pélago revolto. O pescador, desolado, exclama:  “não  é  à  toa  que  eu  não  tenho  fé  em  negro!...”
                                                                         *  *  *
            Frente à repartição pública, a mulher coberta de andrajos, um filho a tiracolo e, ao redor, crianças maltrapilhas, exangues e aparvalhadas, oferece, indecisa e tímida, a mercadoria que trazia consigo, acrescentando: “É pr'a comprá remédio,  na  farmácia,  mode  tratá  dos  fio...”
            Instado pelo anúncio, o chefe, grave e circunspecto, lançou um olhar de comiseração ao grupo e respondeu com o clássico monossílabo de negativa. Diante da resposta, talvez já esperada, o pequeno cortejo, a inspirar comiseração, põe-se novamente em marcha, preparando-se para novas oferendas e, quiçá, para novas  recusas.
            Cenas da vida que passa...
                                                                                  Tanabi, 21 de janeiro de 1960.


Nova Associação Beneficente em Tanabi

            Sob os auspícios da Comissão Organizadora da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais, tendo à frente a figura dinâmica de Francisco Duarte Azadinho, que sempre se dedicou a fundar e manter obras assistenciais em Tanabi, sendo atual Presidente do Lar das Crianças, realizou-se, a 29 do corrente, no salão nobre do Colégio Estadual e Escola Normal “PE. Fidélis”, concorrida reunião que foi presidida pelo Dr. Nelson de Carvalho Seixas, médico especializado e Delegado da APAE  na  região  centro-sul  do  Brasil.
            Compareceram e tomaram parte na mesa o Dr. Odilon de Almeida Moraes filho, M.M. Juiz de Direito da Comarca; Dr. Marino Passaglini Filho; D.D. Promotor de Justiça; Sr. Sebastião Almeida Oliveira, chefe de Gabinete e representando o Sr. Prefeito Municipal e o Dr. Venizelos Papacosta, Vice Prefeito Municipal, por si e representando  Cônego  Victor  de  Jesus  Herrero,  Vigário  da  Paróquia.
            Abrindo os trabalhos, fez uso da palavra o Sr. Francisco Duarte Azadinho, que expôs aos presentes as finalidades da APAE. A seguir, apresentou os nomes componentes da diretoria provisória da entidade, que foi eleita por aclamação dos presentes, ficando assim constituída: Presidente de Honra, Sr. Pedro Ovídio, Prefeito Municipal; Presidente: Dr. Manoel Torres; Vice-Presidente: Dr. Devair Gigante; 1º Secretário: Sta. Neula Zuanazzi; 2º Secretário: Nelson Aguera Garcia; 1º  Tesoureiro:  Akila  Nissida  e  2º  Tesoureiro:  Sebastião  Meneguetti.
            Empossada a nova diretoria, e ainda com a palavra, o Sr. Azadinho apresentou o conferencista Dr. Nelson de Carvalho Seixas que, em palavras repassadas de entusiasmo e fé, empolgou o auditório numa exposição clara e fluente das novas teorias sobre o excepcional, a educação e o trato do retardo que, por sua natureza perante a sociedade, maior assistência desta reclama, tendo sido o orador insistentemente aparteado pelos estudantes, sequiosos de informes científicos, apartes que o Dr. Seixas suscitava e respondia com clareza meridiana.
            Ao finalizar, concitou a população tanabiense a vencer mais este desafio: cerrar fileiras em torno da novel associação beneficiente, que reclama o concurso de todos para se implantar em nosso meio. Para encerrar, foram exibidos magníficos slides da APAE regional e um belo filme italiano que sobremodo sensibilizou  os  presentes  por  seu  fundo  social  e  educativo.

                                                                       Tanabi, 01 de maio de 1970.

Marciano Maciel da Silva – O patriarca de Ibiporanga

Descendente direto do tronco dos Felícios e dos Maciéis, ligados ao posseiro João Berto da Companhia que, em conjunto, povoaram o grande imóvel rústico Cachoeira dos Felícios, Marciano Maciel da Silva, cidadão exemplar e progressista, tornou-se, mercê de seu trabalho profícuo, abastado fazendeiro, possuindo, por herança e aquisição, uma propriedade rural que abrangia cem alqueires de terras onde atualmente se acha ereta a localidade de Ibiporanga, imóvel esse que era servido pela velha pista de gado que provinha da Barra Mansa e Águas Paradas e se dirigia para o então único centro civilizatório e povoado: José do Rio Preto.
            Foi aí, num cômodo de ligeira elevação, que separa as águas do córrego Varginha e do Ribeirão Cachoeira, que Marciano Maciel da Silva decidiu fundar um povoado, idéia que se concretizou aos 10 de março de 1934 com o auxílio de moradores do local, sendo o patrimônio batizado com o expressivo topônimo “Ibiporanga”, a significar “terra bonita” e que, no decorrer do tempo, aos poucos se urbanizou com a construção de uma centena de casas de alvenaria, belo templo católico, jardim público, grupo escolar, com suas ruas e praças iluminadas e lâmpadas  de  mercúrio,  tudo  a  indicar  uma  localidade  em  franco  progresso.
            Além de fundador da povoação, Marciano Maciel da Silva doou espontaneamente áreas para edificação de uma Capela sob a invocação de Nossa Senhora da Aparecida, que se tornou padroeira do lugar, e ainda para a ereção do cemitério local e do prédio onde hoje se assenta o atual Grupo Escolar; foi, sem nenhum  favor,  um  batalhador  incansável  para  o  progresso  de  Ibiporanga.
            Seus progenitores foram Felício Batista de Almeida e Emília Eduarda da Conceição, naturais de Ribeirão Preto, onde residiam e onde também nasceu nosso perfilado. Estes, com o decurso do tempo, venderam suas posses ao Cel. Francisco Schimitd e se transferiram, com armas e bagagens, para o sertão de Rio Preto, mais precisamente para a fazenda Cachoeira que, então, ficou conhecida por “Cachoeira dos Felícios”, tornando-se, ipso facto, pioneiros da região da gleba municipal tanabiense. Com o falecimento de seus pais, Marciano Maciel da Silva tornou-se proprietário de extensas glebas no ribeirão Cachoeira, tendo por limites o rio Preto e a Barra Mansa, local onde hoje se encontra a localidade de Ibiporanga. Casou-se em Monte Aprazível, com dona Juliana Maria de Jesus, sendo esta filha de Francisco de Paula Ribeiro e Maria das Dores de Jesus. Marciano Maciel da Silva faleceu em 19 de março de 1953 e sua esposa no ano de 1971, ambos no município  de  Floreal,  SP.
            Desse consórcio teve o casal 13 filhos, que vão aqui relacionados: Emilia Marciano Barreto, casada com José Alves Barreto e ambos já falecidos; João Marciano Filho, casado com Maria Sebastiana de Jesus, também já falecidos; Francisco Marciano da Silva e Gertudes Juliana da Silveira, residentes em Cosmorama; Euflozina Marciano Barreto, casada com José Marciano Barreto, residentes em Valentim Gentil; Maria Marciano Barreto, casada com Jorge Marciano Barreto, ele já falecido e ela residente em Monte Aprazível; Jerónima Marciana da Costa, casada com Otílio Vieira da Costa, residentes em Tanabi; Benedita Marciana Biscassi, já falecida, casada que foi com Guerino Biscassi e residente em Santa Clara do Sul; Ana Marcelina Faustino, casada com Urias Bernardo Faustino, residentes em Santa Fé do Sul; Maria Aparecida da Silveira, casada com Simão José da Silveira, residentes em Tanabi, Helena Marciano, casada com Benedito Maciel da Silva, residentes em Santa Clara do Sul; Felício Marciano da Silva, casado com Lourdes Teodoro da Silva, residentes em Santa Fé do Sul; Antonio Marciano da Silva, casado com Mariana Cecília da Silveira, residentes em Tanabi, e Cassiano Marciano da Silva, casado com Juselina de Paula e  Silva,  residentes  na  Capital.

                                                                                              Tanabi, 20 de outubro de 1977.


* A Escola Estadual de 1º Grau de Ibiporanga passou a denominar-se
“Marciano Maciel da Silva” através do Projeto de Lei 528, de 1977,
na data de, 22 de novembro de 1977. Dep. Wadih Helú (Dep. Estadual).



Frederico Rincão Álvares – Bairro Rincão

            Natural de Jaboticabal, Estado de São Paulo, Frederico Rincão Álvares, fundador da localidade de Rincão, na interlândia municipal tanabiense, filho de João Rincão e de dona Maria Álvares, casou-se, em Tabapuã, SP, com dona Manuela Navarro Flores, tendo o casal seis filhos: Giné (falecido), Antônia, Lourdes, Antônio, Erasmo  e  Jaime.
            Faleceu nesta cidade aos 29 de junho de 1960, com a idade de 60 anos.
            Em 1947, seu pai, João Rincão, adquiriu uma gleba de 158 alqueires de terras na fazenda Nova ou Ribeirão Bonito, município de Tanabi, no espigão divisor do grande imóvel rústico Cachoeira dos Felícios, por onde passava uma linha de ônibus em direção à sede do município de Américo de Campos, terras que doou a seus filhos; neste local, Frederico Rincão Álvares, auxiliado por seus familiares e ainda pelos moradores das cercanias, fundou o povoado de Rincão, sob a invocação de São Sebastião, aos 20 de janeiro de 1948. Atualmente, Rincão é florescente localidade do oeste paulista, possuindo: igreja matriz, escola de 1º grau, vários estabelecimentos comerciais e magnífica praça ajardinada na administração Alberto  Víctolo.
            Homem honesto e trabalhador, ainda que de apoucada instrução, Frederico Rincão Álvares merece, sob todos os pontos de vista, ter seu nome perpetuado na escola estadual de 1º grau que há vários decênios aí funcionava a ministrar instrução primária a centenas de alunos da localidade e cercanias.

                                                                                  Tanabi, 30 de janeiro de 1978
                                   Atualmente a escola do bairro denomina-se Frederico Rincão.

Santa Casa de Misericórdia de Tanabi


            A Santa Casa de Misericórdia de Tanabi foi idealizada e fundada sob os auspícios do Dr. Newton José Cucolichio e um grupo de aderentes que deram cobertura à idéia, aos 10 de agosto de 1975, com aprovação de seus Estatutos próprios devidamente inscritos no Cartório do Registro Civil da comarca de Tanabi.
            A Mesa Administrativa da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Tanabi, eleita em 13 de agosto de 1975, é assim composta: Provedora – Dra. Elta Lily de Cerqueira Lima e Santana; Vice Provedor – José Alves de Magalhães; 1º Secretário – Sebastião Almeida Oliveira; 2º Secretário – João Batista Furquim Lambert; 1º Tesoureiro – Henrique Alves; 2º Tesoureiro – Diego Carmona Garcia;
Conselho Consultivo: Presidente – Dr. Waldemar Alves da Costa; Secretário
Dr. Odilon de Almeida Morais Filho; Membros: Dr. João Batista de Toledo Leme,
Dr. Arnaldo de Carvalho Machado, Dra. Verônica Cesar Saraiva. Diretor Clínico
Dr. Newton  José  Cucolichio.
            A Santa Casa de Misericórdia de Tanabi já está em pleno funcionamento, em prédio próprio, na Praça da Bandeira, 128, com modernas instalações hospitalares, tendo já celebrado convênio com o IAMSPE e, em andamento, convênios  com  o  FUNRURAL,  INPS  etc.
            Pela Lei Municipal nº 679/77, de 08 de setembro de 1977, a Prefeitura Municipal de Tanabi declarou de utilidade pública a Santa Casa de Misericórdia de Tanabi, em virtude dos relevantes serviços médico – hospitalares que esta vem prestando  à  população  da  cidade  e  do  município,  desde  a  sua  fundação.

                                                                       Tanabi, 24 de outubro de 1977



Dados Biográficos da Escola de Comércio
(Atual Escola de 1º e 2º graus “João de Mello Macedo”)

            “Parece-nos que foi ontem... E, no entanto, cerca de nove anos alígeros passaram, voando nas asas subtis do tempo”, palavras do erudito Ariovaldo Corrêa em seu opúsculo “A Caminhada é melhor do que o pouso,” conferência proferida ao ser homenageado pelo corpo docente e discente do estabelecimento, nove anos depois de fundado. E as palavras que intitulam essa conferência, colheu-as o autor relendo a imortal obra de Miguel de Cervantes, em sua obra mundialmente famosa - “Don Quixote de La Mancha”. E prossegue o orador: “Um jovem contador, José de Oliveira Rosa, em fins de 1950, procurou-nos, em Mirassol, na sede da Inspetoria de Ensino Comercial. Era portador de uma carta de apresentação de João de Mello Macedo, que desejava fundar uma escola de comércio em Tanabi. Convidava-nos, Mello Macedo, a colaborar, no sentido de que pudesse alcançar o seu objetivo e a poética cidade, banhada pelo pitoresco “rio das borboletas,” viesse a ter um estabelecimento de ensino especializado para a formação de técnicos em contabilidade. Os deveres do cargo impeliam-nos a auxiliar a iniciativa, mas, ao nível dos deveres do cargo, empurrava-nos a encarar com especial carinho a idéia venturada, a afeição que a tantos e tão longos anos já, na época, nos ligava a Mello Macedo, que nos ensinou a admirar esta terra e admirar esta gente, por qual ele tem vivido,  tem  lutado,  e  tem  sonhado  os  seus  mais  belos  sonhos”.
            E prosseguiu linhas adiante: “Em 1954, formavam-se os primeiros auxiliares de escritório. Três anos depois, Tanabi aplaudia a formação de seus primeiros técnicos em contabilidade. Releva notar que este curso foi autorizado pela  Lei  nº  1076 , de  1950”.
            Em carta firmada aos 27 de outubro de 1986, o educador José de Oliveira Rosa afirmou-nos categoricamente que a verificação prévia da Escola, foi pedida em 24 de agosto de 1950, mas o reconhecimento oficial só se operou aos 05 de novembro de 1980, pela Portaria CEI publicada do Diário Oficial, sendo nomeado Inspetor Federal o mesmo Ariovaldo Corrêa, advogado residente em Mirassol.
             É o seguinte, o quadro de diretores da Escola a partir de sua fundação:    1º - Prof. José de Oliveira Rosa, educador, hoje aposentado, residente em São  José  do  Rio  Preto,  à  rua  São  Paulo,  nº  1988;
            2º - D. Maria de Lourdes Veiga Contatore, esposa do Sr. José Contatore, atualmente aposentada, residente na Praça João de Mello Macedo, 38, em Tanabi;
            3º - Manoel Liebana Torres, advogado, residente em São José do Rio Preto,  rua  Del.  Pinto  de  Toledo,  2573.
            4º - Agnaldo Peixoto dos Santos, educador, atualmente residente em São José  do  Rio  Preto;  período  de  11/8/1970  a  05/08/86.
            5º - A Sra. Regina Célia Elias Colombo exerce o cargo de secretária da Escola a partir de 17 de dezembro de 1972, permanecendo atualmente no exercício do  referido  cargo.
            6º - A Professora Waldira Antonia de Jesus, educadora residente à rua Cel. Militão,  nº 972,  em  Tanabi,  a  partir  de  05/8/1986  e  em  exercício.

            Inspetores Federais que supervisionaram a Escola desde sua fundação:

            1º - Dr. Ariovaldo Corrêa, advogado e educador, residente em Mirassol, SP, à  rua  Barão  do  Rio  Branco,  495,  período  até 06/11/1960.
            2º - João Carbelin, Inspetor Federal, no período de 07/11/1960 a 01/3/1962.
            3º - Antônio Laprano , Inspetor Federal, de 02/3/1962 a 25/3/1973.
            4º - Sérgio Pires de Andrade, Inspetor Federal do Ensino Médio, de 26/3/1973  a  14/11/1975.
            5º - Professor Jair de Campos, Supervisor de Ensino no período de 15/11/1975  a  21/3/1977.
            6º - Esmeralda de Góis Homa, Supervisora Pedagógica, período de 22/3/1977  a  26/5/1981.
            7º - Eliseu Musko, Supervisor Pedagógico, período de 27/5/1981 a 18/12/1982.
            8º - Professora Odete C. Pinhati, Supervisora Pedagógica Substituta, 19/12/1982 a 21/11/1983.
            9º - Professora Waldira Antônia de Jesus, Supervisora de Ensino em Tanabi,  no  período  de  22/11/1983  a  04/8/1986.

            A partir do início, a Escola funcionou no prédio adrede construído pela Cia. de Melhoramentos de Tanabi; cujo prédio mais tarde foram destacados salão nobre e, mais anexos, destinados à Câmara Municipal de Tanabi, onde, desde então, até os  dias  em  curso  funciona.
            Por lei Municipal nº 921, referendada pela Câmara Municipal, em data de 09/6/1986, conforme ata que a seguir vai transcrita, foi criada, com elementos destacados da comunidade, a Fundação Educacional de Tanabi, que entreoutras finalidades se propõe a manter e difundir o ensino comercial e criar cursos de computação e outros, cuja diretoria, eleita aos 22 de abril de 1986, está assim composta:
            Diretoria Executiva: Presidente: Petronilho Corrêa; Vice Presidente: Prof. Nivaldo Lúcio Mazza; 1º Secretário: Bel. Godofredo Froner; 2º Secretário: Antônio de Paula Inácio; 1º Tesoureiro: Dr. Miguel Ernandes Filho; 2º Tesoureiro: Aristides Fabri  e  Vogal:  Prof.  João  Mazza.
            Conselho Fiscal: Dr. João Soler Haro; Engº Jorge Nassar Frange Filho e Antônio  Francisco  Colin.
            Conselho de Curadores: Representantes do Poder Executivo: Professora Magaly Garcia de Carvalho e Bel. Godofredo Froner. Representantes do Poder Legislativo:  Engº  Jorge  Nassar  Frange  Filho  e  Samuel  Garcia  Salomão.
            Representantes do Magistério Público: Waldira Antonia de Jesus e Prof. João  Mazza.
            Pela Associação Comercial e Industrial de Tanabi: João Massis Tomé e Aristides  Fabri.
            Pelo Lions Clube de Tanabi: Prof. Nivaldo Lúcio Mazza e Dr. João Soler Haro.
            Pelo Sindicato Rural dos Trabalhadores Rurais de Tanabi: Antônio de Paula  Inácio  e  Dorvalino  Pontes.
            Pela Loja Maçônica “Fé e Amor,” nº 42, de Tanabi: Dr. Miguel Ernandes Filho  e  Petronilho  Corrêa.
            Pelo Sindicato Rural de Tanabi: Antônio Francisco Colin e Adauto da Silva Pinhel.
            Transcrição de Ata: Ata da 16º sessão extraordinária da Câmara Municipal de Tanabi, em 09 de junho de 1986:-  Aos nove dias do mês de junho de 1986, às 9 horas, no prédio da Câmara Municipal de Tanabi, por convocação do Sr. Presidente deu-se a 16a sessão extraordinária da edilidade, tendo o Sr. Presidente e vereador Samuel Garcia Salomão, como 1º Secretário o vereador Antônio Cáprio e como 2º Secretário o Vereador Florindo Galvani. Iniciando-se a chamada dos senhores vereadores, foi verificada à ausência dos vereadores Moacir Martins Vasconcelos e Atílio Zanetoni, diante do que o Sr. Presidente declarou aberta a sessão, informando a todos que a mesma seria para referendação do Estatuto da Fundação Educacional de Tanabi, e franqueou a palavra ao plenário, que entrou em discussão. O vereador Jomir Maximiano fez uso da palavra parabenizando a Comissão que elaborou o estatuto, na pessoa do Sr. Petronilho Corrêa, e  fazendo alguns comentários sobre o Estatuto em artigo por artigo, desejando sucesso na Fundação. Os demais vereadores parabenizaram também todos os integrantes da Comissão pelo bom desempenho com que vem trabalhando para esta Fundação. Ato contínuo o Presidente coloca em discussão o Estatuto da Fundação Educacional de Tanabi, em votação, foram aprovados todos os seus 35 artigos por unanimidade, sendo referendado nesta data. Nada mais havendo a ser tratado.
            Transcrição da Ata: (Armas da República) – Ministério da Educação, tratado o Sr. Presidente agradeceu a presença de todos, declarando encerrada a sessão da qual foi lavrada a ata devida que, após lida, aprovada vai assinada em sua forma legal. Sala das Sessões, em 09 de junho de 1986. (seguem-se três assinaturas  ilegíveis)
            Transcrição de Ata: (Armas da República) – Ministério da Educação e Saúde – Diretoria do Ensino Comercial – Certidão. Em cumprimento ao despacho exarado no requerimento de JOSÉ DE OLIVEIRA ROSA, protocolado neste Ministério sob o número quinhentos e quarenta e oito, de dois de janeiro de mil novecentos e cinqüenta, em que o peticionário solicita seja passado por certidão: a) quem foi o fundador da Escola Técnica de Comércio Visconde de Mauá, de Tanabi, Estado de São Paulo; b) quem é seu proprietário e seu atual diretor, CERTIFICO: a) que a Escola Técnica de Comércio Visconde de Mauá, de Tanabi, foi fundada por JOSÉ DE OLIVEIRA ROSA, continua sendo diretor daquela Escola, da qual é também o proprietário, conforme comprova um atestado passado pela Prefeitura Municipal de Tanabi, em catorze de setembro de cinqüenta e um, e assinado pelo então Prefeito Municipal Ary Terra Sóssio. E, por ser verdade, eu Eunina de Mattos Amaral, Oficial administrativo, cl. “h”, do Ministério da Educação e Saúde, passei e assinei a presente certidão, aos doze de fevereiro de mil novecentos e cinqüenta e três. (sobre estampilhas federais de dez cruzados, 050,300 e 1,50 cruzados, a data: Rio de Janeiro, 12 de fevereiro de 1953 a) Eunina de Mattos Amaral; VISTO Daisy Faria Rocha Costa a) Daizy de Faria Rocha Costa, Chefe de Seção de Prédios e Aparelhamento Escolar. Rasa Cr$ 5,80; Busca Cr$ 4,00; Folha Cr$ 1,00 Educação Cr$  1,50  Total  Cr$ 12,00.



História do “Pe. Fidélis”

            Acompanhando, passo a passo, o desenvolvimento da cidade de Tanabi reivindica-se a criação de um ginásio estadual onde centenas de jovens, portadores de um diploma do curso primário, pudessem, aqui mesmo, continuar seus estudos. E foi assim que, sob os auspícios do então Prefeito Manuel Garcia de Oliveira, de João de Mello Macedo, Jorge Tabachi, Alberto Vendramini, Valentim Alves da Silva, Emílio Arroyo Hernandes e outros abnegados batalhadores pelo progresso local, organizou-se a Cia. Melhoramentos e Educacional de Tanabi, sociedade anônima, a qual encontrou plena ressonância entre os interessados. Como medida preliminar, foi fundado o Ginásio Municipal, sendo logo iniciada a construção do prédio  próprio,  onde  hoje  instalado  o  Colégio  Comercial.
            Assim, em 1944 já funcionava o novo estabelecimento de ensino secundário que abrigava, em seu seio, centenas de alunos, com inspeção prévia e reconhecimento federal para seu funcionamento regular. Tamanha foi a abnegação dos tanabienses, que os próprios professores lecionavam gratuitamente todas as matérias  exigidas.
            Graças aos esforços de seus diretores, o Ginásio foi equiparado pelo Estado  passando  a  denominar-se  Ginásio  “Fernando  Costa”.
            Projeto de autoria dos deputados Sólon da Silva Varginha e Marcílio Murano obteve sanção da Câmara e do Governador Macedo Soares no ano de 1948.
            Transformado em Colégio e já com a denominação de “Padre Fidélis” aos 24 de dezembro de 1957, pela lei nº 4495, foi elevado a Instituto de Educação, pela lei 6876, de 23 de janeiro de 1962. Entretanto, pela lei nº 619, de 4 de janeiro de 1950, era criada a Escola Normal com a designação de Ginásio Estadual e Escola Normal “Fernando Costa”, que viria complementar a educação dos jovens tanabienses. Abstração feita de nomes locais, pois todos contribuíram com seu quinhão de esforços, merece destaque o trabalho desenvolvido pelo deputado Waldyr Rodrigues, autor do projeto, acolitado por Moura Andrade, Conceição Santa Maria, Pe. João Batista de Carvalho, Rubens do Amaral, Sidney Delcides de Ávila e Sólon  Varginha  cujo  projeto;  acolhido  com  encômios  e  ápodos,  foi  aprovado.
            Entretanto, a lei 5692, de 11 de agosto de 1971, autoria de Jarbas Passarinho, derrubou por terra todas as conquistas anteriores e fez prevalecer o 1º e  2º  grau  para  todos  os  níveis  primário  e  secundário.

                                                                                  Tanabi, 13 de maio de 1983


Estrada do Taboado I

                Entre as idéas preconizadas pelo “Imparcial” ao surgir à luz da publicidade sob a orientação segura do preclaro jornalista Carlos Serpa Duarte, idéas essas que fazem parte integrante do programa desse jornal, uma existe que a meu ver precisa e deve ser discutida, agitada e focalizada entre os competentes na matéria e os interessados em geral, para que a mesma se corporifique, tornando-se, um dia, concreta  e  real;  refiro-me  à  Estrada  do  Taboado.

                Já em 1901 o inclito brasileiro Euclydes da Cunha, em “Contrastes e Confrontos”, numa antevisão do progresso maravilhoso que viria implantar-se nesta predestinada e fecunda faixa do território pátrio, entremostrou, em páginas luminares, as vantagens decorrentes dessa Estrada, sugerindo proficientemente as bases e directrizes da mesma que, partindo de Jaboticabal à margem direita do Paraná, fronteira ao Porto do Taboado, mediante uma ponte de 880 metros sobre o grande rio e dahi pelo Valle do Aporé ganharia o divortium aquarim do amazonas e Paraguay, chegando até Cuyabá, quase o centro geométrico da América do Sul. É fácil comprehender-se as várias e múltiplas vantagens que um melhoramento desse vulto virá proporcionar não só ao nosso Estado como a todo Brazil, pela deficiência  actual  de  communicações  com  o  centro  e  fronteiras  do  paiz.

                Sob o ponto de vista estratégico essa Estrada será de importância inconteste e inconfundível, porquanto, tanto nas luctas intestinas como nas prováveis anormalidades das fronteiras, temos necessidades de comunicações rápidas, a fim de se evitar surprezas de uma invasão extrangeira, como a que

levaram a effeito os paraguayos invadindo todo o Estado Matto-grossence até as fronteiras paulistas. Nessa ocasião, si possuíssemos uma estrada trafegável como a  do  Taboado,  a  lucta  com  aquela  nação  não  duraria  cerca  de  um  lustro.

                Uma estrada como a que nos referimos tornaria mais accessível e commoda uma viagem de auto à Capital, viagem essa que actualmente tem o caracter de raid arriscado, dados os impraticáveis trechos existentes em seu percurso. Tornaria intenso o tráfego com os Estados centraes, augmentando assim o intercambio commercial com a permuta recíproca dos seus productos e valores. Sabidos é de todos que a producção bovina de Matto-Grosso, em sua maioria, é adquirida  pelos  paulistas.

                Agora que as linhas aéreas se distendem até La Paz, passando por Três Lagoas, construída que fosse essa Estrada a guiza de roteiro seguro, teríamos, dentro em pouco, os nossos céus riscados pelos céleres pássaros metálicos, visto que essa Estrada viria encurtar em muito os vôos para as planices andinas, tornando-se as cidades, servidas pelo seu trajecto, prováveis pontos de atterisagem.

                Toda a população desta zona deve cerrar fileiras em torno dessa idéa que o Imparcial em boa hora apresentou; todos os habitantes daqui devem se congregar a fim de que uma representação fundamentada seja dirigida ao Congresso para que seja dado prosseguimento ao projecto que dorme em seus annaes, tornando realidade  tangível  o  grande  sonho  euclydiano  no  raiar  deste  século.

Tanaby, 21 de agosto de 1930.

A Estrada do Taboado II

                Quando os colonizadores portugueses, galgando a serra do Mar, atingiram o planalto piratiningano, o vasto território interior habitado por numerosas tribus indígenas era recortado de trilhas primitivas, algumas de considerável extensão, pondo essas tribus em contacto umas com as outras; serviam essas batidas para as calmarias da paz e os percalços da guerra. Haja vista as constantes referências dos nossos historiadores em trilha dos Guaranis, dos tupiniquins etc... Segundo Orville Derby, os bandeirantes, em suas entradas pelo sertão bruto, em busca do refulgente metal, das faiscantes pedrarias ou mesmo para descer peças, seguiam esses caminhos já existentes à guisa de seguros roteiros.

                Esses rudes desbravadores das selvas brasileiras, ávidos de ouro e de glória, seguindo as pegadas do gentio, abriram caminhos, picadas, atalhos e rodeios, estabeleceram pontos colonizadores, berços das cidades actuais, os lineamentos da nacionalidade. “Sem o saber, estavam fazendo o Brasil”, na frase feliz do mais erudito dos pesquisadores do nosso passado, Capistrano de Abreu. Derrubaram o muro das Tordesilhas que passava rente a São Paulo e andaram pelas cristas andinas a tomar posse, em nome dos reis de Portugal, desses dilatados  domínios  que  hoje  integram  nossa  Pátria!

                A primeira bandeira que pisou as terras virgens de Mato Grosso foi a de Antonio Pires de Campos. André Fernandes, Francisco Bueno e outros vão até o Paraguai e o Peru. José de Campos Bicudo também e ainda Pedro Fernandes, Aleixo Leme. Mais tarde, em 1719, Pascoal Moreira Cabral inicia a mineração dos terrenos  auríferos  de  Cuiabá.

                É possível conjecturar que essas bandeiras, em suas arrojadas incursões pelo agreste sertão das províncias centrais, tivessem percorrido ou mesmo transposto trechos da jurisdição tanabiense, porquanto, embora preferissem algumas a via fluvial do Tietê, viajam outras por terra, a fim de conjurar o perigo das sezões  e  maleitas  e  a  deficiência  dos  rudimentares  batelões. Uma provisão do Conselho Ultramarino datada de 02 de agosto de 1748 fixa  o  rio  Paraná  limite  das  circunscrições  de  São  Paulo  e  Mato  Grosso.

                Evolvem os tempos e, no decorrer do século dezenove, o território dos dois Estados limítrofes vai sendo pontilhado, aqui e acolá, de capelas e povoações.

                Assim é que, em 1838, o antigo arraial dos “Trinta Povos” é elevado à categoria de Vila com o nome de Sant’Ana do Paranaíba, próximo ao rio que lhe empresta o nome. João Bernadino de Seixas ergue, em 1852, o primeiro rancho de sapé, origem da actual cidade de Rio Preto. A colônia Militar de Itapura contava, então, cerca de 90 casas, fundada que foi por ocasião da campanha do Paraguai. D. Pedro II aí esteve em pessoa para acompanhar de perto a marcha das operações contra  o  exército  invasor.

                Urge estabelecer meios de comunicações entre essas longínquas povoações. Cabe aqui, pois, recordar que no primeiro quartel do século passado foi aberta uma picada entre os rios Tietê e Mogi Guassú, desde a cidade da Constituição (Piracicaba) até o lugar propício à margem esquerda do Paraná —o Porto do Taboado.

                Em 1835 foi aberta a nova estrada para São Paulo —a estrada do Piquiry, com mais de cem léguas de Cuiabá ao rio Paraná. Aí encontraram os exploradores diversos moradores emigrados de Minas, recentemente estabelecidos nesse dilatado espaço de terra outrora ocupado pelas ordas dos Caiapós. Esses moradores, os irmãos “Garcia Leal”, legaram seu nome à região que ficou então conhecida por “Sertão dos Garcias”; entre eles destacam-se José Garcia Leal e Januário Garcia Leal, o “Corta orelhas”.

                Vejamos como José Antonio Pimenta Bueno, ilustre presidente de Mato Grosso, relata o estabelecimento do caminho do Piquiry, em relatório que a 1º de março de 1838 dirigia á Assembléia Provincial daquele Estado : “ A nova estrada entre esta e a província de São Paulo recebe o não pequeno impulso; no extremo que toca a esta Capital acha-se aberta na distância de mais de 40 léguas, paralela a antiga vereda que é de nenhum prestar no tempo das águas, à esquerda della, por cima da Serra até o Rio São Lourenço; lugar em que desce-a, e continua pelas abas do mesmo, terreno alto, que oferece toda a facilidade desejada para o trânsito de carros, superior a extensíssima inundação do Paraguai e seus afluentes. Seguindo desta Capitania pelo engenho de Joaquim José de Sampaio, atravessa o São Lourenço 10 ou 12 léguas acima da antiga passagem, corta o Piquiry já dividido em 9 ramos; elle chega à vista do rio corrente perto do destacamento e aldeia do Piquiry; resta abri-la, na distância de 15 léguas mais ou menos para completar-se tão importante obra, cujo adiantamento, como informei ao Governo Imperial, é devido ao infatigável zelo do Vice-Presidente desta Província, Antonio José de Silva, cidadão que há postergado seus interesses particulares sempre que chamado  a  curar  dos  públicos  interesses.

                Do Piquiry até o Parnaíba pode affirmar-se que está aberta definitivamente a estrada, a exceptuar-se a factura de algumas pontes, e de uma barca, talvez já fabricada no Paranaíba; trabalha todavia o Delegado do Governo José Pedro Garcia por dar direcção recta a parte da estrada que de sua Fazenda vem ter ao Jaurú. A estrada actual corre já muito por cima da que fora aberta por José Martins de Carvalho, e o novo atalho ficará ainda superior. Junto ao Paranaíba divide-se a estrada em dois ramos, um para a Província de Minas e outro que seguirá para o de São Paulo; por aquella, em outubro próximo passado, entrou pela primeira vez e chegou a esta cidade uma ponta de porcos e uma pequena tropa de bestas carregadas; veio também quase na mesma ocasião um carro até o Piquiry, lugar para onde seguirão outros, que actualmente já ahi estarão. Quanto a outro ramo que deve dirigir-se à Província de São Paulo, atravessando o Paraná e o sertão, que

mede até a Villa Araraquara, felizmente, Senhores, tenho de congratular-me convosco por achar-se vencida a maior, ou antes toda a difficultada, que até agora se havia opposto à abertura dessa porção, a mais importante da estrada. De uma das bandeiras que em Março do anno passado expedi para abrir a picada por esse rumo, até agora não tenho notícia; outra porém dirigida por José Pedro Garcia abriu-a desde o Paraná até a Villa de Araraquara como participou-me o Governo de São Paulo, officio de que vos transmitto cópia nº 6, e pelo qual ficareis intelligenciado de que aquelle governo faz acompanhar o dito Gracia de gente necessária para vir endireitando a picada, e abrindo a estrada...” (Limites Orientaes de Matto Grosso, João Barbosa de Faria —In Revista do Instituto Histórico de Mato Grosso, tomo VIII).

                Esse caminho aberto de Cuiabá a São Paulo, via Sant’Ana do Paranaíba ou dos Garcias até São Bento de Araraquara atravessava o actual município de Tanabi; não sabemos ao certo que direção tomava: rio Paraná abaixo rumo ao Salto do Avanhandava pela antiga estrada que cortava o São José dos Dourados, passando por Itapura? Em direção de Tanabi e Rio Preto com ponto de passagem por Jaboticabal, tornando-se, assim, o esboço da actual estrada do Taboado, ou quiçá percorria o vale do Turvo tangencial ao nosso município? Pela velha estrada da fazenda “Barra Mansa”?

                Deixemos, porém, a solução deste tema à argúcia dos competentes.

                Como subsídio frisamos que em 1848 já existia a estrada ligando o Taboado ao Avanhandava; essa estrada, actualmente reaberta por conta do Governo Estadual liga, a região ribeirinha do Paraná à estação de Lussanvira, em a Noroeste, passando pela cidade japonesa de Novo Oriente, e o Tietê através uma das mais modernas pontes do interior.

                De indagação em indagação, conseguimos apurar que os primeiros habitantes deste município (Tanabi) foram José Alves Ferreira e João Ramos da Costa, avoengos do Sr. Joaquim Tito da Costa, aqui residente. Estes, acompanhados de suas famílias, deixaram as plácidas montanhas de Minas e se internaram sertão a dentro com suas mudanças transportadas em carros de bois, virando-os no local denominado Viradouro (de onde a razão desse nome), aí estabelecendo suas posses e moradias.

                A entrada desses nossos bandeirantes deu-se há cerca de cem anos, mais ou menos, e o itinerário seguido bem pode ter sido um dos pródromos da via que nós ocupamos.

                Conforme notas por nós extraídas do bem elaborado trabalho do Cel. Adolfo Guimarães Corrêa —“Contribuição para a História de Rio Preto” —em julho de 1867 o Tenente Taunnay, mais tarde Visconde, para levar as partes oficiais do acampamento de Canudo, à esquerda do rio Aquidauans, para São Paulo, o caminho que teve para Araraquara depois de São Francisco de Sales foi, “por ensombrada e larga estrada em espessa mataria seguida quase sem interrupção umas boas 50 léguas”, passando pelo arraial de São José de Rio Preto, então  deserto  por  causa  do  recrutamento.

                Embora transpondo o município de Tanabi parece-nos que o ilustre viajante não percorreu a estrada do Taboado, dada a direção São Francisco —Rio Preto; deve, no entanto, ter cruzado nosso sertão ainda que em suas raias lindeiras.

                Vamos, sem mais delongas, ao histórico dessa rodovia e, para isso, concedamos a palavra ao Cel. Adolfo, antigo habitante de Rio Preto que assim se externa: “A 80 léguas de Uberaba, Sant’Ana do Paranaíba, em Mato Grosso, convencera-se da vantagem de procurar comunicação por São Paulo, dado ser exacto que a via Uberaba sempre representava um dia a mais de estrada de ferro até Santos. Os homens bons dalli, a cuja frente puseram-se os senhores. Cel. Carlos de Castro, Cap. José Maria e Padre Ferraz, votaram-se à patriótica empresa. E o que ella foi já dissemos em certa occasião assim: “Em 1892, três cidadãos residentes em Sant’Ana do Paranayba, o Cel. Carlos Ferreira de Castro, o Cap. José Maria e o Padre Ferraz, vigário daquella villa, resolveram abrir uma estrada que do porto do Taboado alcançasse o bairro do Viradouro, último ponto habitado ao norte  de  São  José  do  Rio  Preto.

                Depois de algumas tentativas penosas e infructíferas para atravessar as 20 léguas de terras devolutas no rumo determinado, decidiram descer o Paraná, entrar no rio São José, subi-lo até onde fosse possível a sua navegação e depois procurar por terra o Viradouro. Na exploração fluvial do São José, encontraram os restos da ponte de Januário Garcia e os esteios da casa onde morou um ferreiro criminoso, de Pitangueiras, que lá fora homisiar-se, trabalhando para o povo de Sant’Ana no fabrico de ferros para marcar, como o atestam as innúmeras marcas a fogo nos esteios que ainda lá existem. Depois de muitos dias de não fácil navegação, os exploradores notaram numa prainha da margem direita uma lata de sardinha  vazia  e  rasto  de  gente.

                Observando que a lata conservava ainda sua unctuosidade e que o rasto era recente, convenceram-se de que por alli deviam ter passado pescadores.

                Reparando melhor, reconheceram traços de golpes de facão na capoeira circunstante até que foram dar à casa do velho João Costa, morador do ribeirão São João. É escusado dizer como os moradores de Viradouro festejaram os destemidos exploradores e como, desde logo, determinaran-se à abertura da estrada por meio de signaes, de fumaças. Organizada uma numerosa turma de foiceiros e machadeiros, foi logo encetado o trabalho; a travessia foi longa e penosa; muitas picadas foram abandonadas por saírem em varjões intransitáveis; outras custaram trabalhos insanos para atravessar tabocaes e cipoaes emaranhados; as provisões foram escasseiando e os últimos dias a gente alimentava-se exclusivamente de café e rapadura. O velho Padre Ferraz chegou quase desfalecido ao porto do Taboado, sustentado pelo Cap. José Maria com um último pedaço de rapadura que tinha  guardado  na  capanga.

                Essa estrada, aberta a expensas dos três beneméritos Santannenses, foi de grande utilidade à Comissão Hummel, quando ali chegou com os estudos da Estrada  do  Taboado  e complemento  desta”. Os engenheiros dirigidos por Hummel traçaram a “Boiadeira” no governo do Dr. Américo Brasiliense. Esta permitiu os primeiros transportes, pelas vertentes dos  grandes  rios,  do  gado  de  Mato  Grosso  a  São  Paulo  (J. C. Fairbanks).

                Entre os membros da citada comissão destaca-se a figura saliente de Ugolino Ugolini, que tão gratas recordações deixou nesta cidade, tendo plantado na actual rua 7 de setembro, próximo ao largo da Matriz Velha, hoje Praça 24 de Outubro, uma fila de esbeltos coqueiros dos quais ainda restam três exemplares.

                Em 1897, respondendo circular datada de 14 de abril daquele ano, dirigiu a Câmara Municipal de Rio Preto ao Governo de São Paulo veemente apelo no sentido de serem restabelecidas as vias de comunicação do Porto Tabuado, do Avanhandava e do Itapura, porque: “não eram somente vias de interesse municipal, mas artérias principalíssimas da grande viação do Estado, que mais de servir ao município, servem os interesses de São Paulo, para não dizer os interesses da Nação. As duas linhas do Porto do Taboado e do Itapura são as linhas naturais, pelas relações commerciaes entre Cuiabá e o Atlântico, e Santos é o porto natural do Estado de Mato Grosso. Mas além dessa prerrogativa, ellas têm também uma importância eminentemente estratégica, não desprezível: porque permitiria em qualquer momento a concentração de um corpo do exército no Estado de Mato Grosso, fóra da fiscalização das Repúblicas Platinas”. Esse documento, linhas adiante encarece a importância dessa estrada para o transporte de gado, “O gado que de Sant’Ana do Paraíba se dirige aos mercados de São Paulo, via Barretos, ou de Uberaba, tem duas despesas de imposto e de passagem: uma no rio Paranaíba e outra no Rio Grande. Tem de percorrer 80 léguas para chegar a Barretos. Pelo porto do Taboado tem somente uma passagem, a do rio Paraná, um só imposto e uma distância de 36 léguas até Rio Preto (actualmente) mas reduzíveis a 26 quando fosse aberto todo o traçado. Agora juntando as 26 léguas às 20 para Barretos, teremos um total de 46 léguas, então um percurso de 20 léguas a menos pela linha de Rio Preto. Além disso, (insistia o documento) as estradas de Itapura e do Taboado têm uma outra circunstância a seu favor, merecedora de especial consideração —a de ligarem-se com as velhas estradas de Campo Grande, Vaccaria e Miranda, de Coxim, Cuiabá, Poconé e São Luiz de Cáceres, de Sant’Ana e  Jatahy  de  Goiaz”.  (Obra  citada).

                Euclydes da Cunha, à porta da cabana de pau-a-pique em que se abrigara, à margem do Turvo, na estrada do Taboado para Barretos, naquele trecho torturante conforme palavras suas —sonhara uma estrada de rodagem digna de tal nome para o Mato Grosso, seguindo o traçado civilizador de Pimenta Bueno, autor igualmente do projecto ferroviário para Cuiabá, passando em Porto do Taboado.

               Isso em 1901, nos primeiros albôres do século XX.

                Daí para cá avoluma-se o trânsito de boiadas pela velha estrada: a Boiadeira, não obstante a construção da Noroeste; mais ou menos em 1922, Feliciano Sales Cunha aproveita o eixo dessa linha e estende até Sant’Ana do Paranaíba o âmbito de seu empreendimento, fazendo correr até lá as jardineiras da Cia. Transportes. Infelizmente, pela distância a percorrer e outros factores contrários,  deixou  de  funcionar  anos  após.

                Ainda em 1928, o notável sertanista patrício General Rondon, dirigindo-se à delimitação das fronteiras da região noroeste e Alto Amazonas, desceu de Tanabi pela Estrada do Taboado. Nesse tempo, derrota com essa ainda era possível; ultimamente, porém, somente carros de bois, cavaleiros e boiadas conseguem a muito custo vencer as mil e uma dificuldades naturais que aparecem em seu percurso em lamentável abandono. Há, no entanto, rumores vagos de que o Governo Paulista pretende reabri-la de Tanabi ao Porto do Taboado, articulando-se ao  sistema  rodoviário  de  São  Paulo.

                Determinado, embora impropriamente por carência de dados mais positivos, o histórico da Estrada do Taboado, eixo da grande exploração pastoral da região e que carreia o gado dos mercados bovinos de Mato Grosso para os domínios de engorda de Barretos, passemos agora a particularizar-lhe os característicos que a definem, a função que exerce, tudo, enfim, que se relacione à mesma estrada em sua projecção diagonal sobre nosso município (Tanabi).

                Nesse longo trajecto de quase duzentos quilômetros de extensão, a “Boiadeira” desenvolve-se sempre pelo imenso vale do São José dos Dourados, cujo vale cobre uma superfície de oito e meio quilômetros quadrados. Tem o São José cerca de 300 quilômetros de curso e desemboca no Paraná com 55 metros de largura, aos 20º 10’ Latitude Sul e 8º 10’ 45’ Longitude Oeste do Rio de janeiro —dados colhidos no Relatório Geográfico da Comarca de Rio Preto, bem feito trabalho  do  Eng.  Eduardo  Campos.

                Rio genuinamente paulista recebe o São José cerca de cinqüenta afluentes, entre pequenos e grandes, somente em sua margem esquerda e território tanabiense; de Porto Taboado a Tanabi a estrada atravessa numerosos cursos de água, dentre os quais citamos: mais de uma dezena de tributários do ribeirão Ponte Pensa que, que por sua vez conflui no Paraná a pequena distância do Porto;  o ribeirão do Maribondo e seu braço; o Pimenta; os córregos do Ranchão, da Lingüiça, do Jagóra, de São Pedro, de São João, do Buriti, do Santo Antônio (onde se encontra a sede do distrito policial de Piassava, decadente capela com algumas casinhas em ruínas); o córrego do Espraiado, da Cachoeira Feias, em cuja proximidade se encontra a outrora próspera e hoje arruinada povoação de Vila Carvalho, também sede de distrito policial; o córrego da Soledade, o do Juvêncio, o da Prata, o de Antônio Fachina, o da Cachoeira, o da vertente Comprida, o do Açôita Cavalo, o do Carrilho, o da Fortaleza e, finalmente, o Jataí que banha a cidade de

Tanabi; desta às divisas do distrito de Bálsamo cruza o Bacuri, o Sapo, o Sapinho, o córrego  das  Perobas  etc...

                No intervalo dos ribeirões aqui mencionados, outros existem de menor importância  e  cuja  nomenclatura  ainda  não  está  fixada.

                Seguindo a mesma ordem, enumeremos as grandes fazendas que a estrada serve, neste município: “Ponte-Pensa”, vasto latifúndio inculto; “Maribondo”, “Ranchão”, “Jagóra”, “São Pedro”, São João”, “Buriti”, “Santo Antônio do Viradouro, ou Espraiado”, “Prata”, “Carrilho”, “Fortaleza”, “Jataí” e “Perobas”.

                Para dar uma pálida idéia da extensão dessas grandes propriedades rurais, bastante é citar que só a “Ponte Pensa” tem a superfície de 208 a 330.000 alqueires de terras, medida paulista de 24.200 metros quadrados: Um mundo aberto sem porteira na frase expressiva do matuto, um mundo a povoar-se, maior do que certos países europeus! Releva notar que aí predominam as boas terras de cultura, revestidas de espessa mataria; nas demais fazendas, quase todas de bons terrenos, embora entremeados de manchas cobertas de campos e cerrados ou catanduvas, prestam-se à instalação de grandes invernadas, que, aliás, sucedem-se  ininterruptamente  em  todo  o  território  municipal  pela  estrada.

                As referidas manchas são constituídas, a nosso ver, de massapé branco, argila pobre em ferro, produzindo gramíneas e ciperáceas, palmeiras raquíticas, como o tucum, o indaiá e outras; aí encontram-se o gravatá, o araticum, o pau de bodoque, a quina do campo, o vinhático, o pau terra, o ipê roxo e amarelo e outras árvores componentes do cerrado, ao passo que as terras de boa qualidade ostentam a lixa, a sucupira ou faveiro, a figueira, a embaúba, a taquara, a taboca, a pintaiva, o capixinguí, o guatambu, a herva de anta, o jatobá, o jequitibá, a peroba, o cedro,  a  aroeira,  o  angico  etc...

                Flora essa constituída pela decomposição das camadas de gres e lençoes de  diábase.

                Nas cercanias da cidade desenvolve-se a policultura café, cereais, algodão —o regime da pequena propriedade, em suma; trinta quilômetros adiante, prepondera a média, isto é, fazendolas de cem e mais alqueires, quase todas dedicadas à criação de gado e, num raio de dez léguas além, impera o latifúndio, grandes tractos de terra à espera do humano contacto, ainda que, também aqui se desenvolvam  importantes  invernadas  de  criação  e  engorda.

                Em geral, o habitante da zona de influência dessa estrada é essencialmente pastoril, vivendo de renda derivada de compra e venda de gado bovino  e  aluguel  de  pastos  etc...

                Excepção de pequena faixa de alguns quilômetros ao redor de Tanabi; por isso, limita-se a cultivar terrenos somente para o gasto; anos após a derrubada do mato já tem o capim formado, geralmente o jaraguá e, em alguns casos, o gordurinha roxo ou cabeça de negro; em algumas fazendas o proprietário dá terra de graça ao “agregado” em troca da formação do capim.

                Na mesopotâmia dos rios lindeiros o gênero de vida é sensivelmente baixo; ausência de conforto nas habitações, genericamente ranchos; endemias, pobreza por falta de trabalho organizado, eis que o morador dessas paragens, por falta de estímulo pela distância dos centros civilizados, entrega-se à caça e á pesca, abundantes  nessas  paragens.

                À margem da “Boiadeira” pontilham, de quando em quando, a espaços que medeiam uma jornada diária, os pousos e ranchos de beira de estrada. Semelham esses ranchos aos que bordejavam velhos caminhos de burros do impropriamente chamado “Norte de São Paulo”, no vale paraibano e a estrada francana, onde “as tropas ias deixando cair, em cada pouso, um pouco de riqueza”, (observação de Foquete Pinto). Esses abrigos de pousada constituíam, naqueles tempos de antanho, quando o automóvel era ainda um mito, pontos de reunião, movimentados e cheios de vida, constantemente bafejados pelas tropas e boiadas vindas do interior e que se destinavam ao litoral. Como aqueles, os ranchos da Boiadeira animam-se à passagem das grandes boiadas procedentes do centro brasileiro; destinam-se à pousada dos peões, capatazes e boiadeiros, de encostos, consoante a gíria matogrossence, enquanto a manada pernoita no mangueiro ou pastinho de aluguel. Estas construções rústicas erguem-se contíguas a qualquer nascente (“gosguinho”), à jusante da “fazenda” ou “casa-grande”, residência do proprietário, e são constituídas, a mais das vezes, de singelos telheiros suspensos sobre quatro esteios de aroeira, cercados de pau-a-pique, ou, mesmo livres. Uns assoalhados e outros de chão somente e todos de um só aposento, nem sempre cômodo. Afora a locação diurna do pouso, fornece o fazendeiro a peões e boiadeiros aguardente, açúcar, sal e outros gêneros de primeira necessidade, gêneros esses que tem em suas casas, destinados a suprir as faltas dos itinerantes.

                Uma vez que estamos a fazer trabalho de folclorista, não será, talvez, descabido registrar a existência, quer nos telheiros de pouso e habitações, quer nas pastagens e quissáça, de carrapatos, piolhos, percevejos e outros perigosos parasitas a flagelar, impiedosos, os moradores, rancheiros e viajantes; transmitem-se conduzidos pelas bruácas das comitivas em suas viagens de penetração ao Mato Grosso e em torna-viagem, num verdadeiro círculo vicioso. É usual a queima dos  pastos,  no  inverno,  com  o  intuito  de  debelar  os  temíveis  carraças.

                Bordejando as escarpas do acidentado carreiro, encontram-se amiúde cruzes tôscas de madeira, consumidas pela traça temporal que tudo corróe, a rememorar acidentes imprevistos, tragédias nascidas de reencontros fatais ou, mesmo, premeditadas, horripilantes tocaias. Costuma a piedade popular recobrir o símbolo de fé de flores naturais e a crendice sertaneja aí deposita rosários, bentinhos, figuras de cera e até vestes usadas, cumprindo religiosamente um voto formulado...

                Quantas vezes, à roda desses cruzeiros em que outros enterramentos são feitos, sem mais formalidades, vê-se o chão revolvido e perfurado pelas garras profanas  do  necrófago  tatu!...

                O povoador anônimo do sertão é o caboclo, esse caboclo que é o autor de  “Os Sertões” fez a apoteose em páginas imortais e na região da Boiadeira os moradores são quase todos nacionais. Um núcleo autêntico de sã nacionalidade! Povoamento disperso e isolado, onde a paisagem sofreu ligeira modificação pela diminuta  influência  do  trabalho  humano.

                Estamos, porém, na Araraquarense, a “zona pioneira do Estado”, conforme a classifica Pierre Deffontaines —franja geográfica de rápido progresso, onde tudo cambia constantemente e para melhor. Indispensável se torna, pois, a reconstrução dessa estrada que a violência das chuvas, a força da vegetação e tantos outros factores dissolventes fizeram quase desaparecer, a fim de que o nosso “hinterland” possa acompanhar, a par e passo, o surto progressivo de São Paulo.

                Força é convir que, “Toda a vida dos povos gravita em torno das grandes estradas” (Edmond Desmolins —Coment La route crée Le type de La Civilisations, citação de Baptista Pereira) e que na obra de colonização do nosso interior sertanejo não há agente mais poderoso e eficiente que o pastoreio. Ele é a vanguarda da nossa expansão agrícola. O curral precede a fazenda e o engenho. Depois do vaqueiro é que veio o lavrador; o gado preludia o canavial e a plantação cerealífera (Oliveira Viana). Essa rodovia, carretera, como dizem nossos vizinhos, os argentinos, - sinal concreto das relações entre os agrupamentos civilizados de São Paulo e dos Estados limítrofes —Minas, Goiás e Mato Grosso, reconstruída, apropriada ao tráfego de automóveis, tornar-se-á eminentemente estratégica e fará o conúbio das populações sertanejas que aí vegetam com o elemento citadinho; desse intercâmbio mútuo e indústria, em todos os ramos de suas múltiplas actividades.

                Para remate final das apagadas considerações por nós feitas em e sobre a tradicional Estrada do Taboado, amenizemos a impressão do leitor com esta delicada “Symphonia” do mavioso poeta tanabiense —João de Mello Macedo, nome que  é  para  nós  um  símbolo!

Na hora religiosa do cair da tarde,em que tudo tem ressonâncias profundas;nessa hora espiritual de serena tristeza,em que as vózes humanas se confundemcom as vózes da própria natureza,quedo-me a olhar:descendo ao longo da estrada boiadeira,entre nuvens doiradas de poeira,a ondulante e morosa procissãodas boiadas que chegam do sertão...... e a ouvir:o gemido entrecortado dos berrantes,que os ponteios modulam,à dianteira do gado...e o abôio dolente e prolongado dos peões,musicalizando a marcha somnolenta dos bois.Há nessa harmonia barba e errante,a perder-se nos longes da quissaça,como que a angústia sexuada e forte da minha raça!Na monotonia desses sons morrentes espelhan-se as vastidões desoladasdas campanhas ensolaradas,onde seriemas pernaltas estridulamescaladas smorzantes de pipilos...E vém bailar, no rythmo disperso dessa música,que o anoitecer torna mais lyrika,a saudade das polkas paraguayas,dansadas ruidosamente de esporas nos baculêrês de Campo-Grande...e a lembrança da terna cuyabana,flor agreste de amor e de carinho,que ficou, lá para trás, à porta da choupana,numa curva distante do caminho...

 Tanabi, 20 de dezembro de 1936.* O poema citado acima está inserido no livro “Arribada” deautoria de João de Mello Macedo, lançado no ano de 1935.* Artigo publicado na imprensa local “O Município”, de 1º de Janeiro de 1937, e na Revista do Arquivo Municipal —nº 31, de São Paulo.

Estrada do Taboado III

                É com maior júbilo que destas colunas fazemos eco às palavras sensatas e momentosas pelo simpático matutino “A Notícia”, de Rio Preto, subordinadas ao título: “A velha e tradicional estrada do Taboado está em completo abandono” e em cujo trabalho o articulista borda comentários seguros acerca do papel de relevo que essa estrada representa para a economia da região e criteriosamente sugere a necessidade  urgente  de  sua  imediata  restauração.

                Fazendo coro a essas oportunas palavras, aqui estamos, não só para apreciá-las, como, também, juntar mais algumas razões que reputamos convincentes à concretização desse alvitre. Para todos os habitantes da região sempre foi motivo desalentador saber que essa artéria de vital importância acha-se, de há longo tempo, votada a imerecido abandono, a ponto de encontrar-se hoje totalmente impraticável, coberta de imenso matagal e toda ela sulcada de precipícios intransponíveis pelo mais cavaleiro e ainda para o bovino habituado às penosas travessias dos campos naturais de seu Habitat mato-grossense. No entanto, há pouco mais de um decênio, por ela trafegavam comodamente intermináveis manadas e até autos e jardineiras num comércio regular inter estadual.

                Vem aqui a pelo recordar que sua obstrução trouxe, como conseqüência, o desvio da caudal bovina, a partir de Porto Presidente Vargas para, atravessando o Tietê, em Avanhandava, atingir Rio Preto após uma inflexão desnecessária de centenas de quilômetros com grave prejuízo aos munícipes servidos pela velha Boiadeira. Sabido é que atravessada por essa rodovia —que nada lembra tão lindo vocábulo —é toda composta de terrenos adatados maravilhosamente ao desenvolvimento intensivo da indústria agro pecuária, havendo, em todo esse percurso, uma série infindável de fazendas e campos de criação; em suas margens desenvolveu-se, por assim dizer, uma civilização do gado, constituída de retiros e potreiros, piquetes e invernadas, mangueiros, pontos e ranchos de pouso; em suma: todas as instalações imprescindíveis ao serviço de transporte e invernia do gado proveniente do centro leste brasileiro. Nesse imenso trato de terras quase não se avistam culturas permanentes de café, algodão e cereais que não sejam os

indispensáveis à manutenção de seus habitantes os quais têm, no gado, o leit-motiv de sua existência vegetariana. Abandonar, pois, essa imensa pista de gado, como a chamou, aliás com propriedade, Pierre Deffontaines, é condenar ao retrocesso e à estagnação um povo laborioso que se devota a esse gênero de vida partindo do peão até o grande invernista: é provocar o lento deperecimento de todo um vasto material de cultura aí pacientemente armazenado há quase um século.

Tanabi, 18 de setembro de 1941.


“EXPRESSÕES DO POPULÁRIO SERTANEJO”

Jantar realizado no Tanaby Hotel, ocasião em que Sebastião AlmeidaOliveira lança o livro “EXPRESSÕES DO POPULÁRIO SERTANEJO”.


Tanaby Hotel, década de 40.

Ofertando o jantar em nome dos amigos e admiradores e no seu próprio, fala:

 João de Mello Macedo —Poeta e Escritor

Autor do livro “Arribada”.

 

Minhas Senhoras.
             Gentis Senhorinhas.
             Meus Senhores.
             Meu caro Sebastião.

 

Aceitei, sem maiores tergiversações, a honrosa incumbência de oferecer-lhe este jantar. De que valeriam protestos, quiçá, de falsa modéstia? De que valeria patentear aos olhos de todos estes amigos a existência, entre eles próprios, de pessoas capazes de substituir-me, com galhardia e brilho, no desempenho desta amável  entrepreza?

Os gestos de uma recusa, eu nem cheguei sequer, neste caso, a esboçá-los. Senti de meu dever aceitar a glória e a responsabilidade deste oferecimento, sem recuos e sem hesitações. Do contrário, meu caro Sebastião, eu mentiria a amizade, que sempre nos uniu, e as afinidades, que sempre nos aproximaram. Por isso, aqui estou eu, sem atender a razões outras que não aquelas de ordem íntima e sentimental, na desobriga deste mandato, que me honra a mim e aos amigos seus, que me o delegaram, porque, através dele, se reverenciam as coisas altas e superiores  do  espírito.

Este jantar, você bem o sabe, é apenas um pretexto. Com ele, queremos tão somente homenagear o jovem autor do “EXPRESSÕES DO POPULÁRIO SERTANEJO”, pelo muito que esse livro encerra de tanabiense e pelo muito de brasilidade, que ele nos ensina. E para este jantar, que é uma pura manducação nacionalista,  só  nos  acudiu  um  recurso:  chamá-lo  íntimo.

Bem avisados andávamos, assim procedendo. Pela projeção do seu nome nesta cidade, no município e em toda a região, déssemos a esta homenagem um caráter mais coletivo e teríamos de estender mesas ao ar livre para comportar a multidão de seus partícipes. Dess’arte, ficou ela assim circunscrita a um número menor de homenageantes, nada perdendo, contudo, na intensidade do afeto e do carinho, que se devotam ao homenageado. E tivemos, para isso, de recuar para um segundo plano, segundo, no espaço e não no tempo, esse conjunto de qualidades, que fazem de você uma individualidade singular. Singular pelo equilíbrio das atitudes, que harmonizam, numa só linha de retidão e de serenidades, a sua vida particular  e  a  sua  vida  pública.

O homem do lar, em você, continua no profissional, probo e impecável, e se prolonga no cidadão, que ama a sua civitas com o amor firme e constante de todas as horas. Mas, esse conjunto de qualidades, estruturando a bela tradição de honorabilidade e a competência técnica do tabelião, ficou, agora, recuado para um plano  secundário.

Sem nos prescindirmos dele, será, quando muito, moldura ornamental para o “leit motiv” desta cordialíssima reunião, que desse modo se reveste de um cunho acentuadamente intelectual. EXPRESSÕES DO POPULÁRIO SERTANEJO é  que  nos  congrega  em  torno  desta  mesa.

SEBASTIÃO:

O valor do seu livro, para nós, é inestimável. Merecidamente consagrado pela crítica, que o situou de maneira destacada no cenário da nossa cultura, ele possui, no entanto, para nós outros, uma significação a mais. É que esse volume, em que você catalogou vocábulos e superstições regionais, será sempre, para nós, um relicário, a edícula do seu amor à terra e à gente de Tanabi.

Entre as qualidades que se exigem para um “folclorista”, uma delas há que eu tive a felicidade de ver especificadamente referida por um dos mestres dessa ciência, hoje autônoma e de limites definidos dentro da antroposociologia. Essa qualidade é simplesmente aquela sem a qual nada se constrói de duradouro: “Saber amar, com uma fonte perene de afeição, capaz de cobrir, numa onda envolvente de ternura, todos  os  seres  e  todas  as  coisas”.

É Van Gennep quem afirma “ser, por certo, mais difícil recolher materiais folclóricos do que organizar um herbário, ou uma coleção mineralógica, pois, para o primeiro caso, além do amor à ciência, é necessário também que se ame a vida rural, ajuntando-se ao trabalho científico aquela simpatia, aquela “humanidade, como se dizia no século dezoito, que suprime as barreiras sociais e intelectuais”. E a você, todos podemos atestar, jamais faltou o concurso de tão precioso dom. Perfeitamente integrado em nosso meio, amando o gênero de estudos a que se dedica e amando a vida e a gente simples do sertão, com a qual convive no labor diário do seu mister, fácil foi a você apreender-lhe as peculiaridades da linguagem e o pitoresco das suas lendas e superstições. Exercendo junto a ela o ministério da sua bondade, você realizou integralmente o tipo do observador pedido por Saintyves, que é aquele, que, quando não haja nascido na região, que pretende estudar,  deve,  pelo  menos,  ter  sido  adotado  por  ela.

E você, além de ser, pelo nascimento, um homem da alta araraquarense, ainda é mais, pela cidadania, que os próprios tanabienses lhe impõem, um cidadão de Tanabi. Eis porque, ao mesmo tempo em que árdua, tem sido suave a sua tarefa. Tarefa de recolher todo esse material, que, selecionado e depurado no crisol de sua análise, veio constituir o seu livro de estréia, que é bem uma condensação da humanidade e da vida do nosso rincão sertanejo. E apraz-nos aqueles “ricercatori locali”, de que nos fala Giuseppe Cocchiara, aos quais, faltando conhecimentos suficientes para fazerem obra científica, se deixam cair no puro diletantismo literário. É que você opôs as deficiências do meio ao insulamento de sua vontade, a falta de emulação e de estímulo, a força inquebrantável da sua vocação. É que você contrapôs a ausência de professores, aberto pela sua inteligência, o horizonte ilimitado do seu auto-didatismo. Tornou-se, assim, a sua vida uma formosa lição de firmeza de vontade e de fidelidade ao ideal, digna de figurar entre as páginas de Smiles.

E essa inesgotável ânsia de conhecimento, que em tempo algum o abandonou, é que lhe põe, agora, nas mãos, a palma de todas as suas conquistas intelectuais.

                Transferindo de Ribeirão Claro para Tanabi e aqui se dedicando a uma ocupação absorvente, qual seja a do seu movimentado cartório, nunca, entretanto, lhe faltaram lazeres para o trato das boas letras. E, seguindo uma tendência natural do seu espírito, eis que você descobre o veio inexaurível da nossa demopsicologia.

Perquirindo-a, você vem satisfazendo as características fundamentais da sua índole literária. Entre elas, proeminentes, o seu respeito e o seu desvelo por esse claro  idioma,  que,  no  dizer  do  poeta,  vem

               Da avena dos pastores, da harmonia
Que o vento imprime às palmas das palmeiras,
Do bramido do mar e das cachoeiras,
Da voz que impreca à voz que balbucia,
Do sol que canta quando nasce o dia,
Do luar que chora sobre as cordilheiras...


Idioma dúctil e vivo, que cada dia se enriquece de novas expressões, como muitas destas catalogadas por você e que assim se incorporam ao patrimônio comum da nossa língua. E, substratando esse respeito pela língua geral, o seu carinho e o seu entusiasmo por tudo quanto é tanabiense e que é paulista e, finalmente, o seu amor por tudo o que é genuinamente brasileiro. E melhor forma de nacionalismo do que o estudo do nosso folclore você não poderia preferir para as superiores  manifestações  do  seu  talento.

                Referindo-se ao apreço, que nos deve merecer esse gênero de pesquisas, asseverava Basílio de Magalhães, em cuja notável obra “O Folclore no Brasil” você já se encontra honrosamente citado, que “a carinhos rebusca dessas formas de atividade mental e o constante contato com o nosso povo é que nos possibilitarão conhecê-lo melhor e amá-lo mais sinceramente, habilitando-nos, assim, a que também mais eficientemente cooperemos, com ele, por ele e para ele, no robustecimento do caráter nacional e na exaltação sinérgica da alma nacional”!

                Não vai, porém, nesse nacionalismo e nem vai ao regionalismo, que a própria metodologia da ciência folclórica requer, a vesga limitação de localismos estreitos. Mesmo porque o folclore é uma arte e é uma ciência. “Ed é una scienza che parte dalle reggioni e abraccia il mondo”. E porque ela se volta para os costumes e as tradições de um povo, devemos congratular-nos, porque temos a ventura de contar em nosso meio com um intelectual capaz de se interessar por esse magno assunto.

                Zona nova, quase que sem história, aberta aos quatro ventos da imigração, recebendo as mais exóticas influências, é preciso mesmo que alguém vá cuidando de preservar o que possuímos de tipicamente brasileiro, para que se não perca  a  nossa  fisionomia  dentro  da  grande  pátria.

                Desse modo, meu caro Sebastião, com o “EXPRESSÕES DO POPULÁRIO SERTANEJO”, você se inscreve entre os obreiros, que nos levam ao verdadeiro conhecimento dessa hoje tão falada “realidade brasileira”, expressão para muitos vazia de sentido, fórmula mágica a redoirar arengas de tantos patrioteiros  vulgares.

                Por isso, aqui estamos, os seus amigos de Tanabi, para trazer-lhe o nosso aplauso pela publicação desse livro, cujo valor avulta aos nossos olhos, pelas qualidades incomuns de quem o concebeu. O calor desse aplauso está simbolicamente contido na cordialidade deste jantar votivo, que eu tenho o prazer e a honra de oferecer a você, em nome de todos os que aqui se amesendam, por si, ou como delegados dos que não puderam comparecer. E para oferta-lhe esta homenagem, numa festa que é a festa do espírito, mas que é, também, a festa do coração, eu o faço certo de que nos anima, a todos nós, só pensamento e um só desejo: é que você continue voltado para a recolta e o estudo de todas as tradições e de todas as manifestações da sabedoria popular em nossa região; é que você prossiga recolhendo, na bateia do seu garimpo, as grupiaras dessa filologia bárbara, que é a linguagem saborosa e virgem do nosso caboclo, com o que você terá opulentado a nossa e a mesma língua “em que Camões chorou, no exílio amargo,  o  gênio  sem  ventura  e  o  amor  sem  brilho”.

                Assim, tê-lo-emos sempre ao nosso lado, para nosso contentamento e nosso orgulho. Orgulho, sim, porque, no cultivo das letras, acicatado pela sua ânsia de perfeição, você há de subir ainda mais alto, na exaltação de seu próprio nome e na  glorificação  de  nossa  terra  TANABI!

                Com esses votos, formulados em nome de todos os presentes, é que eu quero  erguer  a  minha  taça,  para  beber  a  sua  saúde.   Disse.

                                                                                  ______ * ______

 

Oferecendo um mimo (exemplar
do livro “Expressões do Populário
Sertanejo”, em encadernação
especial) em nome de todos os
convivas, fala:

 

Pascoal Albanese —Contador

 

                Meu caro Sebastião:

                Nessa maravilhosa e primeira Epístola de São Paulo aos Coríntios, deparamos, no versículo sétimo do capítulo décimo, esta significativa expressão: “Sentou-se o povo a comer e a beber e levantou-se para se divertir e dançar”. Com isto, o eminente Apóstolo dos Gentios, profligava a atitude dos idólatras da época, ao tempo que exortava os fiéis ao serviço de Deus.

                Certamente não estamos aqui para comer e beber e divertirmo-nos a seguir: nem, tampouco, estamos a serviço de Deus; e sim, sem dúvida e despidos de qualquer ostentação, reunidos em torno desta mesa, em alegre convívio, menos pelo prazer das iguarias que degustamos, mas pela magnífica oportunidade que se nos apresenta a fim de, congregados por vontade espontânea, rendermos um preito de sincera e justa admiração aos méritos e à inteligência que integram o caráter aprimorado de quem, por seu valor e dotes elevados, se impôs à consideração  e  estima  pública.

                Às brilhantes qualidades que fluem do teu acurado trabalho diário no trato dessa complexa organização civil de códigos e leis, justaste a de proficiente estudioso das coisas de nossa terra e de nossa gente.  Daí, a publicação dessa esplêndida coletânea de vocábulos e frases a que, com muita propriedade, deste o título  de  “EXPRESSÕES  DO  POPULÁRIO  SERTANEJO”.

                Este teu trabalho não enfeixa em si cogitações filosóficas; não trata de problemas sociais ou religiosos; não é obra doutrinária ou de letras clássicas. É trabalho de observações e confrontos; é obra de pesquisa e de investigação; é reunião de elementos que demanda estudo e paciência através de longos anos. E é nisto,  precisamente,  que  está  todo  o  seu  valor.

                Contribuíste, de maneira eficiente, para o vocabulário de termos brasílicos, e enriqueceste, de forma exuberante, o majestoso arcabouço que se vem  erguendo,  desde  longe,  na  seara  “folclórica”  de  nossa  pátria.

                Que esta inestimável e preciosa contribuição não padece sofismas, atesta-a o extraordinário acolhimento que a crítica do País teceu sobre o teu valioso livro. Bem haja, pois, o teu esforço e a tua paciente dedicação que só encontra, neste  terreno,  paralelo  com  o  trabalho  miticuloso  dos  Beneditinos.

                Este acontecimento, que enobrece e eleva ainda mais o teu nome, não podia passar despercebido àqueles que prezam o teu valor e admiram a tua capacidade de trabalho. Eis, aí, o porquê desta homenagem espiritual que aqui nos agremiou, e, para que ela fique concretizada de uma forma material, nós, os teus amigos e admiradores, resolvemos consubstanciá-la no teu próprio livro, do qual extraímos um exemplar que mandamos confeccionar em edição especial, e que se encontra encerrado neste escrínio que te oferecemos com as nossas assinaturas como lembrança perene deste dia memorável. Esta lembrança, modesta é verdade, mas profundamente sincera, simboliza: A jóia do teu trabalho primoroso, envolta  pelo  afeto  e  admiração  dos  teus  amigos.

Agradecendo as homenagens que recebera, fala o autor de “Expressões do Populário Sertanejo”:

 

______ * ______

 

Sebastião Almeida Oliveira

Oficial do Registro Civil e Tabelião por lei.

 

                Meus amigos:

                Depois da palavra magnífica de Mello Macedo e dos bondosos Amigos Valentim Alves da Silva e Pascoal Albanese, melhor fora que a voz do causador involuntário desta esplêndida reunião não se fizesse ouvir, para que a beleza e o encanto intraduzíveis existentes na oração do poeta, que saudou o homenageado, e a eloqüência dos demais oradores, não se encontrassem, lado a lado, num símile desconcertante, com o descolorido e a insegurança do verbo daquele que, devido à sua própria natureza, se sente na incapacidade de alçar vôo, por mais rasteiro que seja, através os céus azulegos da verdadeira oratória. Vencendo, porém, a íntima resistência, por não possuir aquele sopro divino que anima o legítimo artista da palavra, levanto-me para abrir-vos mais uma vez, diante de vossa jamais desmentida generosidade, o meu coração de amigo e conterrâneo. A sinceridade e espontaneidade desta homenagem dão-me forças suficientes na realização deste sagrado  dever  perante  vós.

                 Senhores: Agradecendo-vos esta demonstração incomparável de vossa grande simpatia, que vos reuniu hoje em torno do autor de “Expressões do Populário Sertanejo”, quero, aproveitando esta feliz oportunidade, fazer a afirmação sincera e leal de que, se algum mérito existe naquele trabalho, que é aliás fruto de alguns anos de observação e estudo, o mérito cabe menos a mim do que a esse povo admirável em cujo meio vivo há cerca de três lustros, o povo tanabiense! Meu papel outro não foi que o do garimpeiro a buscar confiantemente na ganga informe do linguajar matuto e nas expressões pitorescas da gíria o diamante certo e inconfundível das belezas que a alma popular conservou intactas através de todos os tempos. Sentindo, bem de perto, as manifestações de sabedoria e acuidade que se irradiam mui naturalmente da língua sertaneja, esse “dizer chão, pitoresco e ao mesmo tempo imaginoso dos que beberam o puro leite dos seios da natureza” de que nos fala Camilo, divino plasmador de tipos imperecíveis, inclinei-me para o trabalho paciente, mas proveitoso, de compilação e adaptação de todas essas singularidades, de registro fiel de todas essas vozes peculiares à nossa região, mas correntes, por assim dizer, em todos os quadrantes do Brasil, com ligeiras alternativas de forma e de sentido; assim procedendo, eu tinha a certeza de que estava contribuindo, ainda que escassamente, para uma compreensão mais perfeita desta gente numerosa que a golpes de audácia e denodo, traça o perfil geográfico e econômico da pátria e fixa a sua fisionomia espiritual no concreto das nações jovens do continente. E, para esse povo, para os obscuros construtores da língua e da literatura nacionais que eu solicito seja adereçada vossa captivante homenagem.

                Permiti, no entanto, meus amigos, que, em nome deles, dos autores de meu livro, pronuncie eu mais algumas palavras desconchavadas, as quais, se não tiverem a ventura de expressar qualquer novidade, atendendo-se a sentença latina —nil novi sub sole —dirão, porém, e com muito calor, do sincero desejo que me anima de corresponder, ainda que de longe, à confiança que vindes de manifestar a respeito do futuro que está reservado às letras regionais, aos estudos da terra e da gente.

                Autodidata que sou, com todos os defeitos do autodidatismo, obscuro estudante e mero perquiridor em campo restrito, mas amigo da inteligência humana em todas as suas primorosas manifestações, venho, de longa data, empregando meus escassos recursos intelectuais no intento de realizar alguma coisa de útil para o desenvolvimento das letras locais. E toda a minha glória, a suprema ventura para mim, reside justamente na circunstância de verificar, hoje, que o meu esforço, apesar da insignificância da obra realizada, com o muito, o infinito do que está para ser feito, mereceu de todos vós atenção e prêmio que longe estive de imaginar. Sinto-me, assim, encorajado a levantar minha débil voz para solicitar de todos quantos desejam ver Tanabi, esta encantadora cidade que tem o condão de prender todos aqueles que a visitam, ocupar um posto de merecido destaque nas letras regionais, a intensificação de seus esforços a fim de que, em época não mui distante, nos seja possível apontar a existência, ao lado de “Arribada”; suculento pomo de sensibilidade e poesia, de obras tão valiosas quanto esta, indicadoras de nosso clímax literário. A tarefa exige de todos vós um esforço prolongado e ininterrupto, mas, este se justifica, pelo muito amor que dedicais a esta terra, pedaço abençoado do Brasil. A arraigada concepção de que as verdadeiras inteligências estão todas centralizadas nas grandes metrópoles tem exercido influência dispersiva sobre o ânimo daqueles que, no interior, ausentes das tertúlias acadêmicas, se dedicam às lides intelectivas, fazendo-os estar, constantemente, com as vistas voltadas para o que se faz nas capitais onde melhor ressoam as clarinadas da Fama! Se muito temos a aprender com os escritores de São Paulo e do Rio, estes, por sua vez, aqui deviam vir buscar a lição que o nosso povo lhes está oferecendo: a poesia, o romance e o conto que palpitam em sua alma. No entanto, eu desejaria assistir ao nascimento, entre nós, de vocações literárias e artísticas que fixassem todos os múltiplos aspectos da incorrupta alma sertaneja, tão rica de motivos originais e característicos, panda de belezas agrestes, mas sincera. Em “Riopretana”, revista que marca os lineamentos culturais do interior paulista, Tavares de Almeida, seu diretor, exprimiu a necessidade que temos de um romancista que, in loco estude as influências de nosso meio, a vida e os problemas sociais de nosso habitat, meltingpot de raças heterogêneas a ferver o caldo de nossa cultura. Colocando-me sob a égide dessa luminosa inteligência, ouso avançar mais, ir além, preconizando o evento de estudiosos que registrem com fidelidade os ciclos temáticos de nosso folclore, daquilo que constitui ou usos e costumes, lendas, contos e recontos do habitante desta faixa pioneira, na feliz classificação de Pierre Mombeig, e recolha e compare essas veneráveis tradições recebidas de além-mar, enriquecidas, porém, e enfloradas com a seiva impetuosa da exaltação tropical. Entre nós, ainda, há lugar para o sociólogo que saiba perquirir com amor e carinho os recessos da alma popular, o comportamento e atuação do homo  rusticus  a  devassar florestas  e  a  modificar  paisagens.

                Essa tarefa vós a podeis realizar, meus caros amigos e concidadãos, com os dotes de vosso talento e cultivo, com a capacidade de trabalho que, mais de uma vez, já destes provas. E da minha, desta tenda, onde dia e noite tenho sonhado lindos sonhos, eu poderia assistir orgulhoso á passagem gloriosa dos que triunfaram às letras regionais, essa coroa de louros, daqueles que edificaram para a posteridade o monumento para a qual as minhas forças foram limitadas e poucas!

                Pela vossa homenagem, que eu sei vos saiu toda do coração, o meu eterno agradecimento. A obra por mim realizada, por si mesma, não justificaria tão excelsa prova de consideração. Recebo-a pela intenção que nela palpita que é a de estimular os novos e, se assim me permitem, repetindo Humberto de Campos, pelo único merecimento que tenho: o de haver partido de mais longe e ter feito caminhada mais árdua que a de quantos palmilharam a mesma estrada, para cantar,  afinal,  com  o  poeta:

                                                                “Eu desta glória só fico contente
                                                              Que a minha terra amei e a minha gente!”

* O jantar teve início às 20h00 e terminou às 23h00. E os amigos seguiram para casa de Sebastião A. Oliveira e, lá, continuaram a declamar poesias.

Após o jantar, na residência do homenageado; presentes os amigos que o acompanharam,  lê  versos  de  sua  autoria:

Oscar Rufino

Funcionário Público.

Ao Sebastião, como lembrança de amigo velho, aí vão uns “Pés Quebrados”.

Meus amigos, meus senhores, Eu faço esta oração,Atendendo o “povaréu”,Com as forças do pulmão,Saudando o homenageadoNosso amigo Sebastião.

Tanabi tem dado livrosE todos livros “dos bão”.Mas, como teu, isso é “peta”,Ninguém rasga o “Expressão”!Pode crer no que te digo,Meu caro Sebastião.

______ * ______

167

Eu fiquei “abestalhado”Já por ser um bestalhão.Se você fosse “calçudo”,Não fazia um livro não.“Desguaritar” dessa forma,Só mesmo o Sebastião.

Eu gostei e não é “puia”.Eu não faço “encrenca” não,Vestir a minha “fatiota”Pra vir dizer “palavrão”,Com a parte de “gabola”,Isso não seu Sebastião.

Teu livro está de “encantar”.Prende da gente a atenção,É um livro de verdadeMerece o teu “Jamelão”.Não é livro de “leréia”,Meus parabéns, Sebastião.

Você não fique “macambúzio”Com a minha saudação;O teu livro está na “ponta”,Não há nele confusãoNem “nhem-nhem-nhem” idiota,Acredite, Sebastião.

“ Os anjos digam amém”,“depois da minha oração”“que recai só em vocꔓcom a nossa gratidão”“panduio cheio”, já sabe:“dar o fora”, Sebastião...

Esta “querência” é boaE é festa sem “rojão”;O pessoal não é “sapeca”E não tem nenhum “tição”Nem “tapados” que não vejamTeu esforço, Sebastião!

O “urutáo” já está cantando,Alegrando o coração,E eu vou “passar a vara”A um “xará” de expressãoQue não “zangue” como euPra te saudar, Sebastião.

Finalizo estas palavras, Pedindo a todos perdão.E se não me entenderam,Consultem “o livro” e verãoQue capricho e que beleza!Meus parabéns, Sebastião.

Tanabi, XIV —V —MCMXL.

Pessoas que tomaram parte no JANTAR —ÍNTIMO

Sebastião Almeida Oliveira - Homenageado, Vergniaud Mendes Caetano - Prefeito Municipal, Valentim Alves da Silva - Funcionário Público, Constantino de Carvalho - Diretor do jornal ”A Cidade” de Monte Aprazível, Joaquim Pacca - Funcionário Público, Oscar Rufino - Escrivão da Delegacia de Polícia, Francisco Vargas —Farmacêutico, Francisco Duarte Azadinho - Coletor Estadual, Tiago Caruso - Chefe do Posto Fiscal da Dir. Receita, Manoel Garcia de Oliveira —Proprietário e Político local, Pascoal Albanese —Contador, Antonio Guimarães —Oficial de Farmácia, Felipe Liebana Torres —Comerciante, Arí Terra Sóssio —Dentista, Militino Rodrigues Barbosa - Diretor do jornal ”Tanabiense”, José Caetano - Proprietário da Tipografia São José, Dr. João Celestino de Almeida —Médico, Francisco Vilar Horta - Escr. Cartório de Américo de Campos, Henrique Alves de Souza —Fazendeiro, João E. do Herval Martins - Guarda-Livros, Antônio Primo Mazza - Guarda-Livros, João Siqueira - Funcionário Público, Tessalônico Barbosa —Proprietário, Pedro Benfati —Comerciante, Basílio Almeida Oliveira - Escr. do Cart. de Cosmorama, Bernardo de Felipe —Dentista, Tufi Abufares —Proprietário, Pedro Mateus de Assis —Dentista, Padre Fidélis Orueta - Vigário da Paróquia, Jerônimo Fortunato Alves Pereira - Juiz de Paz, Sarkis Chain —Comerciante, Basileu Estrela —Oficial do Registro Geral de Monte Aprazível, Antonio Pacca Jr. —Oficial do 2º Tabelião de Monte Aprazível, Germano Robach —Agrimensor, Joaquim Batista de Oliveira —Cirurgião Dentista, Rachid Homsi —Comerciante, Julio Martins Barradas —Comerciante, Gustavo Fernandes Nogueira —Comerciante, Sebastião Ventura da Silva —Proprietário, Jorge Homsi —Comerciante, Brasil Basso —Proprietário, Jorge Marão —Comerciante, Núncio Celeri —Proprietário, Dr. A. M. Pereira Nunes —Médico, Nestor Negreli —Industrial, Oto Pinkwart —Industrial, Joaquim Flausino da Silva - Funcionário Estadual, Marão Elias Marão —Comerciante, Romeu Cabral - Professor Estadual, Alberto Vendramini —Industrial, Josué José Paglione —Fazendeiro, Cirílo Vendramini —Comerciante, João Vargas Filho —Construtor, João de Mello Macedo —Farmacêutico, Dr. Joaquim S. Câmera —Médico, Dr. Assis Santana  — Médico,  Dr.  J.  Barreto  Filgueiras,  Dr.  Otávio  Stucchi...


Benedito Fernandes Sampaio

“O Município” está de lucto!

Benedito Fernandes Sampaio, seu director, após prolongados sofrimentos fechou  os  olhos  para  sempre  às  23 horas  de  24  deste.

Com ele morre o paladino da imprensa local!

Natural do Espírito Santo do Pinhal, era filho de Luís Fernandes Sampaio, residente neste município, e de dona Maria Teodora Sampaio, já falecida. Deixa viúva dona Clarice G. Sampaio e, na orfandade, um púgilo de filhinhas que o estremeciam.

Viveu sempre junto aos prelos, conseguindo, com tenacidade, galgar todos os postos até o de director. Em sua terra natal, posteriormente em Catanduva e por último nesta cidade, onde foi o pioneiro do jornalismo tanabiense, fundando, em 1925, este jornal, que se identificou à vida do próprio município que, como ele, fora instalado nesse ano. Manteve, assim, numa simbiose perfeita, com nossa alforria política, este jornal que sempre esteve consagrado aos interesses desta terra.

Tem ele larga folha de serviços prestados à colectividade e neste semanário sustentou campanhas de vulto, não obstante os percalços que todos sabem  existir  no  jornalismo  do  interior.

Em 1.936, foi eleito para o lugar de vereador municipal e, por escolha de seus  pares,  desempenhou  o  cargo  de  secretário.

Era, também, sócio efectivo da Associação Paulista de Imprensa.

Por isso, é com a mais profunda mágua que redigimos estas linhas, deixando, aqui, consignado o pesar de todos os trabalhadores desta casa, auxiliares, redactor e colaborares, com o desaparecimento de seu director.

Cabe aqui uma referência final: ”O Município” não deixará de existir e não mudará de orientação, da orientação que lhe imprimiu seu extincto chefe. Tendo o favor do

público, continuará como sentinela avançada da imprensa regional, a cumprir o seu programa  que  se  resume  em  servir  os  supremos  interesses  de  Tanabi.

* O referido faleceu aos 35 anos de idade,sem assistência médica, tendo atestado oseu óbito o Dr. João Celestino Almeida. Estásepultado no cemitério central de Tanabi;sob o nº 577 (sepultura).

Notas biográficas sobre o fundador do jornal “O Município” em sua primeira fase.

Nosso Aniversário

Comemora hoje “O Município” seu oitavo aniversário. Verdade seja que, por circunstâncias várias, as quais não vêm a pelo esmiuçar, seu aparecimento não tem sido regular nos últimos meses do ano que se findou; mas, também é preciso que se diga, não fora um grande esforço de nossa parte, secundados por alguns abnegados companheiros, já não estaríamos aqui, com o presente número, a rememorar esta data festiva para os trabalhadores da pena, neste recanto da gleba paulistana.

                A história de “O Município” confunde-se com a história da imprensa tanabiense numa simbiose perfeita. Assim é que, em 18 de maio de 1925, José Batista Carvalho, o “pioneiro” das lides jornalísticas em nosso meio, com o fito de acompanhar o movimento progressista do recém instalado município, lança o primeiro do semanário, “O Direito”, de pequeno formato mas bastante expressivo, com o ânimo suficiente para cumprir o programa que era o de propugnar, na medida de suas forças, pelo engrandecimento da novel cidade sob cuja égide se erigira. Esse periódico vingou até fins do ano seguinte, sendo, por último, orientado por Augusto Bartholo, que lhe imprimira feição mais combativa, sustentando renhidas campanhas. Bartholo e Augusto Abufares associam-se nessa empresa, mudam-lhe o título para “Comarca de Tanabi” e desfraldam a bandeira reivindicadora de nossa autonomia judiciária —infelizmente até hoje não conseguida. Mais um ano decorrido e,  criada  a  comarca  de  Monte  Aprazível,  esfria-se  o  ânimo  dos  lidadores.

                 A 5 de novembro de 1927, Benedito Fernandes Sampaio, pinhalense vindo de Catanduva e que já há alguns meses laborava intramuros, adquire o maquinário do jornal, mudando-lhe novamente o cabeçalho para “Cidade de Tanabi”, por isso mesmo mais consentâneo e conforme com a realidade dos fatos. Torna-se “Cidade de Tanabi” o porta- voz das lutas políticas de então. Estala a

revolução liberal de 1930 e a Constitucionalista de 1932; sucedem-se as administrações provisórias até que assume a chefia do executivo local o esforçado militar Odilon Pacheco que, desejando ligar o seu nome à administração citadina, procura impulsioná-la em todos os setores de sua atividade e para o nosso jornal adquire novas máquinas, assume-lhe a direção, transformando-o em “O Município”, nome  que  ainda  conserva  até  hoje.

Artigo escrito para comemorar o8º aniversário do jornal “O Município”.

Tanabi, 24 de dezembro de 1939.

                Volvidos alguns meses, novamente Benedito Fernandes Sampaio empunha o leme de comando, posto em que o foi encontrar a morte traiçoeira, já no segundo semestre de 1938. Durante esse largo período de intensa atividade, “O Município” de ano para ano melhorou, ainda que lutando com toda a sorte de empecilhos que todos sabem existir na imprensa do interior. Defendeu com denodo os interesses municipais, sustentou renhidas pelejas, avultando, entre elas, a questão da estrada de ferro; registrou com fidelidade as transformações operadas em nosso ambiente e teve palavras de simpatia para os prefeitos que realmente trabalharam pela nossa prosperidade, acolhendo com estímulo e apreço todos os bons empreendimentos; em suas colunas foram ventiladas múltiplas questões pertinentes ao nosso meio e tratados com verdadeiro carinho as coisas tanabienses; por último, aí tiveram guarida trabalhos literários de colaboradores locais, trabalhos esses que mereceram citas e até honrosas transcrições em jornais e  revistas  da  Capital  e  do  interior.

                Infelizmente, com a alienação de sua oficina impressora e outros tantos embaraços surgidos, ainda que “O Município” já estivesse a nosso encargo, não foi dado, por mais que a isso nos esforçássemos, sustentar-lhe o tamanho e mesmo a desejada periodicidade semanal. Ultimamente sofreu colapsos e até ultrajes, mas, graças  a  Deus,  ainda  existe!

                Existe e é mister que não se apague a flama que o anima, porque não é concebível que Tanabi, possuindo idênticas, se não melhores possibilidades que suas congêneres circunvizinhas, não lhe seja dado manter um hebdomadário dedicado integralmente à defesa de seus mais sagrados direitos, de suas prerrogativas de município autônomo e progressista, porque é preciso convir que nenhum alienígena, sem interesses aqui radicados, sem comungar conosco, venha a quebrar lanças pela nossa causa, bater-se pelos nossos princípios; nós é que temos o imperioso dever de nos armar cavalheiros desta cruzada e, para que isso aconteça, preciso é que todo o bom tanabiense cerre fileiras em torno deste jornal, deixe seu conformismo improdutivo, sua inércia apática e venha colaborar conosco, contribuindo  moral  e  materialmente  pelo  soerguimento  desta  folha.

                Só assim poderemos cumprir o programa traçado que é o de erguer, cada vez mais alto, o nome de Tanabi, não mais simples referência geográfica, mas, sim, uma  das  mais  importantes  da  fronteira  planaltina!

Primeira Etapa

                Primeiro aniversário de “O Município”, a ocorrer em 24 de agosto de 1942.

                Com o presente número, completa “O Município” seu primeiro ano de vida, a etapa inicial de sua carreira que não sabemos, mas supomos longa e, quiçá, proveitosa aos supremos interesses do meio haure a seiva de sua existência; e é de praxe, nessas ocasiões comemorativas, fazer um balanço das atividades desenvolvidas no transcurso dos 365 dias volvidos, a fim de, com a experiência adquirida, através de vicissitudes as mais ásperas e alegrias as mais límpidas e propulsoras, traçar, para os dias vindouros, incertos e sombrios como os que atravessamos, um programa de realizações que consubstanciem os interesses próprios e os da coletividades a fim de que a marcha prossiga, ininterrupta e produtiva, na agradável tarefa de bem servir nossa terra e, com ela, os altos interesses  de  São  Paulo  e  do  Brasil!

                Sem a menor sombra de falsa modéstia, sem constrangimento algum, do cimo destas colunas proclamamos alto e bom som termos procurado servir os magnos anseios do povo tanabiense, buscando, para isso, interpretar e resolver seus problemas de município jovem e amparar sua mais prementes necessidades; com esse intuito, as páginas deste jornal veicularam sempre alvitres e iniciativas as mais felizes, quer partissem estas das autoridades administrativas, quer emanadas diretamente das classes populares, uma vez que elas visassem única e exclusivamente o soerguimento moral de nossa gente e tivessem em mira acompanhar, pari passu, o vertiginoso progresso de nossa urbes e de toda a dilatada  gleba  municipal.

                Também reconhecemos, pensar de outra forma contra senso seria, que nem todas as nossas campanhas lograram êxito completo em sua finalidade; mas, como nada se perde e nada se cria, conforme antigo aforismo, os nobres intuitos dessas campanhas serão as sementes que um dia eclodirão no terreno sáfaro onde

foram esparzidas. A localização de uma escola prática de agricultura nas imediações da estação de Engº Balduino não obteve mais que o apoio de algumas vozes isoladas, é verdade, estas, por si sós, abonadoras de nossa tese, mas, em compensação, aí estão realizações que a seu tempo patrocinamos e que ora se ostentam como conquistas de nossas lutas: a instalação, em nossa cidade, do cartório de registro geral da 2a circunscrição, caso único no Brasil, dado não ser o município sede comarcal; o funcionamento, em prédio próprio, exemplo vanguardeiro em toda a região, da Biblioteca Pública Municipal, nascida de alvitre lançado destas colunas e secundado por um púgilo de intelectuais que, graças a Deus, Tanabi se orgulha de possuir; temos, ainda, força é confessá-lo nesta prestação de contas, levado nossa pedrinha de estímulo à próxima instalação aqui de uma agência do Banco do Estado, em prédio adrede construído; a instalação de um campo de pouso para aviões com escola de treinamento em vigor e para a modernização das praças de esporte que vêm atraindo, de toda a região, uma corte de atletas e esportistas em disputas renhidíssimas de prélios empolgantes. Nas páginas deste semanário acoroçoamos sempre os pruridos de emancipação judiciária dos distritos e, como fruto desse trabalho, temos a recente elevação de Brasilândia  e  Cardoso.

                Cumpre rememorar, aqui, nossos lembretes semanais profligando, através da seção “Locais”, a existência de terrenos baldios em pleno centro citadino e a conseqüente morosidade nas construções, fatores que retardam nosso progresso demográfico, dada a exigüidade de prédios locáveis. Nossas freqüentes notas sobre a instrução e a necessidade inadiável da ereção do edifício do Grupo Escolar levam-nos a registrar a notícia da promessa governamental de que dentro de  alguns  meses  será  iniciada  essa  construção.

                Como podem aquilatar nossos leitores, no ano que se findou nosso jornal jamais deixou de aparecer pontualmente uma só vez, mas, vencendo galhardamente toda a sorte de óbices que se antepõem frente à imprensa sertaneja, saiu todos os domingos à hora aprazada, num ritmo constante de vida regular e assim, com o favor público, esperamos mantê-lo no decorrer do ano que se inicia, salvo os imprevistos inevitáveis que rondam a existência do jornal do interior.

                Também no terreno literário tem “O Município” colhido farta messe de louros, impondo-se sobranceiro no conceito público, já sustentando idéias compatíveis e coadunantes à evolução, que ora presenciamos, a ponto de causar viva admiração aos que nos visitam e à população das cidades circumvizinhas, já preconizando a eclosão de nossas forças latentes e o desenvolvimento de nossa economia agro-pecuária. Nossa campanha de otimismo tem conseguido, como frutos ópimos, o afastamento de fantasmas deprimentes, alojados na imaginação doentia de alguns quinta- colunistas portadores de interesses inconfessáveis,

apregoando a decadência de Tanabi, cidade motivada pelo fato de não ser esta tangenciada pelos trilhos da Araraquarense; e esse fenômeno facilmente se comprova pelo desenvolvimento das construções, o recrudescimento de nosso movimento comercial cada vez mais promissor e, em suma, por uma série de realizações que uma administração fecunda, aliada à boa vontade de seus habitantes, vem dotando nossa terra a ponto de torná-la invejada e admirada hoje pelos  próprios  detratores  de  antanho.

                Nosso jornal tem procurado tornar-se o veículo da cultura sertaneja ao serviço da inteligência de seus leitores e colaboradores. Confirmamos nossa assertiva referindo que dezenas de artigos aí insertos em primeira mão têm sido objeto de comentários favoráveis e animadora apreciação da parte de administradores, jornalistas e intelectuais da região, da Capital e de outros centros do país onde quer que esta folha atinja levando nossa mensagem  colaboradora. Esses artigos vêm sendo transcritos por órgãos de reconhecida probidade literária e cultural, fato esse que sobremodo nos envaidece, e nos anima a prosseguir na senda  encetada.    

Tanabi, 20 de agosto de 1942.

“O Município”

                Falar de “O Município”, velho órgão de imprensa tanabiense, é fazer o histórico de nossa urbes e do clã, que a habita porquanto foi ele, durante muito tempo, e continua a ser, a expressão exata do ambiente local. Cabe aqui, por isso mesmo,  ligeiro  retrospecto.

                Tanabi já teve uma série de jornais a partir de sua elevação a município, em 1924, um sucedendo a outro; vale dizer: continuação do anterior com variação de título. Assim é que o primeiro deles, por ordem cronológica, foi “O Direito”, fundado em 17 de maio de 1925 por José Batista de Carvalho, tornando-se, ipso fato,  o  decanto  de  nossa  imprensa  municipal.

                 Em data de 3 de novembro de 1926, surgiu “Comarca de Tanabi”, nome pomposo que bem demonstra como era velho nosso desejo de alforria judiciária, só conseguida em 1945. Dirigiu-o, algum tempo, o espírito irrequieto de Augusto Bartholo.

                Um ano após, ou seja, precisamente em 5 de novembro de 1927, Benedito Fernandes Sampaio, que já vinha trabalhando na redação de “O Município” desde sua fundação, muda-lhe o rótulo para “Cidade de Tanaby” e o mantém regularmente até fins de 1932. A 1 de janeiro de 1933, qual nova crisálida, sai à luz “O Município”, sob a direção de Odilon Pacheco e Gilberto de Andrade, mas, na verdade, cozinhado pelo indefectível Benedito Fernandes Sampaio, que por mais de uma década foi tenaz e persistente mantenedor da imprensa nesta cidade, atendendo-se ainda que um mês não era decorrido quando o mesmo Sampaio assume a responsabilidade do jornal, fazendo-o circular, a despeito de todas as dificuldades, até às vésperas de ser falecimento, a 24 de agosto de 1938. Dessa data em diante, nosso modesto nome passa a figurar no cabeçalho de “O Município”, como seu diretor, não por assomos de vaidade, que disso não curamos, mas tão somente em homenagem a quem nos precedeu e também para não deixar perecer a flama, que sempre nos impulsionou, porque isso de escrever para jornal, ou melhor, ser jornalista, é um vicio, é uma cachaça, como assevera com muita justeza o exímio biógrafo  de  Machado  de  Assis,  Mário  Matos.

                Mudando de assunto, assinalemos ainda a pertinácia de Miltinho Rodrigues Barbosa que, de vez em quando, assume o comando deste semanário, mantendo-o  com  hiatos  e  intermitências  ao  sabor  das  circunstâncias.

                Foi então que o signatário destas linhas, aliando-se ao dinamismo de Valentim Alves da Silva, unidos por um só ideal que era o de não deixar perecer a imprensa local, manter sua tradição, fizeram que o jornal viesse à tona revestido de novas roupagens. Saiu a 20 de agosto de 1941 o número inicial desta segunda fase, que se caracterizou por sua regularidade, e ainda por conter, cada número, trabalhos originais que o tornavam requestado por todos, gregos e troianos.

                Cabe aqui um parêntese: a rigor, “O Município” deve comemorar seu aniversário não agora, a 20 de agosto, quando completou treze anos de existência e, sim, a 01 de janeiro, ocasião que perfará, precisamente, vinte e duas primaveras. Mas, por ter sido iniciada numeração nova, a partir da segunda fase, convencionou-se designar a data de 20 de agosto como efeméride comemorativa.

                Decorridos meia dúzia de anos por motivos supervenientes, entregamos “O Município” a Mário Mendes Ferreira e João de Mello Macedo, espíritos lúcidos sempre voltados para as boas causas ou, por outra, estes é que não se conformaram com vê-lo desaparecer e o mantiveram por mais alguns anos com aquela diretriz segura que sempre foi o seu apanágio.

                Depois é Nelson Camargo que enfrenta o batente mais algum tempo, auxiliado pelos bons amigos da imprensa local. Após ligeiro hiato, ressurgindo, qual nova fênix, em sua fase atual, orientado por Waldemar Alves da Costa, Venizelos Papacosta e Italino ª Cuogui, que, imbuídos do mesmo ideal, insuflam-lhe sangue novo em suas artérias.

                Mensagens de amizade e de colaboração, os artigos que o jornal estampa em suas colunas nada mais são que veículos de cultura a refletir o pensamento e a inteligência de leitores e colaboradores. É uma coluna de comunicação com o público. Por isso mesmo, amanhã quem quiser fazer o estudo de nossa história em gestação, é na coleção de jornais como “O Município” que encontrará dados e subsídios para escrevê-la. Sim, por que o jornal, diário ou semanário não importa, longe de ser arquivo de futilidades, como queria Voltaire, é repositório redivivo de tudo o que aconteceu na vida de uma coletividade, tudo aí foi paulatinamente registrado para tornar-se, com o evolver dos tempos, fonte de consulta digna de crédito, atendendo-se quanto é falha a memória popular.

                Nós que já laboramos intramuros desta redação, que o ajudamos a manter algum tempo, podemos dizer, com toda a convicção, quanto é penoso sustentar um jornal no interior, principalmente nos pequenos centros como o nosso. É preciso ter vocação para mártir, fazer os prelos gemer em surdina, dia após dia, na tarefa ingrata de soltar os volantes. E, para enchê-lo com matéria que não seja publicidade, ou transcrições, é mister espremer o cérebro e dar tratos à bola a fim de que o artigo de fundo, as várias ou o suelto contenham algo de interesse, coisa digna de acatamento e, de admiração por parte dos leitores e, sobretudo, não ofendam quem quer que seja, não vá precipitar vagalhões nas vagas sempre ondulantes da opinião pública, dado que a sensibilidade da gente interiorana é a mais refinada possível.

                Verdade seja que a ressonância de um jornal de pequeno burgo é também limitada e não alcança as grandes esferas. Mas, ainda que vox clamantis in deserto, é melhor tê-lo assim, pequenino e apagado, a nada possuir, a não ter nada. E vem aqui, a talho de foice, lembrar que nenhum outro jornal, quer das cidades vizinhas, quer dos grandes centros como São Paulo e Rio, nenhum deles, repetimos, poderá defender  com  mais  denodo  nossas  reivindicações.

                Nenhum deles estudará, com mais profundidade e interesse, nossos problemas internos, dado que eles também, onde são editados, tem outros tantos problemas a tratar e outras reivindicações a pleitear. Estão, portanto, em trincheiras opostas, não podem competir conosco e quebrar lanças por nossas causas.

                Daí a necessidade de prestigiar o que é nosso, prata da casa, de acolher esta folha que por longos anos vem sendo porta voz das aspirações tanabienses, jornal que, no mais aceso das lutas partidárias que agitam ou agitaram esta comuna, não perdeu jamais sua serenidade e manteve sempre a mesma atitude outrora  decantada.

                E note-se que isto não é discurso encomendado: saiu ab imo pectore.

 Tanabi, 23 de agosto de 1954.

Fenix Ressurecta

                Todos aqueles que têm uma parcela de amor a esta terra, e são todos os que aqui labutam, devem estar, a estas horas, eufóricos e contentes com o reaparecimento, na arena de combate, de nosso tradicional hebdomadário “O Município” que, após longa letargia, como a que agora acaba de deixar, circula nesta cidade há uma boa dezena de anos, fundado que foi por Benedito Sampaio logo após a instalação da sede municipal, em 1924, e que o autor destas linhas e Valentim Alves da Silva trouxeram, de novo, á luz da publicidade nos idos de 1942.

                A nós, principalmente, que sempre dedicamos a Tanabi o melhor de nossos esforços, modéstia à parte, e nunca fomos cassandras a vaticinar marasmos ou retrocessos para estes rincões, mas sempre acreditamos no desenvolvimento desta comuna, a nós, repetimos, somente alegrias insopitáveis poderiam trazer a notícia sobremodo alvissareira de que este jornal voltaria a circular a fim de que nossos privilégios de cidade intelectual não sofressem diminuição, face a outras que também, êmulas de progresso e estuantes de vida, ostentam índices de cultura, através de vibrantes periódicos, sentinelas a proclamar feitos  ousados  de  gente  que  quer  progredir  e  civilizar-se.

                Diante disso, cabe-nos, a nós, tanabienses de coração ou de nascimento, prestigiar com firmeza e sem dubiedades o jornal que ora reinicia suas atividades, cooperando com este denodado semanário que sempre foi, nada obstante duras penas, veículo de nossas mais lídimas aspirações no campo econômico e social; ajudando-o, moral e materialmente, a fim de que ele possa manter-se a coberto de riscos financeiros, a defender sempre nossos interesses, a noticiar nossas realizações em todos os setores da atividade humana. Corroboramos, nesta assertiva, o que disse Girardin sobre o tema em tela: “Não são os redatores que fazem  o  jornal,  mas  os  assinantes”.

                Prestigiando “O Município”, que é nosso —prata de casa- estamos também confirmando, com apreço e simpatia, o novo surto de progresso que aqui se manifesta e que se concretiza com a próxima inauguração do aristocrático “Clube dos Tangarás”, realização dinâmica de Newton José Cucolíchio, acolitado por uma plêiade de eficientes colaboradores, como um atestado vivo a enaltecer nossos foros de civilização ao lado de iniciativas outras como essa em que se transformou a Indústria Tanabiense de Óleos Vegetais, já em franca produção, as pequenas indústrias e as novas casas comerciais que aqui se instalam, além da inauguração, que para breve previmos, de uma agência do Banco da Lavoura de Minas Gerais, renomado estabelecimento de crédito que, aqui se fixando, por certo ensejará a vinda de outras congêneres também prometidas. Para finalizar, cumpre congratularmo-nos com a população local pela recente inauguração dos belíssimos prédios do 2º Grupo Escolar e da Casa da Lavoura, além dos imponentes edifícios do Banco do Estado, Fórum, Lar das Crianças, Delegacia de Polícia e outros, como os que se acham em construção: o Posto Bivalente, o Colégio Estadual e Escola Normal, capazes, cada um de per si, de honrar e dignificar cidades de maior vulto que  a  nossa  querida  Tanabi.

                                                                                                  Tanabi, 01 de março de 1961.

A imprensa em Tanabi

                Corria o ano de 1924 quando as tropas comandadas pelo General Isidoro Dias Lopes preparavam-se para deixar a capital paulista rumo aos campos fronteiriços do Sul e, em 25 de dezembro do mesmo ano, pela lei nº 2009, Tanabi era guindada à ambicionada emancipação político- administrativa, sendo o município instalado com grandes festas aos 13 de março do ano seguinte. Nesse mesmo dia, surgiu seu primeiro jornal, “O Direito”, sob a direção de José Batista de Carvalho, que exercia, então, as funções de agente postal, tendo, como gerente, Benedito Fernandes Sampaio, sendo certo que o jornal era editado numa tipografia de Uchoa. O Cel. Militão Alves Monteiro, político de projeção regional, vereador junto à Câmara Municipal de Rio Preto, não só obteve a criação do município, como, também, foi seu primeiro prefeito e influiu, até sua morte, em 1931, na condução dos mais importantes eventos municipais. Cumpre ressaltar que, antes do aparecimento do  “O Direito”, circulava semanalmente, em formato tablóide, e foi aqui editado o jornal “Folha de Tanabi” que, sob a direção de Nicolau Lerro, jornalista e mais tarde coletor federal, defendia facção política, mas teve vida efêmera. Depois de “O Direito,” surgiu em Tanabi, “A Comarca de Tanabi”

sob a direção de José Augusto Bartolo acolitado pelo edil municipal Augusto Manoel Abufares, e cujo primeiro número apareceu em 7 de fevereiro de 1926 a expressar o anseio da população local por sua alforria jurídica que, entretanto, foi postergada até 30 de dezembro de 1944, dado o fato de ter ocorrido o linchamento do Cacheado na cadeia pública local, sob as vistas complacentes dos potentados municipais, fato este de grande repercussão em todo o estado, o qual motivou o governo paulista a instalar a comarca não nesta cidade, e sim em Monte Aprazível, aos 26 de maio de 1926,  para  grande  desplante  e  frustração  dos  tanabienses.

                Aos 18 de dezembro de 1927, Benedito Fernandes Sampaio, um batalhador em prol de nossa imprensa, fundou “A Cidade de Tanabi”, passando, este órgão, posteriormente, a ser denominado “O Município” que, em sua primeira fase, teve a direção de Odilon Pacheco, interventor municipal para esse cargo designado por ter sido um dos chamados tenentes da revolução de 1930.

                Exercendo, como exercemos, desde 1927, o cargo de oficial do registro civil, cujo distrito atingia as barrancas dos rio Paraná, publicávamos, como de praxe, os editais de casamento pela imprensa local, depois de afixados em cartório. Acontece, porém, que nem sempre o jornal circulava, e havia casos em que o casamento era celebrado sem a devida publicação e, aos 26 de maio de 1940, José Caetano fundou “O Tanabiense,” tablóide secretariado por Militino Rodrigues Barbosa; mas o jornal não tinha existência jurídica e, ao sermos questionados, por seu proprietário, para que publicássemos os editais no referido jornal, disso discordamos motivados pela agravante de estar ele cobrando Cr$ 20,00 cada edital sendo seu preço anterior Cr$ 5,00, tendo, na ocasião, José Caetano representado ao Juiz da comarca contra a não publicação dos editais. Diante disso, fomos a São José do Rio Preto onde adquirimos por quinze mil cruzeiros uma tipografia que foi transferida para esta cidade e instalada  em prédio próprio anexo ao cartório de paz,

na rua Dr. Cunha Jr, outrora designada Carlos de Campos. Convidamos, então, o Dr. Valentim Alves da Silva, jovem advogado recém chegado da Capital, para diretor, ficando nós como redator-chefe e, assim, fizemos reaparecer “O Município”, aos 24 de agosto de 1941, trazendo este, semanalmente, artigos de cunho intelectual e, inclusive, os indefectíveis editais de proclamas. Note-se que o jornal aparecia regularmente aos domingos e, na ausência de tipógrafos, nós mesmos, os diretores, compunham todas as páginas do jornal, dos artigos de fundo aos anúncios. Foi essa uma luta ingente, pois exercíamos profissão alheia aquela de praxe. E não suponham que o nosso hebdomadário era impresso em modernas rotativas, dessas que hoje compõem em grande jornal em poucos minutos; nada disso, o que havia eram caixinhas contendo tipos de várias qualidades, que a gente tinha de “catar” para com eles compor vinhetas, sueltos, artigos de defuntos e ainda matéria geral de todos os matizes e feitios. Mas o certo é que, nada obstante tudo isso,  vencemos  a  parada,  pondo  de  lado  obstáculos  e  percalços.

                Mais tarde, passada a onda, cedíamos nossa parte na empresa ao Dr. Valentim e, logo após, jornal e oficinas eram transferidos a Nelson Camargo, atual diretor do diário “A Vanguarda”, de Votuporanga, o qual, por sua vez, transmitiu seus direitos à Empresa Gráfica “O Município” LTDA., composta pelos senhores Dr. Waldemar Alves da Costa, Emilio Arroyo Hernandes, Antônio Primo Mazza e Italino Alderighi Cuogui a quem coube, finalmente, o acervo do título e oficinas de impressão, cabendo, ao Italino, a tarefa de manter o jornal até o presente momento, já agora com o título de “O Município de Tanabi”. Na fase anterior, o Dr. Venizelos Papacosta, advogado e educador figurava, como redator do jornal, tendo sempre colaborado em suas colunas. Por ocasião do aniversário de “O Município”, em artigo intitulado “Primeira Etapa”, assim nos expressávamos: “Sem a menor sombra de dúvida, sem falsa modéstia e sem constrangimento algum, do alto destas colunas proclamamos, alto em bom som, termos procurado servir os magnos anseios do povo tanabiense, buscando, para isso, interpretar e resolver seus problemas de município novo ao amparar suas mais prementes necessidades; com esse intuito, as páginas deste jornal veicularam sempre alvitres e iniciativas, quer emanadas das classes populares, quer partissem estas das autoridades administrativas, uma vez que elas visassem sempre o soerguimento moral de nossa gente e tivessem em mira acompanhar pari passu o progresso de nossa urbes em formação e de toda a vasta gleba municipal” . Comentávamos, também, nesse artigo, a próxima instalação do cartório de registro geral, a emancipação dos distritos de Américo de Campos e Cosmorama, a construção do prédio do grupo escolar, mais tarde denominado “Ganot Chateaubriand”, além de outros melhoramentos  almejados.

                No interregno de quase sessenta anos, que abrange o período destas anotações, diversos periódicos aqui surgiram, embora tivessem existência precária, jornais escolares como “O Arauto”, fundado por Júlia Serafim da Silva, “Martin Cererê”, sob a responsabilidade de Nelson Camargo e ainda “O Cererê”, orientado por Luís Maria Aimones Fúmis, poeta concretista e apreciado estilista. São meteoros fugazes que surgem e desaparecem, mas merecedores de apreciação por esta resenha. E, para encerrarmos este nosso despretensioso escorço, eis que surge, em nossos dias, Oue mais precisamente em 18 de março de 1983, o semanário “Voz de Tanabi,” sob a direção de Jomir Maximiano, o qual traz, em seu cabeçalho, a legenda de ser o “mais independente e o melhor jornal da região,” formando, ao lado do veterano “O Município de Tanabi,” intrépida dupla  noticiosa  a  veicular  fatos  e  notícias  dos  pagos  tanabienses.

Tanabi, 21 de julho de 1983.

Estrada de Ferro

                Tanabi está de parabéns!

                De parabéns está toda a população disseminada através dos doze mil quilômetros quadrados de seu território! A Estrada de Ferro Araraquara, o sonho que sintetiza todas as mais altas aspirações deste povo, está em vias de próxima realização com a prometida vinda das fitas de aço a esta nunca assaz decantada e promissora  região!

                De facto: o que se depreende das ultimas notícias veiculadas pelos jornais, (notícias essas que tiveram o condão de impirar justificado júbilo em todos os tanabienses) tem-se como certa, inquestionavelmente certa, a efectivação para breve  dessa  importância  medida,  o  prolongamento  da  Araraquarense.

                Nestes últimos dias, tivemos, de fonte oficial, três actos de extraordinária significação para nossa terra; o primeiro emanado da Secretaria da Viação, trata do prosseguimento dessa ferrovia para além do distrito de Bálsamo, passando tangencialmente à mesma localidade; o segundo, um trecho da mensagem do preclaro Chefe do Executivo paulista à Câmara dos Deputados, em o qual, o Dr. Armando de Salles Oliveira, com a visão de estadista que o notabilista em todos os seus actos, preconiza a orientação da estrada pela margem direita do rio São José

dos Dourados em demanda do rio Paraná, e, finalmente, como fecho de ouro de tão relevantes medidas, a autorização publicada no “Diário Oficial” de 08 de julho corrente, mandando prosseguir trinta quilômetros, além de Mirassol, conforme estudos anteriormente feitos; eis, na íntegra, o teor desse despacho: E.F. Araraquara: Autos 19664 —Prolongamento de 30 quilômetros além de Mirassol —“Autorizo a construção do prolongamento de 30 quilômetros da EFA, segundo o projecto e orçamento; apresentados e nas condições propostas no ofício G 62. Remetam-se estes autos ao Departamento de Estradas de Rodagem, a fim de que o mesmo tome conhecimento das sugestões do Sr. Director da EFA no ofício acima mencionado, relativamente a estradas de rodagem na zona interessada”.

                É de ver-se que tópico transcrito situa claramente o ponto final desse prolongamento precisamente em Tanabi, uma vez que essa é a distância que medeia entre nossa “urbs” e Mirassol. Mais tarde, como bem dizem as referências da mensagem estadual, o desenvolvimento da estrada proceder-se-á até o rio Paraná, em ponto conveniente, após um percurso de 216 quilômetros pelo dorso do divortium aquarium São José —Preto e São José —Turvo, atravessando em cheio o imenso hinterland tanabiense, de acordo com o admirável traçado de autoria de Gonzaga de Campos que, criteriosamente, seguiu os passos do saudoso Pimenta Bueno e outros menos ilustres engenheiros patrícios, todos acordes em que essa linha de projecção continental prossiga pela margem direita do São José dos Dourados.

                Sim, porque, somente com essa directriz, poderá realizar in-totum os objectivos que colima, os quais, entre outros de alta finalidade, se consubstanciam nos postulados de Euclides da Cunha: a) conquista dos sertões; b) enlace internacional  imposto  pela  pressão  dos  acontecimentos.

                Não será demasia salientar que esta última proposição refere-se à defesa estratégica contra possíveis convulsões internas e não menos viáveis ataques às nossas  fronteiras.

                O Diretório Político do Partido Constitucionalista local não se tem descurado desse magno assunto e é assim que, além de entendimentos pessoais com os membros do Governo, ao ter conhecimento do acto oficial determinando o prosseguimento da linha-tronco para esta zona, endereçou longo ofício ao Exmo. Sr. Governador do Estado, Secretário da Viação e mais autoridades, congratulando-se com a mesma e fazendo, ao mesmo tempo, veemente apelo, a fim de que os nossos interesses, os legítimos interesses de Tanabi, não fossem postergados ou quiçá postos à margem, quando da materialização desse relevante cometimento, e, além disso, presentemente, patrocina uma representação popular, verdadeira moção de solidariedade ao Governo paulista que em boa hora enfrenta e resolve  um  dos  mais  intrincados  problemas  da  região.

                Dizemos enfrenta e resolve porque as palavras do documento governamental, longe de serem unilateralmente a favor de nossa terra, Tanabi,

contemplam a laboriosa população de Monte Aprazível com a promessa de que estudos estão sendo feitos dum ramal que “partindo das proximidades de Santa Adélia, se desenvolveria no espigão divisor dos rios Tietê e São José dos Dourados” servindo, dessarte, Mundo Novo, Itajobí, Ibirá, Potirendaba, José Bonifácio e Monte Aprazível,  ou  seja,  a riquíssima  zona  de  sua  trajectória.

                Dada a posição favorável do terreno desprovido de relevos ou acidentes de mor importância, o que equivale a dizer com reduzido número de obras de arte a construir, cremos, firmemente, na possibilidade auspiciosa de ouvir o silvar das locomotivas nas cercanias da cidade dentro do menor espaço de tempo. Teremos, conseqüentemente a esse facto, a propulsão dinâmica de todas as nossas actividades —lavoura, comércio e indústria, à imediata solução do momento e nunca assaz resolvido problema dos transportes, para mais rápido escoamento dos productos do solo: algodão, café, cereais, madeiras etc...; o desenvolvimento de nossa cidade que assim se tornará o grande empório do sertão e este, por sua vez, grandemente beneficiado será com o dilatar de sua potencialidade econômica em estado latente; poder-se-á aproveitar em futuro não remoto a inesgotável energia hidráulica contida nas majestosas quedas de água que irrompem nos cursos dos caudalosos  rios  lindeiros  do  município.

                Um sistema de estradas rodoviárias convergentes dos confins municipais, localidades e Estados vizinhos, à sede, trará a Estrada o contingente necessário e imprescindível ao intercâmbio e à economia de tráfego, com reais vantagens à região circumjacente. Haja vista a estrada de rodagem estadual Lussanvira-Porto Taboado, passando por Novo Oriente e ora em construção; com relativo dispêndio pode essa via ser trazida até o ponto terminal da EFA, pondo, assim, em ligação as duas  grandes  congêneres;  noroeste  Araraquarense.

                 Estas e outras considerações poderão ser aduzidas como contribuição ao completo elucidar desse tema de vivo interesse regional, o avanço dos trilhos da E.F. Araraquara, agora encaminhando logicamente ao seu destino natural, súmula que é de aprofundados estudos das nossas maiores capacidades técnicas no campo  ferroviário  indígena.

                 Tanabi, tu que vens sendo embalado desde os primórdios de tua fundação com a promessa de via férrea a rasgar os espigões fecundos de teus dilatados domínios, eia, sus! Desperta: indícios seguros aí estão a afirmar categoricamente que o teu dourado sonho vai ser dentro em pouco esplêndida realidade!

Tanabi, 16 de julho de 1936.

Locais...

                Tanabi vem atravessando, presentemente, fase por assim dizer áurea nos seus faustos de cidade jovem. Dezenas de prédios em construção; melhoria sempre crescente de seu comércio interno, com farta renovação dos estoques; sangue novo a infiltrar-se em suas veias com a chegada, diariamente, de forasteiros aqui aportados com o fito de permanência. Novos empreendimentos públicos e particulares a surgir em todos os recantos da cidade; tudo isso aliado a outros fatores, nos leva a crer que a expansão de nossa terra acompanha agora o ritmo necessário aos grandes cometimentos que todos lhe predestinam. Atingiu, por isso mesmo, seu clímax propício, o que facilmente se constata atendendo que, no Departamento Administrativo do Estado está sendo estudado um projeto elevando sua Delegacia de Polícia para 3º classe; a Coletoria Estadual local arrecadou, em 1942, quantia equivalente a três milhões de cruzeiros; dentro em breve serão iniciados os trabalhos do Grupo Escolar, cujo prédio custará ao Estado cerca de CR$405.000,00; por último, a agência local do Banco do Estado, no curto

lapso de três meses, logrou preencher todos os requisitos para sua elevação de classe, fato virgem comparado a outras agências instaladas em lugares de mais decantado  progresso.

                Diante de tudo isso, resta aos tanabienses trabalharem, com denodo, a fim de conseguirem dos poderes públicos, ainda este ano, alforria judiciária para seu  município,  o  maior  entre  os  maiores  da  terra  bandeirante.

Tanabi, 31 de janeiro de 1943.

Dados Biográficos do saudoso ex-Prefeitode Tanabi, Sr. Pedro Ovídio

                Filho do casal Rafael Ovídio e Dionizia Ovídio, o Sr. Pedro Ovídio nasceu na cidade de Ribeirão Preto; foi fazendeiro em Guapiaçu e, em 1946, transferiu-se para esta cidade onde era abastado agricultor. Casado com dona Rosa Bosse Ovídio teve, o casal, dez filhos: Rafael, Antônio, Maria Aparecida, Dionízia, Dolores, Pedro, Rosalina, Lourdes, Luiz Eduardo e Carlos Alberto.

                Foi vereador em várias legislaturas e, mais tarde, eleito Vice-Prefeito. Nas eleições de 15 de novembro de 1968, foi eleito Prefeito Municipal de Tanabi

e empossado em 1 de fevereiro de 1969, cargo que exerceu durante dois anos e meio, aproximadamente, sendo vitimado por desastre automobilístico aos 18 de julho,  vindo  a  falecer  a  26  do  mesmo  mês,  em  1971.

                Como Prefeito, sua administração caracterizou-se pela parcimônia nos gastos, lisura e honestidade no lidar com as rendas municipais que sempre empregou em obras públicas, educação e assistência social. Reformou mais de 50 escolas e grupos escolares da sede e distritos, criou outras em bairros populosos e, sobre-tudo, atendeu a classe menos favorecida por meio de auxílios, hospitalização e aviamento de receitas. Adquiriu várias máquinas, reformou outras e deu atendimento ao setor de estradas, pontes e mata-burros. Deu cobertura firme a todas as reivindicações dos esportistas locais, Tiro de Guerra nº 50, festividades tradicionais da cidade, iluminação artística nas ruas da cidade e diversos melhoramentos  que  muito  impulsionaram  Tanabi  na  zona  urbana  e  rural.

                Pelos trabalhos que realizou, pelo muito que fez por Tanabi e pelo que muito poderia ter feito, não fora a fatalidade que o vitimou, Pedro Ovídio bem merece ter o seu nome perpetuado, denominando o Ginásio Estadual desta cidade, ele que foi um dos mais esforçados administradores no campo da educação tanabiense.

Tanabi, 22 de junho de 1974. 

De Arribada...

Artigo  escrito  sobre  o livro “Arribada”,de  João  de  Mello   Macedo,para o jornal “A Vanguarda”, de Cássia —Minas e nesteinserta em seu nº 1.056, aos 30/08/1936.

                Com ou sem competência, mais de uma vez tenho apreciado, de pena em riste, o aparecimento de um novo livro no mercado imensurável da Inteligência; nem sempre, porém, minhas modestas e despretensiosas apreciações aparecem inseridas nas colunas dos jornais desta zona; impressões pessoais, de mérito reduzido, nenhum interesse suscitariam de outrem, pelo que as conservo comigo para minha diretriz e orientação somente. Mas, não se infira daí, apressadamente, que me arrogo título ou direito de crítico e de crítica.... Minhas reduzidas leituras não me  autorizam  tentar  escalas  e  leituras  dessa  índole.

                Também, e por isso mesmo, não me é permitido, como seria, aliás, de meu agrado, adornar de galas e louçanias os pensamentos áureos e rútilas imagens que a leitura de bons livros sugerem e como que despertam e turbilhonam esvoaçantes em meu cérebro, evocando idéias novas e novos incentivos para atingir maiores profundidades, para devassar os recantos onde se ocultam as pérolas incomparáveis  da  opulenta  celebração  humana.

                A poesia de largo fôlego afaz-nos às grandes idéias, torna ductil o pensamento, expurga-o de demasias e deformidades —afirma-o a crítica desenvolta  do  inolvidável  Humberto  Campos.

                “Arribada”, no entanto, causou-me pasmo e torpor; pasmo por fotografar, com irrepreensível forma, aspectos bucólicos e agrestes de nossa região pastoril, com a suave melodia de inspiradas rimas; torpor, para meu espírito desajeitado e não afeito às subtilezas ocultas que palpitam nos meandros da verdadeira poesia, e por isso, embora admirando-a, não a sabe compreender, não a sabe ver com olhos que  só  os  poetas  sabem  e  poder  ter.

                Não sei, pois, que palavras alinhar neste axórdio para expressar nitidamente o que se passou nos escaninhos de minha alma ao ler extasiado aqueles adoráveis poemas que J. Mello Macedo —poeta e poeta vencedor, destilou nas páginas desse livrinho para regalo não somente dos que têm a ventura de privar sua adorada companhia, mas de toda a atual geração de brasileiros, cultores,  como  ele,  da  Arte  e  da  Poesia  em  seu  mais  alto  e  excelso  sentido.

                Demais, a crítica indígena, em todos os quadrantes de nossa terra e por seus mais autorizados intérpretes já se desincumbiu dessa tarefa, que sei não cumprir a contento, dando a Macedo o lugar privilegiado que lhe compete na moderna categoria do pensamento brasileiro. Nada é preciso acrescentar ao que dele disseram os magnatas da pena ao estudarem sua personalidade literária, viva, patente e esplendidamente definida naqueles poemas luminosos de “Arribada”!

                Assim é de perdoar-se esta linguagem apagada e despida de luminárias e a delonga em cumprir o elementar dever de externar —em público e raso —os sentimentos de gratidão impecável à dedicatória que o autor houve por bem lançar no frotespício de sua obra-prima, não tanto por ser o fruto primeiro de seu espírito de eleição, que muito nos promete, como, também, pelo merecimento real que tem —oferenda régia que aguardei avaro ao lado de meus livros de maior predileção.

                “Arribada” fala de um modo particular e tocante à nossa alma de tanabiense, toca-nos de perto em nossa psique ao retratar fidelissimamente os aspectos, a natureza e a humanidade privilegiada da região abençoada que elegemos para o cenário de nossa vida. Eis como o troveiro das gestas sertaneja canta deslumbrado o cemitério humilde e paupérrimo de nossa terra, patrimônio sagrado  de  nossas  mais  devotadas  tradições.

ELEGIA

Melancolia amável de esquecer as horas,a contemplar-te,                    cemitério humilde de minha aldeiaBucolismo suave de scismar,à sombra humida dos açoita-cavallos,debruçando as ramas florescidas,como bençams estendidas,por sobre o teu cercado de aroeiras a pique.Doçura de sonhar, ao rumor elegiaco do vento, que vem do capoeirão bravio, em que te occultas,embalsamado de aromas,povoado de cigarras,de cigarras e de pássaros.

 Cemitério humilde de minha aldêia,sem cyprestes educados,sem marmores aristocraticos,sem pompas,sem fatuidade!(Apenas, adornando-te a simplicidade,boas-noites estrelladas de roxos,a emergir do tijollo musguento dos túmulospobres,môitas rasteiras de periquitos plebeus,alastrando-se pela terra fôfa das covas,coqueiros esguios e asimetricos,a soerguer para o alto o verde novo das palmas...)É ahi, cemitério da minha villa,no teu recanto placido e rural,cheio dessa graça simples e tranquilla,que abranda e que commove o espírito mais forte,é ahi que chega a ser voluptuosoo pensamento lugubre da morte...

                Destacando esse poema não é meu intuito aventar seja o único dedicado à nossa terra; muitos outros se nos deparam no âmago dessa relíquia literária e até se nos afigura que Mello Macedo teve a benévola preocupação, para não ferir melindres, de repartir conosco e sua terra natal —Cássia —as primícias promissivas de  seu  talento  de  escol.

                A Canção do Peão de Boiadeiro, tipicamente regional, deve ter sido concebida quando, emocionado, seu compositor ouvia as modinhas dolentes e saudosas da peonada folgazã, nas horas divertidas dos pousos, esses históricos pousos que emergem ao longo da velha estrada boiadeira e pontilham, em pás aqui-distantes, a diagonal imensa do vasto território tanabiense, sendo Porto-Taboado referência geográfica muito conhecida referendada nessa evocativa canção.

                Nocturno, Arribada, No pouso, Monjolo, A derrubada, Recortado e tantos outros encantadores fragmentos de seu livro parecem escritos com o louvável propósito de fixar os quadros folclóricos da região —ainda remota e desconhecida nas grandes Capitais —quadros esses vinculados por um estilo harmonioso, conciso e emoldurados de graça, na variabilidade intangível de seus ritmos escolhidos, sabido é que “O lavor do estilo é a mais custosa das artes, mas só o estilo dura as obras no tempo. A simplicidade da perfeição vem  do longo esforço, que é um longo amor na divina angústia do belo”, segundo a definição cristalina de Aloísio  de  Castro.

                Os largos vôos demorados e solitários sobre os altiplanos do espírito na contemplação filosófica das cousas estão soberbamente esteriotipados nas oitenta e sete páginas de seu exímio lavor e aí também se divisam, em pronunciados contornos, o temperamento de Mello Macedo, - sua invulgar cultura, proporcionados por extraordinário manuseio livresco, assombrosa memória e rara capacidade de assimilação. Foi isso, talvez, que levou Jurandir Ferreira a escrever, há mais de um septenário, em “A Folha”, de Poços de Caldas e subordinado ao título: “Um poeta de verdade”, este revelador trechinho: “O fato é que nesta nova geração mineira nós não conhecemos nenhum outro poeta que lhe tenha ganho o passo. Citaríamos Carlos Drumond, Abgar Renault, para nomear alguns de grande lustre os modernos, e ele não seriam maiores do que Mello Macedo, talvez o mais novo  de  todos”.

                Bem hajam, portanto, aqueles a quem não esquecem os grandes serviços, os fecundos benefícios que semeiam, em sua gloriosa jornada, esse homens astros, esses vultos singulares, que honram e enobrecem, com as cintilações de seus espíritos, a si próprios, o país em que aspiraram a primeira aura de vida, a humanidade, de que servem de luzeiros e onde a nacionalidade assenta o pedestal de sua glória e grandeza literária, mirando-os e apontando-os como árduos e argutos timoneiros do futuro engrandecimento da pátria —palavras de Carneiro Ribeiro,  que  faço  minhas,  para  saudar  o  Vencedor!

                Aplicáveis lhe são estes conceitos de Amadeu Amaral, em “Letras Floridas”, pormenorizando em magnífico estudo a vida de Raimundo Correia: “O que, apesar de tudo, pudesse haver de relevo e de cor em sua vida, ele o dissimulava à contemplação os estranhos sob a bruma de um tímido e silencioso retraimento”, porquanto, não é somente como poeta que Mello Macedo nos é caro. Ele é, sobretudo, um bom, de uma bondade sem limites, meldrosa delicadeza e elevação de sentimentos, um reconcentrado, vivendo sempre uma potente e radiosa  vida  interior,  vida  que  produz  lantejoulas  como  essa  “Arribada!”

                Confúcio, o venerável filósofo da China vetusta, dividia os homens em quatro classes: bons, médios, medíocres e maus. Macedo, sem nenhum favor, está capitulando entre os primeiros; invoco, em meu testemunho, a opinião dos habitantes de Tanabi, das mais altas às ínfimas camadas, pois todos o rodeiam de uma aura de simpatia e acolhimento persistente. Ele bem sabe repartir cada dia entre vivos e mortos, o amor e o pensamento que é a melhor forma de viver.

                Buscando desfazer a má impressão destes desataviados comentos facultados ao seu autor, e para isso rogo vênia, transcrever esta jóia de valor inestimável  que  emoldura  um  dos  capítulos  de  seu  relicário  poético:

MANSUETUDE

Como é dôce ficar, horas mortas, ouvindoo manso farfalhar das arvores amigas,sob o vento nocturno,e o abafado ruído dos fructos maduroscaíndo sobre as fôlhas húmidas do chão,no perfume envolvente do pomar...Como enternece à gente esperar pelo somno,quanto, lá fóra, a noite sensual do outomnoanda embriagando as flôres de sereno e de luar...Oh! a volupia de ir-se adormecendo,a ouvir uma canção de acalanto e de magua, que nos embala, de longe, bem de longe, na marulhosa quéda de algum vêio dagua...

Tanabi, 13 de dezembro de 1935.

João de Mello Macedo e Sebastião Almeida Oliveira sendohomenageados no Clube dos Tangarás.

 

Mensagem do Prefeito Municipal de Tanabi ao Exmo. Sr. PrefeitoMunicipal de Campo Belo, MG.  A ser entregue no Programa Silvio Santos, dia 30 de maio de 1969.

Redação de Sebastião Almeida Oliveira.

                 Representando os trinta mil habitantes do município paulista de Tanabi, metade dos quais vive e labora na sede municipal, tenho a honra insigne de enviar ao ilustre Prefeito de Campo Belo, MG., esta mensagem de confraternização, com o amplexo amigo de todo o povo tanabiense, irmanado por um só pensamento, qual seja o de homenagear o laborioso povo campo-belense, neste momento solene em que o programa Silvio Santos houve por bem ligar duas comunas distantes num só ideal  de  simpatia  recíproca.

                Tanabi, no 87º aniversário de sua fundação, elevado a município em 1924, vinte anos depois comarca e já agora com foros de segunda entrância, ostenta os melhoramentos de uma cidade civilizada, com todas as suas ruas e praças iluminadas a mercúrio e asfaltadas. Possui invejável topografia, clima ameno e está situada na região fisiográfica noroeste de São Paulo, sendo ligada à Capital por magnífica estrada pavimentada e servida por numerosas estradas vicinais e inter-municipais, além da Estrada de Ferro Araraquarense com duas estações ferroviárias  no  território  municipal.

                A urbes conta atualmente dois mil prédios de alvenaria com perfeito serviço de água e esgoto, farta iluminação elétrica, telégrafo, telefone etc. Possui Hospital, Tiro de Guerra, semanário “O Município”, emissora ZYM-4 Rádio Clube de Tanabi, quatro estabelecimentos bancários, Caixa Econômica Estadual, Coletorias Federal e Estadual, Fórum, cinco cartórios, Estação Rodoviária, Campo de Aviação, Bibliotecas, Delegacia de Polícia, Posto Bi-Valente, Casa da Lavoura, Sindicato Rural, Igreja Matriz Santuário, dois clubes recreativos, três praças ajardinadas, e instituições como Lions Clube, Lar das Crianças, Vila Vicentina, Albergue  Noturno,  Asilo  de  Velhos  etc.

                As principais fontes de renda do município: café, cereais, algodão e gado assim se distribuem: 5.000 cafeeiros produzindo 50.000 sacas beneficiadas por ano; 8.000 hectares plantados em milho produzem 200.000 sacas; 1.000 hectares cultivados em algodão produzem 80.000 arrobas; 500 hectares de mamona produzem 15.000 sacas; 50.000 pés de laranja atingem 100.000 caixas desse produto; 12.000 hectares de arroz dão anualmente 240.000 sacas desse cereal. Quanto à pecuária temos uma população calculada em 50.000 cabeças bovinas com uma produção de 30.000 litros diários e 60.000 arrobas anuais de carne; o rebanho suíno é composto de 30.000 cabeças com 24.000 arrobas anuais de carne e banha; temos, ainda, 100.000 aves com 300.000 dúzias de ovos e 50.000 frangos anuais. O comércio local conta 186 estabelecimentos, 34 máquinas de benefício de café e arroz e mais 15 indústrias diversas, tais como fábricas de móveis, bebidas, usinas de benefício de leite (Nestlé), de algodão, curtume, sapatos e de várias espécies.

                Cinco farmácias, quatro médicos, oito advogados, quatro escritórios, no setor musical, o Conjunto Bossambrasa, a Banda Marcial, fanfarras colegiais e outras.

                Na estação rodoviária local circulam, dia e noite, dezenas e dezenas de ônibus, interligando Tanabi quer ao interior do município, quer às importantes cidades da região: São José do Rio Preto, Mirassol, Bálsamo, Monte Aprazível, Mirassolância, Palestina, Américo de Campos, Pontes Gestal, Riolândia, Cardoso, Cosmorama, Votuporanga, Fernandópolis, Jales, Santa Fé do Sul, e Sebastianópolis  etc...

                 O Município de Tanabi, com 768 quilômetros quadrados, tem um distrito de paz, além da sede: Ibiporanga, e vários núcleos habitados como Ecatu, Perobas, Estação, Rincão etc. É sede de comarca, abrangendo os municípios de Américo de Campos, Cosmorama e Ponte Gestal, com um território de 1875 quilômetros quadrados;  242  hectares  é  a  área  onde  se  assenta  a  cidade.

                É de 15.000 o número de eleitores em toda a comarca e de 10.000 o da sede. Tem 1482 propriedades rurais e arrecadou, em 1968, para os cofres municipais, CR$ 1.584,555,23. Cidade edificada entre dois ribeirões: o Jataí, de onde tirou seu primitivo topônimo, e o Bacuri; tem 525 metros de altitude, 20º22’ de latitude  sul  e  49º37’  de  longitude  oeste.

                O Instituto de Educação “Pe. Fidélis” conta 1.229 alunos matriculados nos cursos ginasial, científico, clássico, normal, e primário; a Escola Técnica de Comércio abriga 145 alunos dos cursos comercial e técnico, e o seis grupos escolares da sede e zona rural e 46 escolas isoladas instruem 2.170 alunos do curso  primário.

                Aí está, pois, em rápidas palavras, um retrospecto de nossa terra e de sua laboriosa população, unida e coesa num só esforço para melhor servir São Paulo e engrandecer  o  Brasil.

                Que estes laços de afeto que o programa Silvio Santos logrou estabelecer, ligando duas cidades —irmãs por um só imenso ideal, sejam perenes e duradouros e, assim, possamos, pelo tempo ovante, duas coletividades jungir num mesmo afeto de simpatia. São os votos que formulo, representando a comuna tanabiense e seu  povo.

                                                               Pedro Ovídio, Prefeito Municipal, em 30 de maio de 1969.

Saudação proferida em praça pública, na cidade de Tanabi, em gigantescamanifestação de regozijo pela vitória da representação de Tanabi na competição “Cidade Contra Cidade”, programa Silvio Santos,Canal 4, São Paulo, em 30 de maio de 1969.

                Digníssimas  autoridades,

                Povo  de  Tanabi:

                 O Clube dos Tangarás, uma das entidades recreativas de maior evidência e projeção, que sempre acompanhou, com carinho e simpatia, todos os movimentos sociais de Tanabi, não poderia ficar alheio a esta retumbante manifestação de entusiasmo coletivo, quando nossa terra, vencendo o marasmo de inconformados e derrotistas, pelo dinamismo otimista de um de seus mais preclaros filhos, MANUEL TORRES, logrou projetar-se à frente de outras cidades mais importantes que a nossa e apresentou-se, galharda e altaneira, a disputar um lugar de honra no programa Silvio Santos, programa que obteve o primeiro lugar de audiência em todo o Brasil. Aí presente numerosa e seleta caravana, com destacada atuação de nossa vibrante mocidade; logrou obter vitória frente à não menos poderosa e culta cidade de Campo Belo, nas rechãs mineiras, e a vitória conseguida, com raça e dignidade, serviu para mostrar, lá fora, que a pequenina Tanabi é realmente, como sempre dissemos, um foco de civilização e merece, também,  um  lugar  ao  sol,  entre  os  heróis.

                Honra, pois, e glória a Tanabi, na pessoa de seu timoneiro MANUEL TORRES e de todos os abnegados tanabienses que, sem medir sacrifícios, bravamente lutaram para conseguir essa láurea para esta cidade e para toda a região,  num  supremo  esforço  em  que  todos  colaboraram.          

                Que o rio das borboletas, onde os tangarás se distraem nas horas vagas, continue sempre a correr no fluxo das idades para conquistar outras vitórias  como  esta,  que  todos  jubilosamente  festejamos.

Tanabi, 1 de junho de 1969.

Inauguração das novas instalações dos Correios e Telégrafos,em Tanabi, no dia 7 de setembro de 1970.

                Exmo. Sr. Dr. Olegário Dantas, D.D Diretor da Regional dos Correios e Telégrafos  de  São  José  do  Rio  Preto.

                Exmas. Autoridades presentes, meus Senhores, minhas Senhoras:

                Aos 28 de fevereiro de 1904, uma comissão de riopretenses composta dos senhores Porfírio, Adolfo Guimarães Corrêa e Frutuoso José de Figueiredo, em representação dirigida ao Administrador dos Correios de São Paulo, pedira a instalação de linhas postais para o Jataí, que a esse tempo não tinha ainda a designação atual —Tanabi. Três anos depois, a 5 de novembro de 1907, a mesma comissão insistia no pedido, alegando que a localidade já possuía cerca de seis mil habitantes e fazia jus ao melhoramento pretendido. Entretanto, há precisamente meio século, na década de 20, Tanabi viu instalar-se aqui, pela primeira vez, uma agência de correio. Nesses recuados tempos, a correspondência era transportada por  estafetas  a  cavalo  pelas  ínvias  trilhas  da  velha  estrada  Boiadeira.

                Anos mais tarde, esse transporte de malas passou a ser feito pelas jardineiras do intrépido Feliciano Sales Cunha, sonhador e pioneiro, o pioneiro que nos ligou à cidade-mater São José do Rio Preto, às localidades sertanejas e ao Estado de Mato Grosso, via Porto do Taboado. Com seus ônibus ronceiros, verdadeiras traquitanas desconjuntadas, pois nem estradas possuíamos, o transporte de malas e passageiros convertia-se num milagre a repetir-se diuturnamente.  E  assim  se  amansou  o  sertão...

                De conquista em conquista, chegamos à comunicação telefônica e telegráfica que nos pôs em contato imediato com os grandes centros comunitários do país. E assim veio o correio servindo à cidade que lentamente crescia. Antes da atual distribuição de jornais pelas empresas editoras dos grandes matutinos da Capital, nas primeiras horas da manhã, a principal meta do tanabiense era ir ao correio, a repartição mais concorrida da cidade, e era comum ver-se conspícuos fazerem fila para receber correspondência, como, também, como nota pitoresca, era comum vê-los, jornal distendido, pelas ruas centrais da cidade, ainda não invadidas pelo automóvel, a deglutir as últimas notícias que o correio lhe trazia, com 24 horas  e,  a  mais  das  vezes,  com  semanas  de  atraso.

                O interessante, porém, é que naquele tempo se lia mais do que na época atual e a importância do sujeito se media pelo número de cartas e jornais que recebia diariamente. Hoje, na era dos televisores, da eletrônica, já ninguém mais lê, ninguém mais cultiva a arte de se corresponder por meio de cartas e a comunicação entre os homens é feita visualmente por aparelhos de transmissão. Infelizmente, o correio  de  hoje  quase    nos  entrega  avisos  de  vencimento...

                Entretanto Tanabi se ressentia, nos dias atuais, de correio à altura de seu adiantamento, nada obstante os insistentes apelos da Regional de Rio Preto. Nossa agência postal telegráfica funcionava num pardieiro e tinha o aspecto deprimente de  uma  dessas  agências  de  ínfima  classe  de  uma  corruptela  qualquer.

            Diante disso, a Prefeitura de Tanabi, tendo à frente o Sr. Pedro Ovídio e uma equipe de homens esforçados a assessorá-lo, tomou a iniciativa de construir um prédio funcional, de linhas simples, como este que ora se inaugura. Tanabi agora se orgulha de possuir uma agência à altura de seus  foros  de  cidade  que  se  projeta  para  o  futuro.

                Resta-nos agora a esperança de que a Regional da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, sob a eficiente direção de Olegário Dantas, que tem dotado outros centros iguais a Tanabi de melhoramentos e equipamentos condignos, reserve, também, para esta cidade, melhoramentos condizentes e à altura de seu progresso. É preciso lembrar àqueles que disso conhecimento não tiveram que Tanabi foi a terra-mãe de todo esse rosário de cidades que hoje formam a Alta Araraquarense. Daqui se irradiou o progresso sertão adentro, mas é de justiça também relembrar ter sido ela esquecida na partilha dos benefícios que o Governo distribui para outras comunas, e é para esse ponto que, neste momento, chamo a atenção de todos os que dispõem de uma parcela de poder, quer na região, no Estado ou no País, este país maravilhoso que todos estamos ajudando a construir e a  tornar  vanguardeiro  nas  Américas!

                                                                                                  Tanabi, 7 de setembro de 1970. 

Discurso proferido na “Tarde de Autógrafos”, em 20 de agosto de 1977,às  20 horas, no ginásio de esportes “Tanabi Cestobol Clube”,por ocasião de apresentação ao público do livro “Subsídios para aHistória de Tanabi”, pelo autor, Sebastião Almeida Oliveira.

                O que é que poderíamos falar-vos nesta noite tropical que literalmente denominamos de “Tarde de Autógrafos”? Algumas desataviadas palavras de apresentação de nossa modestíssima “História de Tanabi”, isto é, meros subsídios para o trabalho de maior amplitude, contribuições para uma investigação mais completa da vida pregressa desta urbes?

                Que diremos, então? Que realmente se trata de achegas à historiografia regional tecida, que foi de fragmentos esparsos do passado a custos obtidos; dados paupérrimos coligidos após esforços inauditos e paciência beneditina, compulsando documentos paulatinamente e ouvindo vozes do passado através dos antigos habitantes da localidade, bastando acrescentar que, antes do aparecimento de nossos escritos, que antecederam este livro, nada havia sido elaborado ou registrado acerca da cidade, sua fundação ou sobre a marcha dos acontecimentos urbanos empós o lento dealbar de um século, que se dilui na lenta e inexorável passagem do tempo. E que dizer, então, de nossa acanhada capacidade para enfrentar trabalho de tamanha responsabilidade, que devia e deve ser promovido por elemento culto, tendo a seu dispor, para melhor assessorá-lo, uma equipe de pessoas ilustradas e acurada pesquisa adrede preparada. Mas nada disso aconteceu conosco, e pensar que fizemos tudo isso “na raça”, sem dispor dos mais comezinhos conhecimentos dessa árida matéria que só os grandes catedráticos conhecem, jejunos que somos em história, tendo em vista, ainda, a fragilidade de nosso preparo intelectual, autodidata que somos, sem dispor de um gabarito cultural que se faz mister para cometimentos desse teor.

                E, com estas palavras despretensiosas, estamos apresentando esta obra, que sabemos nascida tão somente da perseverança e do esforço e que assim, desprevenida, vem disputar o favor público numa audácia que atinge e ultrapassa as raias do razoável.

                Entretanto, força é confessá-lo que, amando, como amamos, este  rincão, que nos abriga há cinqüenta longos anos, quisemos anotar os principais acontecimentos que aqui se desenrolaram e dar-lhes, afinal, aspecto de um livro, livro que fosse, como era nosso desígnio, um repositório dos mais destacados eventos aqui ocorrido, nesse lapso de tempo, despidos de outras vaidades além de podermos contribuir para o engrandecimento de Tanabi. Se conseguirmos alcançar

em parte, esse objetivo, já nos consideramos pagos pelo esforço despendido, e quem isso poderá afirmar são todos aqueles que nos dão a honra de suas presenças neste local, todos aqueles que, mesmo fora deste recinto, acompanham com simpatia nossa atuação, lenta, mas persistente, em prol da comunidade, sendo certo que aqueles que irão compulsar esta monografia poderão dizer se o nosso intuito foi ou não alcançado, merece ou não acolhida dos tanabienses da velha guarda e também dos advéns aqui recém-chegados, todos, aliás, contribuindo para maior  grandeza  deste  município  e  da  região.

                Este livro, vou preveni-los, não é aquilo que todos esperavam. Está eivado de lacunas, cheio de erros palmares, bem o reconhecemos, mas, por isso mesmo, necessita de generosa acolhida e fraternal benemerência e jamais a crítica impiedosa que se compraz em destruir, antes que edificar, para que o nosso esforço canhestro não seja descoroçoado, não seja em vão, mas tenha a ampará-lo a recompensa e o apoio daqueles que compreendem quão grande é a nossa incapacidade de realizar obra duradoura, mas, também, como é grande a vontade que  temos  de  servir  e  de  prestar  algum  serviço  à  coletividade.

                O único intuito nosso ao escrever este ensaio foi, como alhures dissemos, registrar dados e informes pertinentes a esta cidade e região para um futuro aproveitamento pelo historiador do porvir, em obra de maior alcance que um dia, estamos certos, será escrita por alguém mais credenciado do que nós. Com esta trabalhinho pretendemos formar um simples patrimônio histórico como fonte de estudo  para  as  novas  gerações.

                E com estas palavras desataviadas e incolores damos por encerrada esta aborrecida  parlenda.

                Mas, antes de nos despedir, cabe-nos, contudo, trazer à colação nosso perene agradecimento a todos os que nos auxiliaram na elaboração deste trabalho e, entre eles, seja-nos permitido salientar a eficiente ajuda que nos proporcionou João de Mello Macedo, o poeta que todos admiramos, quer escrevendo magnífico prefácio, quer orientando-nos com segura diretriz. Também ao Poder Público Municipal, nas pessoas de Milton Cury Miziara e Waldir de Faria, na passada administração, e Alberto Víctolo e Olavo José de Paula, neste exercício, os quais, na chefia do executivo ou na presidência da edilidade, projetaram e aprovaram substancial auxílio para a publicação desta História; a eles o nosso reconhecimento, que fazemos extensivo aos senhores vereadores. Aliás, toda a população tanabiense é credora de nossos agradecimentos, porque nela que haurimos incentivo e foi ela que nos proporcionou meios para a realização deste ambicioso  tentâmen.

                Finalmente, cabe-nos agradecer, e de coração o fazemos, o comparecimento das dignas autoridades aqui presentes e, ainda, com muito amor e carinho, agradecermos a todos, indistintamente, que, aqui comparecendo,

trouxeram sua consagração aos esforços deste velho escriba que ora entrega ao julgamento  popular  estes  parcos  “Subsídios  para  a  História  de  Tanabi”.

                Muito obrigado a todos!

                                                                                                Tanabi, 20 de agosto de 1977.


Noite de Autógrafos do livro:“SUBSÍDIOS PARA A HISTÓRIA DE TANABI”Carmem Vargas de Oliveira, Lambert, Sebastião Almeida Oliveirae  João de Mello Macedo.

Nocturno

(Ao amigo Mello Macedo)

 

                Ambiente morno de uma tarde de abril. A seteira do cronômetro passa, sismarenta e pausada, pela décima nona divisão marcando, displicente, a transição do dia. As cambiantes do crepúsculo, diluindo a tonalidade das cores, vão desfazendo, imperceptivelmente, as arestas contornais das coisas e as formas lentamente  se  imergem  no  lago  impenetrável  do  indiferenciado...

                A lua, esse penduricalho burlesco que a terra maneja por invisíveis cordeis, divaga, erradia e sem destino, pelos domínios indefinidos do azul, ouvindo, talvez,  embececida  e  terna  o  idílio  apaixonado  das  estrelas...

                Cordas feridas de um violão antigo deixam, desferidas e castigadas, escapar lamentos amaríssimos, queixas dolentes que se casam à voz nostálgica do sertanejo  que  lhe  concia  máguas  brotas  do  imo  de  seu  peito...

                E uma vitrola “acordada” fere o espaço, gritando um tango argentino da moda e, no lampadário suspenso de postes postados na muda contemplação de si mesmos, flue a claridade a flux na doida volúpia de espancar as trevas que há pouco adelgaram  seu  manto  escuro  pelos  raros  telhados  do  vilarejo.

                O escapamento-fechado de um auto que parte em desabalada carreira denuncia, de longe, em rumos de escala decrescente, a fugace rapidez de seu itinerário.

                Vem-nos, da usina elétrica, o compasso ritmado das pulsações motoras, dando-nos a ilusão momentânea de ser aquela o próprio coração da cidade que pulsa,  palpitante  de  vida,  de  progresso  e  ansioso  de  expandir-se...

                Despetalam-se os refolhos da memória. Rememoramos, então, pensamentos vividos no decorrer do dia que ora caminha em sua marcha fantasmagórica para o nada. Assim, de simples idéia embrionária no cérebro, por meio de mágicas elucubrações, tecemos as urdiduras de sentimental romance, pleno de minúcias e atrativos, desenrolado em cenários luxuosos, onde, nem sempre,  a  realidade  comparece...

                As antenas auditivas recebem transmissões de sons confusos e divergentes a um só tempo; vozerios imprecisos, ladrar ululante de cães, babélica sonância de miríades de insetos engastados no gramado protetor das ruas, e o conjunto desse rumor impreciso vai, noite a dentro, perdendo a nitidez de sua existência  até  a  indiferenciação  completa,  na  plenitude  do  silêncio.

                Deixamos, então, esse sonhar de acordado, acordando em sonhar dormindo...

Tanabi, 21 de maio de 1929.

Novo Rumo

A renovação ambiente que o Prefeito está operando na estética urbana atingiu também o nosso hebdomadário, que, qual crisálida entorpecida por um marasmo prolongado, transforma-se em alígera borboleta de asas auri-fulgentes e doudas, na ânsia incontida de conquistar o espaço - assim a “Cidade”, deixando a vestimenta antiquada e despojando-se do próprio título, aparece-nos agora em novo formato, intitulando-se “O Município”, como que a indicar que seu raio de ação se estenderá doravante dos acanhados limites citadinos para alcançar o âmbito circunscripcional do imenso território tanabyense, que todos sabem ser o maior da terra  de  Piratininga.

                A nova phase que o nosso semanário inaugura signala uma ephemeride que não devemos olvidar. Antes deve constituir, para todos nós,um motivo de júbilo porque esse pormenor deveras significativo é um índice categórico e incontestável que demos um passo para a frente na progressão infindável de todas as nossas aspirações, progressão essa notável e patente em todos os campos de actividade, a  que  se  entrega  este  povo  laborioso.

                O jornal é como um espelho fiel que reflete em sua face todas as mutações transformadoras de uma cidade e de uma região. Deve ser amparado por todos quando propugna pelos interesses da coletividade e não serve somente de instrumento de discórdias. O nosso jornal, como “prata da casa”, faz jus à boa vontade e synpatia de toda a população a que serve porque será o defensor intemerato de todas as suas prerrogativas e o registro fidedigno de todas as inovações e melhoramentos que a administração municipal vai semeando prodigamente  por  todo  este  vasto  e  promissor  “hinterland”.

                Tanaby precisa ser conhecido lá fóra, não através  de uma lenda falsa ou relatos tendenciosos como soe acontecer, onde se percebe o intuito evidente de menoscabar as nossas possibilidades,mas, sim, com a divulgação sistemática e pormenorizada de todas as riquezas incommensuráveis de sua terra dadivosa, pois, sobre ser uma zona essencialmente agrícola e pastoril, o seu sub-solo

juncado de minérios e mesmo pedras preciosas, que em alguns lugares afloram à superfície, já não falando das immensas reservas de ulha branca que podem, de sobejo, abastecer o maior parque industrial da América do Sul: São Paulo!

                Com uma propaganda bem orientada e feliz, poderemos colocar esta terra na  posição  que  lhe  compete  na  escalada  do  Progresso!

Tanabi, década de 1930.

Livros e Agremiações.

Club é, como todos sabem, palavra de origem inglesa e tem, nesse idioma, entre outras acepções, este peculiar significado: Na Association of persons to promote a common object, or for good-fellowship, etc., esp. One jointly suported and meeting periodically. Union of persons in a company or society for a common porpose.

            Pondo de lado a algaravia arrevezada dos beefs, e utilizando prata de casa, diremos que é uma sociedade ou reunião de pessoas com um fim comum, centro escolhido onde pessoas seletas se reúnem para jogar, ler, conversar, distrair, em  suma.

                 Correspondendo a esse vocábulo temos o portuguesíssimo grêmio, que os dicionários definem: “Corporação de indivíduos ou sócios sujeitos a estatutos e regulamentos  para  um  fim  recreativo  e  ao  mesmo  tempo  instrutivo”.

                Agora que se processa a inauguração solene do “Grêmio Literário e Recreativo de Tanabi”, cremos não ser de todo descabido traçar umas linhas a propósito do mesmo e em prol da criação de uma modesta biblioteca, para maior realce e significação dessa entidade nascida, ao que parece, sob os melhores auspícios.

                Dois motivos capitais, dignos de ponderação, induzem a organizar uma coletânea de livros, revistas e jornais numa das salas dessa corporação; o primeiro, porque o termo literário contido em sua denominação não se justifica se ele, o Grêmio, não for, como esperamos seja, honrado com as luzes da classe pensante desta cidade, se não em tertúlias de alta especulação, pelo menos em palestras acima do ramerrão quotidiano, em reuniões onde se façam ouvir as vocações oratorianas da mocidade e onde se possa ler qualquer coisa para recreio e ilustração  do  espírito.

                O segundo motivo, esse também de certa importância, resume-se no fato de Tanabi não possuir, até esta data, nem sequer uma biblioteca de reduzida capacidade, quer nas sedes associativas, quer em outros pontos, muito embora a situação privilegiada que desfruta de verdadeira capital do sertão, servindo mais de vinte  e  cinco  mil  almas.

             Não fosse o receio de sermos mal compreendidos, diríamos que em Tanabi  não  se  lê...

                Que distância guardamos do povo americano, país até nas estradas públicas se vêem, a cada passo, bibliotecas de todos os tipos, fixas e circulantes, todas procurando elevar o nível da mentalidade, já de si elevada, desse grande povo!

                Ainda há poucos meses volvidos, a Congregação Mariana de Moços iniciou a reunião de alguns livros para a formação de sua biblioteca; pouco tempo teve, entretanto, de vida: em breve, uma e outra passaram para o rol das coisas extintas  e  da  utopia.

                O Tanabi Tênis Clube, não obstante contar em suas fileiras luzida turma de moços comandados pela figura saliente de João de Mello Macedo,também não possui  uma  simples  coleção  de  livros.

                Cumpre salientar que, nesse capítulo, Tanabi não se emparelha com as demais cidades da região rio-pretana. Em todas, algumas de menor importância que a nossa, prosperam e vicejam sociedades recreativas, culturais, religiosas e esportivas, possuidoras, quase todas, de boas bibliotecas para regalo dos sócios componentes.

                Corre por aí uma lenda de que o clima de Tanabi não é propício ao desenvolvimento de agremiações de qualquer natureza. Invocam, em abono dessa asserção, o prematuro desaparecimento da Associação Comercial, da Liga Protetora da Banda de Música, da Sociedade dos Lázaros, da Congregação Mariana, da Irmandade do Santíssimo Sacramento e tantas outras sociedades surgidas sob os melhores augúrios e em curto espaço de tempo dissolvidas; algumas resumem-se simplesmente na reunião inicial, ata lavrada e discursos.

                Parece mesmo haver qualquer sentido verdadeiro nessa ousada afirmativa, fato esse que nos entristece, porque somos bairristas e desejamos o progresso desta terra. Cabe, portanto, a nós tanabienses, que temos amor pelas nossas coisas, desmentir sentença tão deprimente, emprestando nosso decidido concurso a todas as boas iniciativas, a fim de que os nossos foros de cidade próspera  não  venham  a  periclitar  no  conceito  das  localidades  vizinhas.

                Que o novel Grêmio seja um desmentido vivo a essas afirmações duvidosas e possamos um dia ver realizada a idéia, que aqui deixamos impressa, são  os  votos  que  formulamos  destas  colunas.

Tanabi, 21 de janeiro de 1937.

O intelectual e o esperanto

                Necessita, o homem de letras, para exposição e enunciação de seu pensamento, de uma linguagem que se torne compreensível, não só nos pagos onde habita, vale dizer em sua pátria, como, também, noutros países, entre povos de língua diferente àquela que lhe é peculiar. E o vertiginoso progresso de nossa época, para satisfação das relações dos povos, cada vez mais estreitas, está a exigir  a  intercompreensão  de  todos  os  homens.

                Antes de mais nada, cumpre advertir que não iremos propor o banimento da língua nacional, que seria substituída por outra de âmbito mundial. Em nosso caso, embora chamem nosso idioma “túmulo do pensamento”, nunca, jamais, admitiríamos sua troca por outro de maior amplitude e prestígio internacional. O amor que devotamos á língua de nossos ancestrais afasta-nos de cogitações assim malsãs  e  deletérias.

                Todavia, nessa escala de idéias, cumpre advertir que não alimentamos simpatias pela adoção de chamado English Basic que muitos andam por aí a apregoar como excelente veículo de entendimento universal, pressupondo-o escolhido para tornar-se a língua do futuro, dado o prestígio indiscutível que o idioma de Shakespeare goza em todo o Orbe civilizado, principalmente no campo comercial.

                No entanto, o inglês puro e simples, que nestes dias de após guerra ganhou surpreendente difusão em todos os continentes, muito embora as excelentes qualidades de que se reveste, possui, em sua estrutura, algo prejudicial à sua adaptação em muitas nações que nele vêem, antes de mais nada, poderoso instrumento cultural a serviço do imperialismo de um povo que já domina mais de dois  terços  do  planeta.

                Por sua vez, o suave idioma em que tão elegantemente se expressaram Corneile e Chateaubriand, o francês, também de acentuada projeção entre os povos do velho mundo e quiçá da jovem América, não obstante isso, de há muito perdeu sua universal influência, e o próprio latim, outrora poderoso e dominante, arcaíza-se  e  se  torna  obsoleto  em  nossos  dias.

                Assim analisados, nenhum idioma vivo poderia tornar-se a linguagem oficial de toda a humanidade, cada qual trazendo em seu bojo contradições, incongruências, defeitos e qualidades negativas. Também não é aconselhável lançar mão do idioma de algum país para com ele subordinar a cultura de outros povos,  deixando-os  em  condições  de  inferioridade.

                Só uma língua artificial poderia  resolver o problema, a fim de não suscitar nacionalismos exaltados e vãs disputas de povos rivais. E, dentre elas todas, do Ido as Volapuk, somente logrou vingar, e alcançou mesma fama e projeção internacional, a genial criação do sábio polonês Zamenhof, o Esperanto, usado presentemente por milhões de pessoas em todos os recantos da Terra. O ideal de Zamenhof, grande paladino da paz e da fraternidade humana, é unir todos os povos da terra sob a bandeira de uma língua única, para que os pensamentos possam ser externados  sem  cogitação  de  raça,  cor  ou  credo  político  ou  religioso.

                Seu fácil aprendizado dá ao Esperanto lugar de merecido destaque entre todos os idiomas falados, além de superar, por sua perfeição, todas as línguas mortas  como  o  grego  (antigo)  e  o  latim.

                Para maior divulgação da obra do escritor nacional, principalmente de artigos em jornais e revistas periódicas, seria interessante e até recomendável acompanhá-los de resumos em Esperanto, a exemplo do que vem fazendo, já há alguns anos, a prestigiada Revista da Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro, cujos trabalhos, de indiscutível mérito e valia, são acompanhados com profundo interesse por todos os estudiosos da ciência geográfica onde quer que esse mensário apareça, mesmo entre gente que desconhece o português. Só assim conseguiremos ver nossa produção mental apreciada por escritores de outros continentes que, via de regra, jamais travaram contato cultural com a língua que falamos.

                O presente Congresso possivelmente fará publicar os seus Anais, a exemplo do que fez o Primeiro Congresso Brasileiro de Escritores, reunido em São Paulo. Propúnhamos, então, fossem as melhores teses acompanhadas de resumos em internacia lingvo, confiada a tradução a pessoas de notória capacidade, a fim de que as cogitações da intelectualidade paulista apreciadas fossem lá fora, além fronteiras, em regiões onde o conhecimento do vernáculo é ainda um mito.

                Propomos, também, que este Primeiro Congresso de Escritores Paulista recomende ao intelectual brasileiro a adoção do Esperanto como linguagem de intercomunicação dos povos a serviço dos sacrossantos ideais de fraternidade.

Tanabi, 11 de agosto de 1946.

* O texto acima foi uma tese para o 1º Congresso de Escritores Paulistas que se reuniram de 22 a 26 de setembro de 1946,na cidade de Limeira, Estado de São Paulo. 

Tanabi

                Tanabi, la domaro, kie mi vivas, estas urbeto kum 6000 logantoj kaj estas lokita en São Paulo, granda kaj progresema brazila stato.

                Gi estis fondita em 1887, sed gi preskáu ne elvolvigis gis la aktuala centjaro. Em la jaro 1907 gi farigis paca distrikto. Gia ricevis, tiam, la aktualan nomon “Tanabi”,  kiu  signifas  “rivero  de  la  papilioj”.

                Granda estas gia territorio kun pli ol dekmil kvadrataj kilometroj. Gia limoj atingas la riveron Paraná kaj la landlimon de Mato Grosso kaj Minas Gerais.

                Multnombraj personoj, kamparanoj kaj bovaristoj, vivas en gia komunomo.

                Em la jaro 1925 la urbo igis sendependa de São José de Rio Preto, cefurbo de  la  regiono,  kaj  de  tiam  havis  propran  vivon  kaj  administradon.

                Kun la alveno de la revolucio de 1930, estrita de doktoro Vargas, kie estis ceregistaro de Brazilo gis 1945, (la actúala estas Doktoro José Linhares), Tanabi kreskis  danke  al  la  trankvileco  política.

                Multnombraj kaj elegantaj domoj estas konstruitaj; stratoj, placoj kaj gardenoj  estas  projektitaj.

                En la internlando aperis diversaj domaroj, fine: Votuporanga, hodiaú fariginta komarko; Fernandópolis, cefurbo de komunumo; Cosmorama, prospera urbeto; Igapira, Cardoso, Ibiporanga, Américo de Campos, Jales, ciuj distriktoj. Estrela do Oeste, Indianopolis, Parizi, Santo Antonio, Jacilândia, Nogueira, Kaj grandnombraj aliaj lokoj inkluzive Cachoeira dos Índios, kiu estas la plej bela kaskadaro  de  la  regiono,  kiun  ciuj  admiras.

                Pro la jugista administracia reformo de 1944, Tanabi perdis la plimulton de sia territorio. Tamém, malgraú tio, ke gi perdis tiun areon, gi estas ankoraú granda kaj  prospera.

                Actúale giahavas bibliotekon, forumon, hospitalon, ginastikejon, lernejon, bankojn, almarigejon kun tri aeroplanojkaj lernejo de aviado; gi havas ciusemajnan gazeton “O Municipio” fonditan de la autoro de ci tiuj linioj, notarioficejojn, Electra lumon, katolikam pregejon, radiostacion, bonan vojon kaj alian plibonajojn.

                                                                                                 Tanabi, 11an de novembro de 1945a.

* O texto acima foi reproduzido para que o leitor tenha noção da escrita esperantista. O referido foi escrito para Svisa Internacia Servo deBerna, Suissa (revista internacional de Berna), descrevendo a cidade de Tanabi.

Totens e Tabus

Tabu, palavra originária da língua polinésia, hoje incorporada ao léxico universal, designa tudo o que é sagrado, proibido e impuro. Sua violação, por isso mesmo, acarreta castigos sobrenaturais: doença, loucura, morte. Por sua vez, totem, de origem americana, designa o pai ancestral da clã, seu espírito protetor e benfeitor e,

assim, substitui a religião em muitos povos primitivos. São de origem totêmica o culto dos animais no Egito, os deuses primevos da Grécia e das tribos antigas da

América, da África e da Austrália. Assim, o dragão lendário dos amarelos, a vaca sagrada dos brâmanes, o Boi Apis e o Milhafre dos egípcios, a pomba, representando o Espírito Santo entre os católicos, são outras tantas exteriorizações simbólicas  e  totêmicas.

               Figas, amuletos, camafeus, derviches, estatuetas, velhos ídolos de pedra dos aborígenes amerabas são também singulares representações totêmicas de que o homem se vale para preservar-se de perigos e premunir-se contra maléficas influências.

Reminiscências de barcos samienses, que singram o mar de Mirtos, com suas cabeças de javali ou de cavalo à proa, as embarcações do São Francisco, rio eminentemente nacional, trazem, também, horrendas figurações de monstros totêmicos  á  proa  e  à  popa,  possíveis  numes  tutelares  dos  nautas  fluviais.

Costumes bastante difundido é o de pôr cabeçadas, com seus respectivos cornos, espetados em cercados, ou como estranhos manipanços protetores de searas, preservando-os de mau- olhado e outras mazelas temíveis, nada mais representa que imarcescíveis resquícios totêmicos da alma popular conservados através  da  idade.

Idéia totêmica que persiste em muitos povos, a de imitar certos animais, encontra ressonância entre nossos tabaréus que não desdenham usar dentes ponteagudos  ou  limados,  ideal  de  beleza  em  sua  concepção.

Metonímias extravagantes como coisa-ruim, capeta, tinhoso etc. são usuais representações totêmicas do gênio infernal que a linguagem registra.

Farto contingente de nossas superstições tem suas raízes embebidas nessas duas palavras de cunho bárbaro e selvagem: totem e tabu. Deles não prescindem  a  etnografia  e  o  folclore.

Para complemento deste escorço, vão aqui arrolados quase uma centena de proibições que se fundam em motivos mágico-religiosos na alma popular:

1 —Apontar com o indicador certos frutos como: melancia, melão e outras cucurbitáceas,  pois  isso  faz  bichá-los.

2 —Mencionar nome de pessoa falecida.

3 —Cruzar as mãos sobre a nuca: profetiza morte certa dos pais.

4 —Passar por debaixo de escadas; segundo a crença, o muro, o chão e a escada fazem um triângulo, sendo sacrilégio passar através dele.

5 —Transpor o arco-íris: faz mudar de sexo.

6 —Pôr peneira na cabeça: impede o crescimento das crianças.

7 —Ter em casa duas velas acesas a um só tempo: atrapalha a vida do casal.

8 —Deixar vassoura de cabeça para baixo, isto é, invertida: vira o juízo.

9 —Matar gatos: atrasa os negócios e dá sete anos de azar.

10 —Doente mudar de travesseiro: mudou, morreu.

11 —Velho fazer casa nova: morte próxima.

12 —Pisar na sombra de alguém. Por isso, os indus marcham em fila de um, bem separados um do outro, porque, segundo crêem, pisar na sombra do homem representa grave ofensa à sua alma. E têm suas razões, dado que são portadores  de  tradições  milenárias,  que  se  perdem  na  noite  dos  tempos.

                                                                                         Tanabi, 6 de outubro de 1947.

Pioneiros do Oeste Paulista

                Verdadeiro deserto de ecúmeno era, há um século, a região que habitamos. A vasta mesopotâmia formada pelos rios lindeiros Turvo e Tietê, concurrentes do Paraná, era, a esse tempo, a menos povoada do Estado. Deu-se, então, no Oeste Paulista, a penetração de audazes pioneiros, varadores da selva e plantadores de cidades que aqui se instalaram, legítima ou sub-repticiamente, em diferentes pontos do imenso território, produzindo, aos poucos, os aglomerados urbanos de nossos dias, intrépidos sertanistas que repetiram aqui as mesmas heróicas façanhas atribuídas aos bandeirantes do Planalto, homens telúricos, que “se atolaram no massapé etnográfico e sofreram a sedução dissoluta e criadora dos trópicos”.

                Vieram, os primitivos povoadores, por caminhos naturais, picadas abertas a facão, por onde enfiavam cargueiros atufados, veredas sinuosas a custo vingadas por rústicos e dolentes carros de bois, e foram instalando, à margem dos ribeirões, nas clareiras da floresta impérvia, abrindo as primeiras roças e cultivando o solo agreste. Decorrido algum tempo, ergue-se um cruzeiro de madeira em local adrede escolhido por “homens bons” da redondeza e, ao lado igrejinha tosca, o primeiro casebre seguido de outros; uma venda e mais outra e assim cresce o povoado que logo adquire foros de vila e até de cidade. À lavoura organizada cede lugar a mataria bruta. Modifica-se a paisagem derredor e novos costumes substituem hábitos de antanho; empreendimentos novos impelem os homens em todas as direções; a civilização vai aos poucos se implantando do altiplano à planura,  do  tabuleiro  ao  rechão.

                Segundo se infere dos fastos locais, o surto povoador da interlândia teve seu núcleo inicial em Minas Gerais, deslocando-se, sucessivamente, para Casa Branca e Barretos, Campinas e Araraquara, Bebedouro e Jaboticabal antes de fixar-se em nossa região. De Casa Branca, em 1820, provieram os irmãos José e Joaquim Gonçalves de Souza, que se estabeleceram no Borá; da mesma origem procedem, mais tarde, Antonio Carvalho e Silva e Luiz Antonio da Silveira; este e sua mulher, Tereza Francisca de Jesus, são os doadores do patrimônio de São José do Rio Preto, conforme documento assinado em São Bento de Araraquara aos 19 de março de 1852. No mesmo ano, vindo de Casa Branca, aqui chegava João Bernardino de Seixas, incontestavelmente o fundador da cidade e que, ao lado da igrejinha de sapé, construiu sua morada, gérmen da poderosa metrópole de hoje. Aí se hospedou, em 1887, o então Tenente Taunay, quando de seu regresso de Mato Grosso, após transpor cinqüenta léguas de mata virgem aquém rio Grande.

                À guisa de esclarecimento, para explicar a presença dos Seixas nestas paragens, lembremos a versão de que o Imperador Pedro II havia doado grandes áreas de terras a Antonio Bernardino de Seixas, morador de Casa Branca e que, com o intuito de desbravá-las e povoá-las, manda para cá seus filhos José e João Bernardino  de  Seixas.

                Em 1830, mais ou menos, dá-se a entrada de João Ramos da Costa e José Alves Ferreira, que se fixaram, com suas famílias, no Viradouro e São João.

                Registre-se, outrossim, a existência das colônias militares de Avanhandava e Itapura, fundadas por ocasião da guerra do Paraguai; conquanto seu acesso fosse mais acessível por via fluvial, uma estrada ligava-as a Rio Preto e Jaboticabal, estrada essa ainda hoje conhecida por “caminho de Pedro II”. Essas localidades, São Jerônimo, Itapirema e outras são meras referências geográficas encontradiças  nos  mapas  de  1900.  O  resto  era  sertão,  e  sertão  bruto.

                Por volta de 1860, o índio tamoio Joaquim Chico vem residir às margens do Jataí. E, juntamente com Hilário de Souza Rozendo, Agostinho Pereira, Manuel Francisco da Silva, Joaquim Euzébio de Souza e Bento Perez de Souza ergue, aos 4 de julho de 1882, rude cruzeiro que é o marco de fundação da atual cidade de Tanabi.

                Um decênio decorrido, três sertanistas matogrossenses abrem uma picada pelo vale do Dourados, picada essa por onde se orientou Ugolino Ugolini, em 1900, ao construir a estrada do Taboado. A velha pista de gado, hoje abandonada,  tornou-se,  como  é  óbvio,  elemento  civilizador  da  região.

                A 01 de julho de 1908, Porfírio Pimentel, sacristão e companheiro do Pe. Bento, provindos de Jaboticabal, e ambos moradores de Rio Preto, funda Monte Aprazível com o nome de Água Limpa. A ele também se deve a fundação da Monte Alto  e,  em  1889,  de  Catanduva,  ex-Cerradinho.

                Antes do raiar deste século, não há memória de ter sido fundada nenhum outra povoação em toda a região, exceto das localidades mencionadas neste escorço.

                Nessa data, Antonio Martins de Oliveira transfere-se para as proximidades de Mirassol; mas a fundação, propriamente dita, se deve a Joaquim da Costa Penha (que a 29 de junho de 1897 já havia fundado Monte Azul e, mais ou menos por volta de 1925, deu início a Neves) acolitado por Victor Cândido de Souza, Antonio Fidélis e Modesto José Moreira. O ato, que se deu aos 8 de setembro de 1910, vem testemunhado por original ata então lavrada e até hoje conservada.

                Por essa ocasião, Lourenço de Siqueira instala-se nos Três Córregos. Ele, José Rodrigues da Costa (Carioca), Manuel Mano da Silva e José Cantador erguem o povoado desse nome, que teve origem em três casebres, e que hoje se denomina Potirendaba,  com  o  significado  de  “bouquet  de  flores”.

                No mesmo ano de 1910, Felício Bottino, Felipe Scarpeli e Severiano Ferreira fundam Cedral, então conhecida por Cedro, embora o local fosse habitado, desde  1900,  por  alguns  moradores  que  aí  aportaram.

                Ainda na mesma data, José Crescêncio de Souza funda Cerradão, hoje José Bonifácio; nasce Ubarana um pouco mais além. Chegam os primeiros moradores a Nova Aliança, agora Município. No local denominado Córrego Grande, ergue-se novo arraial mais tarde batizado com o nome do notável engenheiro Ignácio Uchoa, de cujo apelativo se aproveitou a parte final: Uchoa. Data de 1912 a fundação de Nova Granada por Francisco dos Santos, que lhe deu o topônimo de Vila  Bela,  topônimo  depois  mudado  para  Pitangueiras.

                Com a construção da primeira casa por Nicola Storti, nasce Engenheiro Schimitd. Guapiaçu, que já se chamou Ribeirão Claro e até Sapato Queimado, como querem as más línguas, teve o patrocínio do preto Manuel Firmiano de Silva (Manuel Carreiro), José Braga, José Basílio de Almeida e outros fazendeiros do local, dado que já existia em 1912, conforme testemunho pessoal do autor.

                Da. Lourença Ayala funda, em 1920, o povoado de Garagem, nome do atual distrito de Bálsamo. Registra-se, então, o aparecimento de Águas Paradas, mudado, posteriormente, para Américo de Campos, e tendo por fundador Manuel Francisco, ao que supomos o mesmo que ajudou a erguer o cruzeiro do velho Jataí. E Álvares Florence, que já se chamou sucessivamente Igapira, Monteiro e Marinheiro, por certo deve ter tido origem nessa época, ou um pouco antes. A seguir, em 1921, João Pacheco de Lima, com o primitivo nome de Barra Funda, ergue  a  localidade  de  Ipiguá.

                Vem depois Palestina, fundada nas proximidades do ribeirão Piau, por Valentim Álvares e os irmãos Rogério e José Gonsalves da Silva ao 1 de janeiro de 1922. No mesmo ano é erguida Nipuã com o nome de Cachoeira da Boa Vista.

                Em homenagem ao seu fundador Cândido Poloni surge, aos 3 de maio de 1926, a vila de Poloni, e a 24 de junho de 1928, dia de São João, Joaquim Fernandes de Melo e Manuel Ricardo de Lima plantam o marco genetriz de Nhandeara. Macaubal, outrora Coqueiros, nasceu em 1924, sob a égide da trindade: José de Freitas Cais, Manuel Camilo de Figueiredo e José Garcia Sobrinho.

                Pereira Barreto, originário do núcleo nipônico Novo Oriente, surge em 1932. Nesse mesmo ano, a 1 de janeiro, Julio Catini e Antonio Cândido Borges, irmanados, fundam Cosmorama, na comarca de Tanabi. No ano seguinte, Antonio José de Carvalho (Tonico Barão), Feliciano Sales Cunha e outros erguem o arraial de Palmira, atual General Salgado. Em 1934 vem Ibiporanga, fundada por Marciano Maciel da Silva e, a 2 de novembro de 1935, origina-se Duplo Céu, à frente Manuel Dias e outros. Em 13 de junho, João Gonçalves Leite lança os alicerces  de  Pedranópolis.

                Ao lado de Brasilândia, sob o auspícios de Carlos Barozzi, numa emulação feliz, Joaquim Antonio Pereira funda, em 1939, o patrimônio de Pereira,

hoje Fernandópolis. A 8 de agosto de 1937, o agrimensor Guilherme Von Truembach lança a pedra fundamental de Votuporanga, em terras da firma Teodor Wille &Cia, cidade essa que seis anos após era elevada a distrito de paz, município e comarca num só dia. A 7 de maio de 1945, José Felix e José Beran fundam Victoria Brasil e, a 15 de abril de 1941, Euphly Jalles, latifundiário na Ponte Pensa, edifica Jalles. A 27 de outubro de 1946 nasce Macedônia, nome de seu fundador João de Mello Macedo.

                Nesse entretempo, mais de uma dezena de novas localidades surgiram no abençoado torrão conhecido por Oeste Paulista, mas, ao elaborarmos este apanhado, não obtivemos dados categóricos, embora compulsássemos publicações regionais. Entre as omissões, lembremos aqui: Cardoso, Pontes Gestal, Três Fronteiras, Santa Fé do Sul, Albertina, Guarani do Oeste, Indiaporã, Tupinambá, Mira Estrela, Bela Vista, Valentim Gentil, Simonsen, Estrela D’Oeste, Parizi, São João das Duas Pontes, Meridiano, Conde de Prates, Brasitânia, Populina, Floreal, Magda, Turiúba, Buritama, Planalto, Major Prado, Monte Douro, Junqueira, Monções, Auriflama, Gonçalves, Brioso, Costa, União, Mangaratu, Onda Branca, Boturuna, Ingá, Jurupeba, Onda Verde, Balduíno, Ecatu, Mirassolândia, Eliziário, Ventura, Mendonça, Monte Belo e tantas outras por aí brotadas como cogumelos. Gratos seriamos aos interessados que no enviassem dados e informações seguros para melhor divulgação deste trabalho, documentando-o.

Tanabi, 2 de fevereiro de 1952.

Contrastes e Confrontos

                Referem crônicas lendárias da antiga Roma que nobres e plebeus sibaritas, à cata de prazeres requintados, celebravam, em determinados lugares, festins orgíacos em homenagem a Baco, a divindade do vinho e dos prazeres. E sobre as ruínas desse culto pagão, via de regra, foram construídos templos e mesquitas, igrejas e capelas cristãs, transformando, destarte, o profano em sagrado, santificando o local irreverente. Preces e hosanas substituem, em nossos dias, o que foi, outrora, a prática aviltante de ritos bárbaros, o estertor dionisíaco de uma sociedade em decadência. Assim, no lento evolver dos séculos, que se sucedem indefinidamente, a humanidade foi se aperfeiçoando espiritualmente, em lenta ascese, das trevas à luz, a aproveitar lições colhidas de geração em geração, pelo  tempo  ovante.

                Mutatis mutandi, recordemos que, nos pródomos da fundação de Tanabi, da nossa mui nobre e leal cidade de Tanabi, um punhado de “homens bons”, que formavam o núcleo inicial do povoado, houveram por bem construir, em terreno adrede escolhido, tosco cercado de madeira à guisa de cemitério, onde eram inumados os mortos do clã tanabiense. Situado na esquina da atual Praça da Bandeira, deixou de existir, nessa função, lá pelos idos de 1918, quando foi oficializado o atual Campo Santo da vila Operária que, dito de passagem, ostenta em sua fachada austera, na portada principal, a secular inscrição destruidora de orgulhos e vaidades: Revertere ad locum tuum. Carcomida pelo tempo, a paliçada derredor desgastou-se e desapareceu; esborroaram-se os jazigos de terra batida: cruzes, coroas e ex-votos desfizeram-se paulatinamente a justificar universal consenso de que o tempo tudo consome.

                Veio o progresso destruidor e irreverente. O terreno, murado e cimentado, mudou de aspecto: nele foi construída moderna quadra de cestobol onde, diariamente, a mocidade se exercita em pugnas esportivas que demandam esforço, movimento e agilidade, numa algazarra peculiar à juventude que põe em prática o conselho de Juvenal, mens sana em corpore sano, sem contudo atinar, e à mocidade tudo se perdoa, que assim procedendo, transforma em profano aquele recinto outrora sagrado...

                E ao lado dessa quadra desportiva construiu-se moderno salão de festas, onde se pratica o culto de Terpsícore, uma das nove musas da mitologia grega, aquela que presidia à música e à dança, representada, via de regra, tangendo uma harpa e vários instrumentos e músicos à sua roda. Dir-se-ia que aí, nesse local, dançando, estão os tanabienses a cumprir estranho ritualismo, um culto totêmico ao passado, quando, na verdade, cultua-se o presente, o momentâneo, o atual, com danças e músicas irreverentes a perturbar o sossego de quem já não vive. No salão festivamente adornado, em determinados dias, há, também, renhidas disputas de truco, acompanhadas e terminadas por brados de triunfo, doestos inocentes, gritos e exclamações que lembram colóquios do homo terrificus das eras glaciais...

                E, assim, num contraste chocante entre a Roma imperial e a nossa Tanabi provinciana, verificamos nada ter de que nos ufanar com a transformação operada no antigo campo santo da gens tanabiense. Mas, assim mesmo, e nada obstante isso,  viva  o  Progresso  com  todos  os  seus  ritos  iconoclastas.

Tanabi, 14 de abril de 1959.

Alguns comentários sobre o Tangarás

                Surgiu, o Clube dos Tangarás, de uma perene aspiração popular, tendo por escopo a fundação de associação recreativa e cultural que servisse, em seus desígnios, aos precípuos interesses da coletividade. E foi ao encontro dessas aspirações que o Dr. Newton José Cucolíchio teve a iniciativa de levar avante esse magnífico tentâmen, reunindo, a convite seu, nos salões do Sindicato Rural de Tanabi, cerca de cinqüenta pessoas gradas com o fito de levar a bom término essas idéias  preliminares  em  esboço.

                 Após concorrida reunião, constante de ata, ficou decidida a fundação de um clube de campo que congregasse a sociedade local, ocasião em que, para gáudio dos presentes, doou, exponte sua, uma área de oito alqueires de terras, nas cercanias da cidade, que servisse aos fins em pauta, concretizando, assim, a aspiração de todos. Em reuniões seguintes, foi posta em discussão, e em seguida aprovada, proposta do presidente para ser escolhida denominação a ser conferida ao novo sodalício, tendo o Sr. João de Mello Macedo, por aclamação geral, apresentado o topônimo “Clube dos Tangarás” que saiu vencedor, vocábulo e frase a expressar os movimentos naturais de uma ave —tangará —da família dos frangilineos, que habita o norte do país e que se especifica como dançadora e que, em seu conjunto, compõe uma das mais belas designações em entidades correlatas, e que tão bem se coaduna com o propósito em mira. Foi, a seguir, escolhida por aclamação uma missão de quatro membros com a incumbência de estudar e apresentar os estatutos da novel entidade, estatutos esses que foram aprovados em tempo hábil, sendo, finalmente, inscritos no cartório competente da comarca. Estava, pois, o Clube dos Tangarás com existência legal e plena capacidade jurídica para exercer suas funções, o qual vem, até hoje, funcionando regularmente a contento, sempre, ou quase sempre, sob a orientação criteriosa e esclarecida de seu presidente vitalício, Newton José Cucolichio, ou seja, desde a fundação,  aos  31  de  março  de  1960,  até  a  presente  data.

Achegas para a história do Tangarás

                Nos pródomos da fundação do Clube dos Tangarás, nos idos de maio de 1960, em uma das reuniões preparatórias, cogitou-se do nome que deveria designar a novel entidade recreativa tanabiense, ocasião em que seu idealizador, o Dr. Newton José Cucolichio, entregou à assembléia, adrede convocada, a tarefa de escolher essa designação para que a nascente agremiação tivesse um nome sonoro, expressivo e ao mesmo tempo com significado pertinente às suas funções sociabilizantes.

                Nessa ocasião, consultados que fomos, aventamos aplicar ao grêmio que se fundava o nome de “Jataí Clube”, em homenagem à antiga denominação desta urbes, Tanabi, dado que a cidade, antes da criação do distrito de paz, em 1907, chamava-se pura e simplesmente “Jataí”, assim como designava também o rio ou ribeirão que lhe banha os flancos, o querido “rio das borboletas”, tradução indígena do vocábulo “Tanabi”, na opinião acertada do saudoso tupinólogo paulista Plínio Ayrosa, com quem tivemos a honra de conviver nos intra-muros do Instituto Histórico de São Paulo. Acresce que, em abono de nossa tese, o clube deveria ser, como realmente foi, localizado na margem esquerda dessa correnteza. Logo, nossa idéia, sem ser despicienda, era corroborada pelas circunstâncias do meio ecológico e  tinha  a  seu  favor  razões  históricas  dignas  de  aceitação.

                A essa altura, ao lado de fartos aplausos colhidos, surgiram debates contrariando nosso ponto de vista, ocasião em que foi alvitrado consultar-se o ilustrado poeta tanabiense Mello Macedo a fim de que este apresentasse proposta contendo o desejado topônimo. Ato contínuo, o festejado autor de “Arribada”, num momento inspirado, sugere a nominata “Clube dos Tangarás”, alusão à famosa ave canora que no recesso da floresta brasileira executa incrível coreografia, verdadeira “avis rara” no campo da ornitologia universal, aplicada, essa denominação, “mutantis mutandi”, ao fim que se tinha em mira: danças e diversões.

                Tangará é nome genérico das avezinhas da família de dançadores, ou tanagras. A pipra longicunda é de cor azul celeste pelo lado abdominal e, no dorso, tem a cauda e as asas pretas, tendo no cocuruto um círculo ou coroa de magnífica e brilhante  cor  vermelha,  conforme T eschauer.

                Posta em discussão ambas as propostas foi aprovada a sugestão de Mello Macedo,  conforme  a  ata  respectiva.

                Passou, então, “Clube dos Tangarás” a designar o novo centro de diversões, e realmente expressa um dos mais formosos toponímicos que nomeiam entidades dessa natureza, pelo que, registramos aqui, neste desconchavados comentários,  as  nossas  homenagens  ao  seu  idealizador.

Tanabi, 13 de junho de 1965.

Fundação de Votuporanga

                Testemunha ocular da história, eis-me aqui a recordar os fastos comemorativos da fundação de Votuporanga, no ano do cinqüentenário, para consignar meu depoimento pessoal referente aos fatos que antecederam ou se sobreporão à fundação da urbes, ou seja, os primeiros rudimentos da instalação humana nos contrafortes dos grandes imóveis rústicos Marinheiro e Viradouro, em pleno deserto ecumênico onde só haviam esparsos vestígios de penetração e a rara presença  de  pioneiros  como  Sebastião  de  Lima  Braga  e  outros.

                Vamos, porém, aos fatos: o Cel. Francisco Schimit, terra teniente em Ribeirão Preto e proprietário de uma gleba inexplorada de treze mil alqueires de terras, nesta região, viu-se, de um momento para o outro, compelido a desfazer-se de seus bens por insucesso no mercado cafeeiro, sendo obrigado a entregar as terras do Marinheiro, no Município de Tanabi à firma Theodor Wille & Cia., magnata do mercado de Santos, em pagamento de seu débito. Levados a bom termo as negociações, Carll Helwig, sócio-diretor, houve por bem juntar-se a Guilherme Vom Trumbach, também residente no litoral, surgindo daí a Empresa Retalhadora de Terras, que teve a incumbência de promover o loteamento de toda a gleba em lotes urbanos e rurais, estes com 5, 10, 20, ou 50 alqueires, que seriam vendidos a preços razoáveis e pagamento a prazo, ficando decidido a implantação de um “patrimônio”

no divortium aquarium dos rios Turvo e Dourados; Diversos agrimensores foram incumbidos de planificar o loteamento, em plena mata virgem, por onde passava velho caminho ligado à Boiadeira, em direção ao Porto Taboado, no rio Paraná. Foi adrede providenciada a abertura de ruas e praças destinadas ao futuro povoado e foi lembrado, pelos diretores, reunidos na sede da fazenda, onde também se achava o Sr. Germano Robach, qual o nome de batismo do povoado a ser fundado. Germano, amigo e compatriota dos empresários, convidado a se definir, alvitrou meu nome como pessoa capaz de encontrar um topônimo expressivo para designar o local, tendo, na ocasião, mencionado meu nome como conhecedor do tupi-

guarani e membro do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, além de Tabelião  de  Tanabi.

                Posta em discussão essa idéia, foi, logo, unanimemente aprovada e, dias após, ciente de minha escolha para esse desideratum, seguimos, eu e Germano, a cavalo, perlongando picadas recentemente restauradas, pelas lindes da grande

gleba agrária, em busca de elementos que nos autorizassem a fazer a escolha pretendida. Em determinado momento, numa encruzilhada, divisando, no chão revestido de húmus, uma tabuleta semi-destruída pelos cupins e que trazia, em seu bojo, tosco letreiro assim expresso “Faz. Votuporanga”; chamado o meu companheiro, disse lhe: Eis aqui o nome ambicioso do que foi outrora a designação do imenso imóvel rústico, já aprovado pelos antigos da fazenda, e que trazia em seu conteúdo um significado expressivo da língua tupi-guarani, a língua dos aborígenes, primitivos habitantes do Brasil, a significar “bons ventos, brisas suaves,”  tal  qual  Buenos  Aires  no  sul  do  continente.

                Ato contínuo, regressamos para a sede do empreendimento, onde apresentamos o vocábulo escolhido, “Votuporanga”, o encontro fortuito da tabuleta e o seu significado, o qual foi unânime aprovado, quer pelos diretores, quer pelas pessoas presentes. Foi, então, escolhida e fixada a data da fundação da localidade: 08 de agosto de 1937. Nessa data, previamente chamado, Pe. Isidoro Cordeiro Paranhos, vigário de Bálsamo, oficiou a missa inaugural, presentes regular numero de convidados, inclusive o Prefeito de Tanabi , Sr. Manoel Garcia de Oliveira,

os diretores da firma Carll Helvig, Dr. Guilherme Vom Truembach, Sr. Otto Richter, Gilberto Sampaio Vidal, deputado e advogado dos empreendedores. O local escolhido para implantação da vila, na quadra em frente a atual e imponente Igreja Matriz, foi construído, provisoriamente, um pequeno rancho de madeira branca, tirada da mata derredor, coberto de folhas de coqueiro. Rezada a missa, ao som de acordes  musicais  (pois achava-se presente a Banda Municipal de Tanabi),

vivas, discursos e grande regozijo popular, estava fundada Votuporanga e, logo a seguir, nos dias vindouros, foram iniciados os trabalhos de desobstrução das vias públicas, abertos os primeiros poços e edificados os prédios para a escola municipal e primeiras vendas que aí se instalaram, inclusive para residência de famílias dos pioneiros. O afã se instalou no povoado: pessoas cavalgando alimárias, em carrinhos e carroças, alguns “pés-de-bode”, jardineiras etc, num verdadeiro “rush”, compravam lotes e neles foram iniciando benfeitorias para sua instalação. O entusiasmo era geral e a fama do “pueblo” era um incentivo para a vinda de novos moradores, e foi assim que se expandiu derredor, sendo certo que se deve aos caminhoneiros e viajantes a propagação imediata do vocábulo por todos os recantos do Brasil, num frêmito de propaganda invulgar, tal qual foi observado nos Estados Unidos quando todos se dirigiam para o interior do país em busca de ouro, petróleo e outros incentivos.

                Aos poucos vai-se adensando o povoado, instala-se a 2º divisão distrital, o comércio se anima, centenas de escrituras são lavradas, legalizando-se os terrenos adquiridos e negócios entabolados. Mas “nem tudo que reluz é ouro”, lá diz o brocardo e, em dado momento, tremenda seca na região torna a vida dos habitantes de Votuporanga difícil e precária por absoluta falta de água em poços e cisternas, e o desânimo se instalou entre os ádvenas. Entretanto, como tudo tem um término, a seca passou, mas, logo em seguida, nova calamidade ocorreu e assim cessou a tranqüilidade dos votuporanguenses; um fato novo aconteceu:com o término da Segunda Guerra, o Brasil adere aos Aliados, sendo confiscados todos os bens dos súbditos do eixo, inclusive da fazenda “Marinheiro”, onde Votuporanga tinha sua sede. Nesse ínterim, o Governo Federal nomeia uma comissão para administrar esses bens, a qual encarregou o Cel. Alcides Rodrigues de Souza de gerir os negócios do imóvel e sua respectiva sede municipal. Surge, de inopino, uma demanda de terras que desde 1924 se achava incubada na então comarca de Jaboticabal; caminha, a seguir, pela comarca de São José do Rio Preto, vindo, posteriormente, para os auditórios da comarca de Monte Aprazível que abrangia, na época, o município de Tanabi, com trânsito judicial, culminado em despejo em massa contra todos os moradores, donos de lotes e datas, com suas respectivas construções, chácaras e fazendolas, despejos esses efetuados manu militares por pelotões de captura da Força Pública do Estado, acolitados por oficiais de justiça que alegavam resistência dos executados. Foi um “Deus nos Acuda”: o clamor público refletido nos jornais do interior e da Capital alertaram o Governo, e o Poder Judiciário tomou imediatas providências, suspendendo o despejo e promovendo uma correição geral na comarca de Monte Aprazível o que resultou na punição dos culpados e na paz dos habitantes do núcleo demandado, sendo de ressaltar a atuação enérgica e patriota dos advogados Felizardo Calil e Ziegler de Paula Bueno, que se colocaram ao lado do povo; mais tarde, o Tribunal de Justiça reconheceu os direitos da população, com prejuízo total para os “grileiros” e traficantes que aí se instalaram como abutres insaciáveis. Na reforma Administrativa Qüinqüenal foram criados, num só dia, o município e a comarca de Votuporaga, o primeiro instalado em 01 de janeiro de 1945 e esta, a seguir, no mesmo ano. O primeiro prefeito nomeado foi Francisco de Vilar Horta, antigo tabelião em Américo de Campos; Nelson Ferreira Leite, de saudosa memória, foi o juiz de direito da novel comarca, que foi criada sob os auspícios do Interventor Fernando Costa com o beneplácito do Secretário da Justiça, Dr. José Adriano Marrey Júnior. Instalaram-se escolas, estabelecimentos bancários, repartições públicas e executaram-se obras de infra-estrutura na cidade: luz elétrica, água e esgotos, guias e sarjetas, aprimoraram-se as instalações de casas comerciais e residências, grandes indústrias aí se localizaram e a cidade uma potência em ritmo de um grande e notável empório regional, tornando-se conhecida e admirada nos quatro  cantos  do  país  e  do  exterior.

                Cumpre referir aqui, ao término destas notas, que além do nome escolhido para a povoação, também contribuímos, modéstia à parte, com a elaboração do Brasão de Armas da Cidade, estilizado que foi pelo artista plástico Itajay Martins, que então lecionava em estabelecimentos de ensino de Votuporanga, atualmente residente na capital; Brasão de Armas esse que foi unanimemente aprovado pela Câmara Municipal local, nada obstante nossos parcos conhecimentos de heráldica.

                Segue-se, agora, pequena nominata de pessoas que tomaram parte na fundação da cidade, e também primitivos habitantes que fizeram e fazem o engrandecimento desta terra, um dos mais destacados centros geográficos do oeste  paulista.

                Dr. Carll Helvig e senhora; Dr. Guilherme Vom Truembach e senhora; Dr. Gilberto Sampaio Vidal e senhora, residentes em Ribeirão Preto; Sebastião Almeida Oliveira e senhora dona Carmen Vargas de Oliveira, residentes em Tanabi; o primeiro, membro do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo e de várias instituições literárias e científicas do país, que escolheu o nome de Votuporanga e de seu Brasão de Armas; Manoel Garcia de Oliveira, prefeito de Tanabi e que acompanhou a implantação da nova comuna;Francisco de Vilar Horta, antigo morador na região, tabelião em Américo de Campos e primeiro prefeito municipal de Votuporanga; Sebastião de Lima Braga, administrador da firma Francisco Schimitd na região e antigo morador no local; Demétrio Acácio de Lima, fazendeiro nas cercanias;Ten. José de Souto Cirne, atual diretor da Banda Municipal de Tanabi, onde reside, e um dos fundadores e dirigentes da Orquestra Sinfônica de São José do Rio Preto; Pe. Isidoro Cordeiro Paranhos, vigário de Bálsamo e que oficiou a missa campal de fundação de Votuporanga; Guntel Schamall, ajudante de agrimensor e sua mulher, professora Olga Faria Basílio, sendo esta a primeira pessoa que lecionou na escola improvisada e que funcionou logo a seguir à fundação; Abílio Franco, professor de primeiras letras e que se propôs lecionar de graça na localidade; O irmão do Pe. Isidoro, cujo nome nos escapa, e que foi o primeiro comerciante no local; Antonio Marin, um dos primeiros adquirentes de lotes na povoação, cujo nome figura como bairro na cidade; José Abdo Alfagali, também dos primitivos comerciantes; pai do tabelião Aziz José Abdo; João Batista Budin, que, após sua vinda para o burgo, construiu vários prédios na cidade; Germano Robach, agrimensor e construtor da primeira olaria nos arredores da cidade; foi ele que sugeriu a indicação de nosso nome como apto para descobrir um nome original para a cidade projetada; Prof.Wolfrang Wehinger, renomado musicista e sua esposa; Cristian Waideman, proveniente de Mirassol; Francisco de Souza, padeiro em Tanabi, e que fundou a primeira panificadora da cidade; Manoel Ramalho Mata, fundador do primeiro cinema da cidade; João Batista Gonzáles e seus irmãos, que se tornaram proprietários aqui; Braz Vita, procedente de Araraquara e Mirassol; foi um dos impulcionadores da

localidade; Germano Pernica, hábil carpinteiro e construtor de prédios; Otto Pinckwart, também carpinteiro e companheiro de Pernica, ambos procedentes  de  Tanabi;

Tanabi, década de 80.

Dia da fundação da cidade de Votuporanga: 08/08/1937.  Dentre osfundadores destacamos Sebastião Almeida Oliveira.

Na seara imensa do folclore

                Na seara imensa do folclore, há muito o que respigar, e nela a superstição figura como um dos self-repeting process dos mais corriqueiros e iterativos.

                A própria etimologia da palavra exprime a idéia de sobrevivência ce qui persiste dês anciens ages e De la Sagesse, citado por Sebillot, doutrina que a superstição popular vient de falblesse d’âme, d’ignorance ou néconnaisse de Dieu bien grossière; dont elle se trouve plus volontiers aux enfants, femme, vieillards, malades assaillis et battus de quelque violent accident. Inclinant natura ad superstítionem barbari, escreviam os latinos, pensando de igual modo. Selvagens, bárbaros ou civilizados, homens, enfim, possuem uma alma coletiva onde repousam as próprias superstições, crendices, as suas formas de arte ou de ciência elementares que lhes dão a intuição do mundo anterior, preliminares e precedentes às criações pessoais mais tardias da ciência abstrata ou da arte culta, acrescenta João Ribeiro.

                Costumavam os gregos pôr uma moeda nas mãos de seus mortos, justamente antes do enterro. Essa moeda serviria, diziam, para pagar sua passagem pelo Stix, rio mitológico do inferno.

                Revivescência desse costume ancestral fomos colher, entre nós, no uso de colocar, na boca de um assassinado, determinada moeda, gesto esse que obriga o homicida a apresentar-se às autoridades.

                As loiras filhas de Albion jamais limpam o cisco da porta de frente de suas vivendas. Fazer isso, acreditam, é atrair má sorte para o seu home. Nesse caso, nossas patrícias são bem menos exigentes e pouco se atém com a varredura portas afora, mas instintivamente evitam varrer a casa ao sol posto ou na sexta-feira “maior”.

                Destruir baratas é contribuir cegamente para a sua propagação, explica um conceito popular e, para nos livrarmos desse inseto ortóptero, nada mais fácil que colocá-lo numa caixinha e deitar esta num caminho: aquele que a encontrar levará  para  sua  casa  essa  imundícia  de  asas.

                Idêntico processo aplicam gregos e troianos para afastarem ratos de um local: por meios “amigáveis”, solicitam em carta escrita, colocada sobre uma pedra, a “ter a bondade de abandonar aquele campo e passar ao vizinho”.

                Para cura da febre, usavam os romanos garantida mezinha: Cortavam as unhas do paciente e pregavam as aparas, com cera, sobre a porta da casa contígua antes  do  nascer  do  sol.

                Os bosquímanos da Austrália cortam as unhas de seus mortos com medo que, se assim não fizerem, os cadáveres possam esgaravatar um caminho para fora  da  cova  e  vir  assombrar  os  vivos.

                Os japoneses, porém, evitam cortar unhas à noite com receio de encontrar garras  de  gato  na  ponta  de  seus  dedos  ao  amanhecer.

                Quanto a nós, destacamos a inibição de cortar unhas na sexta-feira, no pressuposto de que o demônio leve as aparas para seus domínios, onde aguardará a  alma  de  seu  portador.

                Os naturais do Eire, pacíficos irlandeses de incríveis vestimentas, impedem, a todo custo, a entrada de pintarroxo em suas residências, por acreditarem que ele lhes trará pesadas chuvas ou neve. Nesse ponto somos mais condescendentes: achamos que a visita de um beija-flor aos nossos aposentos prenúncio  é  de  felicidades,  principalmente  se  ele  tiver  a  cauda  branca.

                Nossa boa gente campezinha evita atirar fora pedaços de pão, porque, adiantam, este foi abençoado por Deus, simboliza a abundância e pô-lo fora é atrair a miséria. No século XVI, aquele que asistiu aos grandes descobrimentos, os pacatos camponeses costumavam aspergir com água benta a massa do pão antes de levá-lo ao fogo. Em nossos dias, guardando esse mesmo rito, em muitas casas onde se cozem pão, é habito cortá-lo em forma de cruz antes de ser enfornado, para melhor  crescer  a  levedura.  

                A maioria dos fornos populares tem a forma arredondada; dizem que esse tipo de construção provém dos africanos, que preferiam essa forma à quadrada, porque,  nesta,  os  maus  espíritos  podiam  esconder-se  com  facilidade.

                                                                                                       Tanabi, 28 de março de 1942.

Religião e folclore

                Por baixo da capa do cristianismo, palpita muito vivo o coração do paganismo, escreve Leite de Vasconcelos, o saudoso compilador das tradições portuguesas, e fá-lo com linguagem própria e perícia costumeiras, dado que a religião popular repousa num misto de crendices supersticiosas onde é difícil separar o divino do profano, mormente nas regiões pioneiras, lugares em que perdura uma religião feita de mitos, crendices, promessas, práticas ineficazes, fanatismo e preconceito. Desse rol de abusões e preconceitos, colhidos diretamente da alma popular, emergimos triunfantes da “racclota”, registrando, a seguir, uma das mais típicas manifestações do opulento folclore regional.

                1 - Não se deve atirar ao lixo ou deixar cair pão no solo, porque isso atrai miséria  e  é  pecado  (de  pão  se  faz  a  hóstia).

                2 - Cuspir na água, profanado-a, não é aconselhável, porque com ela fomos  batizados.

                3 - É pecado negar de servir, na qualidade de padrinho, a quem quer que seja, principalmente à gente de cor; falta tão grave só poderá ser remediada paraninfando  consecutivamente  sete  pimpolhos  “coloureds”.

                4 - Criança que expira antes do batismo não vai para o céu e, sim, primeiramente, para o Limbo, e junto ao seu túmulo ouvem-se, anos a fio, choros plangentes.

                5 - Filho não pode fumar diante dos pais porque, na outra vida, densa cortina  de  fumaça  separará  uns  dos  outros.

                6 - É pecado negar de vender toucinho a gente necessitada.

                7 - Árvores maninhas frutificam quando surradas na véspera de São João.

                8 - São tentadas pelo Demo famílias cujos nomes e apelidos coincidem e se  repetem.

                 9 - O uso de bentinhos ao pescoço, em forma de escapulário, é seguro antídoto  contra  mau  olhado,  inveja  e  outros  efeitos  maléficos.

                10 - Para debelar impinges e outras afecções cutâneas, nada mais infalível  que  circundá-las  com  a  frase  “Ave  Maria”.

                11 - Oração de São Marcos, trazida como num patuá, confere ao portador valentia  e  denodo;  é  o  talismã  dos  valentes.

                12 - Diabo não entra em casa que tenha, em suas portas, desenhos representando  a  cruz  de  Salomão.  

                13 - É aconselhável não empreender viagem em Sexta-feira Santa; igualmente, não se deve trabalhar na primeira segunda-feira de agosto, dia aziago por  excelência.

                14 - Quem quiser achar objetos perdidos, basta invocar em altas vozes a São  Longuinho,  que  é  o  padroeiro  das  coisas  desaparecidas.

                15 - Livramo-nos de cobras e outros bichos perigosos recitando o versículo seguinte: “São Bento, São Bento, livra-me deste bicho peçonhento”, sabido  é  que  esse  maioral  da  Igreja  comanda  os  répteis  venenosos.

                16 - Um ovo ao relento, em homenagem a Santa Clara, faz aplacar a chuva;  desenhar no  chão  a  efígie  do  sol  conduz  a  idêntico  resultado.

                17 -  Não presta atirar em urubu: dá azar, e em pomba por ser esta a imagem  do  Espírito  Santo.

                18 - Pecado é negar de oferecer nossa mão a quem nos cumprimenta. Um shakehands  nada  custa...

                19 - Não é de bom alvitre cortar as unhas na última semana da quaresma; o demo, que é sorrateiro, leva as aparas para o inferno, onde estas aguardarão seu possuidor.

                20 - Arrisca-se a ficar cego aquele que trabalha em dia de Santa Luzia; no caso de qualquer afecção ocular, mesmo invocada não nos atenderá a santa padroeira dos olhos. Prevenindo represálias, nossa gente dantes prefere burlar o descaso dominical do que infringir o preceito em dia santificado de sua devoção.

                21 - Comprar estampas ou imagens de santos não é permitido; quando muito poderemos trocá-las; sagrado eufemismo que acoberta transações dessa natureza  em  que  os  mascates  são  peritos.

                22 - Não presta deixar a mesa posta longo tempo após as refeições, porque  o  Anjo  da  Guarda,  aí  presente,  não  se  retira.

                23 - Mulher no período lunar está impedida de comungar. É pecado.

                24 - O remoinho é produzido pelo saci pererê em suas costumeiras diabruras. Temos aí um vestígio de animismo primitivo, segundo o qual havia espíritos que produziam os fenômenos da natureza, (L.Vasc, “Opúsculos).

                25 - Para o sabão de cinza não “desandar”, é bom fazer uma cruz no

fundo da vasilha.

                26 - Sonhos os mais lindos terá a moça que puser três rosas debaixo do travesseiro  na  véspera  de  Santo  Antônio.

                27 - A simples invocação dos nomes de Santa Bárbara e São Jerônimo, padroeiros  das  tempestades,  faz  aplacar  os  revoltos  elementos.

                28 - Cruz em frente da habitação protege o dono contra as tentações do Tinhoso.

                29 - Colocar amuletos de cera em cruzes de beira de estrada é meio aconselhável para obter cura de membros atrofiados por feridas e moléstias repugnantes.

                30  -  Antes dos sete anos, as crianças são consideradas anjos e tem, por esse motivo, o condão de ver as almas dos entes que morrem, quando estas sobem para o céu, logo após o trespasse, perdendo, no entanto, essa regalia do septenário em  diante.

                31 - Credo recitado “às avessas”, isto é, invertido, dá-nos a visão do Coisa-Ruim; rezado de costas afasta o sono e, proferido com muita devoção, ajuda o cavaleiro  a  suster-se  na  sela  ainda  que  o  animal  seja  bravio.

                32 - Qualquer desejo poderá ser realizado pondo-se a imagem de Santo Onofre numa vasilha contendo aguardente e renovando-se esta até conseguir o almejado.

                33 - O aperto de mão, cruzando os braços, num encontro de quatro pessoas, dá azar; desmancha o casamento dos casados e atrapalha o dos solteiros.  O  vulgo  teme  o  gesto  cruciforme.

                34 - Não presta olhar para trás quando se faz a via sacra em Semana Santa;  arrisca-se  ao  apedrejamento  por  mãos  invisíveis.

                35 - Reses nascidas em noite de São João soem trazer em seu estômago pedras que o vulgo crê encantadas, e quem as encontrar pode estar certo de que possui  o  talismã  da  boa  sorte.

                36 - Restos da fogueira joanina servem para aplacar a fúria dos elementos; queimar palmas bentas em domingo de Ramos conduz a semelhante resultado.

                37 - Cura-se o sapinho ou aftas colocando-se a chave do sacrário na boca do  recém-nascido.

                38 - As manchas da lua em plenilúnio formam a imagem de São Jorge a cavalgar fogoso ginete e, de lança em riste, combate o dragão que ameaça destruir a  terra,  diz  conhecida  lenda  popular.

                39 - Santo Antônio é o protetor da gente casadoira; mas quantas vezes as moças fazem-no descer, de cabeça para baixo, ao fundo dos poços, ficando sua  imagem  em  tão  lôbrego  sítio  até  que  o  milagre  se  produza?

                40 - Todas as danças são invenções diabólicas, exceto o cateretê, acredita o sertanejo brasileiro, porque esta foi abençoada e até praticada por Jesus quando em  sua  peregrinação  terrestre.

                41 - O patrocínio dos morféticos foi confiado a São Lázaro, que protege especialmente os seus xarás; daí a grande abundância de nomes dessa natureza na zona rural, onde é crença de que apor o apelativo Lázaro nos rebentos é preservá-los,  seguramente,  do  morbus  infeccioso.

                                                                                          Tanabi, 21 de dezembro de 1942.

Superstições Joaninas

                O povo nunca perde totalmente o seu patrimônio de crenças; transforma, adapta, acrescenta, escreve um grande cultor da etnologia portuguesa; daí o constante renovo da superstição em geral, particularmente a que se prende ao onomástico de São João, a propósito do qual circulam, em trevas brasileiras, crendices que a fantasia alindou  e a tradição oral veio repetindo até nossos dias. Dentre elas, a mais conhecida é a que tem por cenário os bucólicos recantos da

bíblica Judéia. Anunciado pelo milicianos da corte celestial nascera o meigo bambino JESUS e Nossa Senhora foi com ele à casa de sua prima Santa Isabel, que a esse tempo esperava o Batista, o qual, ainda no ventre materno, ajoelhou-se para saudar o pequenino Redentor do Mundo. Inteirada a Virgem do que ocorrera, pediu esta um sinal quando viesse o nascimento, ao que respondeu a Santa: “Mandarei plantar, no alto da colina, um mastro com uma boneca e mandarei acender uma grande fogueira”, de onde se originaram essas ígneas festanças, anualmente repetidas, de luminárias e fachos, encantadoras piras ardentes em que até as sobras do lume, e as próprias cinzas, servem para aplacar as fúrias da natureza.

            Veio à luz o Precursor; Nossa Senhora, tão logo avistou as volutas de fumaça no alto do morro, imediatamente seguiu para o local a fim de vê-lo. Algum tempo depois, o menino perguntou a Santa Isabel: “Minha mãe, quando é o meu dia?” e esta lhe respondeu: - “Quando for o teu dia, eu te avisarei, meu filho, dorme”. Dormiu infante e só acordou quando já São Pedro era festejado. Novamente indagou quando era seu dia, tendo, como resposta, estas palavras: - “O teu dia já passou, meu filho.” —“Ora, minha mãe, por que não me disse, que eu queria brincar.” —Dizem que, se ele soubesse, ficaria orgulhoso com as festas que lhe fazem, ou, então,  que  o  mundo  pegaria  fogo  de  uma  vez...

                Dessa adorável lenda outras nasceram. Há uma profecia, de mil anos, quando a alma humana estava cheia de bruxedos, abusões e mitos, que vaticina o fim do mundo para quando o dia de São João (o maior do ano, na concepção popular) coincidir com a celebração do Corpo de Deus. E esse horrível evento ocorreu neste ano da graça de 1943, mil novecentos e quarenta e três após o nascimento de JESUS, dando ensejo ao aparecimento de interessantes superstições correntes na região sertaneja, onde laboramos, todas relacionadas com  o  tema  joanino.

                Assim é que, dois de junho, aerólito de grandes proporções riscou os céus brasileiros dirigindo-se para o norte. Esse fulgurante meteoro, qual alígero fogo de artifício, em sua momentânea trajetória pelos domínios do ar, espargiu, em derredor, vistoso feixe de luz multicolorida, secundado, daí a instantes, por espetacular ribombo, desses que o vulgo costuma batizar de “trovão em seco”. Fenômeno trivial ao que dispõe de dois dedos de erudição e conhece, ainda que pela rama, os rudimentares segredos da astronomia, causou ele, como soe acontecer em casos tais, profunda impressão no seio da população campezinha que, supersticiosa por excelência, nada, ou quase nada, percebe desses espetáculos pirotécnicos das alturas, mas, com a imaginação ferida, liga-as a prognósticos de nenhum modo favoráveis à continuação da vida neste vale de lágrimas. E tivemos, então, oportunidade de anotar deliciosas narrações que circulam entre os crentes e cultores do preconceito. Diziam alguns que essa estrela cadente é núncia de pragas, desgraças, calamidades e outros meios de extermínio,

inclusive revoluções, e veio logo a pronunciamento argentino para confirmar; outros, mais prolixos, adiantaram que nessa noite fatídica veio ao mundo uma criança que, instantes após seu advento, sem outras cerimônias, sentou-se no leito e daí afirmou, alto e bom som, para quem quisesse escutar, que a atual guerra duraria pouco tempo... justamente porque o mundo, este velho e carcomido globo em que habitamos, ia se acabar precisamente no dia de São João, por coincidir a data aniversária do Batista com a festa de Corpus Christi.  E o anunciado fim dar-se-ia por forte tremor de terra que tudo destruiria. Salvos do cataclisma seriam somente aqueles que possuíssem, em seus lares, a medida do corpinho do recém- nascido. E foi um rol interminável de medidas que célere se espalhou por todos os recantos rurais, vindas não se sabe de onde, mas religiosamente guardadas, até previstas para que, na hora crucial, não fossem pilhados desprevenidos os míseros mortais. Mas, desprestigiando-a aos olhos do vulgo, outras lendas mais jocosas foram geradas pela imaginação popular e houve que dissesse, com desplante e irreverência, que esses curtos fios de linha assinalavam exatamente a medida de um papo de velha!... Quem a possuísse consigo, na noite encantada de São João, nada teria a temer, ao passo que, o descuidado que a perdesse, ou viesse a queimá-la, esse ficaria, irremediamelmente, dessa data em diante, para todos os efeitos das leis sobrenaturais, herdeiro e detentor do gigantesco “papo de cordão”. Por via de dúvidas, muitos foram os que não facilitaram e muniram-se previamente do milagroso fio...

                Já vai longa, porém, esta parlenda e convém encerrá-la, suavizando tão enfadonhas previsões com o registro de doces cantigas que a gente do povo costuma  entoar  em  louvor  ao  venerado  Santo  no  dia  de  seu  genetlíaco:Se São João soubesse

Que hoje era o seu dia,
Descia do céu à terra
Com prazer e alegria.
Donde vindes, São João,
Pela calma, sem chapéu?
- Venho de apagar as velas
Que se acenderam no céu.
Ó meu São João,
Eu vou me lavar;
Se eu cair no rio,
Mandai-me tirar!
Capelinha de melão
É de São João;
É de cravo e de rosas
É manjericão!

        Tanabi, 24 de junho de 1943.

O alecrim no folclore

Planta da família das labiadas, o alecrim, Rosmarinus officinalis, Lineu, deve seu nome à raiz Rhos marinum, de rosée de la mer, rocio do mar e goza, na boca do povo, de virtudes mágicas como preservativo eficaz para afugentar todos os males do corpo e do espírito. Seu olor agradável desvia o mau-olhado, acalma doenças do coração e, por isso, sua presença é quase obrigatória na habitação rural.

 Segundo antiga crendice européia, o alecrim, penhor de imortalidade, com sua folhagem sempre verde, conservava os mortos, e o seu emprego era recomendado em cerimônias religiosas e funerárias, costume ainda conservado em pleno nordeste do Brasil. Orlavam-se de alecrim  os lares romanos, sendo seus ramos utilizados como meio de purificação e, numa receita de Chiarini, em pleno século XV, recomendava-se o uso de suas flores, junto a outros ingredientes, para conservar a mocidade. Na Bolonha, essas mesmas flores, postas em contato com o coração, produziam alegria. Na Espanha, há quem lhe atribua a virtude de ter dado asilo à Virgem, quando de sua viagem para o Egito sendo peculiar àquele país enfeitar as casas com galhos de rosmaninho em plena noche buena, isto é, por ocasião do Natal. Para os Cretenses é símbolo da felicidade.

                 Com tantos predicados reunidos, era natural que o alecrim influísse, como influiu, poetas e trovadores populares, registrando-se, a seu respeito quadras mais ou menos expressivas que respigamos no folclore daqui e de além-mar.

Alecrim verde arrancadoDura só quarenta dias, Assim trago no meu peitoEsta grande tirania.Alecrim tem vinte folhasE a roseira dezesseis,Ou me ames com firmeza,Ou desprezes de uma vez.Alecrim verde arrancadoNa tua mão reverdece;Quem eu quero não me quer,Quem me quer não me merece.

Essas quadras, por nós recolhidas na região que habitamos, semelham outras de vários quadrantes e, até, alienígenas, todas enaltecendo qualidade, apregoando virtudes do lendário rosmaninho. Ambos enaltecendo o poder medicamentoso do alecrim, presença constante na bruxaria portuguesa e ibero-americana, contribuinte permanente e jamais olvidado do folclore brasileiro.

Tanabi, 10 de fevereiro de 1962.

A casa do sertanejo brasileiro

                Reflexo da zona natural em que se levanta, a casa do sertanejo é construída com material que lhe faculta o meio, diferindo em cada região os tipos e estilo em uso, mas encarna sempre a própria história da formação brasileira. Assim, no Amazonas, as construções primitivas são feitas de piso suspenso por causa do charco quase generalizado, e suas três paredes, teto e assoalho feitos de palha tecida ou lisa, geralmente folhas de palmeira ubussú e assai; outras vezes constam de barracões rústicos vedados por ripas de paxiúba e desprovidos de todo o conforto e segurança, moradia típica do seringueiro nômade; ao Nordeste, refletem as habitações os característicos da flora local, em que predominam os babaçús, carnaubeiras e vastos coqueirais; aí as casas são feitas com armação de madeira e telhado de palha, algumas barreadas, das quais é tipo o mocambo, casas que indicam a inquietação e a infixidez de quem estava partindo e voltando a cada momento, na aguda observação de Cassiano Ricardo; já na região centro-leste do país, na qual habitamos, São Paulo, Minas, Mato Grosso, Espírito Santo, Rio e Sul da Bahia, impera o pau roliço nas construções rurais, sendo que, em muitas delas, a própria porta é de pau roliço natural; são edificações batumadas de barro vermelho, ao qual se junta estrume de curral, tendo, por cobertura, as mais singelas o sapé, e as melhoradas a telha vã, com assoalho sem revestimento; são as chamadas casas de pau-a-pique, feitas de grosso esteios de aroeira, madeira preferida porque dura mais de cem anos, esteios roliços ou lavrados a machado tendo paredes de varas trançadas com barro “batido a sopapo” e, quando o dono é “caprichoso, o barro é alisado recebendo, então, leve camada de reboco e pintado de ocra com bizarros desenhos de plantas e animais; na região sulina, o Paraná como centro, as casas são construídas de madeira serrada, pela abundância de pinho; paredes, teto e piso são revestidos desse material, dando-lhes um aspecto típico e inconfundível; aí, como aliás em outros lugares, registram-se habitações bastante rudimentares, consistentes em ranchos mal acabados, cabanas de palmeira cobertas de folhas de faciroba.

                A grande maioria das habitações do Brasil é construída de barrote, observa Roy Nash; telhado de duas águas, raro de quatro, e todos com manso declive; poucas divisões internas, geralmente uma sala, um só quarto; cozinha em forma de puxado, compartimento escuro e mal ventilado com portas e janelas de pequenas dimensões; grande é o número, em certas regiões, das que ostentam, como paredes e tetos, esteiras e caniços de palha tecida, mister em que há muitos peritos; este tipo, para dimensões e cobertura é bastante adequado ao clima tropical. Casas construídas de adobe, isto é, um tijolão feito com terra fraca e sem fogo ao qual se adiciona, muitas vezes, para dar-lhes maior consistência, capim cortado em pedacinhos e, além dessas, há as paredes de taipa, feitas depois da cobertura com um caixão de tábuas onde se vai socando o barro que será, depois de seco, a parede; nesse estágio do barro socado, “refúgios construídos do mesmo barro triste das montanhas”, porquanto de barro são feitas as paredes onde proliferam parasitas, de barro é o chão batido, e o próprio telhado é de barro cozido. Quase todos esses tipos, por suas condições insalubres, má disposição arquitetônica e outros múltiplos fatores contrários, tornam-se desaconselhados para o soerguimento de nosso padrão de vida campesina e, em nenhum caso, ambiente propício à existência vegetativa do trabalhador brasileiro. “Casa de cachorro” crismou-a o romancista José Lins do Rego citação de Tavares de Almeida num belíssimo apanhado de sociologia regional onde verbera nosso procedimento para com o trabalhador da gleba, pária abandonado nas casas de colônia, a mais das vezes pardieiros acasalados e infectos, ou no retiro distante e primitivo do peão e do campeiro de gado.

                De cabanas de sapé, capim e folhas de coqueiro, madeira roliça amarrada com cipó e, cobrindo-a, camadas de barro cru e queimado, materiais extraídos com relativo trabalho da mata circunjacente, de casas desse gênero está semeado o Brasil inteiro, não há contestar. São elas idênticas, em muitos portos, às choupanas da Inglaterra medieval, semelhante às choças de colmo usadas no tempo dos

romanos pelos invasores sarracenos. Em geral é péssimo o viver de nosso caboclo; assim, levanta, para sua moradia, não um conjunto residencial onde o conforto, o bom gosto e a higiene tenham guarida, mas antros imundos onde se tem receio de permanecer, dada a miséria reinante; e pousar neles, sobre constituir temeridade, tornar-se-ia real suplício, dada o incômoda companhia de insetos parasitas que tem no “barbeiro”, na “chupança”, nas pulgas e seus afins o protótipo da perniciosa raça geradora de males incontáveis. Antes de tudo, o sertanejo é um forte, já afirmara, de uma feita, o imortal Euclides da Cunha, e afirmou com muita razão visto que, se assim não fosse, acabaria sucumbindo às inclemências e adversidades do meio, à rudeza  extrema  de  seu  viver  primeiro.

                Cumpre atentarmos, como lição a aprender, no exemplo dos camponeses de Santa Catarina que, lidando os mesmos materiais que nós usualmente empregamos, conseguiram edificar habitações confortáveis e até artísticas; casas de campo, de tijolo vermelho e madeira pintada a preto, uso de chaminés, banheiros etc., tudo isso em flagrante contraste com o tugúrio pouco recomendável de nosso caipira, morando sempre em casas provisórias, que nunca torna definitivas, em cafuas, mocambos, ranchos, taperas, choças e cochicholos, mal ambientados, em suma,  e  onde  a  palavra  lar  não  tem  aplicação.

                Não se devem violentar as tradições, o caráter e as tendências do povo, ensina o leader da sociologia nacional, Gilberto Freire, mas simplesmente orientá-lo, aproveitando e utilizando tudo o que for útil e prestadio, tudo o que as experiências de quatro séculos nos oferecem e desprezando o rotineiro e prejudicial, traçar novos rumos no sentido de dotar o brasileiro do campo de habitação condigna ao nosso max e às nossas condições de vida. A casa do rurícola deve reunir o maior número possível de material e elementos de construção tradicionalmente  brasileiros,  concluímos,  parodiando  Contreras,  no  México.

                Encerramos estas linhas pensando, como o autor de “Sobrados e Mocambos”, que só o aumento da capacidade de aquisição por parte dos brasileiros que se alimentam mal, que andam descalços; que vivem em habitações a que ninguém é dado lobrigar rudimentos de higiene, poderá resolver esse complexo problema, o da habitação rural, que tão poderosa influência exerce sobre o homem.

                                                                                                Tanabi, 20 de julho de 1940.

Carro de bois

                O carro, em si, compõem-se de: rodas e mesa.

                As rodas são compostas de três peças de madeira resistente, geralmente cabreúva, ou bálsamo, ipê etc.; a do centro tem o nome de meão; as laterais chamam-se cambotas; por sua vez, as cambotas são ligadas internamente por outra peça de madeira denominada arreia em número de duas; as pontas do eixo que atravessam as rodas são ligadas externamente, para não se abrirem, por meio de dois ferros com pontas mergulhadas na madeira e que tem o nome de gato; duas cavias prendem as rodas ao eixo; junto à extremidade das rodas, uma carreira de pregos pontilhados, servindo de enfeite, toma o nome de agulha, e a parte metálica dos bordos chama-se ferragem, de onde a operação de ferrar o carro, que consiste em avermelhar o ferro com uma grande fogueira, em forma circular, e assim colocá-lo na roda; o ferro, ao esfriar, perde a dilatação e comprime-se junto àmadeira com bastante  resistência.

                A mesa do carro é composta de várias peças de madeira e ferro, assim discriminadas; duas chedas que cingem a forma da mesa e avançam até justapor-se ao cabeçalho com irregular espessura; o centro, composto de duas ou mais tábuas formando, com a cheda e o cabeçalho, o estrado ou assoalho do carro; a traseira, peça de madeira bastante grossa que se une às duas chedas, também denominada cadeão; presa à traseira, em suspenso, está o argolão que serve: a) para arrastar o carro quando há necessidade de afastá-lo; b) servir de apoio à aguilhada quando o carro está em repouso; as chedas têm doze perfurações onde se colocam os fueiros, e são estes que protegem a carga por si sós ou cingindo a esteira, geralmente feita de taboca ( a mais preferida), de bambu ou taquara; na parte inferior, as chedas comportam ainda dois cocões de cada lado e são estes que cingem o eixo; os cocões separam-se da cheda por meio de outra peça que toma o nome de chumaço; este chumaço deve ser feito de madeira mole e própria e tem a função de, pelo atrito, fazer o carro cantar; por esse motivo é mister engraxá-lo freqüentemente para que não se queime; do centro do carro parte uma peça de madeira que vai até sua extremidade, abarcando as chedas, e tem o nome de cabeçalho, dando-se à sua ponta a denominação de pigarro, isto é, à parte de madeira que prende a tiradeira; chaveão é a peça que prende o tamoeiro; espeque, ou pau-de-espera, geralmente roliça que sustenta o carro em posição normal, firmado junto à extremidade do cabeçalho, principalmente quando a carga é pesada e há necessidade de aliviar as juntas do coice; azeiteiro é um objeto ou vasilha feita de chifre que traz o azeite emoliente com o qual se unta o eixo; eixo, em forma oblonga, oitavado e afilado no centro, ajustando-se às rodas por meio dos cocões e chumaço, sendo geralmente feito de cabreúva ou bálsamo, ipê, faveiro, aroeira ou garapa.

                O carro é puxado por quatro, seis, oito, dez ou mais juntas de bois; a 1º junta tem o nome de coice ou de cabeçalho; a 2º tem o nome de chave; a 3º meio; a 4º  contra-guia  e  também  pé-de-guia,  e  a  última  o  nome  de  guia.

                Os bois são presos uns aos outros no pasto por meio do ajoujo, quando estes já maduros têm seus chifres argolados; sendo novos e de chifres tenros, são presos por meio da songa, isto é, uma correia mole; assim ligados, o carreiro ajusta-lhes a canga que, por sua vez contém: a) chaveia, perfuração por onde passa o tamoeiro; b) o tamoeiro, grossas cordas de couro torcido que cingem a canga ao cambão; c) os canzis, peças de madeira que atravessam a canga, um de cada lado do pescoço do animal, sendo ligados por baixo da barbela por meio da brocha; os canzis são recortados em cavas por onde se ajusta a brocha; as juntas são emendadas, umas às outras e ainda ao cabeçalho, por meio do cambão, tendo na sua extremidade grossas cordas que recebem o nome de tiradeira; por sua vez, a tiradeira é cingida ao cambão por meio da chaveão, peça de madeira que o atravessa.

                Para estimular os bois, usa o carreiro a aguilhada, popularmente conhecida por vara de ferrão; a vara é sempre de madeira flexível, como a perobinha, tendo na extremidade um ferrão meio rombudo para não rasgar o couro da rês; uma chapa de ferro cinge a extremidade da vara; o ferrão tem no centro pequena perfuração onde passa um aro de ferro que, por sua vez, tem diversas pequenas argolinhas; o barulho destas basta, muitas vezes, para animar a boiada.

                Quando há necessidade de afastar o carro, colocam-se duas juntas de bois na traseira, prendendo-se o carro pelo argolão por meio do tirante ou simplesmente  da  tiradeira,  de  onde  seu  nome.

                Em viagem, o carreiro conduz sua água de beber por meio do corote, ou ancorote, e ainda por meio de cabaças; acabando-se o líquido precioso, enche sua vasilha  no  primeiro  córrego  que  encontra.

                Curiboque: é uma vasilha feita de ponta de chifre com a qual os carreiros guardam  raspas  de  fumo,  ou  rapé.

                Macuta:  capanga ou bolsa feita de couro e usada pelos carreiros para condução  de  seus  trastes.

                Mariquinha: espécie de trempe com a qual os carreiros mantêm em suspenso suas panelas; é uma espécie de forquilha tríplice, tendo ao centro um gancho.

                Café de carreiro:  beberagem preparada na estrada, em vasilha de folha, chamada chocolateira, sem emprego de coador; a borra do café é retirada por meio de  colher  e  afirmam  os  entendidos  que  se  trata  de  bebida  saborosa.

                Quebra-quebra: nome que dão aos estalidos das rodas quando o carro está  em  marcha  e  bastante  carregado.

                Recabem: outro nome do cadeão que vai preso à mesa por intermédio do cabeçalho.

               Tucura: boi que não freqüenta curral.

                Esparso: o que tem os chifres retos em sentido perpendicular à cabeça.

                Cachorro-do-mato, chapéu-de-couro: são denominações dadas ao novilho  caracu.

                Camurça: rês de cor amarelo claro.

                Amuar: ação do boi que, por raiva ou cansaço, recusa-se a prosseguir viagem, permanecendo deitado e sem ação.

                Candieiro: guia dos bois; menino que segue à frente dos bois conduzindo pequena  vara  de  ferrão.

                Cangote ou cogote: lombo, pescoço, cachaço; lugar onde descansa a canga.

Aparelhada: boiada escolhida, onde todos as juntas são iguais, quer em cor, quer em tamanho.

Espirituoso: boi irrequieto que costuma abandonar os canzis quando em trabalho.

Combuco: boi de chifres recurvados.

Gaitado: uma das três vozes do carro de bois, cujo cântico é: fino, baixão ou gaitado.

Amarrar: benzer, encantar o carro por meio de rezas e sortilégios; o amarrador costuma marcar a distância que o carro pode percorrer até ser amarrado.

Amarrador: boi manhoso que costuma deitar-se ao chão quando em marcha.

Empinar: ação do carro que consiste em elevar o cabeçalho e abaixar a traseira pondo em jogo a estabilidade da carga. Para que isso não aconteça, é preciso  saber  repartir  dita  carga.

Meio carro: como seu nome indica, comporta o meio carro metade do carro completo, sendo geralmente puxado por novilhos amansados com redobrada paciência.

Fasta: do linguajar carreiro; ordem imperativa que obriga os bois a afastarem o carro em sentido contrário à marcha; em geral, cabe à junta de coice essa  função  e  o  fazem,  erguendo  a  cabeça  bem  alto.

Ôoooa!: ordem de parada; quando a boiada é bem adestrada, em ouvindo essa  voz,  para  imediatamente  sua  marcha.

Êia!: ordem imperativa de marcha, assim como Vamos! Etc.

Emenda: auxílio costumeiro que um carreiro presta ao outro, fornecendo sua boiada para safar carro atoleiro ou auxiliar subida íngreme etc...

Curral de viúva: assim denominam curral abandonado, em mau estado de conservação.

Carrear: trabalhar com o carro, ganhar frete.

Tolda: cobertura, geralmente de couro cru e às vezes de esteira, que os carreiros põem por cima dos carros em forma arredondada para permitir o escoamento das chuvas; usam toldar o carro não só para proteger a carga, como, também, para condução de gente, como ainda é comum nas zonas afastadas, em pleno  sertão.

Nome de bois: Brilhante, Figurão, Faxineiro, Sete de Ouro, Caprichoso, Faceiro, Formoso, Cortão, Melindroso, Rodado, Estudante, Marreco, Maginado, Trigueiro, Baralho, Limoeiro, Engomado, Semblante, Passeio, Chibante, Moroso, Laranja, Dourado, Pavão, Estrela, Cadete, Marmelo, Namorado, Malhado, Fazendão, Camurça, Topázio, Completo, Mirante, Boneco, Maneiro, Durão, Capitão, Galante, Moreno, Pinheiro, Retrato, Relógio, Brasileiro, Barroso, Estrangeiro, Marcante, Violão, Saudoso, Redondo, Figurão, Suspiro, Amoroso, Quebranto,  Jeitoso,  Roseiro,  Rochedo,  Guampudo,  Espaço,  Carinhoso.

Provérbios e adivinhas

 

1 - Onde se mata o boi, aí se tira o couro.
2 - Todo mundo quer ser ferrão, ninguém quer ser boi.
3 - Boi manso é que arromba a cerca.
4 - Boi espirituoso vara no vão dos canzis.
5 - O  carreiro  trabalha  muito,  mas  só  lhe  sobra  a  cantiga  do  carro.
 
1 - Por que é que boi baba? —É porque não sabe cuspir.
2 - O que é o que é, as filhas vão adiante e a mãe vem chorando atrás? —O carro e
os  bois.
3 - São doze irmãos em viagem e nenhum deles passa adiante do outro? —Os fueiros do carro.
4 - Por que é que o boi berra? —É porque não sabe falar.
5 - O que é que vai no mato, é inhambu, quando volta, é jacú? —É o carretão, quando
vai vazio e volta com longa cauda, a tora.

 

Superstições e crendices

                 Três pancadas dadas com a aguilhada na roda do carro obrigam a boiada a marchar  quando  está  manhosa..

                Carreiro, para ser bom mesmo, precisa saber tombar o carro sem auxílio de  outrem.

                Quem aproveita suor dos bois não progride, não vai para a frente em seus negócios,  tal  qual  carniceiro  ou  açougueiro,  jamais  enriquecem.

               Se o carro não cantar, os bois não puxam com gosto.

                A cantiga do carro é um luxo para o carreiro, como o estalar dos bilros é, para  as  rendeiras,  um  incentivo.

                Caçador, carreiro e pescador são mentirosos; o primeiro fala de suas bravatas na caçada; o pescador, de que lhe escapou o melhor peixe de seu anzol; e o carreiro, como ninguém assistiu descarregar seu carro para transpor o atoleiro, diz convictamente: Oh! Minha boiada é bicharada mesmo, não negou na passagem do atolador.

                Chifre de boi queimado, e raspado, sendo posto em infusão, e tendo como veículo pinga ou erva-de-Santa Maria, faz criança lombrigueira expelir os vermes.

                Ferimento produzido em animais por arame farpado cura-se lavando a cesura  com  água  em  que  se  coseu  esse  arame.

                O gado pediu água até endurecer os chifres e o cavalo até endurecer os dentes.

                O bom carreiro acostuma os bois a passar atoleiros pondo peso reduzido no carro, pois aquele que tem pouca prática é conhecido por fazer justamente o contrário  e,  assim  fazendo,  a  boiada  facilmente  desanima.

                “Este carro para cantar é um pau de formiga” —idiotismo da gíria carreira para  demonstrar  a  excelência  do  veículo.

                “Pela cantiga do carro eu sei a cor dos bois” —também colhido na mesma gíria; “Pela cantiga do carro eu sei de que pau é o chumaço” —ambas demonstram jactância,  superioridade.

                “Seu couro está vendido” —idem, ameaça de morte ou simples gracejo entre  os  carreiros.

                O carro de bois exerce marcada influência na infância do roceiro, tornando-se brinquedo predileto do caipirinha, quer use o primitivo carrinho de sabugos e rodas de cabaça, quer os mais desenvolvidos onde atrelam cães ou cabritos.

                Carreiro surdo sabe que seu carro canta pondo a mão na traseira do veículo;  pela  trepidação  descobre  que  realmente  canta.

 Cantos e contos sobre o carro

                 Conta um carreiro que, certa vez, em viagem, subitamente seu carro parou de cantar, deu forte rugido, as rodas cessaram de rolar e a mesa saiu de arrasto, puxada pelos bois. Vendo a viola em cacos, o carreiro galgou lesto ao cabeçalho, fez uma simpatia, gritou pelos bois e o carro imediatamente voltou ao normal, prosseguindo  viagem  sem  outros  percalços.

                Dizem que havia um preto velho com tanta paixão por um carro que, não possuindo um desses veículos, arranjou um carrinho de cabritos e com ele ia buscar lenho no mato; mesmo que a viagem fosse perto do terreiro, costumava dormir na estrada para ter a sensação de uma viagem longa...

                Havia um carreiro dotado de tamanha força que, quando a boiada encalhava a carruagem, punha-a em marcha com um simples empurrão na traseira.

A alegria do carreiro
É ver o carro cantar;
Daí da frente, ó candeeiro,
Deixa esse carro rodar.
Correr atrás de boi grande;
Pedir a quem tem que dar;
Quem tem dois pode dar um,
Quem tem só um não pode dar.

Costumes locais

               Antes da era do automóvel, isto é, no princípio do século, os carreiros do município de Jaboticabal, Araraquara e até Campinas abasteciam-se de sal e outros produtos necessários; levavam seus carros atopetados de carne e toucinho salgados em grandes jacás com capacidade para um suíno gordo; gastavam muito sal para que não se deteriorasse no longo período da viagem, geralmente três meses, e isolavam as postas de carne com palha de milho, sendo o toucinho vendido na base de dois mil e quinhentos réis a arroba. Outras vezes era o azeite de mamona que servia de lastro, conduzido em barris, pano de tear e outros produtos da terra; formavam grandes comboios de quatro,cinco ou mais carros, todos levando juntas sobressalentes para revezarem os cansados e doentes, e dizem que o bois pedrentos ou pedreiros resistiam melhor. Em lugares onde não havia caminho certo, o carreiro subia ao cabeçalho do carro, daí comandando a expedição, sendo seguido pelos demais carros; saiam do pouso às dez horas, dada a dificuldade em ajuntar os bois de manhã, por falta de cercas e vedações, costumando encostá-los junto a algum córrego ou clareira; cozinhavam seu alimento em mariquinhas ou tripeças em locais adrede escolhidos para pouso junto a alguma aguada; o carreiro trazia consigo a inseparável viola e terminavam em alegres  catiras.

                Nessas longas jornadas, o eixo do carro costumava atorar, isto é, gastar-se completamente, o que obrigava o carreiro a substituí-lo por outro eixo feito na ocasião.

                O boi é amansado geralmente quando atinge dois anos de idade; atrelado a outro manso, é colocado no centro da boiada, onde vai aprendendo a marcha a seguir.

                O carro conduz geralmente de 35 a 40 sacas de arroz, mas a carga média é de 25 sacas e 80 a 100 mãos de milho, cada mão com 60 espigas.

                 O carro de bois é, para o caboclo brasileiro, seu veículo por excelência, ao passo que a carroça é o meio de transporte preferido pelo elemento alienígena. Ver um carro pilotado por um estrangeiro qualquer, italiano, espanhol ou português, é motivo de curiosidade, assim como ver um autêntico caipira guiando uma carroça de burros.

EXHORTAÇÃO

Canta, carro de bois! Canta,
que a tua sentidíssima cantiga
elasticiza os músculos retesos
dos velhos bois, que te conduzem...
Canta, carro de bois! Canta,
que a tua melancolia toada
alegra a alma ingênua do carreiro!
Canta, carro de bois! Porque, quando lá vaes
                                                          gemendo,
escondido nas cavas e nas grotas,
quem, acaso, te escuta fica imaginando
que a própria terra é que está cantando...

                                                          Poema de João de Mello Macedo.

O carro de bois no folclore

                 Estando o carro encravado e a boiada desanimada de fazer força, o melhor é desabotoar a tiradeira no pigarro, dar em seguida três voltas com a boiada em torno do carro e, refeita novamente a emenda, isto é, posta a boiada em seu lugar, o carro  sai  sem  outra  dificuldade.

                Costume é também, para casos tais, cavoucar com enxadão adiante da roda; neste caso, não se porá o enxadão dentro do carro antes de ele safar-se, porque,  fazendo-o,  não  aluirá.

                Para obrigar a junta de guia, que não quer afirmar-se nessa posição, tira-se a junta do coice, coloca-se esta na frente e o carro andará; logo a seguir, retornar a  junta  para  o  coice  e  a  guia  prosseguirá  bem.   

                Se o carro está queimando, está aluído ou com falta de graxa; como remendo provisório, aconselha-se ao carreiro urinar na cantadeira do carro.

                Boiada de carro no encosto, para não fugir dessa posição, pegam-se os ajoujos, dá-se uma laçada com eles e põe-se no argolão ou na oca do carro; com essa  simpatia,  os  bois  ficam  amarrados  e  não  saem  da  querência.

                Carreiro ganhava outrora $500 e seu ajudante $500; ganha hoje 10$000 de jornal e o candeeiro $5000; o ganho diário, inclusive o carro, é de R.s 25$000 a 30$000.

Tanabi, 31 de outubro de 1941.

Santo Antônio e a tradição popular

                Não é possível desconhecer o influxo espiritual de Santo Antônio na vida social brasileira, comenta Ataliba Nogueira em magnífico ensaio onde estuda a influência do querido santo em nossa tradição. Realmente, a presença do taumaturgo, lisboeta e paduano a um só tempo, na alma brasileira, é patente e imorredoura como legado valioso que herdamos de nossos maiores, e se manifesta pela devoção popular, muitas vezes preenche de abusões, mas sincera e comovente. Já em 1856, trezentos anos volvidos, num sermão que ficou famoso pela linguagem usada, proferido no Maranhão, assim falou Vieira, manifestando-se sobre as virtudes do santo franciscano: “Se vos adoece o filho, Santo Antônio; se vos foge o escravo, Santo Antônio; se mandais a encomenda, Santo Antônio; se esperais o retorno, Santo Antônio; se requereis o despacho, Santo Antonio; se perdeis a menos miudeza de vossa casa, Santo Antonio; e, talvez, se quereis os bens alheios, Santo Antonio”. É ele, pois, pau para toda obra, espécie de fac totum que tudo resolve e a quem se recorre nos momentos difíceis, eterno e incansável esbanjador  de  milagres.

                Daí sua presença constante entre nós, onde foi soldado das tropas coloniais com patente de capitão, tomando parte saliente nas defesas da Bahia, Pernambuco, Rio e outros pontos do litoral, sempre que invocado fora na refrega ingente.

                Contam-se aos milhares, pelo Brasil afora, os que lhe usam o nome e, por isso mesmo, festejam-no jubilosos em sua data natalícia —13 de junho. É o orago de centenas de freguesias, padroeiro de muitos conventos, irmandades e confrarias; na toponímia, ruas, praças, povoados, cidades e ainda rios, montes e acidentes naturais deste vasto país trazem seu glorioso nome repetido. Em muitos lugares fazem, os devotos, piedosas romarias às suas ermidas, e, noutros, novenas e trezenas que lhe são consagradas de envolta com os primeiros tributos pirotécnicos do  adorável  mês.

                As moças lhe escrevem ternos bilhetes em confidências íntimas e, quando o santo se mostra irredutível, vão às vias do cabo, arremessando sua imagem ao solo três vezes, ou arrancam violentamente o menino Deus de seus braços, com o propósito de lhe mover o ânimo. Incontáveis promessas e ex votos lhe são dedicados diariamente, mas, quantas vezes, oh! Ignomínia, mergulham sua imagem dulcíssima em pleno charco com o fim utilitário de obterem chuva. Para que as coisas perdidas apareçam, rezam as mulheres, com muita fé, seu conhecido responso; mas as moçoilas irreverentes vão ao cúmulo de descer sua imagem “de cabeça para baixo”, ao fundo do poço, onde permanecerá até que seja conseguido apaixonado anelo: retorno da pessoa amada ou próximo casamento, de onde esta quadrinha, vazada em linguagem desprevenida, mas bastante expressiva:

                Meu Santo Antonio querido,
                Meu Santo de carne e osso,
                Se tu não me dá marido,
                Não tiro você do poço.

                 E o achador de coisas perdidas, em concorrência, às vezes, com o diabo, - verdadeiro êmulo de São Longuinho, a quem todos confiam o encontro de suas perdas: mas a imaginação popular vai mais longe e dele exige trabalhos bem mais penosos, como este da quadra seguinte:

                Santo Antônio pequenino
                Mansador de burro brabo
                Vem amansar minha sogra
                Que é levada do diabo.

                 E a superstição manda que, se vos dói a cabeça, basta envolvê-la com bandeira que traz a efígie do Santo, dessas que tremulam galhardamente na imensa maioria das habitações rurais, e o alívio vem pronto e eficaz; mas, se quereis ganhar corridas de cavalos, cumpre enterrar a imagem do milagroso na meta final da raia ou pista. Contra malignas influências, vezes sem conta temos visto sua imagem ornando mercearias e farmácias, e bem poucos lares brasileiros prescindem suas representações iconográficas em artísticas litografias de suave evocação.

                E o trovador ambicioso seu desejo assim define:

                 Não quero Santo Antônio grande
                Dentro de meu oratório;
Eu quero é o pequenino
Porque faz meu peditório.

                 Conhecida lenda registra que, estando o Santo a pregar em Lisboa, recebe, nesse momento, comunicação de que seu pai ia ser levado à forca como criminoso; imediatamente recomenda o Santo aos fiéis que entoem uma Ave-Maria enquanto vai a Roma justificar a inocência de seu progenitor, regressando a tempo de com eles concluir a celestial prece. Ressabidos dessa crendice, vislumbramos na cantiga circense com a qual rematamos es linhas destituídas de nenhum mérito:

Santo Antônio é bom santo
Que livrou seu pai da morte,
Mas não livra estes meninos
Da ponta do meu chicote

                                                                                                   Tanabi, 13 de junho de 1942.

Crendices Joaninas

                Remonta aos tempos bíblicos a origem das fogueiras e do mastro de São João que neste mês crepitam e se erguem em todos os lares do interior brasileiro; repousa, segundo a lenda poética de Afonso Arinos, no sinal convencionado entre Nossa Senhora e sua prima Isabel: aquela cujo bebê chegasse primeiro anunciaria o fato mandando fincar um mastro na montanha próxima e acenderia em torno uma fogueira. Couberam as honras da anunciação a Isabel, porque estava escrito que São João Batista seria o precursor do Divino Infante. Nasceram daí as comoventes festas joaninas, outrora mais brilhantes que hoje, em que o ardor e a devoção vão, infelizmente,  morrendo.

                Cumpre, por esse motivo, ir resguardando a flor mais pura das nossas tradições, das ternas superstições nascidas em torno dessa encantadora natividade, antes que elas se percam no olvido dos dias tumultuosos que passam.

                Conquanto menos acessível que Santo Antônio, o dileto filho de Isabel, que teve a ventura de batizar o meigo Bambino, é bem o santo casamenteiro por excelência, freqüentemente invocado pelas candidatas ao conjugo vobis, e assim é que, para saber qual o futuro esposo, deve a moça escrever o nome de todos os prediletos, em diferentes retângulos de papel que, devidamente enrolados, são colocados ao sereno em plena noite joanina; aquele que amanhecer mais entreaberto, conterá esse o nome do escolhido; outro método consiste na oferta de uma ceia à meia noite desse advento a todos os prováveis pretendentes: aquele dos primeiros que surgir, aos olhos da enamorada, esse será o felizardo com o qual se unirá pelos laços do himineu; mas, para simples obtenção do nome do futuro esposo, enterrar, ainda nessa noite benquista, afiada faca em caule de bananeira e quando o sol surgir de novo, ao retirar a lâmina, encontrará nesta gravadas as iniciais do ambicioso noivo; casamento espontâneo e breve logrará aquela que atirar uma madeixa de seus cabelos na cova onde será plantado o mastro de São João; plantar três dentes de alho na sagrada noite, pensando firmemente na pessoa ideal e querida, e amanhecendo, estes brotados: casamento na certa; moça que quer descobrir quais as posses de seu futuro, nada mais fácil que colocar debaixo do travesseiro, em noite de São João, três grânulos de feijão, um deles com sua pevide, outro semi descascado e o terceiro desprovido de casca; ao amanhecer, retirará um deles, indicando a primeira riqueza; o segundo posses medianas e pobreza o último; prenúncio certo de casamento é o fato de acontecer saltarem simultaneamente  fogueira  de  São  João  dois  jovens  de  sexo  oposto.

                Aquele que, à meia noite de São João, a mais curta do ano, segundo a tradição, não divisar, no espelho das águas, sua efígie completa, nesse mesmo ano morrerá;  daí a  quadrilha  popular:


                Na noite de São João
                Fui lavar as minhas mágoas,
                As mágoas tão negras são
                Que enegreceram as águas.

                Água apanhada no rio, ao clarear desse dia, tem o condão de espantar sevandijas,  baratas  e  percevejos.

                Caule de mangueira, mangifera indica, engrossa facilmente sendo riscado a  canivete  na  véspera  de  São  João.

                E as árvores maninhas, jaboticabeiras e laranjeiras de preferência, florescem  e  frutificam  sendo  surradas  nessa  adorável  madrugada.

                No decorrer dessa noite, apanhar o primeiro ramo que se encontrar no caminho e com ele friccionar as verrugas é obter cura radical dessas incômodas excrescências.

                Para aplacar tempestades: queimar restos de lenha, servida em fogueira de São João, e quem tem fé inabalável no Evangelista pode atravessar descalço e incólume  sua  ardente  pira.

                Finalmente, para ter sorte, basta encontrar pedra expedida do bucho de rês nascida em noite de São João. São João, entretanto, não assiste às comemorações de seu genetlíaco e dorme três dias a fio, reza popularíssimo reconto, porque, dizem, se soubesse quanto é festejado na terra sentir-se-ia orgulhoso e perderia sua alma. Variação dessa lenda é a que vem expressa nas seguintes  expressivas  quadras  do  folclore  popular:

 

São João está dormindo,
Não acorda, não!
Dê-lhe cravos e rosas
E manjericão.
 
Se São João soubesse
Que era hoje seu dia,
Descia do céu à terra
Com prazer e alegria.

                                                                                                 Tanabi, 24 de junho de 1942.

Para o Historiador

Sebastião Almeida... os deusesderam-te um belo destino:ser escritor, fina lavra,desde criança, menino...

Em terra inculta escrevestea bico de arado brutoe a terra se abriu em flore a terra se abriu em fruto.

Escreveste em branca páginaa bico de culta penaficou a página históricae ficou também poema.

Poema à terra formosa...borboletas...rio fluente...história de altivo povono passado e no presente...

Povo e terra agora escreveno coração, na memória,o teu nome, monumentoum monumento de glória.

* Este poema é uma homenagem do Poeta e Prof. Luiz  Maria Aimones Fúmis. Amigo de longas datas de Sebastião Almeida Oliveira.










   



            











        
























5 comentários:

  1. ALEGRIA: bairro e córrego afluente do ribeirão Jataí distante cerca de oito quilômetros da cidade. Querem alguns que o verdadeiro nome da fazenda geral “Jataí de Baixo” seja esse de Alegria, dado que é lá que se processou uma das primeiras posses nas terras de Juca Boiadeiro hoje pertencente a terceiros. Gostaria de acrescentar que, Juca Boiadeiro era meu avô e seu nome era José Alves Garcia. Permutou sua propriedade em Tanabi com outra em Aparecida do Taboado MS (MT naquela época) onde residiu até falecer, acredito que no início de 1941 pois meu irmão, que é de 17/06/1941 tem o seu nome mas não tem Neto no nome pois o avô havia falecido. Juca Boiadeiro trouxe consigo toda a família, filhos, noras e netos.

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  2. ALEGRIA: bairro e córrego afluente do ribeirão Jataí distante cerca de oito quilômetros da cidade. Querem alguns que o verdadeiro nome da fazenda geral “Jataí de Baixo” seja esse de Alegria, dado que é lá que se processou uma das primeiras posses nas terras de Juca Boiadeiro hoje pertencente a terceiros. Gostaria de acrescentar que, Juca Boiadeiro era meu avô e seu nome era José Alves Garcia. Permutou sua propriedade em Tanabi com outra em Aparecida do Taboado MS (MT naquela época) onde residiu até falecer, acredito que no início de 1941 pois meu irmão, que é de 17/06/1941 tem o seu nome mas não tem Neto no nome pois o avô havia falecido. Juca Boiadeiro trouxe consigo toda a família, filhos, noras e netos.

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  3. Para ser mais exato, se assim posso dizer pois é o que ouvi pois sou mais novo e nem conheci meu avô, Juca Boiadeiro permutou sua propriedade de Tanabi SP com uma outra que era de propriedade de Joaquim Lucas em Aparecida do Taboado MT (Naquela época) e parte dessa "fazenda" de Aparecida do Taboado, meu avô doou para a Igreja onde foi formado o Patrimônio Bom Jesus e que ficou mais conhecido como Cabajá.
    e ainda mais, meus irmãos mais velhos referiam-se a Jerônimo Fortunato como Tio, não sei realmente qual o grau de parentesco.

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  4. Recentemente conversando com meu irmão mais velho, fez 92 anos em
    28 de junho deste ano, ele disse que Jerônimo Fortunato era genro
    de Juca Boiadeiro, meu avô, casado com Maria Alves Garcia, apelidade de Maria Juca, faleceu em Araçatuba SP.

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  5. Juca Boiadeiro é avô do meu falecido sogro, Antônio Martins Garcia (Tortéia). Estou fazendo a árvore genealógica da família no site https://www.familysearch.org/ , se puder acrescentar dados lá, vamos aumentando as informações. Qualquer dúvida, me chame no email deboralfg@hotmail.com

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